quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Oito competências-chave

1. Como é sabido, em 2001 o Ensino Básico Português sofreu uma reorganização curricular.

2. A lógica dessa reorganização, à semelhança doutras que foram realizadas noutros países, assenta, não em conteúdos, mas em competências.

3. A noção de “competência”, constante no Currículo Nacional do Ensino Básico vigente, tem levantado, entre os professores, inúmeros problemas de entendimento, de operacionalização e de utilização.

4. Não, não são (todos) os professores que entendem mal. A noção é que, tal como se apresenta, é equívoca. Isto é reconhecido, preto-no-branco, pelos principais mentores do Movimento de Reorganização Curricular por Competências (posteriormente, noutro texto, poderei apresentar algumas das suas explicações).

5. Face às muitas dúvidas levantadas pelos professores desde 2001 até ao presente, a tutela e os especialistas que advogam a noção tem divulgado inúmeros documentos que a abordam. Também se têm publicado muitos artigos em revistas de educação, bem como vários livros técnicos e de divulgação.

6. Uma das muitas dúvidas dos professores é a seguinte: qual o lugar dos conteúdos num ensino organizado por competências?

7. Têm os professores razões para expressarem tal dúvida, pois uma das “mensagens” (entre o explicito e o subliminar) que passa quando se aborda a noção de “competência” é que os conteúdos serão contemplados na condição de servirem para se adquirirem de competências, estas sim o cerne do ensino.

8. Que outra conclusão se pode tirar das seguintes frases retiradas do documento curricular acima referido: a competência “integra conhecimentos, capacidades, atitudes, estratégias…” e “a aquisição progressiva de conhecimentos é relevante se for integrada num conjunto mais amplo de aprendizagens e enquadrada por uma perspectiva que coloca no primeiro plano o desenvolvimento de capacidades de pensamento e de atitudes favoráveis à aprendizagem”?

9. Ainda assim, nesse documento, depois de apresentadas as competências gerais (que são dez) e a sua operacionalização transversal (que soma quarenta e seis), são apresentadas as áreas disciplinares com as respectivas competências (cujo número varia).

Mas, muito importante, reconhece-se a existência de áreas disciplinares, sinal, digo eu, de que há conhecimentos que podem e devem ser tratados com os alunos.

10. Ora, foi noticiado recentemente que o Conselho de Escolas, além de se preparar para apresentar proximamente uma proposta para nova revisão curricular do Ensino Básico (outra!), ela assentará em competências estabelecidas pela União Europeia.

11. Li que o presidente deste orgão consultivo do Ministério da Educação, sublinhou a necessidade de formarem áreas de competências, áreas curriculares com disciplinas ou conjuntos de disciplinas: "Se temos uma competência histórico-geográfica para desenvolver com os alunos, não precisamos de ter uma disciplina de História e outra de Geografia. Poderão juntar-se", exemplificou.

12. Apesar do exemplo não entendi bem; melhor não entendi a ligeireza com que se descartam disciplinas fundamentais, como a História e a Geografia, ao mesmo tempo que se introduzem estranhas temáticas como "empreendedorismo".

13. E muito menos entendi o que se segue: “O importante é que a nível do Ensino Básico se consigam desenvolver as oito competências-chave (...): comunicação na língua materna e em línguas estrangeiras, competência a Matemática e competências básicas em Ciências e Tecnologia, competência em Tecnologia Digital, Aprender a Aprender (ter competências para aprender sempre), competências sociais e cívicas, espírito de iniciativa e empreendedorismo, consciencialização da identidade cultural e a sua expressão."

Esperemos para ver o que se segue. Mas o que se segue será nesta linha, pois está estabelecido na União Europeia que assim seja.

Notas:
Para escrever este texto consultei um artigo do jornal Público, que se pode encontrar aqui. No De Rerum Natura escrevi dois textos sobre a questão das competências: aqui e aqui.

5 comentários:

José Meireles Graça disse...

Durante o séc. XV, uma intriga palaciana na Corte Chinesa levou a que a expansão marítima do Império se suspendesse e A China se voltasse para si mesma. Não tivera sido assim e, quem sabe, os Chineses (que detinham a mais avançada tecnologia de navegação, à época) teriam talvez descoberto o caminho marítimo para o Ocidente. Lembrei-me disto a propósito desta nova maluqueira da clique bruxelense. A Europa da diversidade sempre foi terreno de lutas e morticínios. Também foi sempre terra de progresso, por a diversidade de experiências levar a que umas se afirmassem e outras não. Lá vamos, a caminho da uniformidade pateta.

José Batista da Ascenção disse...

Sobra-me a idade/experiência e falta-me a saúde e a paciência para me pronunciar sobre as baboseiras que estaremos obrigados a seguir. Pois se o que temos tido nos conduziu até aqui... Aprender a aprender? Mais? Outra vez? Apenas afirmo: pobres dos mais pobres dos portugueses, ou eu sou muito pessimista (tomara que o fora)ou vão estar reduzidos à mais vil "escravatura" - a "escravatura" da ignorância e da miséria.
Vá lá, todos a chamarem-me pessimista.

Fartinho da Silva disse...

Concordo em absoluto com o José Batista..., posso estar enganado mas estou em crer que as disciplinas centrais estão em vias de desaparecer para dar lugar a áreas disciplinares transversais... é o pós-modernismo em todo o seu esplendor em aplicação prática nos desgraçados dos alunos sem capacidade financeira para fugirem à "escola" pública das experiências muito giras, "progressistas" e "democráticas"!

rt disse...

Depois de um ensino básico "organizado" desse modo, escolaridade obrigatória até ao 12º ano! Vai ser difícil, mas eu sei qual é a receita do "sucesso". Para que os ilumidados que nos governo possam apresentar resultados "positivos" numa qualquer conferência de imprensa (perante jornalistas semi-analfafabetos e incapazes de fazer uma pergunta digna desse nome), bastará implementar estas 2 medidas: proibir as reprovações e acabar de vez com os exames nacionais (ordenar o facilitismo, como tem sucedido, talvez não seja suficiente).
Em breve, Portugal estará à frente da Finlândia e da Coreia do Sul - nas estatísticas do nosso governo e não nas do PISA, claro!

zé povinho disse...

quem sabe se isto tudo não é programado. cidadãos ileterados e incompetentes é o sonho de qualquer governante.

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