terça-feira, 1 de dezembro de 2009

HEGEL SOBRE O PAPEL DA ESCOLA


Temos falado aqui repetidas vezes do papel da escola. Ao ler os "Discursos sobre Educação" do filósofo alemão G. W. F. Hegel (Edições Cotovia, 1994, tradução e introdução de Maria Ermelinda Trindade Fernandes) achei que valia a pena deixar aqui um passo do discurso de encerramento do ano lectivo do Gymnasium (Liceu) de Nuremberga que Hegel, na qualidade de Reitor, proferiu a 2 de Setembro de 1811 (a gravura mostra Hegel a dar uma lição):
"A vida na família, isto é, aquela que antecede a vida na escola, é uma relação pessoal, uma relação do sentimento, do amor, da fé e da confiança naturais; não é o laço de uma coisa, mas o laço natural do sangue; a criança aqui vale porque é criança; experimenta, sem o merecer, o amor dos pais, assim como tem de suportar a sua cólera, sem ter qualquer direito contra esta. Em contrapartida, no mundo, o homem vale por aquilo que realiza; só tem valor na medida em que o merece. Pouco lhe advém do amor ou por causa do amor; aqui vale a coisa, não o sentimento e a pessoa particular. O mundo constitui um ser comum, independente do que é subjectivo; o homem vale aí segundo a sua habilidade e utilidade para uma das suas esferas, tanto mais quanto ela se desfez da particularidade e se formou no sentido de um ser e um agir universais.

A escola é portanto a esfera mediadora que faz passar o homem do círculo familiar para o mundo, das relações naturais do sentimento e da inclinação para o elemento da coisa. Isto é, na escola começa a actividade da criança a receber, no essencial e de forma radical, um significado sério, na medida em que deixa de estar ao critério do arbítrio e do acaso, do prazer e da inclinação do momento; aprende a determinar o seu agir segundo uma finalidade e segundo regras; cessa de valer pela sua pessoa imediata e começa a valer por aquilo que realiza, a conquistar para si um mérito. Na família, a criança tem de agir correctamente no sentido da obediência pessoal e do amor; na escola tem de se comportar segundo o sentido do dever e de uma lei, por causa de uma ordem meramente formal, fazer isto e abster-se daquilo que de outro modo poderia bem ser permitido ao singular. Ao ser ensinado em comunidade com muitos, aprende a atender aos outros, a ter confiança em outros homens que de início lhe são estranhos, a ganhar confiança em si mesmo ma sua relação com eles, e, deste modo, a iniciar-se na formação e na prática das virtudes sociais."

1 comentário:

Manuel de Castro Nunes disse...

Pois... Não é desta escola que se tem andado a falar...
Andamos a falar da escola onde a criança não «deixa de estar ao critério do arbítrio e do acaso, do prazer e da inclinação do momento», não já dela, mas da escola e do sistema.
Talvez fosse oportuno complementar a citação de Hegel com outra de Sócrates/Platão, Politeia: «Nem interessa que esta cidade exista ou venha a existir (...) o que interessa (...)».

O corpo e a mente

 Por A. Galopim de Carvalho   Eu não quero acreditar que sou velho, mas o espelho, todas as manhãs, diz-me que sim. Quando dou uma aula, ai...