sábado, 14 de novembro de 2009

ESQUIZOFRENIA


Destacamos a crónica do médico J.L. Pio de Abreu no "Destak" de ontem (na imagem "O grito" de Munch):

Um sintoma típico da esquizofrenia é a divulgação do pensamento. Os doentes convencem-se de que alguém lhes tira os pensamentos e os divulga por todo o lado. Imagine-se o seu drama. Devassados na mais profunda intimidade, os seus desabafos, irritações, expectativas, fantasias e mesquinhices são expostos na praça pública. Sem poderem guardar segredos, eles anulam os sentimentos e remetem-se a um comportamento artificial. Fica uma consolação: quanto mais pessoas falarem deles, mais importantes se sentem.

Quando surgiram os telemóveis e a internet, muitas raparigas descobriram que os seus ex-namorados, zangados mas conhecedores da tecnologia, sabiam tudo o que elas faziam e pensavam. Pura e simplesmente, interceptavam os computadores e telemóveis, ficando ao corrente do mínimo desabafo ou combinação com amigas. Sem serem esquizofrénicas, elas sentiam o mesmo drama e obrigavam-se a adoptar pensamentos e sentimentos artificialmente correctos. Temo, aliás, que muita gente, consciente da iminente devassa da sua intimidade, já se tenha habituado ao politicamente correcto.

A esquizofrenia tem a ver com a presença de vias cerebrais anómalas que levam informação onde não a deviam levar. Em Portugal, também se estabeleceram vias anómalas entre sectores do Ministério Público e da Comunicação Social. Será esquizofrenia social? O certo é que os doentes têm, finalmente, razão. Há quem roube pensamentos para os divulgar na Comunicação Social. De facto, podem roubar o pensamento a muitos, mas só divulgam o daqueles que são importantes.

J.L. Pio Abreu

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