O nosso dia a dia encontra-se profundamente marcado pela ciência. Tal acontece devido a objectos tecnológicos – objectos relacionados com a ciência – que cresceram e se multiplicaram a ponto de estarem omnipresentes à nossa volta. Basta acordar de manhã por um rádio-despertador e aquecer um copo de leite no microondas para reconhecer que o nosso dia começa com um “banho” tecnológico. Logo a seguir continua na nossa profissão que, hoje em dia, não dispensa o computador (máquina que arredou várias outras ou entrou por dentro de várias outras) e o telefone (que já entrou nos nossos bolsos). À noite, a televisão apodera-se das nossas horas de lazer. A Internet – esse casamento do computador com o telefone – entrou também no nosso quotidiano, tanto de dia como de noite, tanto no trabalho como no lazer.
Onde está a ciência em todos esses artefactos? Em todo o lado, embora de forma invisível. As ondas de rádio e as microondas como formas de radiação foram um belo resultado matemático na teoria do electromagnetismo antes de serem a resposta à necessidade prática de enviar informação à distância ou de aquecer os alimentos. O computador, o telefone e a televisão não seriam possíveis sem a busca da primeira das partículas elementares - o electrão. E a World Wide Web (cujos endereços até já aparecem nos programas de rádio e nos pacotes de leites) é o resultado da investigação em Física de Partículas no CERN, em Genebra, Suíça: de meio profissional dos cientistas partilharem os seus dados experimentais passou rapidamente a meio global de comunicação.
A ciência é, em primeiro lugar, a descoberta do mundo. Só depois, como um bónus (bónus porque não está garantido à partida e só se recebe com alguma sorte!), é um meio de transformar o mundo para se viver melhor nele. A procura do conhecimento a respeito do mundo é uma das marcas mais essenciais da espécie humana, ela própria parte desse mundo. Tal procura tem um método, o chamado método científico. Requer a dúvida, a crítica, a admissão do erro. E exige a transmissão livre aos contemporâneos e aos vindouros.
Há um paradoxo quando se fala em ciência e quotidiano. O nosso quotidiano mudou, de facto, com os prodígios derivados da ciência, mas continua, em muitos aspectos, alheio a ela. A ciência está em todo o lado, mas não há suficiente consciência dela. Não é suficientemente reconhecido o valor do método científico. Lida-se mal com a dúvida, não se exerce a crítica, ignora-se o erro. Há quem use os mais modernos telemóveis, com Internet, GPS e tudo, mas recuse a atitude científica e até por vezes a racionalidade. Há correntes que permeiam a nossa sociedade (incluindo, desgraçadamente, a escola) que diminuem e até combatem a ciência, lembrando, por exemplo, os riscos e danos da tecnologia. Esquecem-se que, se é verdade que há riscos e danos associados à ciência, como de resto os há em qualquer actividade humana, eles só se podem enfrentar e debelar não com menos mas com mais ciência.
O que nos falta para ultrapassar o referido paradoxo? Precisamente a cultura científica, quer dizer, a ciência no seio da sociedade, a ciência interiorizada nas nossas vidas. Como tão bem disse Carl Sagan, falta ainda “a ciência compreendida e acolhida por toda a comunidade humana”.
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5 comentários:
Há correntes que permeiam a nossa sociedade que diminuem e até combatem a ciência (...) falta ainda “a ciência compreendida e acolhida por toda a comunidade humana”
Infelizmente a religião é a corrente anti-ciência com mais peso. Atente-se nesta notícia
O sangue do padroeiro de Nápoles, São Januário, tornou-se líquido este Domingo, de forma extraordinária, quando o Patriarca da Igreja ortodoxa do Chipre, Crisóstomo II, estava perante o relicário.
O prodígio, considerado pela tradição como de bom augúrio, foi classificado pelo Cardeal Sepe como "sinal da providência do Senhor e da vontade de São Januário de transformar Nápoles numa ponte entre as religiões, para construir a paz".
Mas o pior é a mentira descarada que vem a seguir;
"um grupo de cientistas da Universidade de Turim confirmou há anos que a substância contida nas duas ampolas do relicário é sangue autêntico. Os cientistas reconheceram então que não podiam explicar por que razão o pó se transforma em sangue num dia determinado e a seguir em pó, precisamente até à data seguinte."
A ciência antes de ser Técnica é e tem que ser cultura.
Penso muitas vezes no referido problema. É de facto impressionante o peso que a escola exerce numa cultura não-científica (não direi anti-científica).
Uma cultura anti-científica é pró-activa em aniquilar o método científico. Não será este o caso da escola. Mas só muito tarde na minha vida académica: já depois de aprender muitas fórmulas e de fazer muitas contas, derivadas, etc... só aí é que percebi que grande parte das teorias me foram apresentadas como verdades absolutas e nos foram impostas. Não se aprendeu a existência de certas escolas de pensamento, não se aprendeu que até chegarem a ficar sólidas foram necessários processos de revisão e de exposição à crítica. O tão falado espírito-crítico não é incutido aos alunos nas nossas escolas, e depois admiram-se que as pessoas leiam qualquer livro, ou qualquer teoria e a engulam. É o que acontece nas escolas: engolir o que diz no livro.
A cultura científica é uma atitude que deve ser cultivada em mais áreas da nossa vida. O espírito crítico é de grande importância para que as pessoas possam ter um pensamento independente acerca do seu mundo.
"Há uma maior diferença entre um ser humano que sabe mecânica quântica e outro que não sabe, do que entre um ser humano que não sabe e os grandes símios" - Murray Gell-Mann.
"Mais de 25% do produto mundial bruto depende da nossa compreensão da Mecânica quântica"-da Scientific American
Ó Rita tão irritada! ;)
Onde está a tal "mentira descarada", afinal?! Será nessa notícia ou na mera suposição não confirmada desse post dos "Bloody Miracles"?
Hummm... já me faz lembrar as ingénuas demonstrações - pouco convincentes e forçadas, mas enfim - do inefável Randi acerca dos poderes telecinésicos de Geller, profusamente documentados em experiências controladas e que, como já disse no tema próprio, foram igualmente reproduzidas por outros "paranormais". Afinal, convém que as experiências científicas sejam replicáveis, certo?! :)
Voltando ao tema, há de facto notícia de que, em 1986, uma equipa de seis especialistas, sob a direcção do Professor Dr. Pier Luigi Baima Bollone da Universidade de Turim, concluiu tratar-se de sangue humano esse contido nos tais relicários em Nápoles.
Já agora, este Professor é o mesmo que, 8 anos antes, também atestou a veracidade do santo sudário, outro tema super-controverso e que continua a dar muito que falar.
Bem, mas como prenda aqui aos cépticos remeto-os para o artigo bastante completo do Comité Italiano para a Investigação do Paranormal, e que no fundo é neutral. A hipótese tixotrópica também está lá, mas a questão de fundo quanto à natureza do "sangue" permanece por esclarecer.
http://www.cicap.org/en_artic/at101014.htm
De notar, que embora sem dar pormenores, esse artigo confirma a existência do estudo da Universidade de Turim, ainda que não o considere conclusivo, apontando algumas falhas ou possíveis interpretações diversas.
Em suma: não há nenhuma "mentira", nem descarada nem mascarada, mas apenas atrevimento e falta de rigor de quem fala de cor sem investigar com isenção e verdadeiro espírito científico, só porque os "milagres" parecem impossíveis... e já está!
Neste contexto, a hipótese de sangue humano, mesmo que contaminado com alguma outra substância, é ainda mais rigorosa e válida do que a mera especulação "a la Randi" de Margherita Hack mai-lo o óxido ferroso!
Talvez sim... talvez não... quem sabe... pois então! :)
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