segunda-feira, 22 de outubro de 2018

VASCO PULIDO VALENTE NO "PÚBLICO" SOBRE OS PORTUGUESES E OS DESCOBRIMENTOS


Vale a pena ler a entrevista do historiador ao PÚBLICO  em https://www.publico.pt/2018/10/21/politica/entrevista/portugueses-optimos-1848215

Eis um extracto:

"P- Acha que os portugueses têm sentimento de superioridade?

 VPV- Têm! Com certeza que sim!

P-  Acha mesmo? Por que é que diz isso?

VPV- Está a dizer isso porque os portugueses dizem mal dos outros portugueses e de Portugal. Mas isso significa que têm a segurança necessária e sufi ciente para dizerem mal de Portugal e dos portugueses. Vá arranjar um húngaro que diga mal da Hungria e dos húngaros! Não arranja um! Pronto, deve haver um. Isto é um exagero retórico. Encontre um polaco que diga mal da Polónia como nós dizemos de Portugal... Deve haver poucos. Nós somos seguríssimos. A coisa mais importante que é preciso ter na Europa nós temos, que é a nacionalidade. Temos mil anos. Leia o ensaio da Hannah Arendt sobre a nacionalidade. Se você não tiver nacionalidade, não existe.

 P- Portanto, ter um Estado-nação com estas características é uma vantagem nesta altura...

VPV- Com certeza. Os portugueses têm uma segurança que ninguém tem. Inabalável. O que custou a alguns portugueses foi deixar de ser portugueses porque a nacionalidade os perseguia mesmo quando eram exilados. Anos e anos, depois continuavam a ser portugueses. Uns continuam a ser portugueses porque ensinam Português em universidades estrangeiras ou escrevem para jornais portugueses, outros porque são do Benfica ou do Sporting. Mas continuam todos a ser portugueses. Temos uma nacionalidade inabalável e não é só por termos fronteiras. É porque em Angola se fala português quase sem acento [sotaque], porque no Brasil se fala português, porque demos a volta ao mundo — bem sei que foi no século XV e XVI. Mas isso é um pilar, nós não precisamos de provar nada ao mundo. Um país tão pequenino que fala português como o Brasil, como Angola, deu a volta ao mundo e foi à Índia...

P- Isso deve-nos orgulhar?

VPV- Não é orgulhar. É o não termos de provar nada a ninguém. Nós somos óptimos!

P- Se se chamasse Museu dos Descobrimentos para si não era problema nenhum?

VPV- Não era problema nenhum. Essa coisa do esclavagismo é muito simples. Nós não tínhamos dinheiro, quando se começou a fazer o comércio de escravos intensamente, não tínhamos dinheiro para ter uma Armada que vigiasse a costa de Angola e de Cabo Verde. Era uma fronteira livre, pilhava- se tudo, homens, mulheres, crianças, ouro, pedras. Ninguém em Portugal era oficialmente pela escravatura, que não existia legalmente desde 1876. É verdade que houve escravos até muito tarde em Portugal, que acabaram por se fundir na população. No século XVII, o padre António Vieira começou a pregar contra a escravatura e contra os abusos dos brancos. Mas Portugal não tinha meios para patrulhar as costas para impedir o comércio de escravos.

P-  Acha que esta discussão toda é um sintoma do politicamente correcto?

VPV-  É para estes senhores e estas senhoras justificarem a sua existência. Os propagandistas do politicamente correcto são muitas vezes ignorantes e o que eles dizem é muitas vezes grotesco. Mas, se repararem bem, o politicamente correcto é o individualismo, são tudo causas individualistas, são causas para libertar o indivíduo e lhe devolver o livre-arbítrio, até ao ponto de eu escolher se quero morrer. Ao Estado português não interessa se um indivíduo quer morrer, há muita gente que quer morrer. O problema é saber quem o mata. O médico assistente? Haverá médicos no hospital especialistas em matar pessoas? Uma espécie de carrascos com o curso de Medicina?

P- Mas o Museu dos Descobrimentos é uma proposta do PS, de Fernando Medina, que só recuou por causa de protestos de alguns académicos.

VPV- Eu tenho um nome que até foi usado por Salazar, que é o “Museu do Mundo Português”.

P- A exposição de 1940 era a Exposição do Mundo Português. Se o Museu dos Descobrimentos já causa polémica, imagine-se esse... Esse é mesmo neocolonialista.

VPV- Não é. É contar o mundo que, no passado, foi dos portugueses. É passado. O que foi efectivamente, bom, mau ou assim-assim."

2 comentários:

Anónimo disse...

Nós podemos ser ótimos, como diz Vasco Pulido Valente, mas se tivéssemos mais algum dinheiro, ainda seríamos melhores!
Atualmente, para além do passado glorioso, dos séculos XV e XVI, e do Eça, do século XIX, praticamente já só temos estradas, como dizia El Rei D.João II, mas, agora, empenhadas!

Anónimo disse...

Ler e ouvir VPV é um prazer.
O homem pensa, analisa e parece não fazer fretes.
Colem-lhe os rótulos que quiserem, isso é irrelevante, como irrelevantes são todos os rótulos.
Um bom recorte, este destacado por e publicado no "De Rerum Natura".
Mais uma dúzia deles e safar-nos-iamos.

O FÍSICO PRODIGIOSO

  Cap. 43 do livro  "Bibliotecas. Uma maratona de pessoas e livros", de Abílio Guimarães, publicado pela Entrefolhos, que vou apre...