segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

A Ciência e o Milagre do Sol

Segunda parte do meu artigo que saiu na revista "Fátima XXI" cuja primeira parte está aqui:

http://dererummundi.blogspot.pt/2017/10/a-ciencia-e-o-milagre-do-sol_12.html


A voz dos cépticos

Vejamos o que disse o já referido padre Jaki, autor de livros que tentam conciliar a ciência e o catolicismo. De facto, ele propôs uma teoria meteorológica explicativa do “milagre”. Jaki, que só muito mais tarde visitou Fátima, estudou o assunto com bastante cuidado (por exemplo, não confundiu os dois Almeida Garrett, como muitos antes e depois dele fizeram) descreveu assim o fenómeno [ 14] :
“... Como muitos presentes sentiram subitamente um aumento acentuado de temperatura deve ter ocorrido uma repentina inversão de temperatura. As massas de ar frio e quente poderiam propulsionar aquela lente de ar rotativa numa órbita elíptica primeiro em direcção à Terra, e depois empurrá-la, como se fosse um boomerang, de volta à sua posição original. Enquanto isso, os cristais de gelo agiam como tantos outros meios de refracção em relação aos raios solares (...) Apenas um observador, um advogado, afirmou três décadas depois que o caminho da descida e ascensão era elíptico com pequenos círculos sobrepostos. Tal observação faria um sentido eminente para qualquer pessoa familiarizada com a dinâmica dos fluidos ou mesmo com o funcionamento de um boomerang. Há, na verdade, muita informação científica disponível para abordar cientificamente o milagre do Sol (...) A interacção cuidadosamente coordenada de tantos factores físicos seria, por si só, um milagre, mesmo que não se queira ver mais do que aquilo que realmente aconteceu. Claramente, o "milagre" do sol não foi mais do que um mero fenómeno meteorológico, ainda que raro. Caso contrário, teria sido observado antes e depois, independentemente da presença de multidões devotas ou não. Eu simplesmente considero, o que fiz nos meus outros escritos sobre milagres, que, ao produzir milagres, Deus geralmente faz uso de um substracto natural aumentando muito os seus componentes físicos e as suas interações. “
 Mas, para ele, se o fenómeno foi natural, o facto de ter ocorrido no exacto dia prenunciado constituía um milagre. Na mesma linha vai Diogo Pacheco de Amorim (1918-2013) , professor de Matemática da Universidade de Coimbra, que em 1962 apresenta um relato bem sistematizado dos vários testemunhos, na revista O Instituto [22] e, no final, conclui, comparando-o com um milagre de Cristo em que tinha havido um vaticínio confirmado, que se estava em presença de um milagre.
É particularmente interessante por ser bem informado o artigo do professor Auguste Meessen, que sua análise de aparições e "milagres do sol" que apresentou no Simpósio Internacional Ciência, Religião e Consciência realizado no Porto em 2003 [23] afirmou que, sem duvidar da veracidade dos vários depoimentos, os “milagres do sol” não podiam ser aceites e que as observações relatadas foram efeitos ópticos causados pela prolongada observação directa do disco solar. Meessen alega que as imagens residuais na retina, produzidas após breves períodos de olhar fixo no Sol, são a causa mais provável dos efeitos observados de dança. Deve notar-se que o próprio José de Almeida Garrett revelou ter realizado com êxito experiência de alterações visuais ao olhar fixamente para uma luz branca. Meesen cita um artigo do British Journal of Ophthalmology [24] que discute alguns “milagres do Sol” posteriores. De facto, ele chama a atenção para o facto de que milagres do Sol têm sido testemunhados em muitos locais onde peregrinos têm olhado para o Sol. Ele refere, por exemplo, as aparições em Heroldsbach, na Alemanha, em 1949, onde efeitos ópticos semelhantes foram testemunhados por mais de dez mil pessoas.
Stuart Campbell, num artigo do Journal of Meteorology de 1989 [25], colocou a hipótese de uma poeira estratosférica que mudou o aspecto do sol, tornando mais fácil olhar para ele e fazendo com que ele aparecesse amarelo, azul e violeta e rodasse. Para isso referiu um fenómeno semelhante observado recentemente na China. Na mesma linha Paul Simons, fala de alguns efeitos ópticos podem ter sido causados por uma nuvem de poeira vinda do deserto do Sahara [26]. Não me parece plausível essa ideia da nuvem de poeira pela necessidade de ter tido efeitos numa região maior do país.
Existe nos Estados Unidos e noutros países uma comunidade céptica, que investiga e discute fenómenos milagrosos e paranormais. Sobre Fátima, argumentam à partida como não podia deixar de ser, que não há notícia de qualquer movimento anómalo do Sol no referido dia que de resto teriam consequências catastróficas: qualquer variação da distância Terra-Sol acarretaria consequências climáticas globais. Benjamin Radford, escritor céptico do Committee for the Scientific Investigation of Claims of the Paranormal (CSICOP), que tem discutido milagres e OVNI defendeu que "o sol de facto não dançou no céu. Sabemos isso, evidentemente, porque toda a gente da Terra está sujeita à acção do sol e se as estrela mais próxima de nos subitamente começa a fazer alguma ginástica celeste milhares de milhões de pessoas seguramente teriam dado conta disso.“ [22] Este é também o argumento do biólogo inglês Richard Dawkins, conhecido opositor da religião, que nos seus livros Decompondo o Arco Íris [27] e a Desilusão de Deus [28] aborda o fenómeno de Fátima, baseado na posição sobre milagres do filósofo escocês David Hume: se 70 mil pessoas têm razão que pensar dos milhares de milhões que não viram nada de anormal acontecer ao mesmo Sol? Radford sustenta que fenómenos solares ou efeitos psicológicos podem dar conta do fenómeno. Segundo ele: "Ninguém sugere que as pessoas que disseram que viram o milagre do Sol – ou outros milagres em Fátima ou noutro sítio estão a mentir ou a enganar. Em vez disso muito provavelmente experimentaram o que dizem. Mas a experiência teve lugar na sua maior parte no interior das suas mentes.“
Uma outra voz dessa comunidade céptica é Joe Nickel, investigador do CSICOP, que sugere que pode ter sido um parélio , um fenómeno atmosférico relativamente comum (não parece plausível, por este ser um efeito estático [ 29] ) ou efeitos visuais causados na retina após exposição à luz intensa. Esse autor escreveu que o "baile do Sol" observado em Fátima foi "uma combinação de factores, incluindo efeitos ópticos e fenómenos meteorológicos, como o sol visto através e nuvens finas, parecendo um disco prateado. Outras possibilidades incluem uma alteração da densidade das nuvens que passaram fizeram com que a imagem do Sol alternadamente brilhasse e diminuísse, aparentando assim um avanço e um retrocesso e poeira ou partículas de água na atmosfera refractando a luz solar e causasse uma variedade de cores." [26] Enfatizou ainda o poder de sugestão psicológica das testemunhas oculares, referindo o caso de outras aparições com milagres do Sol parecidos.
Um outro autor céptico é Kevin McClure que, no seu livro The Evidence for Visions of the Virgin Mary [30], diz que a multidão na Cova de Iria esperava o milagre que tinha sido anunciado. Para ele a multidão simplesmente viu aquilo que esperava ver.
É curioso referir que os “milagres do sol” são relativamente comuns. Meessen fala de aparições e de milagres do sol em vários países. Houve até “milagres do Sol” bno Vaticano: em 13 de Outubro de 1951, o cardeal italiano Federico Tedeschini afirma que o Papa Pio VII, que afirmou o dogma da Assunção de Nossa Senhora, presenciou, em 30 e 31 de Outubro, e 1 e 8 de Novembro, um milagre desse tipo nos jardins do Vaticano. Deixou notas pessoais sobre ele [31]. Parece estranho este assunto não ter sido aprofundado, uma vez que se trata de um testemunho do mais alto representante da Igreja Católica. Nos tempos mais recentes, continuam os “milagres do Sol”, alguns muito parecidos com o de Fátima, como na Colômbia (2009), na Bósnia-Herzgovina (2009-10) e no Brasil (2011). Existem dalguns registos em vídeo feitos por amadores que foram colocados na Internet. Em Portugal, também têm ocorrido outros milagres do Sol. Registem-se casos recentes em Ourém e mesmo em Fátima [32]. A Igreja tem alguma dificuldade em lidar com a repetição deste tipo de fenómenos. No caso de Fátima, há autores que dizem que Fátima se impôs à Igreja em vez de ser a Igreja a impor Fátima. Verifica-se que outros casos não se impuseram à Igreja.
O físico polaco Artur Wirowski, da Universidade de Loszd, propôs recentemente em vários artigos [33-35] uma modelação que reproduz aqueles registos, baseada no conceito de rotação de cristais de gelo agregados existentes em nuvens. Parece ser a primeira modelação matemática de “milagres do Sol”. Sendo uma descrição físico-matemática não trata de questões biológicas e psicológicas.

Conclusões

Não há dúvida de que muitas pessoas observaram um fenómeno estranho a 13 de Outubro de 1917. Não existe, com base no que conhecemos da ciência a possibilidade desse fenómeno ser de natureza astrofísica, Com enorme probabilidade tem uma causa natural: condições meteorológicas muito particulares e, principalmente, fenómenos óptico-neuronais que, tendo um padrão comum, diferem necessariamente conforme os observadores e que têm de resto aparecido noutros sítios e lugares. Esta última circunstância diminui o carácter extraordinário do “milagre do Sol” de Fátima.

Nunca, que saiba, foi reunida numa comissão incluindo crentes e não crentes, num processo necessariamente interdisciplinar, com o intuito de tentar uma racionalização do evento desse dia. Há visões parciais. Com ópticas diferentes. Lidos os diversos depoimentos, uns de 1917 e outros não, percebe-se que será difícil escapar a uma posição céptica sobre no milagre. Por vezes existe no sector crente uma tentativa de uso de figuras de autoridade em abono do milagre, de que é exemplo a alegada presença de um catedrático de Ciências na Cova de Iria. Ora não só não esteve presente como não há registo de qualquer observação científica do fenómeno. Esse tipo de erros só pode prejudicar a crença em acontecimentos milagrosos, mesmo para quem esteja predisposto a fazê-lo. Dá de resto uma imagem falsa da ciência pois esta não vive de autoridade mas sim de provas. Mesmo as maiores autoridades podem cometer os maiores erros.

A posição céptica da ciência não impede obviamente que os crentes possam falar de milagres no sentido em que consideram o fenómeno, qualquer que ele seja, manifestação da divindade. Alguns autores falam do milagre da profecia de Lúcia, mas esta não foi muito específica e pode bem ter acontecido que a esperança de um milagre tenha ajudado à ocorrência do fenómeno de visão parecida a um grupo de pessoas. De resto há incongruências no depoimento de Lúcia, como a previsão, colocada na boca de Nossa Senhora, de que a Primeira Guerra Mundial acabaria nesse dia de 13 de Outubro, o que não aconteceu.

Historiadores como José Eduardo Franco e José Cardoso Reis [36], reconhecendo a relevância do “milagre do Sol” para o fenómeno religioso de Fátima, em vez de falarem simplesmente de milagre preferem falar do milagre da interpretação de Fátima: “É mais consistente, e menos sujeito às derivas explicativas da ciência, situarmos a dimensão transcendente mais no processo de comunicação e interpretação do que na mecânica invulgar dos fenómenos.”
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Referências: 

(...)

[14] Stanley L. Jaki, A Mind’s Matter: An intelectual Autobiography. Cambridge IK, William B. Ferdmans Publishing Co., 2002, Cap. 13, “A Portuguese Proverb” . Ver também: Stanley L. Jaki (1999). God and the Sun at Fatima, ??, Real View Books, 1999.

[15] Auguste Meessen, “Aparições Marianas e “milagres do Sol””, in Fernando Fernandes, Joaquim Fernandes e Raul Berenguel (org.), Fátima e Ciência. Investigação Multidisciplinar Experiências religiosas”, Lisboa: Ésquilo, 2003, pp. 25-50; também publicado em J. Fernandes, N.L. Santos (eds.), Actas do Forum International Science, Religion and Conscience”, Porto, 23-25 de Outubro de 2003, Centro Transdisciplinar de Estudos da Consciência, 2005, Consciências, 2, pp. 199-222.
[16] Gonçalo de Almeida Garrett, reproduzido em Documentação Crítica de Fátima : Seleção de Documentos (1919-1930), ibidem


[18] Costa Brochado, (1952) As Aparições de Fátima, Lisboa: Portugália, 1952

[19] Fina d’Armada, O que se passou em Fátima em 1917, Amadora, Livraria Bertrand, 1980; Fina d’Armada; e Joaquim Fernandes. Intervenção Extraterrestre em Fátima – as aparições e o fenómeno OVNI, Amadora, Livraria Bertrand, 1982; idem,. As aparições de Fátima e o fenómeno OVNI, Lisboa, Estampa, 1995; idem. Fátima – nos bastidores do segredo, Lisboa, Âncora Editora, 2002.

[20] Richard Feynman, O que é uma Lei Fisica, Lisboa: Gradiva, 2000. 
 [21] Diogo Pacheco de Amorim (1960), “O fenómeno solar de 13 de Outubro de 1917”, O Instituto, vol. 122.º , p. 145.
[22] M. Hope-Ross, S. Travers, S. and D. Mooney, “Solar retinopathy following religious rituals”, British Journal of Ophthalmology (1988), vol. 72(1988): 931–34

[23] S. Campbell, “The Miracle of the Sun at Fátima,” Journal of Meteorology, Vol. 14, Nº. 142, 1989.

[24] P. Simons, “Weather Secrets of Miracle at Fátima,” Times, 17 / February /2005.

[25] Benjamin Radford, “The Lady of Fatima and the miracle of the Sun”, https://web.archive.org/web/20150415200520/http://m.livescience.com/29290-fatima-miracle.html

[26] Richard Dawkins Decompondo o Arco Íris , Lisboa: Gradiva, 2000.
[27] Richard Dawkins, Desilusão de Deus, Lisboa: Casa das Letras, 2007.
[28] John Nickell, Looking for a Miracle: Weeping Icons, Relics, Stigmata, Visions, and Healing Cures. [S.l.]: Prometheus. 1983.

[29] M. Minaert, The nature of light and colour in the open air, New York: Dover. 1954

[30] Kevin McClure, The Evidence for Visions of the Virgin Mary, New York; Sterling Pub Co Inc 1984.



[33] A. Wirowski, “Modelling of the Phenomenon Known as “the Miracle of the Sun” as the Reflection of Light from Ice Crystals Oscillating Synchronously”, Journal of Modern Physics, 2012, 3, 282-289.

 [34] A. Wirowski, “The Non-linear Modeling of the Rotational Vibrations of the Electrically Charged Cloud of the Ice Crystals”, Open Journal of Mathematical Modeling, Vol. 1, No. 2 (2013), pp. 46-57.

[35] A. Wirowski, “The Dynamic Behavior of the Electrically Charged Cloud of the Ice Crystals”, Applied Mathematics and Physics, 2014, Vol. 2, No. 1, 19-26 http://pubs.sciepub.com/amp/2/1/6
http://www.lastampa.it/2017/05/12/vaticaninsider/eng/the-vatican/pius-xii-and-fatima-the-secret-of-the-miracle-of-the-sun-2nNKbwXFRlmkaL695iVSuO/pagina.html
[36] José Eduardo Franco e Bruno Cardoso Reis, Fátima: Lugar Sagrado Global, Lisboa: Círculo de Leitores, 2017.





7 comentários:

Anónimo disse...

Por mim, quanto à interpretação do milagre de Fátima, adoto a atitude de independência e prudência de um juiz cego, em sentido figurado, que pesa os argumentos e provas das partes nos dois pratos de uma balança bem calibrada e equilibrada.
O Sol é uma estrela que tem, e sempre teve, uma influência decisiva na vida do Homem. No processo altamente complexo que se desencadeia quando um vulgar camponês olha para o Sol, entram sempre os seus olhos e a bagagem cultural que acumulou ao longo da vida. Por exemplo, um camponês que arroteava os campos das férteis margens do Nilo, no tempo do deus Rá, no Egito Antigo, olhava para o Sol e nunca lá viu o que viram os três pastorinhos de Aljustrel, no século XX, posto que o egípcio não foi catequisado pela Santa Igreja, Una, Católica e Apostólica.
Mais do que um conflito de interpretações entre Igreja e Ciência, aqui temos o problema de diversidade cultural associada aos processos de perceção da Natureza.
Resumindo, só se pode interpretar a natura tendo cultura. As culturas são todas iguais, ou umas são melhores do que as outras? O que é a verdade: massas de ar que sobem e descem na atmosfera, ou a Nossa Senhora de Fátima que está no céu e faz rodar o Sol?

Cisfranco disse...

A ciência tem o seu método de ver e descobrir a realidade, e a religião tem as suas fontes. A contradição entre ambas (religião e ciência)não é mais que aparente. Quando a contradição entre ambas parece existir, alguma delas está a invadir (nem que seja da forma mais subtil) o campo de acção da outra. Simplesmente cada uma tem por objecto aquilo que não é objecto da outra. De qualquer modo, a ciência é muito útil à religião, não para a fundamentar (o que talvez não aconteça nunca), mas para que, tendo-a em conta, esta se depure cada vez mais e se dedique à essência do seu objecto.

Anónimo disse...

Não estou totalmente de acordo com o senhor Cisfranco. Sem ir mais longe, acha que as explicações científicas e religiosas do milagre do sol a bailar em Fátima não podem ter pontos de contacto, senão tangíveis, pelo menos tangenciais?
Se Deus criou tudo, a ciência deve estar contida na religião e não o contrário, conforme parece sugerir Cisfranco. A mim ensinaram-me que a Bíblia foi escrita por homens inspirados por Deus. Não me venham agora dizer que as verdades científicas contêm as verdades divinas. De um ponto de vista científico, o Sol não bailou em Fátima, mas pode ter bailado apenas nas cabeças de pessoas religiosas e mal nutridas que apanharam demasiado sol.

Cisfranco disse...

Há sempre um falar e dois entenderes. A mim também me não parece que o m/ comentário supra devesse motivar o seu comentário. Mas cada cabeça sua sentença e assim é que está bem. Seria necessário muita conversa para definir pontos de vista. Em relação ao assunto em apreço (a dança do Sol), para mim, entre dois extremos que conduzem ao mesmo resultado - a negação - (um, advogando que não houve absolutamente nada, aliás os observatórios astronómicos nada registaram e, outro, pura alucinação da multidão) há um modo de ver intermédio, sem dúvida misterioso que fez as pessoas ver o que viram. Deus é mistério. Nunca ninguém viu Deus, apenas as suas manifestações e esta será talvez uma delas... Mas não é o cerne do Cristianismo, nem pouco mais ou menos.

Anónimo disse...

Para mim, esse "modo de ver intermédio", embora ainda conserve uma aura de mistério, é já um sintoma da decadência acelerada da Igreja Católica, a quem já vão faltando as forças, e dinheiro, para declarar absolutas muitas das suas verdades. Assim, o Sol ter bailado para muitas pessoas não quer dizer que o Sol tenha realmente bailado, mas também ainda não significa que as pessoas sejam mentirosas ou loucas!
De qualquer maneira, concordo que a "essência do objeto" da religião não pode ser o Sol que baila para o povo.

Anónimo disse...

Queremos e cremos que haja uma só Ciência (apesar das "ciências ocultas"; apesar dos "cientistas" impostores e manipuladores e dos "funcionários da Ciência", que também precisam de ganhar a vida; apesar dos pantomineiros da Ciência).
Há muitas religiões; religiões para todos os gostos; umas obrigatórias em determinados sítios e épocas, outras "recomendadas", outras, nem uma coisa nem outra.
Hoje, mais do que nunca, não há crivo para o(s) disparate(s) - graças a deus, somos livres.

(Se o comentário passar, é provável que aí venha uma réplica a considerá-lo ... disparate! É a "vida"!)

Anónimo disse...

O comentário, muito bem escrito, do anónimo do dia 25 de dezembro, faz-me desconfiar que ali anda a mão, e as ideias, de um daqueles monges bonzinhos que de vez em quando aparecem nos jornais e nas televisões explicando aos leigos que temos de ser sincréticos quando debatemos Ciência e religiões. No meu tempo, frequentei a catequese da Igreja Católica e lá ensinaram-me, essencialmente, que Deus criou tudo, incluindo os lírios do campo, que nos devemos amar uns aos outros e que os bons vão para o Céu e os maus para o inferno. Aqueles pontos mais especiosos da doutrina em que fui examinado, como o mistério da Santíssima da Trindade, nunca me despertaram grande interesse. Acho que também me avisaram de que, para ser bom menino, nunca devia invejar a vaca do meu vizinho, mas quanto a esses aspetos mais práticos da moral na vida quotidiana sempre considerei a fórmula “Não faças aos outros aquilo que não gostarias que te fizessem a ti”, do chinês Confúcio, mais simples, abrangente e exequível do que o conselho bíblico, mesmo levando em conta o simbolismo da linguagem religiosa. Mas, voltando à vaca fria do artigo, o que está em causa é saber se o sol bailou, em Fátima, com a Ciência ou com a Teologia, posto que o Povo, sendo do género masculino, não podia aspirar a mais, no Portugal de 1917, do que a uma visão muito longínqua e, eventualmente, muito distorcida do fenómeno milagroso.
Parece-me contraproducente que a Igreja Católica continue a apostar na propalação de milagres ao gosto popular como forma de aumentar o rebanho dos seus fiéis. Por exemplo, Eça de Queirós, no seu Dicionário de Milagres, descreve, na sua prosa elegante e assertiva, um milagre ao gosto popular do século V que hoje achamos inverosímil:
“Santa Germana ia encher a sua bilha à fonte, quando uns campónios lha quebraram grosseiramente, dando-lhe uma peneira velha em seu lugar. Germana, sem proferir uma só palavra, levou a peneira à fonte, encheu-a de água e trouxe-a aos camponeses sem perder uma gota.
Em memória deste milagre, representa-se Santa Germana com uma bilha e um tamis aos pés.- O abade Blampignon, Vida de Santa germana”

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