A história informa, a literatura ilumina. Na primeira a linguagem esclarece, na segunda a linguagem envolve. Não se trata de pôr uma contra a outra, mas, sim, uma com a outra.
Uma biografia romanceada junta-as. Na obra que daí resulta não importa tanto a verdade, e a dúvida que a acompanha, mas, sobretudo, o chamamento para aquela ou aquelas vidas que se contam, como se assim mesmo tivesse sido.
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É o caso da biografia e lenda de Isabel de Aragão, a Rainha Santa, que Vitorino Nemésio percorre desde o nascimento até à morte, num livrinho que num dia se lê e, evidentemente, se aprecia.
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Diz o escritor em nota final:
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"Escusávamos talvez de acrescentar que este livrinho é uma 'vida', ou seja, uma interpretação puramente biográfica da Rainha - uma obra de arte. Seja como for, não perdemos o pé na História, não inventámos um único personagem ou facto; a nossa invenção é puramente psicológica. Não se pode fazer uma 'vida' com as verbas avulsas dos arquivos."
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E deixo o leitor com algumas palavras que permitem fazer uma «vida»:
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"Era bonita. É certo que as filhas de reis já são embelezadas pela própria majestade em que nascem, mas esta era bela de seu, com feições mais fortes do que finas, de uma força elegante a acusada sobretudo nos traços ósseos, que dão às mulheres de raça uma energia radiante. O retrato de Colónia, único autêntico, fala de uma solenidade vagamente luminosa, própria de quem levou consigo um mistério e um carácter. De cabeça bem erecta, voada de véus que a coroa cinge, olha docemente para baixo, numa atitude em que a oração e a autoridade se combinam. O pescoço tem a inflexão das mulheres altas, o queixo afirma vontade e qualquer coisa de menos sagrado, um ar feminino e bem humano; umas flores estampadas pelo sirgueiro no vestido sublinham esta impressão.Traz um cordão cheio de nós e o alto de um manto de rainha. Mas isto é uma composição, síntese de pintor."
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Referência: Nemésio, Vitorino (2011). Isabel de Aragão, Rainha Santa. Lisboa: Texto.
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1 comentário:
À minha maneira:
RAINHA SANTA
Filha de Reis do trono de Aragão,
a majestade tinha de Rainha,
dando vontade de beijar-lhe a mão
e mesmo o chão por onde ela caminha.
De uma beleza rara era o seu rosto,
como se verifica em seu retrato,
e para além de se vestir com gosto
era pessoa do mais fino trato.
Iluminava-lhe as feições um ar
de uma certa doçura, se calhar
nas águas mansas do Mondego haurida.
Muitíssimo esmoler, tinha o condão
de em frescas rosas transformar o pão
que aos pobres dava sem qualquer medida!
JOÃO DE CASTRO NUNES
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