domingo, 4 de dezembro de 2011

O argumento do botão

Na continuação do texto Ninguém os obriga!

Tenho-me apercebido de outro argumento para justificar programas de televisão em que não encontro qualquer justificação, como sejam os que cabem na categoria de reality shows: “os aparelhos têm botões: quem não os quer ver que use o botão de desligar”.

Ainda que, por suposição, todos ou a maioria dos espectadores usasse esse botão quando percebesse a transposição de certas fronteiras éticas, isto não teria efeitos regressivos: não evitaria, portanto, a transposição de tais fronteiras, apenas evitaria que a transposição fosse vista, integral ou parcialmente.

Logo, em rigor, não poderiam ignorar-se transposições desse teor, dado que, materialmente, elas já aconteceram, e são elas que constituem o primeiro problema. É nele que autores de programas, críticos de televisão, patrões e accionistas, jornalistas e apresentadores, terão, mais dia menos dia, de se centrar: “até onde é legítimo irmos”? Eis o que devem perguntar a si próprios, isto se não se perguntam já.

E que não percam tempo, nem nos iludam, com essa ideia peregrina de que quem tem “o poder do botão” é que deve decidir, porque sabem perfeitamente que a estratégia do quanto-pior-melhor, que ajudaram a criar, funciona entre os espectadores e evolui a cada dia que passa.

Sobretudo não convoquem a escola para ensinar as crianças, os jovens e os adultos a “carregar no botão”, como tenho visto vezes de mais referido.

5 comentários:

José Batista da Ascenção disse...

Caríssima Professora Helena Damião:

Em matéria de "educações", à escola já se pediu, ou pede, entre outras coisas:

- Educação para a saúde: Educação alimentar; Educação para a sexualidade; Educação para a higiene; etc.
- Educação cívica;
- Educação ambiental;
- Educação para prevenir o consumismo;
- Educação para a prevenção rodoviária;
- Educação para a inclusão;
- Educação para a socialização;
- Educação para o desporto;
- Educação para a prevenção da ação pedófila;
(...)
E, claro, da lista também faz parte a "educação para os audiovisuais"...

Isto depois de termos disciplinas "clássicas" que se chamam "educação física" ou "educação musical".

E há também quem fale de "educação matemática"...

E quem adote com entusiasmo termos como "(i)literacia" ou "inumeracia" em vez dos estafados conceitos de analfabetismo ou ignorância. Nestes casos nem sei como não se optou por umas convenientes "educações qualquer coisa..."

De tal modo que, humilde, mas assertivamente, desde há muito pergunto: Quantas "educações são precisas para educar realmente um ser humano"?

Não corremos o risco de "gastar" de tal modo o termo educação que, qualquer dia, passamos a evitá-lo?
E, nesse dia, como vão passar a designar-se as "Ciências (quantas?...) da Educação"?
Ou já ultrapassámos esse risco?

Qual é o papel da "escola", afinal?
Peço(-lhe) desculpa, por tanta "impertinência".
Acredite que não é por mal.

Anónimo disse...

A verdade é que, por mais que custe admitir, o poder está naqueles que têm o comando na mão. A explicação está na simples relação entre a procura e a oferta. Se a procura é muita, a oferta, eventualmente, acabará por satisfazer essa procura.
A razão pela qual certos programas televisivos existem, e acabam por ter uma ou mais temporadas, deve-se ao simples facto de eles terem uma quantidade (mais que) razoável de espectadores, pois se ninguém os visse, então acabariam por ser cancelados. Certos conteúdos apenas são incluídos nestes programas porque sabe-se que atraem a atenção do telespectador, fazendo nascer neste uma sede por mais ordinarices do género... sede esta à qual as televisões vão continuando a responder.
Não é assim tão difícil de compreender isto, até porque esta regra não rege apenas o mundo televisivo...
Há quem goste de ordinarices, há quem prefira supostos "assuntos superiores"... deixai viver cada um em harmonia com o que mais lhe agrada.
Porque é que as minhas preferências por ciência ou literatura hão-de ser superiores às do meu vizinho que vê religiosamente a Casa dos Segredos?

Anónimo disse...

O "poder do botão" é sem dúvida um argumento falacioso. Confúcio, como publicado recentemente neste blogue, diz que o Princípe deve estar rodeado de homens de saber e de artistas. Assim os responsáveis pelas leis que regem os audiovisuais, sobretudo a televisão, pelo seu avassalador efeito na formatação das mentes, da turba, da opinião pública. E esta formatação reflecte-se no dia a dia de todos nós, para não dizer que compromete as futuras gerações. Como dizem os antigos, muito antes da cibernáutica, o homem não é uma ilha. Temos de pensar uns nos outros. A estupidez dos reality shows é constrangedora, imbecilizante, ignóbil. E atinge no âmago as crianças, através dos seus pais, em primeiro lugar. A escola não pode sobrepor-se a estas realidades "sozinha"; é de cima que o exemplo tem de vir. E não se trata de uma questão de "ovo ou galinha"?, porque temos a História a mostrar-nos com clareza que, para o bem e para o mal, o exemplo vem de cima!
HR

Anónimo disse...

Não é a televisão que formata as mentes, mas sim as mentes que formatam a televisão.
E de que maneira é que os reality shows concretizam esse efeito estupidificador na população? De que forma comprometem as futuras gerações? São estes argumentos que não consigo entender (ou melhor, consigo, mas não aceito, pois de fundamentação têm 0).
Independentemente de indivíduo X ver reality shows/telenovelas/séries/futebol/jogos/parvoíces na net, pode ser um indivíduo perfeitamente competente e cumpridor, quiçá mais do que muitos "pseudo-intelectuais" cujos interesses estes tomam como qualquer coisa de superior aos devaneios da plebe, entretida pela televisão e futebol.
Independentemente de todas as pessoas que "perdem tempo" com reality-shows e afins, há sempre os vossos tão aclamados membros produtivos da sociedade. Que seria do mundo se todos gostassem de reality shows... e se por outro lado, todos gostassem dos ditos "assuntos superiores", o mundo seria tão mau quanto na hipótese anterior!
Estes romanticismos pseudo-intelectuais que tresandam a snobismo e concepções utópicas de um mundo onde ninguém vê reality shows e todos lêem livros de filosofia, ciência, etc, é algo que não compreendo por parte daqueles que se julgam tão sábios e se tomam por opositores a qualquer preconceito.
Preocupai-vos mais com o que vocês vêem, e menos com o que os outros gostam de ver.

Anónimo disse...

Os reality shows têm um efeito redutor na Mundividência das pessoas, já por si reduzida. E todos nós, sem excepção, agimos em consonância com a realidade que conhecemos. O vocabulário é rude, não há qualquer pensamento válido e todas as pessoas que lá vão são emocionalmente descompensadas.

E depois há as crianças que, naturalmente, aprendem por imitação.

Parece que já chegou ao ponto de fazerem sexo no programa. O próximo passo deve ser filmarem as pessoas a urinar e a defecar.
HR

O corpo e a mente

 Por A. Galopim de Carvalho   Eu não quero acreditar que sou velho, mas o espelho, todas as manhãs, diz-me que sim. Quando dou uma aula, ai...