quarta-feira, 11 de maio de 2011

Infância

Destacamos um poema de Rainer Maria Rilke, enviado, em comentário, por um leitor, a quem agradecemos a escolha e a partilha.

Infância

Passa lento o tempo da escola e a sua angústia
com esperas, com infinitas e monótonas matérias.
Oh solidão, oh perda de tempo tão pesada...
E então, à saída, as ruas cintilam e ressoam
e nas praças as fontes jorram,
e nos jardins é tão vasto o mundo —.
E atravessar tudo isto em calções,
diferente de como os outros vão e foram —:
Oh tempo estranho, oh perda de tempo,
oh solidão.

E olhar tudo isto à distância:
homens e mulheres; homens, homens, mulheres
e crianças, tão diferentes e coloridas —;
e então uma casa, e de vez em quando um cão
e o medo surdo trocando-se pela confiança:
Oh tristeza sem sentido, oh sonho, oh medo,
Oh infindável abismo.

E então jogar: à bola e ao arco,
num jardim que manso se desvanece
e por vezes tropeçar nos crescidos,
cego e embrutecido na pressa de correr e agarrar,
mas ao entardecer, com pequenos passos tímidos,
voltar silencioso a casa, a mão agarrada com força —:
Oh compreensão cada vez mais fugaz,
Oh angústia, oh fardo!

E longas horas, junto ao grande tanque cinzento,
ajoelhar-se com um barquinho à vela;
esquecê-lo, porque com iguais
e mais lindas velas outros ainda percorrem os círculos,
e ter de pensar no pequeno rosto
pálido que no tanque parecia afogar-se — :
oh infância, oh fugazes semelhanças.
Para onde? Para onde?

Rainer Maria Rilke

in "O Livro das Imagens"Tradução de Maria João Costa Pereira

14 comentários:

Anónimo disse...

Que doce é revisitar a infância pela mão de Rainer Maria Rilke, o Poeta que defendia ser doloroso o crescimento das crianças! JCN

Anónimo disse...

À minha maneira:

INFÂNCIA

De quando era criança, vêm-me à mente,
olhando para trás, os espantalhos
mais os rodízios feitos com bugalhos
que dos regatos punha na corrente!

Aos pássaros armava ratoeiras,
de longe lhes seguindo os movimentos
e aproveitando todos os momentos
para tirar das tocas as toupeiras!

Que feliz eu me sentia nessa altura,
fugindo à escola sempre que podia
por a considerar uma tortura!

Ainda hoje a natureza me seduz
com tudo o que ela tem de oposto à cruz
desta minha actual... monotonia!

JOÃO DE CASTRO NUNES

Anónimo disse...

O meu primeiro contato com Rilke foi "Cartas a um Jovem Poeta", na adolescência. Há leituras que se fixam na nossa abóboda íntima como uma estrela na abóboda celeste, ou como uma lapa na rocha dura batida pela tenacidade das ondas, são as leituras que ficam para todo o sempre, como é o caso. Não conhecia este poema. Obrigada pela partilha.

Relativamente à infância, Agustina diz, em Dicionário Imperfeito: "A infância vive a realidade da única maneira honesta, que é tomando-a como uma fantasia. Não tentem explicar o mundo a uma criança, que ela saberá despistar as provas oferecidas. Não lhe interessam provas, mas sim mistérios. Os adultos desempenham o papel de desmancha-prazeres: porque vigiam, porque ensinam, porque desprezam a imaturidade".

Sobretudo e acima de tudo, temos que nos alertar uns aos outros, sempre e a todo o momento, para não cairmos na cega tentação de desprezar a imaturidade...que é tão bela e prometedora...!
HR

Anónimo disse...

Continuando a partilhar, sobre a infância:

"A uma criança que dança no vento"
Dança aí junto ao mar;/ Que te importa/ O rugido da água, o rugido do vento?/ Sacode a tua cabeleira/ Molhada de gotas de sal;/ Tu que és tão jovem ignoras/ O triunfo do néscio, não sabes/ Que o amor mal se ganha e logo se perde,/ Nem viste morrer o melhor operário/ E todos os feixes por atar./ Por que hás-de temer/ O terrível clamor dos ventos?" (Yeats)

Gostaria que se não dominasse as crianças pela imposição do temor, que é o que se anda a fazer em discursos mentirosos de liberdade.
HR

Anónimo disse...

Continuando a partilhar infância, regressando ao nosso país, a alguém que sob o título Provérbio, diz: "A noite é a nossa dádiva de sol aos que vivem do outro lado da terra".

"Carta da Infância

Amigo luar:
Estou fechado no quarto escuro
E tenho chorado muito.
Quando choro lá fora
ainda posso ver as lágrimas caírem na palma das minhas mãos
e brincar com elas ao orvalho nas flores pela manhã.
Mas aqui é tudo por demais escuro
e eu nem sequer tenho duas estrelas nos meus olhos.
Lembro-me das noites em que me fazem deitar tão cedo e te
oiço bater, chamar e bater, na fresta da minha janela.
Pelo muito que te tenho perdido enquanto durmo
vem agora,
no bico dos pés
para que eles não te sintam lá dentro,
brincar comigo aos presos no segredo
quando se abre a porta de ferro e a luz diz:
bons dias, amigo."
(Carlos de Oliveira)
HR

joão boaventura disse...

Criança

Cabecinha boa de menino triste,
de menino triste que sofre sozinho,
que sozinho sofre, — e resiste,

Cabecinha boa de menino ausente,
que de sofrer tanto se fez pensativo,
e não sabe mais o que sente...

Cabecinha boa de menino mudo
que não teve nada, que não pediu nada,
pelo medo de perder tudo.

Cabecinha boa de menino santo
que do alto se inclina sobre a água do mundo
para mirar seu desencanto.

Para ver passar numa onda lenta e fria
a estrela perdida da felicidade
que soube que não possuiria.

Cecília Meireles
in 'Viagem'

joão boaventura disse...

Menino

No colo da mãe
a criança vai e vem
vem e vai
balança.
Nos olhos do pai
nos olhos da mãe
vem e vai
vai e vem
a esperança.

Ao sonhado
futuro
sorri a mãe
sorri o pai.
Maravilhado
o rosto puro
da criança
vai e vem
vem e vai
balança.

De seio a seio
a criança
em seu vogar
ao meio
do colo-berço
balança.

Balança
como o rimar
de um verso
de esperança.

Depois quando
com o tempo
a criança
vem crescendo
vai a esperança
minguando.
E ao acabar-se de vez
fica a exacta medida
da vida
de um português.

Criança
portuguesa
da esperança
na vida
faz certeza
conseguida.
Só nossa vontade
alcança
da esperança
humana realidade.

Manuel da Fonseca
in "Poemas para Adriano"

joão boaventura disse...

Si quieres educar bien a tu hijo

PROTÉGELO, no lo cubras
ABRÍGALO, no lo tapes
AYÚDALO, no lo reemplaces
ÁMALO,no lo idolatres
ACOMPÁÑALO,no lo lleves
INCORPÓRALO,no lo aisles
MUESTRALE EL PELIGRO, no lo aterrorices
ALIÉTALO EN SUS ESPERANZAS, no lo desencantes
NO LE EXIJAS SER EL MEJOR, pídele que sea bueno
NO LE PRODIGUES AMOR, dale amor
NO LO MANDES A ESTUDIAR, prepárale el clima de estudio
NO LE FABRIQUES UN CASTILLO,vivan todos con naturalidad
NO LE ENSEÑES A "SER", ayúdalo para que sea "él" mismo
NO LE DEDIQUES LA VIDA, vive la vida con él.

D. Nolte

joão boaventura disse...

Educar.

Educar es lo mismo
que poner un motor o una barca ...;
hay que medir, pensar, equilibrar ...;
y poner todo en marcha.
Pero para eso,
uno tiene que llevar en el alma
un poco de marino, ...
un poco de pirata, ...
un poco de poeta, ...
y un kilo y medio de paciencia concentrada.
Pero es consolador soñar
mientras uno trabaja,
que ese barco, ese niño,
irá muy lejos por el agua.
Soñar que ese navío
llevará nuestra carga de palabras
hacia puertos distantes, hacia islas lejanas.
Soñar que cuando un día
esté durmiendo nuestra propia barca,
en barcos nuevos seguirá nuestra bandera enarbolada.

Gabriel Celaya.

joão boaventura disse...

Los niños aprenden lo que viven

Si un niño vive criticado.
Aprenderá a condenar
Si un niño vive con hostilidad.
Aprenderá a pelear.
Si un niño vive avergonzado
Aprenderá asentirse culpable.
Si un niño vive alabado
Aprenderá a apreciar.
Si un niño vive con honradez
Aprenderá a ser justo.
Si un niño vive con seguridad
Aprenderá que es fe.
Si un niño vive con aprobación
Aprenderá a quererse a si mismo.
Si un niño vive con cariño y amistad
Aprenderá a encontrar amor en el mundo.

D.Nolte.

Anónimo disse...

À minha maneira:

INFÂNCIA

De quando era criança, vem-me à mente,
olhando para trás, os espantalhos
mais os rodízios feitos com bugalhos
que dos regatos punha na corrente.

Aos pássaros armava ratoeiras,
de longe lhes seguindo os movimentos,
e aproveitava todos os momentos
para tirar das tocas as toupeiras.

Que feliz me sentia nessa altura,
fugindo à escola sempre que podia
por a considerar uma tortura.

Ainda hoje a natureza me seduz
com tudo o que ela tem de oposto à cruz
desta minha actual... monotonia!

JOÃO DE CASTRO NUNES

Anónimo disse...

Infância todos tivemos
e meninos todos fomos;
só que nem todos dispomos
de engenho para evocar
esse tempo em que vivemos
sem no futuro pensar!

JCN

JCN

Anónimo disse...

Que doce é revisitar a infância pela mão de Rainer Maria Rilke, o Poeta que considerava ser doloroso o crescimentos das crianças! JCN

Anónimo disse...

Que piada tem reproduzir, assumindo-os, os poemas alheios?! JCN

O corpo e a mente

 Por A. Galopim de Carvalho   Eu não quero acreditar que sou velho, mas o espelho, todas as manhãs, diz-me que sim. Quando dou uma aula, ai...