segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011
Sobre Miguel Bombarda
Post recebido do historiador António Mota de Aguiar:
Miguel Bombarda, médico e político português, homem de vasta cultura e formação científica, nasceu no Rio de Janeiro em 1851. Veio ainda jovem para Portugal, onde começou os seus estudos, tendo em 1877 terminado o curso da Escola Médico-Cirúrgica de Lisboa, onde passou a ser Professor. Em 1892 foi nomeado director do Hospital Rilhafoles em Lisboa, mais tarde Hospital Miguel Bombarda, onde exerceu psiquiatria até à sua morte .
O fim do século XIX e início do século XX foi marcado por profundas alterações políticas, económicas e sociais em Portugal. No contexto das alterações ocorridas, a contribuição dada por Miguel Bombarda como professor e director do Hospital Rilhafoles foi assaz relevante, não porque tenha sido um diligente investigador (devido às suas múltiplas actividades não lhe ficava muito tempo livre para a investigação), mas sim, graças ao seu empenho, e ao de outro médico, Sousa Martins, na criação de dois laboratórios de histologia no Instituto Bacteriológico Câmara Pestana e no Hospital Rilhafoles, respectivamente em 1882 e 1897.
Além da sua actividade como político, foi impulsor de revistas como O Correio Médico e a Medicina Contemporânea e, em 1906, presidiu a um Congresso internacional de medicina em Lisboa, tendo exercido ainda diversas outras actividades.
Miguel Bombarda contribuiu significativamente para fixar em Portugal as raízes das disciplinas de fisiologia e histologia, tendo nomeado Marck Athias para dirigir o Instituto de Histologia do Hospital de Rilhafoles. “Foi o empenhamento de Marck Athias na vertente experimental da medicina que permitiu criar as condições propícias ao nascimento da bioquímica em Portugal”, escreve Isabel Amaral, Professora da Universidade Nova de Lisboa. Por isso, quando nos anos 30 do século XX, Kurt Jacobsohn veio para Portugal, criando e desenvolvendo o estudo da bioquímica, encontrou uma base formada nos anos anteriores pelos mencionados médicos portugueses.
Miguel Bombarda defendeu o determinismo radical, i.e., a ideia de que tudo no mundo é um produto de condições que podem ser cientificamente estudadas, sendo a vida um fenómeno explicável pela “organização molecular” e pelas “condições do meio”. Materialista convicto, escreveu Consciência e Livre Arbítrio, publicado pela primeira vez em 1898, do qual fazemos aqui uma síntese.
Para Bombarda não existiam mistérios inacessíveis à razão humana. Disse ele que: “Os outros, os que da crença vivem e pela fé morrem, procuram a verdade no sentimento. Há no seu espírito presentimentos e intuições. Não há demonstrações, nem mesmo as procuram ou as aceitam. No seu coração está a razão, a natureza e o destino das coisas”. E, como “as propriedades dos corpos são invariáveis em presença das mesmas condições…existe de toda a evidência uma ordenação, uma harmonia, um fatalismo fenomenal…” Mais à frente, Bombarda acrescentou: “A invariabilidade de relacionamento fenomenal, que permite o estabelecimento dessas leis, é o que constitui o determinismo…”… e “a noção dessa lei geral…tem o valor de um axioma geométrico”.
Idealista, republicano convicto, Miguel Bombarda não defendia a selecção darwinista. Na Introdução a um livro de um autor da época (Landislau Batalha) escreveu: “(…) Em toda a natureza o factor cooperativo tem sido a fonte ubérrima da adaptação e da evolução. A selecção darwiniana, com a sua desoladora e impotente luta pela existência, já fez o seu tempo. (…)”.
Defensor do cooperativismo, pensava que um mundo melhor havia de chegar: “…quando os interesses de classes começarem a embotar-se e o ideal humano tiver infiltrado os espíritos, a fraternidade deixará de ser um mito e a humana felicidade uma utopia”.
Morreu assassinado por um doente, a dois dias da implantação da República, para a qual ele tanto tinha contribuído e no seio da qual certamente teria um futuro promissor. “Morrer assim é estúpido”, teve ele a lucidez de dizer na hora da sua morte.
António Mota de Aguiar
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1 comentário:
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