segunda-feira, 21 de fevereiro de 2011

O BESOURO E A PALMEIRA



A minha crónica semanal no "Diário de Coimbra".

Esta é uma história que acaba em Coimbra.

Um viajante biólogo galáctico que passasse pela terra há cerca de 145,5 milhões de anos atrás (início do Cretácio) observaria uma enorme diversidade de dinossauros, compaginando em florestas de fetos, cavalinhas, cicadáceas e algumas coníferas, etc., com pequenos mamíferos, tartarugas, répteis, crocodilos e insectos como os besouros (coleópteros), entre muitos outros seres vivos.

Se o viajante regressasse à Terra cerca de 80 milhões de anos depois (fim do Cretácio superior), há cerca de 65,5 milhões de anos atrás, ficaria surpreendido com uma profunda alteração na biosfera: uma perda de 60% na biodiversidade, indicando que os ecossistemas do planeta teriam passado por momentos de dramática e súbita mudança – o evento KT.

Contudo, a sensação de perda seria rapidamente substituída pela de maravilhamento por encontrar um planeta paradisíaco, revestido por uma flora tropical com inúmeras e novas espécies de plantas com flores (angiospérmicas), como as magnólias, cerejeiras, araucárias, faias, figueiras, palmeiras, entre outras famílias de arbustos e arvores florescentes, uniformemente distribuídas pelo planeta.

Seria recebido por um planeta renovado e florido, refeito de um luto aparentemente inacabável e pesaroso!

Sentiria um clima tropical global, com uma temperatura média cerca de quatro graus superior à dos nossos dias. Espantosamente, o viajante conseguiria encontrar, por exemplo, palmeiras distribuídas desde o equador a latitudes hoje ocupadas pela Gronelândia!


Para além de novas espécies de animais mamíferos e placentários, observaria revoadas de novas espécies de pássaros e enxames de novos insectos como borboletas e abelhas a participar co-evolutivamente na selecção de cores e padrões florais.

Verificaria que alguns mamíferos pequenos não se tinham extinguido, mas sim evoluído, assim como inúmeros representantes de grupos de insectos como as moscas e besouros resistentes e já conhecidos desde a última visita.

Se o imaginário viajante biólogo tivesse visitado na semana passada o terceiro planeta a contar do Sol, teria ficado com certeza muito admirado pela biodiversidade nos ecossistemas que nos últimos 60 milhões anos matizaram a biosfera da Terra.

E, num recanto tropical no Jardim Botânico da Universidade de Coimbra, o viajante observaria que uma palmeira da espécie Phoenix sylvestris (originária do sul do Paquistão, Índia e Bangladesh) estava a ser abatida por um espécimen do Homo sapiens especializado no abate arborícola, sob as ordens das autoridades responsáveis.

Exemplar único neste Jardim Botânico e talvez mesmo em Portugal, a palmeira, com cerca de 12 metros de altura e 78 anos de idade, foi declarada infectada por um escaravelho vermelho, coleóptero da espécie Rhynchophorus ferrugineus, originário da Ásia.


Este besouro, com aspecto de tâmara, tem vindo a globalizar-se alastrando a sua presença para África e Europa - terá chegado ao mediterrâneo europeu por volta de 1980.

Hospedeiro de palmeiras não participa na polinização das suas flores. Muito pelo contrário, durante a fase larvar do seu ciclo de vida, depois de ter eclodido dos ovos depositados na base da coroa da palmeira, alimenta-se de folhas novas e tenras, escava buracos com 1 metro de comprimento no tronco o que danifica tecidos internos vitais para a planta, soçobrando a morte da mesma.



Para informação do turista galáctico, as outras espécies de palmeiras do Recanto Tropical do Jardim Botânico da Universidade de Coimbra, recordação viva de alguma vegetação do final do período Cretácico, irão ser alvo de tratamento de prevenção anti-escaravelho-vermelho, evitando assim um mesmo fim precoce: cinzas.

António Piedade

7 comentários:

Botelho disse...

Situação que tem vindo a ser causa do abate de inúmeras palmeiras. Em Faro já quase não encontramos exemplares destas palmeiras. Fico curioso, e sem saber a razão, porque não são afetadas todas as palmeiras do mesmo modo. O escaravelho parece-me adaptado apenas a um número reduzido de espécies de palmeiras, deixando as restantes de "pé". Felizmente. Se continuar ao mesmo ritmo deixará, dentro de pouco tempo, de ter alimento, fonte de nutrientes para a fase larvar, e procurará estadia noutras paragens.
Por cá já se falou que teria vindo a "galope" de palmeiras adquiridas por uma loja de grandes dimensões dos lados de Albufeira. Outros dizem que veio com as tempestades que se deram há tempos atrás. Verdade seja dita Vini, vidi, vici e agora parte para outro lugar.

Anónimo disse...

Desculpe, mas, por muito que lhe custe, não é "vini", é "veni". JCN

Botelho disse...

não custa nada e uma correção é sempre importante (principalmente quando se é um leigo em latim). Da aprendizagem retira-se o combustível para a evolução.

José Jorge Frade disse...

Descobri hoje este blogue, por indicação de um amigo, também amante do conhecimento e da descoberta, também utilizador dessas ferramentas para melhoria da nossa própria natureza. Só posso agradecer o trabalho que aqui vem sendo feito! Continuem, pois o aproveitamento colhido é sempre mútuo: de quem escreve e de quem lê.

باز راس الوهابية وفتواه في جواز الصمعولة اليهود. اار الازعيم-O FLUVIÁRIO NO DESERTO disse...

enxames de novos insectos como borboletas e abelhas?
há alguns que afirmam isso
Gene Evolution in Lepidoptera . ..... lepidoptera, probably arose in the late Cretaceous to early Tertiary. ...
Alguns pensam ter sido mais cedo

Early steps of angiosperm–pollinator coevolution

pollen grains and pollen clumps common in the mid-Cretaceous. ... MacClade reconstruction of the evolution of pollination modes based on molecular ...

The hypothesis that early flowering plants were insect-pollinated
could be tested by an examination of the pollination biology of
basal angiosperms and the pollination modes of fossil angiosperms.
We provide data to show that early fossil angiosperms
were insect-pollinated. Eighty-six percent of 29 extant basal angiosperm
families have species that are zoophilous

und so weiter

o vini vem do vinil ou da vinificação?

São Canhões? Sabem mesmo a manteiga... disse...

e quanto às belhas... Eusociality in Apidae evolved c. 80 million years ago in the late Cretaceous. ... Evolution of sociality in a primitively eusocial lineage of bees. ...

logo com 15 mega já tavam velhinhas

Cláudia da Silva Tomazi disse...



Compactivel.

O corpo e a mente

 Por A. Galopim de Carvalho   Eu não quero acreditar que sou velho, mas o espelho, todas as manhãs, diz-me que sim. Quando dou uma aula, ai...