terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

O trabalho dos que repõem a ordem

Se para os "Actos de Deus", como Carlos Fiolhais lembrou em texto antes publicado, podem contribuir, e muitas vezes contribuem, erros, negligências, precipitações, bem como interesses menos confessáveis, também é verdade que, para socorrer as pessoas que são vítimas desses “Actos” e para repor alguma ordem na Natureza, vemos intervir, equipas de excelência composta por técnicos discretos e dedicados, que percebemos dominarem saberes especializadíssimos.

Digo isto lembrando-me, em concreto, da leitura dum livro sobre as operações de resgate dos mortos que a queda da Ponte de Entre-os-Rios causou. Os seus autores são o capitão-de-fragata e engenheiro hidrográfico Augusto Ezequiel, e o jornalista António Vieira.

Sobre a escrita deste livro, escreveu o sociólogo António Barreto em Setembro de 2001, no Prefácio:

"Descrever acontecimentos dramáticos, mas sem explorar os sentimentos fáceis. Falar da dor sem pieguices. Narrar um empreendimento, de todos conhecido, mas de modo a que, ao ler este texto, ficamos com a impressão de que não sabemos o fim (...).

Creio não temos, em toda a literatura contemporânea portuguesa, nada que se lhe pareça. Sob o olhar obsessivo de toda a população, aqueles marinheiro tinham tarefas particularmente difíceis a executar. A pressão das emoções, da política, das televisões, da imprensa, dos “directos”, da concorrência entre empresas de informação e de toda a opinião pública era tal que se corria o risco de fazer mal o trabalho. Mas, para bem cumprir a sua missão também se corriam riscos: os de contrariar a dor de alguns e de atentar contra os direitos de muitos. Era preciso ser eficaz, competente e rigoroso; e, ao mesmo tempo, aberto transparente e sensível. Podia consolar-se quem sofria, mas se devia dar esperança de vida (…).

Não se pense que o Comandante Ezequiel e seus colaboradores quiseram sobrepor, a todos os direitos e a todos os sentimentos, a lógica implacável de eficiência militar, do rigor científico e do império da técnica. Não ! Quem ler o livro perceberá rapidamente que o seu problema era bem diferente e bem mais difícil. Queriam combinar o melhor possível direitos e eficiência, sentimentos e técnica, informação e segurança. Não foi trabalho fácil."

Referência completa: Ezequiel, A. & Vieira, A. (2001). Missão em Castelo de Paiva: Relato de um participante na operações de resgate. Lisboa: Editorial Caminho.

1 comentário:

Rolando Almeida disse...

Como sou de Castelo de Paiva, vivi próximo o drama da queda da ponte. Como vim nesse mesmo ano, o da queda da ponte, viver para a ilha da Madeira, apanhei também de perto este drama. Mesmo sem grande ciência, estou convencido que são dois dramas incomparáveis. O de Castelo de Paiva não foi completamente surpreendente para as pessoas, como eu, que todos os dias usavam a ponte. É um claro caso de desleixo humano. O da Madeira é completamente diferente. A água não veio das serras somente pelas ribeiras, mas por tudo quanto é lado, por sítios até impensáveis para queda de água, pedregulhos, etc. E a Madeira é habitável somente no litoral, pelo que as serras estão no seu estado mais puro e selvagem. Fiz um pequeno levantamento aqui: http://filosofiaes.blogspot.com/
obrigado

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