Na minha idade já nada me devia espantar, mas espanta-me! O meu estupor reside no facto em a honra se vender e se comprar, ora por muito milhões de vil metal, ora por um simples prato de lentilhas.
Dias atrás, deparei-me com a insólita situação da euro-deputada Marisa Matias do Bloco de Esquerda a declarar-se social-democrata sem que a face lhe corasse de vergonha. Aliás, apenas mais um exemplar num país de trânsfugas em que os exemplos abundam como fungos em terreno húmido. Sete anos antes, Zita Seabra fanática e agressiva militante comunista escrevia no "Verão Quente" no semanário "Expresso" (15/05/1993): "Hoje, o que faz mais sentido é atacar o cavaquismo e os perigos que ele comporta". Esta declaração serviu de razão a um meu extenso artigo de opinião intitulado: “Zita se abra: quais são os tiques do cavaquismo?” (“Correio da Manhã”, 01/06/1993).
Quase diria que premonitoriamente, nele escrevi: ”Para
se ascender a cargos políticos destacados a receita parece estar na militância
do PCP seguida da dissidência propalada “urbi et orbi”. Não fosse o respeito
que me merecem os comunistas que se não vendem, eu aconselharia o
seguinte itinerário: saída da vida política viciosa e entrada no mundo dos
negócios de honestidade mais que duvidosa!
Com a sua indigitação
para o cargo de coordenadora do Secretariado Nacional (quase ia a escrever da
Informação) para o Audiovisual, Zita Sabra duma só cajadada matou dois coelhos chancelando o seu estatuto intelectual
e oficializando a sua devoção ao PSD. E, não vá o diabo tecê-las, joga simultaneamente, em dois tabuleiros: numa
entrevista passa da irreverência a que se obrigou à bajulice
desobrigada (“Expresso”,15/05/1993).
Com a nomeação (quase) no papo, mantém em todos os aspectos uma opinião crítica em relação a alguns “tiques do cavaquismo que lhe é arrancada a ferros pelo entrevistador, ao mesmo tempo que aproveita a deixa para reiterar o seu “profundo respeito, por Mário Soares", um tanto a despropósito, mas que ela afirma ser “a propósito”! Manuel Monteiro que se resguarde porque pelo andar da carruagem, e por quem lá vai dentro, não se livra de um dia destes lhe bater à porta Zita Seabra!”
Parafraseando a letra da de uma canção de ópera cantada por Caruso a Bocelli:”A política é volúvel/ Qual pluma ao vento/ Muda de sotaque e de pensamento”, temos agora, neste ano da graça de 2020, Zita Seabra, como diriam os ingleses, “to be caught with one´s pants down”, mandatária nacional do Partido Iniciativa Liberal.
A terminar, uma pergunta nada inocente: o que diz a presidente do Bloco de Esquerda, Catarina Martins, à social-democracia da sua euro-deputada Marisa Matias? Como cantou Amália, “fado é sorte e do berço até à morte ninguém tem melhor sorte que aquela que Deus lhe dá!” E o fado nacional não tem sido pródigo para com o nosso torrão natal ajoelhado a falsos profetas que lhe anunciaram uma falsa bem aventurança de um dia vinte e cinco aprilino!
3 comentários:
Com grande espanto meu, acabo de verificar "la donna", Marisa Matias, "e mobile" no que respeita a preferências partidárias. Já se declarou publicamente social-democrata e socialista. Quando se declarará bloquista de esquerda que é o partido no qual aufere um salário de 250.000 euros anuais? já é preciso ser ingrata!
:)
Portugal nunca fez o tal 25 de abril.
A esquerda nunca se fez compreender, talvez porque ela própria nunca se compreendeu.
Portugal precisa de uma revolução, a sério.
A esquerda nunca conseguiu explicar porquê e para quê.
Muitos dos seus porta-vozes, sem nenhuma convicção e menos argumentos, seguiram o natural rumo do fazer barulho até que se cansassem de os ouvir.
Mas não passava de barulho, para ganharem uns votos para as despesas.
Tal como há muitos padres ateus a celebrar missas, há bastantes esquerdistas que, não só nunca leram os respectivos evangelhos, como não têm a noção do que andam a fazer.
Se não se recusam a jogar dentro das regras do capitalismo, o que é legítimo que façam, tampouco as contestam e esse devia o núcleo mínimo do seu programa.
E já nem digo, do seu programa de acção, porque, uma vez definido, como é suposto que a esquerda o tenha, aquilo que deve ser feito, e para eles isso é científico, só restaria e faltaria e haveria que o fazer.
Hoje, vemos claramente visto que o 25 de abril pode ter sido uma revolução dos cravos, mas não foi a revolução de que o país precisava e continua a precisar.
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