“Não sendo um blogger tento acompanhar alguns dos mais interessantes - o De Rerum Natura é um dos que vou visitando. (...) No seio da direção da Sociedade Portuguesa de Educação Física, já comentámos a importância da sua participação neste blog para o mundo da Educação Física e do Desporto” (texto que me foi enviado por Nuno Ferro, presidente da Sociedade Portuguesa de Educação Física).
O vídeo aqui publicado, no passado dia 22 deste mês, com o título “A Junta de Educação Nacional”, da autoria do professor reformado da Universidade de Évora, Augusto Fitas, debruça-se sobre o ensino universitário e a investigação científica nacional. Por vir a propósito, referencio aqui o 2.º lugar do prestigiado “Prémio Pfizer” (1963), promovido por esta farmacêutica norte-americana, em parceria com a Sociedade de Ciências Médicas de Lisboa e com o apoio do semanário “Expresso”, atribuído a investigadores do Instituto Nacional de Educação Física (INEF).
Esta matéria relacionada com o ensino superior mereceu-me um estudo, publicado em Lourenço Marques em 1972, no livro da minha autoria, “Sem Contemporizar”, portanto, em época anterior à existência da “internet (1980), em que esta espécie de trabalhos exigia exaustivas consultas a bibliotecas públicas e privadas, a revistas, a “Diários do Governo” e outras fonte de informação, inclusivamente, orais. Transcrevo, o que sobre esta temática escrevi no livro supracitado:
“Nos últimos anos
da Monarquia, em Portugal, existiam no ensino
superior, apenas, a Universidade de Coimbra e diversas escolas superiores espalhadas por Lisboa e Porto.
Com o advento da República, é criada, em 1911, a Universidade
Clássica de Lisboa, agregando uma tantas escolas superiores que ministravam o
ensino das disciplinas clássicas: Medicina, Letras, Ciências, Farmácia e
Direito.
Por decreto de 1930, é estabelecida a Universidade
Técnica de Lisboa com os cursos de Ciências Económicas e Financeiras,
Engenharia na Faculdade de Engenharia e Instituto Superior Técnico e Veterinária.
Em 1961, é-lhe agregado o Instituto
Superior de Ciências Sociais e Política Ultramarina por influência de Adriano Moreira, então Ministro do Ultramar.
Segundo o Decreto n.º 36 507, de 17 de Setembro de
1947, existem em Portugal os seguintes cursos superiores:
Integrados na universidade : Filologia Clássica,
Filologia Românica, Filologia Germânica, Ciências Geográficas, Ciências Histórico-Filosóficas
(posteriormente desdobradas em Ciências Históricas
e Ciências Filosóficas), Direito, Medicina,
Ciências Matemáticas, Físico- Químicas, Geofísicas, Geológicas, Biológicas, Curso
de Engenheiro Geógrafo, Faculdade de Ciências, Faculdade de Engenharia, Instituto
Superior Técnico, Agronomia,
Veterinária, Faculdades e Escolas de Farmácia, Instituto Superior de Ciências
Económicas e Financeiras e ISEU (integrado na Universidade Técnica de Lisboa em
1961, com o nome Instituto Superior de Ciências Sociais e Política Ultramarina).
Fora da Universidade: Arquitectura, INEF, Escola Naval e Academia
Militar” (fim
de citação).
Verifica-se pelo
exposto, que, ainda em datas relativamente recentes, coexistiram em Portugal, médicos licenciados por universidades de Coimbra, Lisboa e Porto e diplomados pela escolas médicas de Lisboa e do Porto.
Antes de 1930, os
médicos veterinários eram diplomados por
uma escola superior não universitária, verificando-se
a respectiva integração universitária nessa data. O INEF, viria a ser integrado
na Universidade Técnica de Lisboa (1975), Arquitectura (1979), tendo sido anunciada no último boletim do INEF , inclusivamente, a respectiva integração na Universidade Nova de Lisboa, criada em 1973.
Foi numa perspectiva,
“honoris causa”, perante as dúvidas levantadas sobre o estatuto académico que
adjectivava o INEF de nacional, aliás adjectivo que serve de identificação para
os institutos universitários de educação física espanhóis, que me debrucei nesse meu livro sobre o
passado do INEF, até porque, segundo Paul Ricoeur, “a historia é uma mediação entre o passado e o futuro”. Isto mesmo foi reconhecido por Roberto Carneiro, então ministro da
Educação, quando numa cerimónia solene comemorativa da criação da Faculdade de
Motricidade Humana, afirmou, em citação “verbo pro verbo”: “O INEF subiu a pulso
o caminho que o havia de levar à Universidade”
No ano de 1992, cumprindo
um desejo de há anos demonstrado pela própria Universidade de Coimbra, com o
parecer unânime do seu Senado, é criada a sua oitava e última faculdade: a
Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física de que pertenci ao respectivo
corpo docente inicial na condição de
convidado.
Nesta ocorrência é
da maior justiça referir o papel do então Reitor, Professor Rui de
Alarcão, do Professor de Medicina Poiares Baptista, do Professor de
Farmácia Pinho Brojo e do Professor de Psicologia e Ciências da Educação Manuel
Viegas Abreu. Seria lapso de memória imperdoável omitir o nome do
professor catedrático Jorge Bento, director da Faculdade de Ciências do
Desporto e Educação Física da Universidade do Porto
Quanto à integração universitária
do INEF houve nomes de professores de educação física que por ela pugnaram com
denodo. Cito como “primus inter pares”, José Esteves. .E porque, como
sentenciou Goethe, “só os mesquinhos são humildes”, seja-me permitido associar
o meu nome ao dele mas em que ele foi gigante e eu simples pigmeu numa
actividade epistolar com ele mantida em sua vida para que a integração da
Educação Física em meio universitário se tornasse numa realidade que viria a
verificar-se, passados trinta e cinco anos, com a integração universitária do INEF
(1940-1975).
Empenhei-me
nesta causa com respaldo em leituras de Ramalho
Ortigão, escritor que no século XIX muita atenção prestou à formação integral dos
jovens: “Em Portugal país de magricelas de derreados da espinhela, nada mais
importante do que a Educação Física; e a ginástica não é uma questão de circo
ou barraca de feira, é uma alta e grave questão de educação nacional”.
De igual
modo, Sílvio Lima, falecido em 1993, professor de Filosofia da Universidade de
Coimbra, com um extenso acervo de artigos (97)
publicados no jornal portuense “O Primeiro de Janeiro”, entre os anos de
39 a 43 do século passado, cuja riqueza envolve matérias de frondosa árvore de que colho títulos como
“Reflexões Críticas Sobre Desporto”; Desporto e Sociedade”, “Desporto e
Ciência”, “Medicina Desportiva”, “Desporto e
Economia”, etc.
Aliás, o
licenciado em Filosofia, Pedro Falcão, defendeu a tese de mestrado na Universidade
de Coimbra tendo como temática a obra de Sílvio Lima que, em crítica demolidora
para com os seus detractores,de entre eles seus pares académicos, teve o Desporto “como
uma questão grave (grave porque etimologicamente pesada) que só parece leve aos
de leve aos de cabeça leve como o sabugo
ou o algodão”.
Pobre país o nosso que tem o atrevimento de se julgar na vanguarda dos melhores métodos de formar integralmente os seu jovens, futuros timoneiros de uma nau a meter água por rombos do casco indo de encontro a rochedos escutando, ao longe, cantos de sereias do Mar Tirreno que lhe prometiam saber dando-lhe apenas ignorância.
Em crítica de Sedas
Nunes, professor universitário e político português (1928-1991): “As
Universidades são formadas por mero somatório de faculdades entre as quais não se
encontra instituída nem se verifica qualquer colaboração relevante para fins de
ensino ou de pesquisa. Em Lisboa e no Porto, a dispersão espacial dos edifícios
universitários consagra, materialmente, esta separação”. Hoje nem tanto, por
ter diminuído o culto de capelinhas em que as universidades viviam numa espécie
de casulo, separadas umas das outras ciosas das suas identidades e individualidades.
Contraditando esta situação, defendeu George Gusdorf: “A atitude do especialista, quer seja matemático ou botânico, filólogo ou historiador, que se debruce ciumentamente sobre o estrito compartimento da sua própria competência deve ser considerada uma demissão. Qualquer dissociação do conhecimento é uma negação do conhecimento. O dever presente é trabalhar para verificar, para dar corpo àquilo que um século de análise desmembrou. O pressuposto da especialização deve dar lugar ao pressuposto da convergência. Ciências e Letras, Ciências da Natureza e Ciências do Homem, que parecem votadas a caminhos distintos, devem tomar consciência, cada uma por seu lado, que são como paralelas que se afastarem da sua própria direcção encontrando-se no infinito”.
Judiciosas palavas estas que encontram eco na Faculdade de Ciências do Desporto da Universidade de Coimbra que, para além de docentes com formação em Educação Física e Desporto, tem docentes de outras áreas científicas como, por exemplo, Medicina, Hematologia Ciências Biomédicas, Ciências da Educação. Isto porque a Educação Física e o Desporto sendo ciências moles, não pertencem ao núcleo das ciências duras que se bastam a si próprias como, por exemplo, a Matemática.
“Post scriptum”: É natural que o leitor se interrogue sobre o facto de eu me ter ocupado somente do ensino superior antes de 25 Abril. A razão é simples: vivia-se uma época em que chamar Anabela a uma mulher feia dizia-se ser um paradoxo. Hoje, quando se fala do curso superior de Miguel Relvas, e de tantos outros compinchas seus, como José Sócrates, que fez exames ao Domingo, corre-se o risco da risada ou mesmo da gargalhada!
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