Texto de opinião recebido de Ângelo Alves (na imagem o escritor francês Albert Camus):
"Écoutant, en effet, les cris d'allégresse qui
montaient de la ville, Rieux se souvenait que cette allégresse était toujours
menacée. Car il savait que cette foule en joie ignorait, et qu'on peut lire
dans les livres, que le bacille de la peste ne meurt ni ne disparaît jamais,
qu'il peut rester pendant des dizaines d'années endormi dans les meubles et le
linge, qu'il attend patiemment dans les chambres, les caves, les malles, les
mouchoirs et les paperasses, et que, peut-être, le jour viendrait où, pour le
malheur et l'enseignement des hommes, la peste réveillerait ses rats et les
enverrait mourir dans une cité heureuse" (Albert Camus).
Paula Teixeira da Cruz, actual ministra da
Justiça, na sua aparição na Universidade de Verão do PSD, afirmou, com a
habitual demagogia dos políticos, que é urgente ter «políticos com formação» e com
«ética». No dia seguinte, o primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho, reiterou
perante a comunicação social, num discurso surrealista e patético, que vai
continuar com as «privatizações» (um almoedeiro, portanto), que baixou a
«despesa pública», e que o seu caminho é o do «sucesso». Perante tanta
verborreia e falta de bom senso, só faltou aparecer o “doutor” Relvas e o
Presidente da República; o primeiro, que parece a raposa Salta-Pocinhas,
aprendeu o valor do “silêncio” e do “dinheiro” com o segundo; o segundo, continua,
há décadas, a ludibriar os portugueses com a palavra “verdade”, quando só pensa
no valor da sua pensão e no futuro da sua família. A Procuradoria Geral da
República ainda não arranjou tempo para analisar o curso do senhor Relvas, de
apenas quatro cadeiras, se acaso as fez. Se fosse um pobre, porventura a esta
hora já estaria preso, como o senhor que lançou uma cerveja ao “Santo Alberto
Jardim”, o grande ocultador de dívidas astronómicas.
No meu entender, todas as universidades
deveriam ser públicas. Criações do capitalismo para o capitalismo, como a Universidade
Lusófona, não entram no meu conceito de Universidade. Com cursos feitos nelas é
possível singrar na vida sem estudar, comprar carros de luxo, passar férias em resorts, etc. Com efeito, alguns Salta-Pocinhas (políticos,
bancários, etc.) formados nelas prosperaram deixando o Estado e os bancos sem
dinheiro. São estes senhores, detentores de contas abissais, aqui e no
estrangeiro, proprietários de quadros de Miró (como Oliveira e Costa), que
deviam pagar a crise, em vez dos cidadãos que ganham a vida honestamente.
Falam
eles em valores. Valores?! A demissão forçada por Relvas da direcção da RTP e a
nomeação de uma pessoa ligada ao PSD para presidente da mesma é um exemplo
claro do regresso ao Estado Novo. O que escrevo, que aliás já escrevi noutras ocasiões,
foi também escrito antes de mim pelo médico e romancista Cândido Ferreira: quem tomou o
poder após o 25 de Abril foram os fascistas, isto é, aqueles que já tinham o
poder. Cavaco Silva, antes do 25 de Abril, era, como muita gente,
fascista. E Miguel Relvas só não era porque, em Angola, ainda não tinha
atingido a maioridade.
A
hipocrisia é tão grande, que hoje se vota no PSD e amanhã se está contra esse
partido. No imediato, só vejo duas alternativas para o país, Manuel Alegre ou
Jerónimo de Sousa, pois só a força da poesia ou a origem humilde poderão salvar
Portugal. Não a verborreia de Miguel Relvas, que diz ter “norteado a sua vida
pela procura do conhecimento permanente”. Não a verborreia de Cavaco Silva, que
cita Teixeira de Pascoaes, Miguel Torga e outros ao mesmo tempo que não hesita em
atingir a cultura (recordo o caso de José Saramago). Não a verborreia de Luís
Filipe Menezes que considera Relvas «inteligente» (desde quando astúcia é
sinónimo de inteligência?). Não a cautela de José Miguel Júdice (ex-bastonário
da Ordem dos Advogados), segundo o qual o pseudo-curso de Relvas não é motivo
para demissão. Não a ligeireza de Nuno Crato, o ministro da Educação que não parece muito preocupado
com o caso Relvas.
Da universidade da verborreia só
sairá verborreia. Nunca saiu, nem nunca sairá, nem verve nem cultura, nem
justiça, nem igualdade. Leiam o último parágrafo da “Peste”, de Albert Camus, a
fim de compreenderem melhor o 25 de Abril. Para aqueles que me acusam de fazer
citações, eu riposto que só cito o que leio nos livros. Para esses sujeitos,
acabo com um excerto de um poema:
«…no sufras/ porque ganaremos/ ganaremos
nosotros,/ los más sencillos,/ ganaremos,/ aunque tú no le creas, /ganaremos.»…
Procurem o autor, por favor.
Ângelo Alves
Procurem o autor, por favor.
Ângelo Alves
4 comentários:
Desassombrado e certeiro
Excelente posta, como o é o poema de Pablo Neruda.
O PSD e o PS tiveram "universidades de Verão"? E têm esses partidos o direito de avacalhar o conceito de universidade? Já não basta o que basta?
Manuel Alegre é uma alternativa para o país? Não usufrui ele de uma pensão por uma profissão que, afinal, não desempenhou senão escassos meses? Politicamente é algo fátuo (lembram-se daquela vez que deu um encontrão em Seguro para ficar ao lado de Guterres quando ele se preparava para discursar quando ganhou eleições?). Em Alegre salvam-se os versos, o que não é pouco.
Para mim, uma alternativa seria Manuel Carvalho da Silva.
Cavaco Silva era fascista? Fará ele ideia do que isso seja ou de que o foi?
No resto sim, concordo com o texto.
Desassombrado e certeiro, mas algo excessivo e até injusto para com Paula Teixeira da Cruz, que me parece estar a tentar demover o peso morto do sistema judicial.
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