Um rapaz acredita que ninguém gosta dele. Em consequência torna-se antipático, o que leva a que, de facto ninguém goste dele. Este é o exemplo típico de uma profecia auto-realizável. A nossa vida está cheia delas. Muitos fenómenos psicológicos e psicopatológicos podem-se entender a esta luz: em certas condições, basta que se tenha uma crença para que ela se realize. As crenças (ou teorias) que os pais têm sobre os filhos realizam-se com frequência, podendo ser benéficas, se forem positivas, ou devastadoras, quando negativas.
É por isso que uma teoria psicológica que adquira importância acaba por parecer verdadeira. Porém, não é a teoria que se adequa aos factos, mas sim estes que se adaptam à teoria. Ela será uma teoria, mas não uma teoria científica.
As profecias auto-realizáveis ocorrem em todos os contextos interactivos onde os humanos são autores e sujeitos da crença, e simultaneamente visados por ela. Para além da psicologia, podemos encontrá-las na política, na sociologia e na economia. Imagine-se o que aconteceria se todos acreditássemos que os bancos iriam ficar insolventes: a crença realizar-se-ia.
Há assim quem entenda que as ciências humanas não são verdadeiras ciências, mas sim retóricas que engendram factos. Fazem-no porém dentro de certas condições e limites, pois às vezes também engendram os factos que destroem a teoria. Nos dias de hoje, pode estar em causa a ciência económica e suas teorias mais recentes.
J.L. Pio Abreu
6 comentários:
Também há os optimistas:
Uma coisa do W. Allen
No, I don't think you're paranoid. I think you're the opposite of paranoid. I think you walk around with the insane delusion that people like you.
Se calhar toda a gente acabou por simpatizar com este!
Boa continuação!
Penso que este blogue pretende ser sério. Assim, se querem ter entradas sobre Economia, ou sobre Ciência Económica, não vos parece que deviam ter um Economista no blogue, em vez de, de quando em quando, fazerem copy-paste de textos publicados em jornais gratuitos?
É só uma sugestão.
Caro Luís Aguiar-Conraria:
Agradeço o seu comentário, e até percebo a bondade do seu ponto de vista. Mas não posso concordar que para abordar num blog como este qualquer assunto se tenha que falar de cátedra. Não podemos ter para falar sobre a "natureza das coisas" um especialista de cada coisa. Se assim fosse, eu e os meus colegas não podíamos falar de muitos assuntos de que, bem ou mal, temos falado. A reflexão do médico psiquiatra Pio de Abreu, conhecido e premiado ensaista,
tem uma componente de psicologia, que poderá até escapar a um economista. Nós aqui gostamos de cruzar saberes.
Um abraço
Carlos Fiolhais
PS) Quanto ao jornal ser gratuito ou não, também outros jornais são gratuitos quando pagamos apenas o brinde. De qualquer modo, o jornal não foi usado pois fui eu que solicitei ao autor o texto para o poder partilhar aqui e suscitar a discussão que de outra forma seria difícil.
Caro Carlos Fiolhais,
Eu não considero que seja necessário falar de cátedra. Eu também gosto muito da interdisciplinaridade e os meus co-autores vão da matemática à Ciência Política. Mas um mínimo de conhecimento é necessário, penso que nem vos passa pela cabeça, em nome a interdisciplinaridade, pôr aqui posts do ilustre jurista Jónatas Machado a respeito de evolucionismo.
Só mais uma nota, desta vez de concordância. Tem toda a razão quando me chama a atenção por me ter referido à gratuitidade de um jornal de forma depreciativa.
Afinal de contas, muito mais importante do que o suporte da mensagem é a mensagem em si. É nesse sentido que vai a minha sugestão no primeiro comentário. Se querem comentar temas económicos, convidem alguém que perceba um pouco disso.
Como exemplo, aponto-lhe o seu colega de Coimbra, Pedro Bação, que tem importante investigação e alguns artigos publicados sobre choques nos mercados financeiros e respostas políticas óptimas.
Antes de falar sobre Economia, este texto fala sobre a dificuldade de aplicar o método científico aos mercados financeiros. Serão as leis económicas leis no sentido em que o são, por exemplo, as leis físicas? Penso que todos estamos de acordo que não. Sendo assim, parece-me natural estabelecer um paralelismo com as teorias psicológicas. Como uma teoria financeira não pode ser falsificável, ela tem de ganhar o campeonato sendo simples e convincente (Black-Scholes, por exemplo). Eu penso que a especialização, levada demasiado a sério, pode ameaçar o conhecimento. E penso mesmo que teve um papel no colapso dos bancos de investimento. O que quero dizer com isto é: Será que os CEO´s e vendedores desses bancos sabiam exactamente o que os seus traders e quants estavam a fazer? Provavelmente não sabiam lá muito bem. E isto porque uns eram especializados em leis, economia, marketing, enquanto outros falavam a linguagem da matemática e da física. E porque no meio desta confusão o que todos queriam assegurar o seu bónus no final do ano. Vamos ver o futuro. Sendo os mercados uma área onde converge a economia, a psicologia, a física, a matemática e muto mais coisas, espero que nos continuem a oferecer questões fascinantes onde todos nós sejamos capazes de dar algum contributo!
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