Com a devida vénia transcrevemos a coluna do médico psiquiatra José Luís Pio de Abreu publicada hoje no jornal "Destak":
Muitas pessoas que acreditam firmemente em Deus, também fazem profissão de fé nos mercados. Às vezes dá jeito que uma entidade exterior regule harmoniosamente a nossa vida, dispensando-nos de fazer um esforço por isso. Também é certo que o movimento da humanidade é ascendente: somos hoje muitos, mas existe mais justiça do que no tempo dos bárbaros e maior comodidade do que a do homem das cavernas. A explicação é que varia: será por causa de Deus, dos mercados, ou da maximização democrática da inteligência e esforço humanos?
Às vezes acontecem coisas que fazem duvidar de Deus, sobretudo quando a maldade impune ou a desgraça gratuita nos batem à porta. Mas os crentes têm uma resposta: foi Deus que nos quis pôr à prova, foi castigo de culpa escondida ou aviso para uma penitência devida. Os Lentes de Coimbra interpretaram deste modo o terramoto de 1755, fazendo com que a prova que contraria a crença metafísica fosse tomada em seu favor.
Agora que os mercados estão a ruir como um castelo de cartas, o que dirão os seus prosélitos? Afinal, foram eles que durante muito tempo nos atazanaram com as consequências da sua fé: que devíamos privatizar a segurança social, a saúde, tudo aquilo que é pago pelos impostos e talvez mesmo o próprio Estado. O que dirão eles agora? Vão dizer que são ineficiências passageiras, a culpa da ganância excessiva ou uma provação necessária à excelsa regulação definitiva. Mas porque é que não se lembram de dizer que foi um castigo de Deus para quem acredita piamente nos mercados?
J. L. Pio Abreu
sexta-feira, 19 de setembro de 2008
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4 comentários:
Quem explica mais este paradoxo (vivemos uma época de paradoxos): cada vez somos mais taxados com impostos para isto e para aquilo e cada vez mais tiramos menos proveito desse facto: saúde a passos largos de ser privatizada, ensino público nessa senda, etc.
Infelizmente, um governo que se diz socialista entretém-se a lançar impostos sobre a classe média cavando inexoravelmente um fosso entre ricos e pobres, dando, com isso,aval a Peter Vries: “Os ricos não são como nós; pagam menos impostos” .
Mas ergamos as mão ao céu em agradecimento ao almirantado desta nau em mar proceloso.
Explico porquê! O Governo ainda se não lembrou (“vade retro Satanas”!) de pôr a canga de um contador às costas dos pobres e remediados para medir os litros de ar consumido pelos nossos pulmões em busca desesperada de novos e rendoso proventos para ajuda milagrosa aos cofres do Estado que deixaram de se abrir ao caudal de dinheiro que nos chegava de uma Europa de mãos largas, em tempo de vacas gordas a encherem as respectivas vacarias. Hoje com a crise que vai por essa Europa e mundo fora o leite, das magras vacas, não chega para alimentar bocas estrangeiras. E nós, para nossa felicidade patriótica, ainda mantemos a nossa identidade nacional.
paradoxo maior:
passar o tempo a injectar liquidez
na esperança de alcançar resultados sólidos....
Caros Bloggers e Caro José Luís Pio de Abreu
Eis um bom exemplo de que não devemos falar do que não sabemos com algum detalhe.
Não há qualquer semelhança entre a "fé" nos mercados e a fé em deus todo poderoso e criador.
Se bem que somos forçados a admitir que às vezes os defensores destas 2 fés distintas coincidem na mesma pessoa.
A crise dos mercados não vai acabar com os mercados. Quem tem fé nos mercados, devia dedicar-se a outra actividade qualquer, como prever as cotações bolsistas da próxima 2ª Feira, por exemplo.
Os mercados só existem, porque existem pessoas que precisam de usar/possuir coisas que lhes fazem falta e de que não dispõe.
Acabemos com o dinheiro e com as palavras "fashion" e mesmo assim, sempre que alguém obtém (sem ser por direito divino ou por furto) legalmente um bem ou serviço de outrém - tenha ou não dado qualquer outra coisa em troca - estamos sempre em presença de um mercado. Infelizmente parece que já na antiga Mesopotâmia se desenvolviam e regulavam mercados. Não se trata por isso de uma invenção moderna.
O mercado é uma ferramenta económica não deve ser um objectivo a atingir. Nunca vi ninguém dizer que tinha fé em que dando com o martelo no prego, ele vai entrar na madeira.
O relacionamento de políticas de privatização da S.Social e quejandos, não tem a sua origem nas filosofias de mercado, mas sim na realidade histórica e estatística de que os privados gerem mais eficazmente qualquer coisa (inclusive o nosso dinheiro)do que os gestores públicos. Números dos anos 90 do último Século diziam que um "Escudo" investido pelo sector público gerava um benefício de 3 Escudos, enquanto o mesmo Escudo investido pelo sector privado gerava 11 Escudos de benefício.
A privatização dos serviços públicos do ponto de vista económico, só tem esta justificação, tudo é resto é treta só para nos perdermos em divagações sobre o que desconhecemos.
Caro Fred20025:
Obigado pela lição sobre as vantagens miríficas da privatização dos serviços públicos.
Mas permita-me a insistência. Se tudo for privatizado, deixando aos particulares a gerência dos assuntos económicoa do Estado para onde vão os nossos impostos?
Na Suécia, por exemplo, pagam-se grandes impostos que são retribuidos por vantagens sociais correspondentes. Nos Estados Unidos, a Saúde a as universidades melhores estão sob a tutela de privados. Acontece que os pobres a esses serviços pouco ou nenhum acesso têm.
Com sinceridade lhe digo que apreciei o seu comentário, por isso, lhe peço uma resposta a estas minhas inquietações. Por via das dúvidas, informo-o que não navego com a bússola pessoal a apontar para a esquerda.
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