sábado, 5 de maio de 2007

ECOLOGIA VERSUS ECONOMIA

Tanto ecologistas como economistas são profetas profissionais. Mas os ecologistas não são sempre bons profetas senão estávamos todos pobres. E os economistas não são sempre bons profetas senão estavam todos ricos.

Um dos ecologistas mais famosos é Paul Ehrlich, professor da Universidade de Stanford. É o autor de um livro, que se tornou um clássico, sobre o crescimento populacional e suas consequências ("The population bomb”, 1968). Saiu depois uma sequela intitulada "The population explosion" (1990) onde, em parceria com a esposa, fez o inventário de algumas razões para ter medo do futuro. As principais eram que a curva da população na Terra estava a empinar vertiginosamente e que a quantidade de recursos disponíveis era finita.

Quem lesse esses livros poderia ficar com a ideia que o melhor era fugir do futuro a sete pés. Estaríamos mesmo condenados ou seria a criatividade do homem capaz de arranjar novos futuros?

Estalou então uma polémica entre o pessimista Ehrlich e o optimista Simon. Julian Simon, professor de Economia na Universidade de Maryland, encontrou em Ehrlich um rival à altura. Se Ehrlich alertava para o superpovoamento e para o esgotamento de recursos, Simon ripostava que, quanto mais cabeças existissem, maior seria a "pool" de criatividade de onde novas ideias e soluções poderiam surgir. Segundo ele, o passado ensinava-nos que a capacidade humana de invenção crescia à medida que os problemas se iam avolumando. Se no futuro houvesse mais pessoas decerto que haveria mais cérebros (Andorra não tem Prémios Nobel e os Estados Unidos têm um grande número deles). E mais cérebros significa capacidade de resolver mais problemas...

Simon publicou em 1980 na revista "Science" um artigo em que criticava Ehrlich. Se há mais gente a consumir mais bens naturais e estes são limitados, os ecologistas inferiam que as matérias-primas tinham de aumentar de preço. Errado, replicou Simon, esses bens poderiam baixar de preço. Ehrlich e Simon resolveram adoptar um exemplo concreto para confrontar as respectivas razões. E, no mesmo ano, fecharam uma aposta sobre o preço daí a dez anos de um conjunto de metais de utilização comum. Ehrlich previa que iam ser mais caros e Simon garantia que iam ficar mais baratos. Em 1990 foi a altura de decidir quem tinha razão...

Ganhou o optimista! Corrigindo os preços para levar em conta a inflação, os metais tinham de facto descido de preço. Aliás quase não era necessária essa correcção porque a descida era acentuada. E assim Ehrlich não teve mais do que pagar (cerca de 600 dólares) ao seu antagonista (as contas, tal como tinham sido acordadas, implicavam que quanto mais os materiais baixassem mais ele teria de pagar). As razões do embaratecimento eram claras: tinham-se entretanto desenvolvido novos processos de detecção e extracção de jazidas metálicas, tinham-se substituído certos materiais por outros novos, etc.

O ecologista pagou mas não desistiu. Continuando profeta da desgraça, comparou Simon a alguém que caía a sorrir de um prédio alto, e, enquanto passava pelo primeiro andar, continuava a sorrir. Simon sorriu e disse que estava pronto a repetir a aposta aumentando a parada para 20000 dólares relativamente ao preço de quaisquer metais em qualquer data futura. Julgava que o futuro ia ser melhor para todos, inclusivamente para ele porque esperava ganhar a aposta. Mas Ehrlich nunca voltou a aceitar quaisquer apostas de Simon, que faleceu em 1998...

27 comentários:

timshel disse...

ia jurar que se Ehrlich fosse ateu e previsse o fim da religião, bastaria mudar apenas duas ou três palavras a esta história

Anónimo disse...

O namoro de ambos é, há muito, indisfarçável. Aliás, os paparazis têm-nos, frequentemente "apanhado" em poses pouco dignas.

Será que, qual bela história da carochinha, poderemos ter esperança de vir a ver as, imagino eu, maravilhosas fotos do altar?

E nesse caso, vamos todos nós acabar remediados?

Artur Figueiredo

P.S. Ao contrário do Ehrlich, e de outras situações, nesta matéria nunca estarei disponível para apostas.

José M. Sousa disse...

AS "previsões", eu diria antes, as chamadas de atenção, de Paul Ehrlich como de outros , tiveram o mérito de apontar para uma evidência: os recursos são de facto finitos e a população não pode crescer indefinidamente. E não é o facto do preço de algumas matérias primas continuar, em termos reais, muito baixo, muitos anos depois das ditas "previsões" que o desmente. Por várias razões, uma das quais é que o preço não reflecte as projecções da relação entre a oferta e a procura no futuro (horizonte de décadas): O mercado é míope. Em relação à população, a verdade é que , por exemplo a China, e a ìndia deverá segui-la, tomou medidas drásticas para controlar a população; em vários países ou regiões houve e continua a haver genocídios aos quais estão subjacentes escassez de recursos: Ruanda, Somália, Haiti, Darfur, Etiópia, etc, etc.
O nosso problema é que temos tendência a concentrar-nos no "mundo desenvolvido" e a esquecer o resto.
Numa área com tão grande inércia como é o controle da população, é muito útil alertar com décadas de antecedência para potenciais problemas. Se, entretanto eles não ocorrerem é sinal de que, se calhar, tomaram-se algumas medidas atempadas. Paul Ehrlich fez muito bem em alertar para o problema, que continua a ser bem real!

Anónimo disse...

Pois é, mas após uns anos os preços dos metais começaram efectivamente a subir...
http://news.thomasnet.com/IMT/archives/2004/05/metals_the_big.html?t=archive

José M. Sousa disse...

«We have in our hands now—actually in our libraries—the technology to feed, clothe, and supply energy to an ever-growing population for the next 7 billion years. Most amazing is that most of this specific body of knowledge was developed within just the past two centuries or so, though it rests, of course, on basic knowledge that had accumulated for millennia. Indeed, the last necessary additions to this body of technology—nuclear fission and space travel—occurred decades ago.»

Julian Simon

A isto, Jared Diamond responde que, à actual taxa de crescimento da população, a massa de toda essa população equivaleria à de todo o universo em 6000 anos!

Entre esta "previsão" de Simon e Paul Ehrlich, parece óbvio de que lado está o bom senso!

Fernando Dias disse...

Carlos Fiolhais,

Afinal qual é a lição da ambiguidade da metáfora?
Que é bom ser optimista.
Que é mau ser ecologista.
Ou no meio é que está a virtude.

E qual é a posição de Carlos Fiolhais?
Vou tentar adivinhar: é optimista quanto à infinita capacidade inventiva e criativa humana, e é pessimista quanto à bondade da infinita exploração dos recursos da Terra por parte da finita imaginação economicista.

João Vasco disse...

Subscrevo todas as sensatas observações do José M. Sousa.

Bem pertinentes.

António disse...

Escrevi algo relacionado faz poucos dias. A ecologia é uma nova religião!

Anónimo disse...

A ecologia não é uma religião é uma ciência.

Anónimo disse...

Proponho ao Prof. Carlos Fiolhais que faça um simples exercício: coloque toda a população chinesa a consumir os mesmos recursos naturais que a população dos EUA (ou da UE) usa neste momento.
Quantos planetas seriam necessários ?
O Prof. Carlos Fiolhais deve ignorar que cientistas como ele, concluíram que há pouco tempo a população da Terra atingiu a capacidade natural de produção. Veja a notícia em:
http://news.bbc.co.uk/2/hi/science/nature/6033407.stm

Se tem outros valores, faça favor de os apresentar.

J. Norberto Pires disse...

Esta história contada pelo Carlos Fiolhais, entre Simon e Ehrlich, é um bom exemplo entre profetas da desgraça e optimistas. Simon acreditava profundamente no "capitalismo", na "liberdade" e no "mercado" (mercado livre). Era um pensador sobre a capacidade humana de re-inventar o futuro: o grande recurso (inesgotável) é a inteligência humana. Acreditava que os recursos naturais não são finitos, porque eram criados pela capacidade humana e na ausência de um, a humanidade inventava outro (costumava dizer que o petróleo não era um recurso, até que a capacidade humana lhe descobriu e atribui um propósito: ou seja, o foco é a "inteligência humana", o verdadeiro recurso natural).

É claro que os avisos, os alertas, os factos, etc., apontados por ecologistas são importantes: o que é exagerado é o fatalismo, a profecia da desgraça, como se tivessemos o destino selado. É na "inteligência humana", imaginativa, livre, com valores e optimista, na sua difusão pela população que devemos apostar (educação). Porque é uma ENORME fonte de esperança e de LIBERDADE.

:)

Vale a pena ler: http://www.juliansimon.com/writings/Articles/POPOPED3.txt

Especialmente os últimos dois parágrafos.

Gostei muito deste post.

J. Norberto Pires

Anónimo disse...

O senhor da ecologia teria feito melhor em apostar no preço do petroleo...

Rui leprechaun disse...

Hummm... muito interessante este debate, cujo desfecho final de facto ainda nem sabemos.

É que mesmo a questão dos recursos naturais serem limitados não se pode considerar um dado adquirido, ou seja, talvez não sejam! E sim, parece-me que as razões do optimista Simons são válidas, mesmo que só parcialmente.

Por outro lado, ainda que os recursos não sejam ilimitados e a sua utilização seja crescente, com o progressivo desenvolvimento das grandes nações asiáticas, por exemplo, o respeito pelo equilíbrio do planeta é um "must" e ignorá-lo seria um disparate que por certo ninguém advoga.

Pessoalmente, também partilho mais do optimismo de Simons, não sei se totalmente pelas razões que ele aponta, mas a sua noção de stock of human knowledge é por certo inerentemente correcta, sim. O espírito humano é a principal fonte de criatividade e sustentabilidade da vida racional neste planeta e o poder criador do Homem é sem dúvida imenso. Por outro lado, não me parece que o crescimento populacional seja a tal ameaça que de há muito vem sendo anunciada. A este respeito, tendo também a concordar de novo com a análise positiva de Simons.

Por fim, numa perspectiva puramente espiritual e idealista não há de facto limites nem escassez de qualquer tipo de recursos, ou melhor, se algum se acaba logo é substituído por outro. Creio que o panorama das ditas novas energias alternativas ilustra muitíssimo bem este ponto. O "peak oil" deve ser inevitável, ao que parece muito em breve, mas a exploração de novas fontes de energia, incluindo algumas não poluentes, deverá fazer com que a transição dos combustíveis fósseis para os não fósseis seja relativamente pacífica e decorra sem demasiados choques... we hope!

Ah, lembrei-me agora que já existe, pelo menos nos EUA, uma fusão da ecologia com a economia chamada "ecolonomics". Tal simbiose parece muito válida e mais ainda quando se encorajam as empresas a terem práticas e comportamentos ecológica e socialmente responsáveis, baseando-se no princípio de que as actividades económicas também estão dependentes do ambiente, logo é um contrasenso prejudicá-lo.

Mas será possível uma simbiose perfeita entre um ambiente saudável e uma economia próspera? Ou podem Ehrlich e Simons conviver pacificamente?!

I guess so, why not?...

Rui leprechaun

(...if mother Earth is all we've got! :))

José M. Sousa disse...

Quando se tratam temas tão complexos como estes raciocinando de forma dicotómica, corremos o risco de revelar alguma ingenuidade. Aliás, corremos mesmo o risco de substituir uma religião por outra, a de uma fé inabalável na tecnologia para resolver todos os nossos problemas.
Quando Simon fala da liberdade, a que liberdade se refere? A de podermos fazer tudo o que nos apetece? Isto, manifestamente não é possível. E não é possível porque não existem soluções técnicas para todos os problemas. Alguns exemplos são referidos em "The Tragedy of the Commons" http://www.sciencemag.org/sciext/sotp/pdfs/162-3859-1243.pdf

do biólogo Garrett Hardin. Hardin diz que: «a technical solution may be defined as one that requires a change only in the techniques of the natural sciences, demanding little or nothing in the way of change in human values or ideas of morality».
Segundo parece ter sido demonstrado matematicamente (von Neumann and Morgenstern) não é possível maximizar duas, ou mais, variáveis em simultâneo. Logo, não é possível que a população cresça indefinidamente sem que isso se reflicta no esgotamento dos recursos, por muito criativa que seja a mente humana!
Por outro lado, a tecnologia resolve alguns dos nossos problemas, mas simultaneamente cria novos problemas, porventura ainda mais complicados do que aqueles que resolveu.
Na sua obra "Colapso" (2005), o biólogo Jared Diamond comenta esta ideia de que a "tecnologia resolverá os nossos problemas":
«This is an expression of faith about the future, and therefore based on a supposed track record of technology having solved more problems than it created in the recent past. Underlying this expression of faith is the implicit assumption that, from tomorrow onwards, technology will function primarily to solve existing problems and will cease to create new problems. Those with such faith also assume that the new technologies now under discussion will succeed, and that they will do so quickly enough to make a big difference soon». Esta última frase deveria soar como alerta, por exemplo, para aqueles que descartam com muita leviandade o problema da crise energética que se avizinha.

Anónimo disse...

A pergunta deveria ser posta em termos qualitativos. Será que a tecnologia, tanta e tão boa que há, não está a mimar-nos demasiado ? Porque será que cada vez mais se vendem ansiolíticos nas sociedades avançadas do Norte ? Ou porque é que os jovens de hoje (e de ontem) passam tanto tempo a viver a vida dos outros (jogos de video, TV) ?
Temos tudo para ser felizes, uma abundância enorme de recursos...mas insistimos em estragar a a base da sustentação por pura ganância. Não sabemos estar uns dias quietos, simplesmente a contemplar, perdeu-se a calma. Muitos miúdos amanhã já não vão saber o que é uma paisagem natural quase intocada !

Manel disse...

Se a virtude estivesse no meio, o mar não teria ondas:
Seria uma grande chatisse!

Anónimo disse...

Num blog que se pretende científico, é extremamente desapontante ver colocados em pé de igualdade as conquistas da ciência económica e os bitaites desmiolados do neo-malthusianismo, como se ambos tivessem a mesma validade, e, só por acaso, os economistas estivessem a "ganhar".

Anónimo disse...

Defending economic growth against leftwing fanatics

http://www.brookesnews.com/071604trainer1.html

José M. Sousa disse...

Manifestamente, este último comentador não entende o âmbito da discussão. Já agora, faço-lhe notar que Malthus morreu em 1834 e Marx nasceu em 1818!

José M. Sousa disse...

Eis um exemplo interessante, a propósito desta discussão:


«The cancer, Walker says, are massive entitlement programs we can no longer afford, exacerbated by a demographic glitch that began more than 60 years ago-- a dramatic spike in the fertility rate called the "baby boom."

Beginning next year, and for 20 years thereafter, 78 million Americans will become pensioners and medical dependents of the U.S. taxpayer.»

Texto completo em: http://www.cbsnews.com/stories/2007/03/01/60minutes/main2528226.shtml

Anónimo disse...

Caro neo-malthusiano jmsousa, se se tivesse dado ao trabalho de ler o artigo quer referi, facilmente verificaria que não só se enquadra perfeitamente no âmbito desta discussão, como refuta cabalmente todas as tolices que levianamente propala.

José M. Sousa disse...

Eu não propalo coisa nenhuma. Não vou perder muito tempo com esta discussão estéril. Se calhar até tenho a mesma formação de base que você. Mas a biologia, a demografia, etc. são ciências!
O âmbito de discussão não é uma corrida de cavalos entre a economia, representada pelo Julian Simon, e entre a sua caracterização do pensamento de Paul Ehrlich. Até porque a "corrida" prossegue....

Anónimo disse...

Propala sim senhor, no seu blog Futuro Comprometido.

O Peter Singer é um idiota, lamento.

Experimente ler 'The Improving State of the World: Why We're Living Longer, Healthier, More Comfortable Lives on a Cleaner Planet' de Indur Goklany

ou

'Why Globalization Works' de Wolf

José M. Sousa disse...

Discordo.

Anónimo disse...

A world full of good news
By Jeff Jacoby, Globe Columnist | May 13, 2007

http://www.boston.com/news/globe/editorial_opinion/oped/articles/2007/05/13/a_world_full_of_good_news/

MM disse...

tretas tecnocratas...

Anónimo disse...

Sei que ainda estou verde para o assunto acima citado, mas acredito que devamos tentar, cada um fazendo sua parte, salvar a nossa casa. Casa esta de muitos moradores, ora extremamente egoísta, ora extremamente ingênuos como eu que acreditam piamente que podem tentar salvá-la das agressões sofridas por pessoas inescrupulosas que pensam somente no bem estar presente, esquecendo-se que no futuro seus próprios descendentes poderão sofrer com seus ataques contra a natureza, nossa casa.Há quem diga que esta mesma é indefesa, mas com o passar dos dias ela nos mostra totalmente o contrário, com seus extraordinários fenômenos que desabrigam seres humanos capazes de pensar egoístamente ou não,assim com nós fazemos com os animais irracionais e indefesos que habitam em suas matas. Quanto a economia ??????????
De que valerá futuramente tanto dinheiro extraído da natureza se não iremos ter onde gastá-lo?
Sim porque daqui alguns anos, o planeta chamado Terra, não mais existirá...
Hoje a vítima é a natureza, amanhã seremos nós..
e a vilã será ela.

"A escola pública está em apuros"

Por Isaltina Martins e Maria Helena Damião   Cristiana Gaspar Professora de História no sistema de ensino público e doutoranda em educação e...