quinta-feira, 11 de junho de 2020

BASTA DE TANTO CINISMO

“O cinismo é a única forma sob a qual as almas 
torpes tocam de leve no que se chama sinceridade”
(Friedrich Nietzsche)

Numa hora em que racistas por uma qualquer varinha mágica se transformam em anti-racistas, ocorre-me um punhado de “almas bondosas” de Lourenço Marques, que logo após 25 de Abril, passaram a frequentar espaços públicos acompanhados de crianças negras filhos de serviçais, vestidas de camisa branca, calção azul escuro e calçadas. Crianças que na véspera só tinham acesso aos quintais dos patrões com camisas rotas, púdicos calções e pés descalços.

Não, não se pense que este “status quo” foi conseguido através de um processo que transformou, de uma hora para a outra, almas negras de racistas em almas brancas de anti-racistas com a pureza da neve da montanha africana de Klimanjaro!

Seria interessante fazer um apanhado desses racistas transmutados em carpideiras em choro convulsivo pela morte de George Floyd asfixiado pelo pé no pescoço de um polícia americano branco. Teríamos enormes surpresas, pela certa.!

Entretanto, a morte de portugueses idosos falecidos pelo coronavírus, depois de ligados meses a fio a ventiladores pulmonares em indiscritível sofrimento, não merece da nossa caridosa alma lusitana mais do que um simples número estatístico ou denúncia  do fácies da nossa ministra da Saúde que se assemelha a uma espécie de “barómetro” do estado de saúde ou doença deses idosos, como tal, ora eufórica, ora compungida.,

Recentemente, foi nomeado pelo Governo um “Gabinete de Intervenção para Lisboa e Vale do Tejo”, face ao preocupante aumento de infectados pelo coronavírus. Ou seja, depois de “casa roubada, trancas na porta”, em crítica da sabedoria  popular.

Coincidência ou não (mas há coincidências levadas da breca!) este crescimento de infectados pelo coronavírus encontra correspondência nas manifestações anti-racistas aos magotes e sem quaisquer cuidados sanitários a que se têm assistido ultimamente e, concomitantemente, ao espectáculo da “Música Pimba”, com inumerável número de assistentes sem cumprir todas as medidas de confinamento exigíveis, com a presença do primeiro-ministro António Costa, ao arrepio das louváveis medidas tomadas no âmbito de um desejável confinamento do dia-a-dia.

Ou seja, levianamente são tomadas medidas elásticas que põem em causa a sobrevivência dos cidadãos e, principalmente, o sacrifício heróico dos nossos profissionais de saúde exauridos de horas e horas de trabalho fora do horário normal de serviço, longe  do seio de  família, com o credo na boca, atingida nos seus sacrossantos direitos.

Haja, no mínimo, bom senso, onde, há corações empedernidos de governantes que nada nos sossegam com a indefinição em nos transmitir uma vida cheia de incertezas científicas e prenha de meias verdades tão criminosas como as mentiras públicas que se vão tecendo e que tanto nos rendem à esperança como nos fazem prisioneiros de horrendas masmorras da actual pandemia.

2 comentários:

Lágrima disse...

O elogio do respeito.
Em todas as dimensões da vida humana, o respeito é o valor que se revela mais precário. O respeito de não roubar, de não falsear notas de vinte dólares para comprar tabaco, de não resistir às autoridades quando se sabe que se comete um crime e, depois, de não ajoelhar em cima do pescoço de ninguém, muito menos, até à morte. Sei que o discurso é superficial, mas o que está na superfície está no fundo...
A violência é o disparar automático da pobreza, da exclusão, do mal-estar individual e social, da intolerância. Impõe-se sempre desmedida, irracional, injusta, difícil de combater, agregando grupos extremistas que aproveitam estes espaços de discórdia para fazer valer a sua ideologia ou a falta dela.
O direito a ter direitos, a haver lugar para todos no espaço universal, a uma coexistência negociada entre grupos, parece ser de urgente cumprimento por uma questão de saúde e funcionalidade de todo o corpo social. Não somos obrigados a gostar uns dos outros, mas deveríamos ser eticamente obrigados ou juridicamente obrigados à aceitação da diferença. A apologia não é a do amor, mas a do respeito, no sentido biunívoco obrigatório. Um respeito que cumpra regras de não invasão do Outro, de livre-arbítrio, de equidade, de relações possíveis, em espaços imparciais e neutros quando não existam outros.
A fórmula de resolução deste problema terá de passar pela eficácia das instituições jurídicas que não deveriam permitir a acumulação de pilhas de processos nas mesas dos juízes consumindo vítimas e culpados e levando, muitas vezes, à justiça pelas próprias mãos; pela eficácia da Escola, tanto na educação cívica de pais, como de alunos; pela eficácia da comunicação social que deveria aceitar gente de todas as cores no seu ecrã e nas suas palavras e estender essa ideia pelas diferentes paisagens mentais; pela eficácia das religiões verdadeiramente inclusivas; pela Arte tentacular de diversos registos que facilmente chegam a todos ou a uma larga maioria; por tudo o que, de alguma forma, ajude a erradicar o racismo mútuo de ódio puro ao Outro, essa divisão entre brancos e pretos no tabuleiro do xadrez que tanto precisa de uns como de outros para que o jogo se concretize na sua plenitude. De que adianta destruir estátuas antigas e filmes memoráveis se o preconceito continua, no dia seguinte, a grafitar paredes?
Convinha tomarem-se posições reguladoras deste estado de coisas, pelo grande mediador do Outro (que referi no parágrafo anterior), e com uma arbitragem vigorosa e resiliente, quando necessário for, de forma a que se diminuam tensões polarizadas e se evitem exageros, para bem de todos.

Rui Baptista disse...

Obrigado pelo seu comentário que li com muito gosto e concordância. Só acrescentaria deve ser o respeito mútuo, isto é o branco respeitar o negro e o negro respeitar o branco. Caso contrário, será negação dos direito de uns em prol de direitos por cumprir por parte de outros. Dias atrás, vi um vídeo em que um jovem negro munido de um bastão partia os vidros de vários carros estacionados num parque de estacionamento português, ocorrência detectável pelas respectivas matrículas.

O corpo e a mente

 Por A. Galopim de Carvalho   Eu não quero acreditar que sou velho, mas o espelho, todas as manhãs, diz-me que sim. Quando dou uma aula, ai...