segunda-feira, 11 de novembro de 2019

A erótica da novidade no ensino básico nacional

Meu artigo de opinião publicado no "Jornal as Beiras", hoje:

“Há uma erótica do novo, o antigo é sempre suspeito” (Roland Barthes).

Publicava, dias atrás, o “Correio da Manhã”, e outros jornais diários, em primeira página (04/11/2019), que “os chumbos poupam ao Estado 5 mil euros por aluno do ensino básico”, assistindo-se, assim, à genuflexão do Ministério de Educação ao trono do Rei Midas, medida criticada, com ácida ironia, por Derek Bok, antigo reitor da Universidade de Harvard: “Se acha que o ensino é caro experimente a ignorância”. Eis portanto a ignorância oficializada!

Aliás, vem de longe! Neste país há o costume de dar passos maiores do que as pernas com a pressa de fazer experiências pedagógicas sem avaliar as consequências. Por ter sido dito por Mark Twain, com delicioso espírito, que “a profecia é algo muito difícil, especialmente em relação ao futuro”, atrevo-me a registar, tão-só, o passado e o presente, sem me abalizar a profetizar o quer que  seja.

A seguir a cada eleição o  Governo empossado, ainda que da mesma área política do precedente, apressa-se a tirar da cartola um coelho, de experiências pedagógicas, ontem glorificadas, hoje nas ruas da amargura, à imagem do feiticeiro de OZ alternando o seu poder com a mistificação de qualidades só aparentes, num país em que a mediocridade é a lei, como escreveu o falecido João Lobo Antunes profundo conhecedor da vida académica universitária lusitana e norte-americana.

Mas o grave é termos pedagogos entronizados em estereótipos de dados estatísticos de países em que o sucesso educativo atinge os melhores índices sem ter em linha de conta a advertência de Agostinho da Silva: “A única salvação do que é diferente é ser diferente até ao fim com todo o valor, todo o vigor e toda a impassibilidade”. 

E deste modo descuram-se programas escolares devidamente estruturados, turmas com alunos em número excessivo, preparação dos professores do básico do 1.º ao 6º anos, baixada no 5.º e 6.º anos, de uma licenciatura universitária para diplomas de escolas politécnicas, por vezes nascidas  em privatizações de vão de escada, etc.

Vezes sem conta, em artigos de opinião, tenho-me insurgido contra a extinção das antigas escolas técnicas que preparavam os alunos, para um saber teórico-prático, umas vezes, por opção própria, outras, por questões económicas. Por outro lado, uma falsa democratização do ensino liceal gerou cábulas em frágeis caboucos de uma cúpula  que desabava ao mínimo abalo de exigência do ensino universitário.

Desse ensino técnico não sobrou pedra sobre pedra, apenas construções actuais de adobe por ausência de um corpo de professores especializados, de antigos mestres de oficinas bem apetrechadas. Esta minha crítica não tem encontrado acolhimento em fronteiras nacionais - é bem certo que poucos conseguem ser profetas na sua própria terra -, todavia teve ela repercussão, altamente positiva, em  extensa citações  por parte de renomados académicos  brasileiros, como dei conta em dois artigos de opinião publicados neste jornal: “O ensino técnico luso-brasileiro” (25/10/2019) e “Ainda o ensino técnico em terras de Santa Cruz) 28/10/2019).

“Last but not least”, pondo o carro à frente dos bois, por dados estatísticos ainda por trabalhar, as agressões selváticas (que, de quando em vez, levam as vítimas a serem assistidas nos hospitais) de alunos ao professores, ou vice-versa, ou entre os próprios alunos, são minorizadas pelo Governo e pelo Conselho Nacional de Educação. Haja, no mínimo dos mínimos, bom senso!

5 comentários:

Anónimo disse...

É impossível estar, infelizmente, mais de acordo e muito me admira a concordância dos EE EE e seus representantes.
Constato, cada vez mais, que psicologia e ciências da educação não se relacionam.
Outro assunto que seria interessante abordar, se tivéssemos Ministério da Educação, é a atitude perante os smartphones , sabendo como eles capturam os cérebros deviam ser banidos das escolas.
Outro assunto que merece abordagem é a desmedida intrusão dos EE EE na Escola não só no que respeita à actividade docente mas também quando entram , por ali dentro, para ajustarem contas com determinado professor .

Helena Damião disse...

Felicitando o Professor Rui Baptista pelo seu poster, permito-me deixar as seguintes notas ao comentário do leitor anónimo.
1) A Psicologia é uma área científica na qual a educação escolar se deve apoiar (entre outras áreas de saber). É, portanto, uma Ciência da Educação. Acontece que na Psicologia convivem várias teorias (algumas científicas outras longe disso), pelo que, dependendo da orientação que se quer dar à educação assim se opta, se segue, se apela a uma ou a outra teoria.
2) A atitude perante os telefones portáteis devia ser informada na Psicologia, sim. De facto, ela disponibiliza suficientes dados confiáveis que permitem concluir que esses instrumentos não são uma mais-valia em termos de aprendizagem quando comparados com o papel e lápis
3) A entrada do encarregados de educação na escola, não como encarregados de educação mas como parceiros na educação formal, tem sido potenciada pelas políticas internacionais e nacionais mas a própria política de escola não lhe é alheia.
Cordialmente,
MHDamião

Rui Baptista disse...

Desde já declaro, ser, parafraseando Eça, “diletante de coxia” no que tange às Ciências da Educação apresentando como crachá a minha experiência na docência, de cerca 40 anos , no ensino técnico, liceal e universitário ( sei correr o risco, de me evocarem que “experiência é o nome que damos aos erros que cometemos”, segundo Oscar Wilde).

Assim, numa auto-aprendizagem pelas leituras que sobre esta temática tenho feito, e principalmente, os contactos frutuosos que tenho mantido, sobre temáticas da Educação, com a Professora da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação Helena Damião, licenciada em Psicologia e doutorada em Ciências da Educação.

Em esclarecimento ao comentário de um leitor anónimo ao meu post (que agradeço), refere-se esta professora universitária, com autoridade académica, ao facto de nas Ciências da Educação haver o perigo de não ser feita uma triagem do que é científico e do que é simples opinião, aquilo que hoje se dá o nome de “achismo”, que leva aos seguidismo cego e perigoso de teorias acientíficas.

Sempre que falo da Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação sinto, mais do que obrigação a devoção, em recordar o seu antigo director, Professor Jubilado Manuel Viegas de Abreu grande defensor da criação da actual Faculdade de Educação e Ciências do Desporto de que fui, no início do seu funcionamento,um dos docentes convidados.

Aqui há anos, fui convidado pela Comissão de Gestão do Núcleo de Orientação Profissional da Faculdade de Psicologia e de Ciências da Educação, sob a presidência do Prof. Doutor Manuel Viegas Abreu, para proferir como proferi, no passado dia 17 de Janeiro de 1990, a conferência intitulada: “A unidade do Homem pelo acto motor”. Desta forma, grande benefício cultural/científico fico devedor a esta faculdade e a dois dos seus docentes supracitados. Para eles a minha gratidão.

Anónimo disse...

Maria Helena Damião, peço desculpa que na verdade não me fiz entender, não estava a referir-me às Ciências da Educação mas a uma facção que tem capturado o Mi(nis)tério da Educação.
Quanto aos EE como parceiros , são muito bem vindos, o problema é que a maioria não o é e quando "entra pela "escola dentro" ( e há cada vez mais casos) é para tirar desforço do professor A ou B, isto porque "o filho nunca lhe mente".

Helena Damião disse...

Caro Leitor, uma das fragilidades das Ciências da Educação/Pedagogia (junto as duas expressões, que designam duas áreas de estudo) e terem respostas para defender algo e o seu contrário. Há correntes, perspectivas (evito o termo teorias) para todos os gostos. E mesmo quando há conhecimento científico seguro para responder a perguntas simples (é melhor usar o papel e lápis do que o écran para aprender) há sempre alguém que discorda... porque na sua opinião. Eu, que trabalho nesta área, digo: a confusão reina. E não vislumbro uma saída.
Se o leitor quiser generalizar bem pode fazê-lo: a um nível mais geral, encontra especialistas em Educação na OCDE, UE, UNESCO com discursos muito aproximados daqueles que por aqui se produzem. São os tais capturados pelos diversos poderes (que não só políticos) precisamente para os legitimarem.
Cordialmente,
MHDamião

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