quarta-feira, 14 de fevereiro de 2018

Não matem a leitura nas escolas

Vale a pena ler os seguintes artigos publicados no jornal El País: ‘Matar a un ruiseñor’ no se podrá leer en algunas escuelas de Virginia por su lenguajede Cristina Pereda (2016) ‘Matar a un ruiseñor’, demasiado ofensiva para los niños, de Paula Corroto (2017).

Ambos se detêm na proibição de mais um livro por responsáveis escolares, com argumentos que encaixam no "politicamente correcto". Foi mais uma vez nos Estados Unidos da América mas podia ser noutro país ocidental; podia ser em Portugal.

Trata-se de um tipo de proibição com particular expressão nesse país, tanto nos níveis de ensino não superior (aqui e aqui) como nas universidades. E no que respeita a universidades, as inglesas não lhe têm ficado atrás (aqui, aqui, aqui).

A alegação de que certas expressões constantes nos livros, sobretudo nos grandes clássicos, certos elementos que contém, certas ideias que abordam podem perturbar não só o bem-estar emocional das crianças e dos jovens mas também a paz social, ganha adeptos dentro e fora do contexto escolar.

Ultimamente, têm sido as mães a queixar-se. Recolhi exemplos de Inglaterra (aqui) e de Portugal (aqui)

Ora, foi precisamente uma mãe que se queixou no Conselho Escolar do livro a que os dois artigo acima citados se referem: Não matem a cotovia, de Harper Lee, publicado em 1960. Queixou-se também do livro As aventuras de Huckleberry Finn, de Mark Twain, mas esse já consta na lista dos títulos mais censurados nas escolas americanas.

Disse essa mãe, e muitas outras concordaram, que certas palavras usadas em ambas as obras perturbaram o seu filho adolescente: "não discordo que seja uma obra da literatura mas há tantos insultos racistas e palavras ofensivas que é impossível ignorar". Entre esses insultos está a palavra "negro", que deixou de se poder pronunciar, tendo sido substituídas pela expressão "a palavra começada por ene".

É importante lembrar que, tal como As aventuras de Huckleberry Finn, Não matem a cotovia conta uma belíssima história que realça, com grande sensibilidade, o "valor de valores" como a igualdade e a liberdade. Por isso mesmo, Harper Lee recebeu em 2007, a Medalha Presidencial da Liberdade.

Contra esta censura imposta pelos mais esclarecidos ou pelos mais ignorantes, estribados nas mesmas razões, que julgam ser legítimas, e que alastra a olhos vistos, fazendo perigar a cultura civilizacional, há que fazer alguma coisa: ler e dar a ler!

2 comentários:

Anónimo disse...

Por mim, recomendo "A Relíquia", de Eça de Queirós. É magnífico!
O Mosteiro da Batalha é um rendilhado feito de pedra; "A Relíquia" é um rendilhado feito de palavras portuguesas.

Fortunata Fialho disse...

A educação vem de casa e a interpretação dos livros também. Nunca proibi a leitura de qualquer livro aos meus filhos, desde que adequados ao seu nível etário, e não se tornaram pessoas com qualquer tipo de preconceitos. Aliás sempre fomentei a leitura tanto de obras recentes como dos clássicos, ler faz crescer, torna as mentes criticas, e abre universos. Não deixem que o preconceito trave o conhecimento e criatividade.

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