Não sei se interpretei bem uma declaração que o nosso Presidente da República fez ontem na Colômbia, numa cimeira empresarial ibero-americano.
Reproduzo o que li no jornal: "ninguém ganha eleições com apostas na educação", "ninguém ganha eleições com educação, ganha-se com emprego, com situação económica, com a segurança".
A jornalista que escreveu a notícia refere ter notado um tom de lamento nestas palavras. É possível que sim, pois qualquer pessoa com discernimento percebe que à educação escolar deixou de ser atribuído "valor em si mesma" e também valor na formação dos alunos, no sentido de os tornar representantes da humanidade. E isso não pode deixar de se de lamentar.
Os sistemas educativos estão reféns de exigências globais de ordem económico-financeira e de empregabilidade, às quais devem responder directa e imediatamente, tendo isso de se ver a curto prazo e de modo muito concreto. Por outro lado, os modelos sociais a que as crianças e os jovens têm acesso são esses e não outros.
Noto também o facto de o Presidente da República ter feito este comentário num encontro de chefes de estado sobre empreendedorismo. O contexto parece-me apropriado: é preciso que os políticos, os empreendedores e a sociedade, de modo geral, percebam que a função da escola, sobretudo no ensino básico, é ajudar a formar pessoas. O empreendedorismo é importante, mas vem depois da escola... ou ainda nela, mas em níveis avançadas e/ou especializados.
Precisamos de repensar a função da escola, de nos concentrarmos no que lhe é específico e que mais nenhuma outra instituição assegura. Precisamos de ver a educação que ela proporciona com altruísmo.
Subscrever:
Enviar feedback (Atom)
FÁBULA BEM DISPOSTA
Se uma vez um rei bateu na mãe, pra ficar com um terreno chamado, depois, Portugal, que mal tem que um russo teimoso tenha queimado o te...
-
Usa-se muitas vezes a expressão «argumento de autoridade» como sinónimo de «mau argumento de autoridade». Todavia, nem todos os argumentos d...
-
Meu texto num dos últimos JL: Lembro-me bem do dia 8 de Março de 2018. Chegou-me logo de manhã a notícia do falecimento do físico Stephen ...
-
Por Eugénio Lisboa Texto antes publicado na Revista LER, Primavera de 2023 Dizia o grande dramaturgo irlandês, George Bernard Shaw, que ning...
5 comentários:
Dou comigo a pensar que a realidade já ultrapassou, há muito, os modelos sociais, económicos, políticos, ideológicos, religiosos, científicos...que continuamos a defender, mas que, como paradigmas falidos, nada mais têm para nos proporcionar do que a vista do abismo.
Os nossos sistemas de inteligência (num sentido muito amplo) estão acoplados aos nossos sistemas de interesses, de tal modo que, dificilmente, a nossa visão das coisas não é "toldada" pelo nosso interesse (determinado pelas variáveis envolventes).
Por exemplo, recuando há cerca de 200 anos, ninguém "profetizaria", na euforia das revoluções, que o capitalismo encontraria os seus limites mais decisivos, não no seu princípio de incentivo à iniciativa e ao empreendedorismo, mas na necessidade de travar os efeitos demolidores das atividades humanas focadas nos lucros, uma vez que estes são cegos, surdos, mudos e têm como "racionalidade" o poder (razão necessária e suficiente).
Ora, o que há 200 anos parecia ser uma estratégia promissora, num planeta ainda intacto, imenso e "inesgotável", também ditava uma visão das políticas...educativas, em consonância.
A palavra de ordem era "explorar, desbravar, esventrar, transformar, romper barreiras, construir, industrializar, dinamizar, mecanizar, consumir...".
Nem por um momento se pensava que tudo isso era o princípio de um momento efémero, de um ápice, e o mais autodestrutivo da história.
Não havia religião, ideologia ou ciência que se apercebessem de que o mundo iniciara uma aventura perigosa; pelo contrário, até das pobrezas, das explorações humanas e das guerras, se extraía um otimismo reinante, sob os auspícios e a suprema legitimação dos ganhos materiais (que se justificavam a si mesmos).
Não é de estranhar que, nesse "clima", não houvesse contemplações para com miseráveis e até os poetas e os bardos infelizes, que expressavam angústias de músicos perturbados por ruídos cada vez mais insuportáveis, não passavam de uns acidentes...
Aliás, para os sentimentos "negativos" e angústias "inexplicáveis" havia terapêutica médica e, como prevenção, a educação.
Bem, abreviando, não é apenas o sistema de educação que tem de ser repensado. O mundo já não é o que era e os paradigmas em que se baseou a atividade humana que nos conduziu até aqui, já mostraram os perigos em que nos colocaram. A própria ideia de empreendedorismo tem um significado diferente do que teria há 100 anos.
Os Estados não vão permitir mais que os grandes interesses coletivos sobre o ambiente, os solos aráveis, a vida dos oceanos, os recursos naturais, em geral, a educação, a saúde e a justiça, fiquem nas mãos de indivíduos que têm como único critério de ação a obtenção do máximo proveito pecuniário.
No tocante à ciência, não vejo mal nenhum em que os Estados a deixem por conta dos interesses privados, desde que não se coloquem em situação de dependência e de subserviência relativamente a esses interesses.
"Os Estados não vão permitir mais que os grandes interesses coletivos sobre o ambiente, os solos aráveis, a vida dos oceanos, os recursos naturais, em geral, a educação, a saúde e a justiça, fiquem nas mãos de indivíduos que têm como único critério de ação a obtenção do máximo proveito pecuniário."
Está a falar a sério?
Tenho a perceção de que, pelo menos ao nível do discurso, nomeadamente económico e político, existe um reconhecimento da gravidade dos problemas derivados dos modelos da industrialização e do capitalismo financeiro e que mudanças de rota são imperativas como condição de esperança nos Estados enquanto organizações políticas dos povos.
Deus o ouça.
santa ingenuidade. meu querido Pérez Reverte : hay que decir más alto que la naturaleza humana se sobrepone siempre :)
os estados são governados por homens , homens que chegaram a esses cargos porque são ávidos de poder e vendem-se a quem der mais.
mesmo , mas mesmo sério , que acredita no que diz Carlos Soares ? não devia confundir desejos com realidade :)
Enviar um comentário