quinta-feira, 21 de maio de 2015

Salvatore Quasimodo: Raio de Luz entre Trevas



1-E É DE SÚBITO NOITE

Cada um está só sobre o coração da terra
Apunhalado por um raio de sol:

e é de súbito noite.
 

 
2-REFÚGIO DE PÁSSAROS NOTURNOS

 No espaço sideral está um pinheiro torcido;
está concentrado e escuta o abismo,

com o tronco dobrado como uma fera.


Refúgio de aves noturnas,
na hora mais tardia ressoa

um  batimento veloz de asas.


Tem então um só ninho o meu peito
Pairando no negror, uma voz;

E está também concentrado na noite.

3-GARÇA
 
No pântano cálido, estatelada nos limos
E adorada por insetos, flagela-me ver

uma garça morta.


Eu devoro-me na luz e no zumbido;
Vencido por ecos pestilentos,

De vez em quando geme um arquejo
esquecido.


Piedade, que eu não seja
Sem vozes e olhares

na memória, um dia.


4-NO SENTIDO DA MORTE

Árvores cerúleas
De onde parte o som mais melífluo

E saboreia, imaturo, as chuvas novas.


Em uma cabeça, dócil
A luz oscila /

Ao enlaçar-se com o ar; //


no sentido da morte, /
Estou aqui com receio do amor.

2 comentários:

Quasi disse...

A noite não é súbita.

Espreguiça-se matinal e rubra
vaga de estrelas pelo soalho
Faz torradas e café para acordar do sonho
Deita na sombra da banheira sais de terra em flor
Veste o espelho e lava o hálito da embaciez dos dias
Faz festas ao gato noturno e sai seja para onde for

Diz bom dia a quem passa, até à morta garça
Trabalha porque ainda não anoiteceu
Repete as horas nas horas repetidas
Todo o dia, o dia imenso
Antes do bréu

Primeiro entardece
Desce o véu sobre o olhar e arrefece
Leva os meninos pela mão para longe
Para fora do crescer do tempo
A ver se a escuridão que há de vir os esquece

E eu brinco a enrolar a trança
da minha abismal janela cósmica
Apagam-se as horas em moribunda dança
Anjos sem asas demonstram o mostrador
Abrem em cada ausência os ancestrais selos
E eu deixo que a noite suba
Pelos meus longos cabelos

FMC

Lineu disse...

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