sábado, 20 de julho de 2013

Ah, não vi!....

Há cerca de uns 13 anos, o Banco Comercial Português, hoje Millenniumbcp, entendeu fazer um aumento de capital por emissão de acções. Os gestores de conta telefonaram aos seus clientes com linhas de crédito especiais para quem quisesse comprar as acções e o banco chegou mesmo a mandar uma carta junto com o extracto informado os clientes disso mesmo.

Qual o problema? Os bancos aumentam capital para poderem emprestar mais dinheiro. Emprestar dinheiro para o cliente entrar no capital do banco é um truque, porque o cliente não tinha esse dinheiro, esse dinheiro veio do próprio banco, ou melhor dos depositantes.  É pedir emprestado ao banco para comprar o banco. Se o cliente der as acções como colateral, como aconteceu no caso BCP, então a coisa passa do ilícito para o ridículo.  Como o dinheiro sai do banco e volta a entrar com soma nula, mas o capital é aumentado, esse montante pode ser multiplicado por 12.5 em termos de autorização para ceder novo crédito.

Outro truque, bem conhecido por envolver figuras importantes do regime, prende-se com o fingir que se está a entrar no capital quando, no fundo, se está apenas a depositar lá dinheiro. O banco vende as suas acções a alguém com o compromisso de as recomprar por um montante pré estabelecido. Obviamente, o dinheiro não está a ser investido, está a ser depositado sem risco. O caso aconteceu no BPN, como sobejamente noticiado.

Em ambos os casos, o Banco de Portugal a quem cabe a fiscalização deste tipo de irregularidades apareceu anos depois a dizer que não viu. O governador da altura até chegou a meter a culpa nas auditoras, com alguma infelicidade porque  estas tinham expresso a sua preocupação durante anos sem que o regulador ligasse nenhuma. O caso do BPN chega a ser caricato por alegadamente envolver um alto funcionário do BdP, hoje presidente da republica.

Porquê trazer este problema nesta altura? Porque o fenómeno se está a repetir. Um accionista entrou no capital dos bancos para lhe pedir emprestado mais dinheiro. E entrou com o compromisso de tirar de lá o dinheiro, uma combinação dos dois truques. Esse accionista é o estado português. Que, curiosamente, tem a esmagadora maioria do capital de outro banco, que procedeu recentemente a um aumento de capital e que,  segundo informações que tive, tinha os comerciais a venderem linhas de credito aos clientes para comprarem as suas próprias acções....

Alguma coisa destas foi escondida? Não, este post também não. Por isso, estou curioso para ver que desculpa vai ser dada desta vez.

6 comentários:

ruialme disse...

A propósito, uma fábula de Ambrose Bierce (1842-191?):

«O GENRO ELEGÍVEL

Uma Pessoa Verdadeiramente Esperta, que geria uma Caixa de Poupança e emprestava dinheiro às irmãs, às primas e às tias, foi abordada por um Maltrapilho que lhe pediu um empréstimo de cem mil dólares.
- Que garantias me dá? — perguntou a Pessoa Verdadeiramente Esperta.
— As melhores que pode haver — respondeu o candidato em tom confidencial. — Estou prestes a tornar-me seu genro.
- Isso seria ouro sobre azul - disse o banqueiro, solenemente. - Mas com que direito reclama a mão da minha filha?
— Com um que não se pode negar sem pensar duas vezes — respondeu o Maltrapilho. - Em breve valerei cem mil dólares.
Sem conseguir detectar um ponto fraco neste esquema de vantagens mútuas, o Financeiro entregou uma ordem de pagamento ao Promotor Disfarçado e escreveu um bilhete à mulher avisando-a que não contasse mais com a rapariga.»

(de 'Esopo emendado & outras fábulas fantásticas', trad. de Fernando Gonçalves, Antígona - Editores Refractários, 1996)

Cláudia da Silva Tomazi disse...

Focardes denota o capitalismo sem ética. Educativo as escondidas jovem João?!

Até breve!

maria disse...

não me diga que não tem praí um modelo matemático com n variáveis que explique e preveja esse comportamento de desenrasque e passa culpas dos agentes económicos :)

João Pires da Cruz disse...

:) Ainda fazem dele primeiro-ministro... :)

João Pires da Cruz disse...

?

João Pires da Cruz disse...

Eu sou contra as limitações de capital, não por uma questão de opinião, mas porque estudei o problema. Mas as regras, a existirem têm que ser iguais para todos. E, neste caso, há quem seja pago para ter resultados e quem seja pago para controlar. Quem é que acha que está a cumprir aquilo para que é pago?

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