domingo, 14 de abril de 2013

"Reviravolta" no ensino das clássicas?

Boris Johnson, como presidente da câmara de Londres tem incentivado 
ensino da cultura e línguas clássicas nas escolas básica (Photo: TELEGRAPH)
Diversos países europeus e americanos por reconhecerem a importância do ensino das línguas e culturas clássicas têm conseguido mantê-las no currículo escolar, mesmo quando todos ventos "pseudo-pedagógicos" sopram a desfavor.

Esses ventos. como é sabido, orientam a aprendizagem predominantemente para a aquisição de competências práticas, concretas, com sentido e utilidade "no" e "para" o quotidiano dos alunos. Isto, diz-se, como resposta a necessidades de integração social e laboral, de promoção da "igualdade de oportunidades".

Ora, é por demais evidente que a aprendizagem de conteúdos da Antiguidade não responde directamente a estes requisitos, ou não responde da maneira como se espera que responda, logo terá de cair na categoria de irrelevante. Ou pior, associando-se-lhe um carácter abstracto e erudito, recaíndo sobre ela a suspeita de desrespeito pela origem étnica dos sujeitos e pelo seu contexto vivencial mais imediato.

Resistindo a esse discurso fortemente ideológico, vários são os países ocidentais em que, quando o Estado se demitiu de assegurar o ensino clássico, autarquias, escolas (sobretudo privadas) e associações diversas tomaram a dianteira.

Um exemplo digno de registo é Inglaterra, onde nos últimos anos muitas escolas básicas, num esforço para aumentar a qualidade da aprendizagem, passaram a proporcionar latim e grego antigo aos seus alunos e isto desde os sete anos de idade.

Pretende-se agora que, a partir de 2014, todas essas escolas tenham o ensino de línguas, e entre elas estão essas duas. Isto com a intenção de se conseguir uma base em gramática, sintaxe e vocabulário capaz de apoiar os processos de compreensão dos alunos.

É justo que se diga que esta "reviravolta" no ensino clássico deve muito à sociedade que, nas pessoas de autarcas, directores de escolas, professores, pais... que têm resistido à tendência de terraplanagem de áreas curriculares fundamentais, legitimada pelos mais altos responsáveis pela educação.

Maria Helena Damião e Alexandra Azevedo

Texto escrito a partir de dois artigos de Graeme Paton, editor de educação do The Telegraph, datados de 
Março de 2010 e de Novembro de 2012, que podem consultar-se aqui e aqui.

6 comentários:

José Batista disse...

Pois, e a orientação da «aprendizagem predominantemente para a aquisição de competências práticas, concretas, com sentido e utilidade "no" e "para" o quotidiano dos alunos, (...) como resposta a necessidades de integração social e laboral, de promoção da "igualdade de oportunidades"» traduz-se, afinal no impedimento de aprendizagens mais profundas e abrangentes e, infelizmente, por um acentuar das desigualdades. É assim como se aos mais pobres só restasse uma espécie de "ler (o mínimo e mal), não saber escrever nem fazer cálculos elementares e sujeitar-se às tarefas ou profissões mais mal remuneradas da sociedade". É, no fundo, condenar os (mais) pobres à pobreza definitiva e promover neles uma espécie de conformismo com essa situação.
Nada como manter as pessoas na escuridão da ignorância para as poder manipular e enganar melhor.
Ora, a escola é a negação da escola se o consente.

perhaps disse...

A Escola Pública começou por ser uma escola para os pobres. Com finalidades de alfabetização e aprendizagens mínimas, aprender a ler e escrever, contar e aplicar com sucesso as quatro operações. Temo que, como no artigo é subentendido, voltemos a esse tempo rudimentar com a desculpa de que terão os alunos de realizar aprendizagens viradas para o lado concreto e prático da vida: o sentido do utilitário sempre me arrepia. Até nos automóveis os utilitários são demasiado reduzidos. Mas educar é formar e informar. Nada tem de reduzido ou redutível. Ou truncamos, decepamos, aleijamos. E sai educação com defeito - e isso, paga o próprio e cada um que com ele convive. Ou seja, todos influenciamos o tecido social. Ninguém é inóquo.


Tanto se fala na educação para os valores...Porém, tudo está já nos clássicos. O latim e o grego ensinam-nos como nenhuma outra língua por serem as nossas matrizes culturais. Não faz sentido que não existam professores capazes de os ensinar, que se subvalorizem as "línguas mortas". Porque também cada um de nós nada seria sem os seus mortos. Alíás, o resultado do utilitarismo educacional está aí, à vista de todos. E não é bom.

A Escola Pública está em involução. Em vez de se reinventar, regressa. Mas não há regressos. Porque a escola que volta não é a do começo. O que quero dizer é que é atrozmente pior a cisão que hoje se cava entre quem é esclarecido e quem o não é.

Como referido no comentário anterior, a ignorância permite por ser cega, consente porque não sabe, deixa pisar porque é subserviente, quer conforto por não saber perguntar e a inquietude não lhe ser hábito, tão difícil lhe é a vida quotidiana.

Por isso, bem hajam os clássicos e quem os defende.

Cláudia da Silva Tomazi disse...

Validar-se-á argumentos relativos a questão.

Jorge Teixeira disse...

Em Portugal não só se acabou com o Latim e o Grego como se adopta uma aberração como o AO90 para acabar com o Português. E ainda se pensa que isto é o progresso.

Helena Damião disse...

Estimado Leitor Jorge Teixeira
Quase que se acabou com o Latim e com o Grego... mas ainda há escolas, muito poucas, que conseguiram constituir uma, duas pequenas turmas.
E há professores que resistem. A Professora Alexandra Azevedo que assina o texto comigo, é um exemplo. Sem qualquer contrapartida, concebeu o programa "pari passu" (de que temos dado conta neste blogue) que está a ser usado em diversas escolas do país ao abrigo da Oferta Curricular de Escola.
Cordialmente,
MHD

Anónimo disse...

Por mim, retornaria tudo ao Ratio Studiorum da pedagogia jesuíta. Obediência e disciplina. Filosofia, Lógica, Letras, Retórica e Teologia antes de tudo, o resto depois.

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