“Tudo deve ser discutido. Sobre isso não há discussão possível” (Pitigrilli, 1893-1975).
Noticiou o “Diário de Coimbra” realizar-se amanhã um debate tendo como temática “A Praxe Académica hoje e ontem”.Num meu post, aqui publicado, no passado dia 7 deste mês, intitulado “A Universidade de Coimbra e a Praxe Académica”, comecei por chamar a atenção para o desrespeito que o uso da capa e batina tem sido sujeito. Escrevi aí:
“Apenas é de lamentar o aspecto descuidado – mesmo para além das festividades da ‘Queima das Fitas’, em que o álcool tolda as mentes e, muitas vezes, transfigura os comportamentos habituais – com que grande número dos utilizadores da capa e batina, que deviam cuidar pela dignidade de ser estudante universitário (e actualmente do ensino politécnico), se apresentam em público. Os rapazes, apenas de calças e colete pretos e camisa branca de mangas arregaçadas e as raparigas de saia e colete pretos e camisa branca como se a democratização do ensino fosse razão de desculpa ou o clima quente da bacia do Mondego sem alteração climatérica desde o tempo em que as trupes zelavam pela utilização a rigor da capa e batina. Ou seja, das duas uma: ou os estudantes vestem o traje académico como a praxe impõe ou usam uma vestimenta que não tenha a pretensão de identificar quem não merece ser identificado como estudante da velha e tradicional academia coimbrã."
Sobre o abaixo-assinado, da iniciativa de docentes da Faculdade de Letras desta cidade, e subscrito, posteriormente, por 120 docentes da Universidade de Coimbra, a apresentar na Reitoria da Universidade de Coimbra, embora compreendendo os motivos que lhes subjazem, entendi, na altura em que foi posto a circular, ser uma medida a não ser tomada em sentido amplo. E apresentei a seguintes razões (ibid.):
“Quanto às praxes, fora do raio de acção das faculdades, corre-se o risco de se estar a criar uma espécie de estado de emergência, retirando, com isso, autoridade e poderes ao Conselho de Veteranos, com mandato para o efeito, que já tomou, no caso em discussão, medidas contra praxes verdadeiramente bárbaras e sádicas que chegam ao seu conhecimento decretando a interrupção de todas elas até ao apuramento de quaisquer responsabilidades, sem o recurso a cargas policiais de triste memória. Mas, por outro lado, também, sem tratar os praxistas como miúdos de calções ou meninas de laçarotes nas tranças do cabelo a quem os professores puxam as orelhas ou dão açoites para evitar diabruras. Acresce ser tarde demais para apelar ao sábio princípio de Albert Einstein, já por mim citado outras vezes: “É fundamental que o estudante adquira uma compreensão e uma percepção nítida dos valores”. Agora, em citação de um aforisma popular (“é de pequenino que se torce o pepino”), esses valores deveriam ter sido inculcados desde os primeiros anos dos bancos de escola”.
Na supracitada notícia do “Diário de Coimbra”, ficou-se a saber que o “Dux Veteranorum”, defende que a praxe académica exige“civismo, educação e uma postura de cavalheiros”. Não se trata apenas de palavras de ocasião não secundadas por acções como prova o facto da garantia por si dada de “na próxima semana ter conclusões sobre as agressões” secundando, desta forma, o Reitor da Universidade de Coimbra ao considerar “inaceitável qualquer tipo de violência”.
As conclusões a saírem do debate de amanhã, “A praxe Académica hoje e ontem”, com a ampla participação de todas as entidades académicas preocupadas com uma solução que dê por finda praxes violentas (algumas delas, saindo do respectivo âmbito para caírem na alçada dos próprios tribunais), pela certa, serão desapaixonadas tendo em atenção um passado de praxe não violenta e em que a participação, no Cortejo da Queima das Fitas, dos antigos estudantes formados (na acepção plena da palavra) pela Universidade de Coimbra chega a ser comovente a saudade que brilha nos seus olhos e o verdor dos anos da juventude a correr-lhes novamente pelas veias como se o tempo tivesse parado desde a sua despedida das margens do Mondego em que Coimbra tem mais encanto, no dizer da canção.
Por se não se perspectivar folguedos de crianças mas um actividade académica multissecular de adultos responsáveis entendo dever ser respeitada a auto-regulação da praxe académica entregue aos próprios estudantes representados pelo “Dux Veteranorum”.
Uma vez que Aristóteles defendeu que “a pior forma de desigualdade é tentar fazer de duas coisas diferentes iguais”, surge, agora, mais do que nunca, o problema das actividades extracurriculares congéneres do Ensino Politécnico de Coimbra. Não seria a altura deste subsistema do ensino superior criar uma tradição própria, sem ser uma espécie de clone da Universidade de Coimbra, adoptando, pelo contrário, uma identidade e regulamentos próprios que o responsabilizem numa terra de ninguém em que não há qualquer implicação de medidas sancionadoras que regem a praxe académica da Universidade de Coimbra?
Sei ser este um tema polémico, mas, como li algures, ”quem não luta não escreve”. Idiossincrasia minha? É possível, mas estou demasiado velho (mesmo em novo não o fiz nunca) para pôr no prato da balança das conveniências os prós e os contras e, em atitude cómoda, remeter-me ao silêncio para não ter discordância de quem de mim possa vir a desavençar porque, como escreveu François Le Rochefoucald,“só achamos que as outras pessoas têm bom senso quando são da nossa opinião”.
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