sábado, 23 de agosto de 2008

Debates quentes

Lomborg apresenta algumas ideias sensatas sobre o aquecimento global e o que devemos fazer quanto a isso aqui, Yohe discorda aqui, mas não me convenceu.

13 comentários:

susskind disse...

Desiderio, a essencia da argumentacao do Lomborg (segundo li e ouvi em varias ocasioes) e' que o aquecimento global e' um problema mas nao e' o unico, e' um problema entre muitos. Dai' conclui que se deve investir mais esforcos e recursos escassos a resolver outros problemas em vez do aquecimento global.

Aquilo que e' de ficar perplexo nesta linha de argumentacao e' o seguinte: por que motivo o Lomborg seleccionou de entre varios e complicados obstaculos a resolver esses problemas (por exemplo,a erradicacao da malaria) precisamente os esforcos para minorar e inverter os efeitos antropogenicos sobre o clima. Nunca ouvi ninguem interroga'-lo neste sentido! E' simplesmente inverosimel que o que impede, o principal obstaculo que afecta a luta contra a malaria e a pobreza sejam os esforcos para minorar os efeitos antropogenicos sobre o clima, diminuir as emissoes desnecessarias de gases de efeito de estufa, aumentar a eficiencia dos processos industriais, dos automoveis, enfim investir em investigacao em melhor tecnologia. E e' uma pergunta obvia (se bem que fora do 'framework' que lhe interessa apresentar publicamente). O activismo do Lomborg 'cheira mal' por todos os lados ...

susskind disse...

Alem do mais, argumentar que actualmente os efeitos globais do aqueciemnto global sao positivos significa que ele esta' a fazer um averaging sobre os efeitos em todos os ecossistemas no globo terrestre.

Simplesmente, isto nao e' aceitavel porque ninguem (ou quase ninguem -- talvez o Tyler Brule seja a excepcao) vive no 'campo medio' do planeta. Ha' quem se lixe e muito pelos desiquilibrios produzidos em certos ecossistemas. Uma etica minimamente razoavel nao pode aceitar que existam uns sacrificados para eventualmente (e se formos rigorosos, esses benificios medios sao muito limitadaos e de curta duracao, segundo os proprios modelos) para aumentar o PIB mundial. Se assim nao for, bom, entao tambem podiamos comecar a fazer planos para proceder a deslocamentos macicos de populacoes como fez o imperio sovietico e, em geral, muitos regimes totalitarios ... por motivos eminentemente racionais dentro do contexto de certos modelos economicos (modelos contingentes, porque nao existem universais ... ainda nao se descobriu a lei da gravitacao universal economica, julgo ... )

Desidério Murcho disse...

Não conheço os outros trabalhos de Lomborg, mas neste artigo os argumentos dele não são esses que refere. E parecem-me plausíveis: que é preferível investir fortemente na procura de energias alternativas, reforçando o investimento nessa investigação, investimento que tem vindo a diminuir desde os anos 80. Como ele argumenta, a ideia de baixar as emissões de CO2 é quimérica porque só os países desenvolvidos vão fazer isso, os outros países não terão qualquer incentivo para o fazer nem terão energias baratas alternativas que possam usar para se desenvolver. Assim, é nítido que este tipo de solução “verde” é na realidade pior para os países menos desenvolvidos, a médio prazo. Não vi no artigo dele qualquer referência a transferências maciças da população. Mas eu penso que o Miguel toca num aspecto central que torna este debate idiota: o ideal “verde” de um mundo sem “capitalismo”. Depois do fracasso do regime totalitário Russo, os novos comunistas pintaram-se de verde e continuam basicamente a estar dispostos a todos os sacrifícios para conseguir os seus fins pretensamente elevados. Mas como ficou bem nítido no seu comentário, estes fins são absurdos: você acusa Lomborg de um defeito capital, que é querer elevar a riqueza do mundo. Pois é. Se formos todos pobrezinhos é melhor, claro, porque com isso destrói-se o “capitalismo”. Como se viver no mundo feudal fosse melhor do que viver na França ou Inglaterra do séc. XXI, ou como se viver na Rússia comunista fosse melhor do que qualquer das duas coisas.

susskind disse...

"você acusa Lomborg de um defeito capital, que é querer elevar a riqueza do mundo"

Nao. O que eu nao aceito e' que a variavel para aferir a distribuicao de riqueza seja a MEDIA da distribuicao. A media pode subir enquanto a distribuicao se torna mais e mais assimetrica .... e gente que, por forca da accao irresponsavel de agentes mais poderosos (capitalistas, ou nao, existem para todos os gostos) veem a sua vida destruida. Qual sera' o efeito de longo prazo da destruicao sistematica da Amazonia, as perspectivas desse cenario nao sao muito animadoras... E' que nem e' plausivel que a riqueza aumente nesse cenario! ...

Por outro lado, a Europa vive num regime de liberdade politica e economica, com bons niveis de vida, e simultaneamente tem emissoes per capita muito mais baixas do que os EUA. Isto demonstra que existem boas margens para a diminuicao das emissoes.

E o problema nao acaba aqui: as reservas fosseis tornam-se mais escassas, estao em zonas instaveis do globo, as lutas para o seu controle dao origem a regimes tenebrosos e nos temos grandes responsabilidades por isso. E nao vale a pena invocar o espantalho 'capitalismo' e 'anti-capitalista' porque todos os regimes participam neste novo Grande Jogo.

Desidério Murcho disse...

Mas, Miguel, nada do que diz põe em causa o que disse o chato do Lomborg! Ele apenas defende que se deve procurar energias alternativas baratas, precisamente para que os países menos ricos as possam usar. E para se fazer isso não se pode gastar recursos diminuindo as emissões de CO2 já. Este argumento parece-me razoável e é totalmente imune ao que o Miguel disse.

susskind disse...

"E para se fazer isso não se pode gastar recursos diminuindo as emissões de CO2 já."


Esse e' um dos pontos fracos da argumentacao dele, ele nao demonstrou que uma coisa exclui a outra. Ate' que se produza uma demonstracao convincente de que nao e' possivel dminuir as emissoes de gases de efeitos de estufa se se quer procurar energias alternativas, eu nao levo o argumento a serio. Se isso fosse demonstrado, de seguida poderiamos avaliar os pros e os contras de cada uma das opcoes.

Desiderio, voce leva mesmo esse argumento a serio? Nao existem outros recursos que sao desperdicados de forma irresponsavel que poderiam ser canalizados para ambas as coisas?

Desidério Murcho disse...

Pela leitura do artigo, levo muito a sério a hipótese de que a diminuição das emissões poderia ser pior porque iria diminuir o crescimento económico; diminuindo este, teríamos menos recursos para investigar energias alternativas. Isto parece-me perfeitamente plausível. Sobretudo, fiquei também impressionado com a ideia de que há hoje menos investimento na investigação em energias alternativas do que nos anos 80.

Evidentemente, não fiz as contas nem conheço os dados em que se apoia Lomborg. Se os dados são reais e as contas estão certas, Lomborg tem um argumento muitíssimo plausível.

Um abrandamento do ritmo de crescimento económico faz-se logo sentir em cortes substanciais na investigação fundamental, pois é mais fácil cortar aí do que em hospitais ou escolas. E cortar aí pode ser muito má ideia, a médio prazo.

Jorge Oliveira disse...

A principal estratégia da humanidade no domínio da energia deve incidir na I&D de tecnologias de armazenamento da mesma.

O recurso aos combustíveis fósseis, actualmente a principal fonte primária de energia, em todo o mundo, não pode manter-se indefinidamente. Por uma razão prosaica: os combustíveis fósseis têm os dias contados. Mais tarde ou mais cedo acabam. E antes disso a sua extracção do subsolo torna-se demasiado dispendiosa.

As limitações ao uso de combustíveis fósseis, por razões que tenham a ver com as emissões de dióxido de carbono, não passam de uma infantilidade, para dizer o mínimo.

Por um lado porque o dióxido de carbono não é nenhum gás venenoso e os efeitos maléficos que os alarmistas climáticos lhe atribuem estão longe de ser provados.

Por outro lado porque nenhum país do mundo, por mais piedosas que sejam as declarações dos seus dirigentes, deixará de recorrer aos combustíveis fósseis.

Faria mais sentido invocar a Termodinâmica para dizer que a conversão do calor em trabalho tem um rendimento muito baixo, pelo que a obtenção de energia através da queima de coisas, sejam os combustíveis fósseis ou mesmo a putativamente renovável biomassa, será a pior forma de alcançar o objectivo.

Ora, sem os combustíveis fósseis o que nos resta? Felizmente, ainda há muitas outras fontes primárias de energia, mas não se justifica fazer aqui o inventário. Uma coisa é certa: todas elas acabarão por ser utilizadas para produzir energia eléctrica, a forma de energia mais versátil, aquela que revela maior facilidade de transformação noutra qualquer forma de energia. Os motores de combustão interna dos nossos automóveis e camiões não tardam a ser substituídos por motores eléctricos.

A energia eléctrica “só” tem um inconveniente. Não sendo armazenável, a sua utilização exige a conversão, no momento do consumo, de uma outra forma de energia, desejavelmente fácil de armazenar. Aqui está o busílis da questão.

A energia proveniente do Sol é aquela que nos oferece melhores perspectivas. E, em última análise, as derradeiras. Mas temos muita sorte. A quantidade de energia que nos chega do Sol é perfeitamente avassaladora, é de borla e promete durar ainda muitos milhões de anos sem variações apreciáveis. Para se ter uma ideia, a energia radiada pelo Sol, que é intersectada pela Terra durante uma simples hora, tem um valor equivalente a toda a energia actualmente utilizada pela humanidade durante um ano. Há que saber tirar partido de tão colossal quantidade de energia mas, sobretudo, há que saber armazená-la de forma a garantir um abastecimento regular e controlado, os atributos indispensáveis de qualquer sistema energético que se preze.

Conclui-se, portanto, que o armazenamento é o problema fulcral da energia a utilizar pelo Homem. Hoje e ainda mais no futuro, pelo que seria este aspecto que deveria merecer a nossa melhor atenção e não as fantasias dos alarmistas do aquecimento global.

Fernando Dias disse...

Desidério,

A ingenuidade pode estar na crença de que a investigação fundamental tal como existe é que vai salvar a catástrofe. Foi a investigação fundamental do actual paradigma que se armadilhou a si própria. O paradigma esgota-se quando a actual investigação já não é capaz de corrigir os problemas que ela própria gerou. Esse é um problema intríseco dos sistemas finitos.

Face a estes novos desafios, não podemos deixar de nos sentir fracos. Só uma mutação na educação e formação poderá inverter a escalada auto-destruidora da investigação fundamental do paradigma que está, e não continuar a apostar nela. A actual investigação fundamental, fragmentada em disciplinas demasiado especializadas, ainda assenta numa visão do mundo que recorta, divide e reduz a realidade. Esta ideologia cientificista que ainda se impõe mundialmente, em nome de referências científicas com ‘técnica’ ultrapassada, acabou por perder o pé.

Isto que digo são meras convicções. Nada de certezas, nada de verdades. Fantasias e utopias há muitas. Podemos evoluir utilizando e armazenando de outra forma a energia solar. Mas não acredito que se evolua para uma boa solução sem uma simultânea mutação na nossa forma de viver e de conceber o mundo. E isso não acontece sem que primeiro a humanidade passe por catástrofes sérias auto-geradas e de várias ordens. Parece que foi isso que sempre aconteceu aqui e acolá neste planeta, pelo menos de há uns dez mil anos para cá, mas não tenho a certeza.

atribodofutebol disse...

Fiz em Junho uma entrevista ao Lomborg para a "Única" do "Expresso que talvez valha a pena recordar. Tem que ser assim, em cache, que de outra forma não estou a conseguir

http://64.233.169.104/search?q=cache:0L2DwFfeBeoJ:aeiou.semanal.expresso.pt/interior/default.asp%3Fedition%3D1860%26articleid%3DES294262+%22o+aquecimento+global+n%C3%A3o+%C3%A9+o+fim+do+mundo%22&hl=pt-PT&ct=clnk&cd=10&gl=pt

susskind disse...

"Mas não acredito que se evolua para uma boa solução sem uma simultânea mutação na nossa forma de viver e de conceber o mundo. E isso não acontece sem que primeiro a humanidade passe por catástrofes sérias auto-geradas e de várias ordens."

Este ponto do F. Dias e' muito pertinente.

E' de notar que a funcao social do debate prpopagado pelos 'mainstream media' (e que o Lomborg, entre outros, cumpre na perfeicao) e' o de restringir o debate a meras questoes tacticas de curto alcance , que preservam todo o sistema politico-economico tal como existe hoje, e desviar as atencoes de um verdadeiro debate estrategico de natureza civilizacional.

Uma abordagem ao problema deveria por um lado procurar pequenos passos realistas que possam diminuir os efeitos antropogenicos no clima e nos ecossistemas com eficiencia crescente ao longo do tempo,e por outro numa reflexao a longo prazo acerca do que significa viver numa sociedade avancada tecnologicamente, com liberdades politicas, economicas e sociais, e que fosse secularmente sustentavel do ponto de vista ecologico e ambiental. Estes objectivos sao certamente possiveis de atingir, mas nao baseados num sistema em que o desenvolvimento esta' baseado no recurso crescente a combustiveis fosseis finitos e cada vez mais escassos, cujo acesso esta' cada vez mais dependente de gigantescos recursos militares, ...

Quantas guerras nao serao inevitaveis nas proximas decadas para o controlo dos commbustiveis fosseis? ... a invasao do Iraque e' so' o principio, a situacao catastrofica em Darfur, a escassez de agua em Israel e na Palestina e o estado dos colonatos e dos palestinianos sao apenas um pequeno cheirinho do que se estara' porventura a preparar para um futuro proximo ... e pode-nos bater 'a porta mais cedo do que pensamos...

lino disse...

Já tinha "investigado" o Lomborg, desde que ele apareceu a dar uns bitaites no Jornal de Negócios, e não me convenceu. Embora o meu negócio tenha a ver com números, não consegui aferir se os do Lomborg estavam certos. Mas ele baseou-se nos dados do Yohe que veio, no artigo que o Desidério diz que não o convenceu, dizer que os dados tinham sido mal interpretados. Afinal, quem tem mais credibilidade: o autor do estudo ou aquele que o interpretou erroneamente, talvez para puxar a brasa à sua sardinha? A propósito: sabem que as grandes seguradoras e resseguradoras mundiais estão seriamente preoupadas com o aquecimento global? É que estas empresas não costumam preocupar-se a sério sem fortes razões.

José M. Sousa disse...

Nem mais, subscrevo o comentário do Lino. O Lomborg é um expert em "memória selectiva" como diz o próprio Yohe.

Continuo espantado com a importância que se dá a alguém como o Lomborg que fala sem conhecimento, lançando para o ar ideias aparentemente sensatas, mas que não resistem a uma análise mais aturada. Quando ele diz que se devia combater a malária e investir no fornecimento de água potável, e não em combater o aquecimento global como se fossem áreas mutuamente exclusivas e não relacionadas, demonstra a sua ignorância e/ou má fé!
Sugiro a leitura de "Seis Graus" http://futureatrisk.blogspot.com/2008/02/seis-graus-o-nosso-futuro-num-planeta.html

Em relação às consequências económicas globais, refiro apenas o impacto (que se começa a detectar já hoje!) do derretimento dos glaciares de montanha sobre a agricultura e o abasteciemnto de água quer na América Latina e do Norte, Ásia, Europa e mesmo África, sim África.
Os da Ásia terão um impacto tremendo em países como a China, ìndia, Paquistão e Bangladesh.
Alguém sério considera mesmo que a Europa pode viver tranquila com países como os citados a sofrerem os impactos destas crises.
A solução ou, enfim, tentativa de solução (se ainda formos a tempo) para muitos destes problemas não pode basear-se em esquemas mentais tradicionais (nomeadamente os económicos). No caso das tecnologias limpas, por exemplo, o que está em jogo é demasiado importante para os detentores estarem preocupados com as "royalties": essas tecnologias têm que ser cedidas gratuitamente e o mais rapidamente possível aos países que necessitam delas e o seu custo ser assumido colectivamente, caso contrário as consequências do AQ serão assumidas colectivamente quer queiramos quer não, num grau infinitamente pior!

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