Por A. Galopim de Carvalho
As diferentes paisagens da Terra, em qualquer momento da sua história, foram e são, em grande parte, reflexo das características meteorológicas aí prevalecentes. Esta afirmação é evidente para a generalidade dos cidadãos que, embora nunca tenham formulado esta conjectura, têm-na por adquirida. Sem saírem deste nosso rectângulo, no ocidente da Europa, todos relacionam os campos verdejantes do Minho com a maior pluviosidade anual ali verificada (2000 a 2400 mm) e as terras de sequeiro do sudeste alentejano com os menores valores dessa mesma precipitação atmosférica.
À escala mundial, a televisão mostra-nos constantemente imagens dos múltiplos visuais do nosso planeta marcadas pelo clima, sejam, por exemplo, a floresta equatorial da Amazónia, os glaciares do sul da Argentina, a pradaria norte-americana ou a estepe siberiana, a tundra boreal ou as areias escaldantes do Saara. Embora na explicação da paisagem, haja que ter em conta o enquadramento geológico regional, com destaque para a natureza das rochas (granito, xisto, calcário, etc.) que lhes servem de substrato e da respectiva estrutura (modo de ocorrência dos corpos rochosos: homogéneos, estratificados, dobrados falhados, etc.), a influência do clima é muito superior.
Face a esta realidade desenvolveu-se um capítulo, comum à geologia e à geografia, conhecido por “geomorfologia climática”, com o estabelecimento de domínios ou regiões morfoclimáticas. “Faça sol ou faça chuva” é uma expressão vulgar de alusão ao estado do tempo, informação que diariamente nos chega através dos boletins meteorológicos, transmitidos pela televisão, pela rádio e pelos jornais. O estado do tempo, num dado lugar, é uma manifestação de uma realidade mais vasta, própria e à escala do nosso planeta, a que chamamos clima.
Em termos muito simples, entende-se por clima um conjunto de fenómenos próprios da atmosfera, na interactividade que estabelece com os oceanos (e os lagos de maiores extensões) e com as terras emersas, nas quais a latitude, a altitude, a interioridade e a cobertura vegetal têm papel mais visível. Temperatura, humidade do ar e pressão atmosférica são factores de clima assegurados pela energia radiante do Sol. Relacionados entre si, são os responsáveis pelas situações de tempo quente ou frio, de tempo chuvoso ou de neve ou, pelo contrário, de tempo seco. São ainda responsáveis pela existência de vento, não raras vezes catastrófico, tal a intensidade que chega a atingir. O clima condiciona a alteração superficial (meteorização) das rochas, a génese e evolução dos solos, a erosão e transporte (evacuação) dos materiais erodidos (os sedimentos que estão na génese de muitas rochas sedimentares), bem como a ocupação vegetal e animal, incluindo a humana.
A paisagem é um sistema dinâmico, só aparentemente estático. É como um simples fotograma de um filme, escreveu Don L. Eicher, em 1970. Processos geodinâmicos internos à escala global, com destaque para as translacções continentais e os enrugamentos orogénicos, ocasionaram mudanças de latitude e de altitude e subsequentes modificações climáticas que, por sua vez, determinaram mudanças na paisagem. " Na Terra só há alteração das rochas, formação de solos e erosão, (três aspectos modificadores do relevo e, portanto, da paisagem), porque há energia solar e porque temos uma atmosfera e uma hidrosfera, duas entidades susceptíveis de captar essa energia e de a transformar no dinamismo necessário aos processos geológicos ocorrentes à superfície e, também, aos biológicos. As massas de ar diferentemente aquecidas pelo calor solar dão origem à circulação atmosférica, processo que se traduz na existência do vento.
Nas baixas latitudes, nomeadamente nas regiões intertropicais, a incidência dos raios solares aproxima-se e atinge a perpendicular (o Sol está a pique, como vulgarmente se diz), aquecendo o ar mais do que nas latitudes das regiões polares. Nestas, a incidência desses raios é muito oblíqua e, até, rasante, pelo que a temperatura do ar é aí muito mais baixa. Esta diferença de aquecimento faz com que o ar quente suba e o ar frio desça, sendo essa uma das causas da circulação atmosférica (outra causa é da própria rotação do planeta). Por outro lado, a evaporação da água à superfície dos mares, rios e lagos e a resultante da transpiração da cobertura vegetal (uma realidade bem visível nas grandes florestas equatoriais, quentes e húmidas) fornece humidade suficiente para formar nuvens que o vento transporta e descarrega como chuva ou neve, consoante as temperaturas locais. É, sobretudo, a esfericidade do globo terrestre e a consequente variação da latitude que determinam a zonalidade climática de que toda a gente tem noção, ainda que sumária e empírica.
Foram areias deste tipo e vasas finas da mesma natureza que, uma vez litificadas, deram origem a muitos calcários, entre eles os do Jurássico das nossas Serras do Sicó, d’Aire e Candeeiros, bem como do barrocal algarvio, e testemunham o posicionamento tropical destas regiões nesses recuados tempos.
O nosso satélite, embora receba o mesmo tipo de energia, não dispõe destas duas entidades, pelo que não exibe qualquer actividade erosiva para além da resultante dos antiquíssimos impactes meteoríticos. Cessado o vulcanismo que aí existiu e diminuída a intensidade de quedas meteoríticas, as suas paisagens são praticamente as mesmas desde há mais de 3000 milhões de anos. Nas imagens, o Minho verdejante e o Alentejo a caminho da desertificação.
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