Novo poema de Eugénio Lisboa:
O MUNDO QUE O HOMEM CRIOU
Os sinais estão aí, por
todo o lado,
insinuam que o mundo
apodrece,
que está todo
despedaçado,
que, sem redenção,
sobreaquece.
Os rios e os mares
infectados,
os vírus desvairados,
assassinos,
as terras desertadas,
devastadas,
dilúvios afogando
peregrinos,
o mundo em completo
desconcerto
a vida cada vez mais
degradada,
a luta pela vida num
aperto,
a esperança de viver
desbaratada,
os hospitais cheios e
exauridos,
os cemitérios todos
esgotados,
os gritos das crianças
assustadas,
apagando-se em sítios esquecidos!
A lama, o sangue, o
pus, a merda toda
medalhas que sobraram
da vida que houve,
no meio de tudo isto, a
estuporada foda,
resto de vida, que
durar não soube!
Da música sublime que
se criara,
sobra, para acompanhar
a derrocada,
marcha fúnebre para a
ardida seara,
montanha de ruínas
assombrada.
Radiações que matam
devagar
e o frio que aos poucos
nos devora,
tudo eficaz arte de
matar,
dando-nos um final que
não demora.
A história do homem nesta
Terra,
feita de conflitos e
descobertas,
deu pra inventar
ciência e guerra
e, ao terror, ofertar
portas abertas.
O nosso mundo vai
chegar ao fim
e, desta nossa
construída glória,
finar-se-á, a um toque
de clarim,
história de que não
ficará memória.
Eugénio Lisboa
1 comentário:
Um poema inspirador. Um poema que é um toque de clarim.
Muitas batalhas foram perdidas porque o fragor dos ferros e dos gritos não permitiram que os combatentes ouvissem os toques da ordem.
Ficavam assim à mercê do inimigo, desorientados, em vez de fugirem, resistiam, mas sem rectaguarda, ou fugiam desordenadamente na direcção errada.
A comunicação, nas batalhas, sempre foi um dos pontos chave e mais difíceis de conseguir e de coordenar, sobretudo antigamente, em que os sinais sonoros para chegarem às tropas, não deviam confundir-se com os sinais do inimigo, perderem-se no espaço ou serem distorcidos pelo ruído produzido durante a batalha.
A comunicação é, se prestarmos alguma atenção ao problema, o calcanhar de Aquiles, da guerra como da paz.
A guerra é para especialistas, como a ciência é para especialistas, mas as técnicas e os combates são para todos. À ciência não pode ser imputada nenhuma responsabilidade. A pólvora não tem culpa de ser explosiva, nem as máquinas têm culpa de demolir, nem o fogo tem culpa de devorar e liquefazer tudo, até um certo ponto. Nenhuma droga, ou aeronave, podem ser responsabilizadas dos danos que causam. Assim como um cão ou um vulcão. Mas podemos sempre tentar metê-los a todos numa prisão. Só que, enquanto o homem continuar a existir, à solta, ou não, vai ser obrigado a lutar pela sobrevivência e isso tem de ser colectivo.
Infelizmente, a humanidade não tem sido muito bem-sucedida na tentativa de fazer o melhor. A natureza, incluindo a humana, é indócil e rebelde, para não dizer inábil, relativamente a uma bondade objectiva dos nossos actos construtivos, tantas vezes com imenso trabalho e sacrifício.
Afinal, temos andado a construir destruindo, ou a destruir construindo? Quanto das construções são destruições irreversíveis? E como remediar e evitar continuar?
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