domingo, 14 de julho de 2019

ABORDAGEM DIMENSIONAL DA HISTÓRIA

Novo artigo enviado por Nuno Pereira:

    O sistema educativo tem como escopo principal formar cidadãos autónomos, críticos e participativos, e não apenas produzir mão de obra de acordo com a lógica do mercado. A História desempenha papel central na construção da identidade e na formação da cidadania. A identidade nacional, reformulada em processo contínuo, cria consciência de pertença a um país e vínculos entre cada geração e as gerações anteriores. No caso singular português, constitui-se com base essencialmente na autonomia política e na continuidade territorial, de duração extraordinária. O conhecimento histórico incute a crença na possibilidade de mudança das condições em que se vive, ao permitir compreender não só a diferença entre a realidade atual e a pretérita, mas também que os direitos de que gozam hoje os cidadãos não foram mercês do poder estabelecido, mas conquistas ao longo do tempo.

    A História de Portugal (antecedida pela Geografia da Península Ibérica), no 2º ciclo do Ensino Básico, assume importância significativa para alunos cujo desenvolvimento cognitivo se encontra no estádio de transição entre o pensamento concreto e o pensamento formal. O conteúdo da disciplina já não se centra tanto nos acontecimentos político-militares das elites e dos heróis (como na História tradicional), mas ocupa-se também com as estruturas, as tendências, as mudanças da administração central e local, da sociedade, da economia e da cultura. Como é evidente, nas aulas, a cada passo estabelecem-se relações do passado com o presente e vice-versa, interpreta-se conforme o contexto de cada época e promove-se a ação investigativa.

    Todavia, segundo o programa vigente, os alunos partem para o estudo da história dum país de que pouco conhecem. De facto, nestas idades, possuem um conhecimento restrito ao seu quotidiano e ignoram bastante acerca do país e mesmo do local onde vivem, pelo que as comparações passado-presente e vice-versa são obviamente muito frágeis, embora ações com personagens em tempo e local remotos, por si sós, despertem interesse. Acresce ainda que é no fim do 6º ano de escolaridade que aparece o capítulo «Portugal Hoje», onde a turma praticamente não chega por falta de tempo, pelo que pode terminar o 2º ciclo sem ter ideia precisa do país real. Ora, torna-se mais natural conhecer primeiro «Portugal Hoje» para depois estudar o seu passado desde as origens até à atualidade.

    Além do mais, ao longo do 5º e do 6º ano, o devir histórico é apresentado como noções esparsas, difíceis de reter e de relacionar por falta de estruturação. Porém, para conhecer algo melhor há que em princípio examinar parte por parte. Assim, para ficar mais clara a história dum país pode-se seccionar em várias dimensões - política, militar, administrativa, social, económica e cultural – e depois integrá-las em blocos coesos de cada época e em sucessão ordenada.

    A análise dimensional (sincrónica e diacrónica) permite compreender de modo coerente e sistematizado (com menor perda de informações) a História de Portugal e aproveitar melhor o seu potencial transformador.
                               
                                                                 Nuno Pereira  (psiquiatra)

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