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Todas as mensagens vão no mesmo sentido: é preciso pôr as crianças e os jovens a ler, a andarem sempre com um bom livro atrás, a gostarem de ler os autores de renome... porque a leitura, qual "complexo vitamínico", faz bem a tudo quando se está a crescer: enriquece o vocabulário, ajuda a escrever bem, permite descobrir o mundo, ensina a raciocinar, e mais isto e mais aquilo...
Mas, é "sobejamente conhecida... a falta de interesse e gosto que os jovens manifestam pela leitura", diz-se na badana da minha edição popular da Asa, já com dez anos.
Adultos, incluindo professores e pais, muitos dos quais dispensam a leitura, preocupam-se com a rejeição, a aversão ao "mergulho" nessa actividade por parte daqueles que educam, e, assim sendo, não podem deixar de se atormentar: ao aluno, ao filho está destinado um futuro sombrio.
Seduzem, insistem, ameaçam, mas nada parece resultar... resta-lhes conviver com a culpa. E nesta época do ano é pior: as férias estão traçadas para serem um tempo de leitura; se os adultos esclarecidos não conseguem levar os miúdos a ler pelo menos um livro por semana, falharam!
Acontece que "o verbo ler não suporta o imperativo", volto a Pennac, naturalmente. Para atenuar essa culpa, talvez resulte ponderar em cada um dos dez “direitos inalienáveis do leitor” que ele redigiu e explicou com fina ironia e muito saber, no caso, de experiência feito, sobretudo como professor, mas também como pai.
1-O direito de não ler;
2-O direito de saltar páginas;
3-O direito de não acabar um livro;
4-O direito de reler;
5-O direito de ler não importa o quê;
6-O direito de amar os “heróis” dos romances;
7-O direito de ler não importa onde;
8-O direito de saltar de livro em livro;
9-O direito de ler em voz alta;
10-O direito de não falar do que se leu.
9 comentários:
Concordo com o senhor Daniel, cujo parece ser entendido. Nada é mais aborrecido que ser obrigado a ler. Será mesmo o caminho mais curto para não ler.
Julgava que as férias eram para descansar e só lia quem eventualmente sentisse - ou sinta - a leitura como descanso; dizem que há gente assim, que descansa lendo.
boas férias no modo que quadre a cada um
Muito bom
Liberdade
Ai que prazer
não cumprir um dever.
Ter um livro para ler
e não o fazer!
Ler é maçada,
estudar é nada.
O sol doira sem literatura.
O rio corre bem ou mal,
sem edição original.
E a brisa, essa, de tão naturalmente matinal
como tem tempo, não tem pressa...
Livros são papéis pintados com tinta.
Estudar é uma coisa em que está indistinta
A distinção entre nada e coisa nenhuma.
Quanto melhor é quando há bruma.
Esperar por D. Sebastião,
Quer venha ou não!
Grande é a poesia, a bondade e as danças...
Mas o melhor do mundo são as crianças,
Flores, música, o luar, e o sol que peca
Só quando, em vez de criar, seca.
E mais do que isto
É Jesus Cristo,
Que não sabia nada de finanças,
Nem consta que tivesse biblioteca...
Fernando Pessoa (1934)
Fé: "substância das cousas que se devem esperar, argumento das cousas que não aparecem." (S. Paulo)
Portanto, a existência é um intervalo na fé (tudo o que aparece não existe teologicamente - a teologia é um esforço de perceção do que não existe). Cristo não é real. Se o fosse, não seria esperado.
Ler é engano. Criar é secar.
Segundo Steiner, “Mais de oitenta porcento dos adolescentes americanos não sabem ler em silêncio; há sempre um pano de fundo de música, de volume maior ou menor. A intimidade, a solidão que permite um encontro em profundidade entre o texto e a sua recepção, entre a letra e o espírito, é hoje uma singularidade excêntrica, psicológica e socialmente suspeita. Inútil determo-nos sobre a derrocada do nosso ensino secundário, o seu desprezo pela aprendizagem clássica, pelo que se aprende de cor.”.
Infelizmente, entre nós, a situação não será muito diferente, mesmo entre os jovens que têm “sucesso educativo”, isto é, entre os que chegam ao ensino superior. Isto não é apenas um "palpite", pois muita da minha experiência pessoal aponta nesse sentido.
Deixo aqui o testemunho de uma situação que vivi há cerca de sete anos. Nessa altura acompanhei o meu filho, que ainda não tinha dezoito anos, à capital do distrito, para entrega da candidatura ao ensino superior. Falava-se em esperas de várias horas, pelo que me preveni levando o jornal diário, vício antigo, e um pequeno livro; o meu filho, como fazia sempre, levou o livro que andava a ler. Havia realmente muitas dezenas de pessoas à nossa frente, espalhadas pelo pátio da escola, pelo resolvemos, depois de tirar a senha de atendimento, instalar-nos numa sombra e mitigar o inconveniente do tempo de espera através da leitura. A forma como fomos olhados, particularmente ele, facto que atribuí também às características do livro que levara (preto, com uma lombada de mais de dez centímetros e em inglês), levou-me a reparar que éramos os únicos que aproveitávamos aquele tempo com a leitura. A conclusão a tirar só podia ser uma: se isto se passa com os jovens que conseguiram terminar o secundário e querem continuar os estudos, com os outros as coisas não são com certeza melhores...
"se isto se passa com os jovens que conseguiram terminar o secundário e querem continuar os estudos, com os outros as coisas não são com certeza melhores"
Nao sao melhores porque? Qual o motivo?
Caro "Anónimo"
Queria eu dizer que os outros, os que não conseguem concluir o 12º ano, mais facilmente se esquecem de levar um livro, ou mesmo uma simples folha de jornal, para, no mínimo, poderem, numa situação semelhante à que referi, proteger a moleirinha do sol. O que, digamos, não é saudável...
S. Paulo pode ser uma sumidade com a auréola, mas não se verificar o mesmo com definições acerca do que não aparece e nos parece a nós, mortais que usamos bonés e chapéus, ser indefinível.
E no entanto, burrice minha certamente, não retiro da frase dele que o que aparece não exista ou seja intervalo. Cristo foi pessoa. Tinha conta, peso e medida. Apareceu e existiu. A fé faz dele um deus, mas não pode negá-lo enquanto existência. Mesmo que a sua figura humana seja chamada de aparência. Ninguém é apenas o seu nome.
Sob um determinado ponto de vista, ler é engano. As palavras não são as coisas; por mais exíguas, as últimas diferem e suplantam o dizê-las. Diria antes que, para além dos princípios edificantes da leitura – que deixo para mentes mais doutas -, ler é viver uma segunda realidade esquecendo, se possível, a primeira. Pode mesmo constituir-se como substituto de alguma inépcia nos embates com as aparências que muito nos existem. Ou constituir apenas mudança de registo. Ser evasão do espírito. Interesse desinteressado.
“criar é secar”. Pode até ser verdade. Que nascemos para isso: secar. Criar há-de ser como no reino vegetal as plantas, cada ciclo aproxima-as do fim. E nesse sentido tudo que se faça nos leva a essa condição última.
Mas se afirma que criar nos seca por nos sentirmos incapazes de mais, não é assim que a realidade funciona. Os artistas, pintores, escultores, escritores, actores e etc, não os seca senão a morte. E mesmo a arte de viver, quem a possui tem-na a vida toda; a criatividade dá ao homem a vontade de continuar. Creio mesmo que é ela que cria o desejo. Sem o qual seríamos uma desistência.
Penso muita vez que em Portugal se aproveita mal o tempo de ler. Que na praia se lê pouco, no campo idem, nas esperas de consulta parecido, e etc.
Porém, numa candidatura ao ensino superior, que se segue a um período de estudo intenso, parece-me natural que os estudantes prefiram conversar, conhecer outros...
Mas é verdade que os jovens são impertinentes com quem tem um comportamento menos igual. E que um estudante que lê um livro com tais características não é vulgar. Conheço alguns que usam esse género de leitura e tenho a certeza que não levariam tais livros para uma candidatura.
Os hábitos familiares, como se vê, importam. Parabéns.
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