A pergunta anda no ar: quem é tão parvo que escolhe estudar Humanidades… História ou Filosofia por exemplo!? Ou, ainda pior, Clássicas!?
Sabe-se que não dá acesso a emprego, logo não se queixe quem, terminada a sua licenciatura, mestrado, doutoramento e/ou pós-doutoramento, se vir no desemprego… Opte por Engenharias. Há muitas à escolha…
Não, este não é um raciocínio de pessoas desavisadas mas de pessoas cultas que fazem opinião no país e que noutras matérias até se têm mostrado razoáveis. E, neste país, as mais das vezes exaltado mas substancialmente acrítico, a tendência para seguir ideias devastadoras é regra....
Desde que deixei aqui uma reflexão muito completa de José Pacheco Pereira, fiquei mais atenta ao assunto e, naturalmente, mais preocupada com a leitura do problema e suas consequências: o conhecimento que as universidades proporcionam tornado (apenas) instrumental; a negação de sentido às Humanidades, porque não podem ser usadas de imediato; a criação de expectativas de carreira muito provavelmente irrealistas para quem segue áreas tecnológicas... tudo isto, e mais do que isto, revela um estado muito frágil da cultura... Podemos ter subido nas estatísticas, no número de diplomados neste ou naquele patamar académico, mas tal não nos trouxe uma maior consciência da necessidade absoluta de mantermos vivas as diversas dimensões do conhecimento.
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12 comentários:
Boa tarde. Ao ler o seu texto não consegui perceber muito bem a sua opinião acerca do que introduz no primeiro parágrafo do seu texto. Há uma falta de diversidade, há. Isso é prejudicial, é.
Mas então do ponto de vista de um pai e de um aluno é suposto arriscar "por aquilo que se gosta" para chegar ao fim dos estudos e ter de trabalhar noutra coisa fora da área (que na maioria das vezes se detesta), com equivalência ao 12º ano?
Não é pedagógico os próprios alunos perceberem que há prós e contras nas suas escolhas e que estão inseridos numa sociedade em que o não ter trabalho (e dinheiro) é um grande contra?
Obrigado, boa tarde.
@Francisco Monteiro:
Creio que a autora está em desacordo com a ideia de que os cursos Humanísticos são uma opção inferior e insensata em comparação com os Tecnológicos. Pelo menos foi com essa ideia que fiquei após a leitura deste texto.
E, francamente, também partilho essa opinião. Compreendo que a preocupação em optar por um curso "com saída" e futuro é elevada, mas é preciso não nos esquecermos que um curso é para a vida. E de que serve, afinal, a vida se não for para a vivermos como queremos e a fazer algo de que se gosta? Ou vamos estar à espera do dia da reforma para finalmente começar a viver, todo o trabalho até então apenas um meio para acumular fortuna? Se isso é vida, então tenhamos medo...
Se os cursos Humanísticos e os outros são vistos desta forma, é porque essa foi a atmosfera que se criou. Se ninguém lhes der uma oportunidade, nada nunca irá mudar. E note-se que é perigosíssimo para a saúde de uma nação fomentarmos a tecnocracia mas deixar a cultura mal-nutrida. O que é um povo sem cultura? De que servem as máquinas e a Ciência se tudo o resto se for?
Quando se gosta mesmo, consegue-se algo. Pode não ser o ideal, mas não é impossível ter futuro numa área Humanística. É preciso é procurar mais e com mais atenção... e se o país não nos suporta, pois que nos façamos ao mundo, der por onde der, custe o que custar. Somos ou não somos cidadãos do mundo?
Será que a Helena também diria isto a quem escolhe estudar cursos de educação? Tenho sérias dúvidas... Existe uma desproporção imensa em vários sectores entre as profissões que são procuradas na nossa sociedade e aquelas em que os estudantes se escolhem formar, e a Helena sabe disso. Existem imensos Professores a mais do que o necessário, tal como pessoas formadas noutras áreas, e não vale a pena vir com o valor "não utilitarista" ou "não instrumental" ou "não imediato" dessas áreas.
Seria maravilhoso se todos tivéssemos um curso de educação ou humanidades, mas se assim fosse viveríamos todos na miséria. Mas, claro, esse seria um caso muito extremo. Assim, com esta desproporção intermédia em que estamos, vivemos um pouco mais pobres, especialmente aqueles que a Helena aconselha a que façam ouvidos moucos quando lhes dizem que não vão ter emprego...
Não sei o que diga...
Quando era novo fui aconselhado a seguir Engenharias. Era algo que daria um emprego certo. Fi-lo pois não tinha berço nem "amigos" que me proporcionassem ocupação que não fosse pelo mérito excelentíssimo (ao alcance de muito poucos onde não me incluo) ou pelas necessidades de mercado. O que me poderia esperar se fosse astrónomo?
O comum dos mortais tem de ser mais pragmático.
Lembro-me da beleza de uma flor de Feynman. Posso apreciá-la no seu todo e cada dia a vejo mais bela. Sei de ciências e engenharia mas aprecio, e leio, romances e outros livros, sejam eles clássicos ou não.
Não quero deslustrar as Humanísticas. Mas poderão estes, além da beleza dos clássicos e quejandos, vislumbrar aí a segunda lei da termodinâmica?
Quero absolutamente conhecer alguém com a sua substileza e dos pouoos que têm a graça e o alcance de saber o alcance da 2ª Lei. Talvez tenha sido meu aluno no iST.
Gostei de ler o texto e estou plenamente de acordo com ele.
Os comentários, na generalidade, baseiam-se em princípios, na minha óptica, errados. Confunde-se formação académica com formação profissional, ainda que, nalguns casos, possa haver coincidências; confunde-se o SABER com a aprendizagem de uma profissão; e intui-se que só os jovens em busca de profissionalização é que frequentam a academia.
A ideia de que só é válido, útil e necessário o conhecimento que dá emprego, é profundamente anti-democrática. Teremos de estudar todos Engenharia, ou Arquitectura, ou Medicina, isto é, seremos todos obrigados a estudar apenas aquilo que alguém entender que tem saídas profissionais, ou que alguém pretender venham a ser áreas prioritárias ou adequadas de formação? Não estaremos qualquer dia a moldar os estudantes como numa padaria: este ano só dá jeito uma fornada de enfermeiros, para o ano queremos tradutores, no próximo ano só precisamos de médicos...
O que é isto!?! Então eu não posso estudar Filosofia? Ou alguém que estude Filosofia é incompetente para exercer uma profissão que não exija níveis de especialização de conhecimentos como Medicina ou Física Nuclear? Deixa de se ensinar Línguas, Filosofia, História, Arte, Literatura, e passamos todos a ser meros executantes de actividades profissionais, com conhecimentos limitados exclusivamente à nossa área de actividade profissional, incapazes de PENSAR para lá da profissão? Grandes evoluções em muitas áreas (dificilmente na Física Quântica, eu sei) são feitas por pessoas que trazem conhecimentos disciplinares diferentes a cada uma das áreas profissionais, com novos olhares e novas perspectivas. Eu não posso ser Engenheira e querer estudar Literatura? Eu não posso estudar e aprender sobre o que eu quiser, mas apenas sobre aquilo que o Estado quiser que eu aprenda? O que estamos a fazer é a limitar drásticamente as áreas do conhecimento a que cada um pode aspirar. E, com isso, perde-se a maior parte da nossa cultura, entendendo-se cultura em sentido lato, como o conjunto do saber que fez a nossa civilização chegar onde chegou. Podemos deitar uma boa parte fora? Eu não consigo aceitar isso. O que não significa que os jovens não devam ser informados de que um curso superior não é (necessariamente) um curso profissional. Se apenas se pretende conhecimento profissional, tire-se um curso deformação profissional. A academia é (sempre foi e devia continuar a ser) muito mais do que isso!
Excelente conselho Doutora Helena Damião.
As engenharias não são mais do que a linha mais avançada da fileira do conhecimento. Antes delas e sustentando-as estão milénios de Scientia, começando pela Filosofia. Ser engenheiro é ser capaz de fazer omeletes. Mas nem por isso se aprende de onde vêm os ovos, qual a anatomia e fisiologia da galinha, a organização do galinheiro, a evolução da espécies e um sem-fim de conhecimentos que precedem a nobre, mas restritíssima arte, de fazer omeletes.
O que irá acontecer quando, daqui por uns tempos, toda a gente souber fazer muito bem omeletes sem nunca ter visto uma galinha?
Não sendo de Humanidades, considero que é essencial e determinante para a formação de qualquer pessoa uma sólida preparação académica em Humanidades antes de qualquer outra coisa. Depois disso, poderá vir o resto. Antes de mais é preciso ter "mundo". Depois poderão ir aprender um ofício, que é isso que fazem as engenharias - são escolas profissionais.
tudo muito bonito, mas..
Para alem da profissão conta a dimensão humana e pedagógica.
O problema é que as ditas humanidades atabalhoaram-se de tal forma que quem cursa exactas podem segui-las se quiser mas quem se formou em humanidades quase não consegue mudar de ramo, nem quer na maior parte das vezes.
A formação deveria ser de modos a que a pessoa se torna-se útil a si mesma, o problema é que as humanidades são giras, mas não pro activas, o caso da termodinâmica é um deles, ou a simples leis da gravidade, cujo desconhecimento afecta a maior parte dos doutores humanísticos..
não são úteis não porque não dão emprego mas porque cristalizaram um conhecimento do qual nada mais extraem o que já foi extraído, pararam no tempo e raras são as excepções..
Excelente comentário. A meu ver a principal origem desta ideia de que só os cursos "profissionais" é que têm valor vem de um povo com restrita cultura e que sempre deu maior importância aos sectores primário e secundário.
É preciso compreender que os cursos que consideram de valor não existiriam sequer sem aqueles que chamam de cursos inúteis. E é preciso também compreender que a Academia existe como núcleo de troca e criação de conhecimento, não como uma Escola Profissional.
Tal como disse acima Isabel Soares, se se pretende um curso de formação meramente profissional, pois que se tire exactamente isso. Nem todos os cursos o são, nem têm de o ser. Felizmente o conhecimento distribui-se em inúmeras áreas de igual importância. O que é realmente triste é as pessoas não compreenderem esse ponto - que todas as áreas são importantes, de uma maneira ou de outra. Talvez se compreendessem, as saídas profissionais não estariam tão desiguais.
Não são pró-activas? Não são úteis? Então mas o ser humano vive de quê, do trabalho meramente? Sabia que sem qualquer tipo de input artístico o ser humano daria em doido e acabaria com diversos distúrbios psicológicos?
Imagine-se viver o resto da sua vida sem música, sem artes visuais, sem cinema, sem séries de televisão, sem livros, etc. Tudo isso é arte. A Literatura também está aí incluída. Ou acha que a escrita não tem valor?
E sabia que sem as ciências humanísticas grande parte da medicina do foro psicológico estaria tão atrasada que andaríamos todos a ser tratados com técnicas primitivas e de pura tortura em asilos para qualquer problema que pudesse surgir?
Lá porque não encontra os resultados que estes cursos trazem - talvez porque não os procura, ou não os procura bem - não quer dizer que eles não existam. Lá porque desconhece a real Ciência das Humanísticas não quer dizer que ela não esteja lá. Antes de se deitar abaixo algo, convém reflectir e informar-se sobre exactamente o que é que se está a subestimar.
Imagine a nossa sociedade sem estas ciências que diz estarem estagnadas e que não são úteis ou pró-activas, se conseguir. Provavelmente vai pensar nelas de uma forma diferente.
Ainda assim, concordo que não é dada a devida importância a estas áreas e, como tal, as saídas profissionais sofrem bastante. Mas isso não é porque as áreas não têm valor, mas sim porque são menosprezadas. Não confundamos as coisas.
Caro Anónimo,
Se não servirem para mais nada, pelo menos as Humanidades servem para que as pessoas cultas não confundam o Presente do Indicativo com o Pretérito Imperfeito do Conjuntivo. Entendeu??
(Se não houver quem ensine a ler e a escrever a um engenheiro, como poderá ele engenhar?)
Sabe o que faz algumas pessoas dizerem coisas tão absurdas como as que acabo de ler nestes comentários? A falta de Cultura, que só é fornecida pelas Humanidades e pela Investigação Fundamental!
Já que muito se fala aqui da termodinâmica, seria bom que recordassem quem foram e que formação de base tinham os pais da álgebra, da geometria e da física...
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