“Para ensinar há uma formalidade a cumprir, saber” (Eça de Queiroz, 1845-1900).
Escreveu Carl Gustav Jung: “Sou eu próprio uma questão colocada ao mundo e devo fornecer a minha resposta; caso contrário estarei reduzido à resposta que o mundo me der.” Julgo ter sido esta uma razão que levou Ana Benavente, antiga secretária de Estado da Educação de um governo socialista, feroz adversária do exame de acesso à carreira docente e pertinaz defensora da capacidade de as escolas superiores de educação ministrarem cursos de docência para além do 2.º ciclo do básico, a formular a Nuno Crato, recém-empossado ministro da Educação, a seguinte pergunta: “Tem afirmado publicamente a sua concepção de uma Escola centrada em três pilares: Exames (muitos), que servirão para avaliar alunos e professores, conteúdos disciplinares estritos e prova de entrada na profissão docente. Como garante que tais orientações trarão melhores aprendizagens para todos os jovens face aos desafios do mundo actual?” ("Público", 26/06/2011).
Num país em que “a mediocridade é a lei “ (António Lobo Antunes), vem esta polémica à baila porque é preciso atenuar os efeitos perversos do acesso à docência baseado na nota de diploma de formatura, sem ter em conta a forma aleatória de que ela se reveste para os respectivos candidatos, com origem universitária ou politécnica, em escolas de desigual exigência no que respeita aos diplomas outorgados. Remar contra a maré tem os seus custos, pois, como escreveu Herculano, a polémica é da própria condição humana: “Das definições possíveis do homem, uma só é verdadeiras: “o homem é o animal que disputa”.
Causa sempre frisson, em muito boas almas, a necessidade de uma prova de ingresso ao ensino não superior, no esquecimento de que, como li algures, quem não mede não se preocupa com as coisas. Sobre esta questão (como aliás em muitas outras) diria, como Cesar Cantu: “não mudei de sentimentos conforme as ocasiões e não namorei a popularidade, renegando a própria consciência”.
Como o leitor já deve ter reparado, é meu hábito recorrer a adágios. Ora, como nos ensina a voz do povo, “palavras leva-as o vento”, mas, em contrapartida, o que está escrito, escrito fica. Desta forma, com o aval documental constante de um acervo de posts publicados neste blogue, faço uma síntese cronológica de uns tantos excertos de prosa minha sobre este tema com a convicção de que discutir ideias é a melhor forma de estar ao serviço da democracia. Assim:
1. “A formação dos futuros professores deixa muito a desejar. Segundo notícia do “Expresso” (9.Fev.2008), intitulado “Erros nas universidades”, 'os alunos mais responsáveis da Faculdade de Letras de Lisboa queixam-se de que os “maus tratos do Português chegam ao corredor da universidade. Temos colegas que dizem ‘púzio’ (em vez de ‘pu-lo’(…). ‘Fizestes’, ou ‘dizestes’, em vez de ‘disseste’ ou’ fizeste’, ‘derivado a…’ ou ‘ténhamos’ são mais alguns exemplos do que os estudantes escutam a toda a hora”'. Se é assim que falam, difícil não me parece descortinar erros de palmatória no que concerne a textos seus manuscritos numa sociedade em que os correctores de texto dos computadores “escrevem” pelo autor.(…) Saudosos tempos nos separam da época de ouro de Eça que referindo-se, salvo erro, a Pinheiro Chagas, o retratou como 'um homem simples sem ambições excepto saber e tendo como único receio o erro”' No entanto, o testemunho dado pelos actuais alunos da Faculdade de Letras fazem renascer a esperança numa juventude capaz de si criticar a si própria, verdadeiro oásis num deserto cultural generalizado. Embora comungue da opinião de que há um limite em que a tolerância deixa de ser uma virtude, hesitei, mesmo assim, em escrever este texto com respaldo em prosa queirosiana: ‘Achais estas páginas cruéis? Pensais que não nos dói tanto escrevê-las como vos dói lê-las?’” (“O Acesso à Carreira docente”, "De Rerum Natura", 15/02/2008).
(CONTINUA)
Escreveu Carl Gustav Jung: “Sou eu próprio uma questão colocada ao mundo e devo fornecer a minha resposta; caso contrário estarei reduzido à resposta que o mundo me der.” Julgo ter sido esta uma razão que levou Ana Benavente, antiga secretária de Estado da Educação de um governo socialista, feroz adversária do exame de acesso à carreira docente e pertinaz defensora da capacidade de as escolas superiores de educação ministrarem cursos de docência para além do 2.º ciclo do básico, a formular a Nuno Crato, recém-empossado ministro da Educação, a seguinte pergunta: “Tem afirmado publicamente a sua concepção de uma Escola centrada em três pilares: Exames (muitos), que servirão para avaliar alunos e professores, conteúdos disciplinares estritos e prova de entrada na profissão docente. Como garante que tais orientações trarão melhores aprendizagens para todos os jovens face aos desafios do mundo actual?” ("Público", 26/06/2011).
Num país em que “a mediocridade é a lei “ (António Lobo Antunes), vem esta polémica à baila porque é preciso atenuar os efeitos perversos do acesso à docência baseado na nota de diploma de formatura, sem ter em conta a forma aleatória de que ela se reveste para os respectivos candidatos, com origem universitária ou politécnica, em escolas de desigual exigência no que respeita aos diplomas outorgados. Remar contra a maré tem os seus custos, pois, como escreveu Herculano, a polémica é da própria condição humana: “Das definições possíveis do homem, uma só é verdadeiras: “o homem é o animal que disputa”.
Causa sempre frisson, em muito boas almas, a necessidade de uma prova de ingresso ao ensino não superior, no esquecimento de que, como li algures, quem não mede não se preocupa com as coisas. Sobre esta questão (como aliás em muitas outras) diria, como Cesar Cantu: “não mudei de sentimentos conforme as ocasiões e não namorei a popularidade, renegando a própria consciência”.
Como o leitor já deve ter reparado, é meu hábito recorrer a adágios. Ora, como nos ensina a voz do povo, “palavras leva-as o vento”, mas, em contrapartida, o que está escrito, escrito fica. Desta forma, com o aval documental constante de um acervo de posts publicados neste blogue, faço uma síntese cronológica de uns tantos excertos de prosa minha sobre este tema com a convicção de que discutir ideias é a melhor forma de estar ao serviço da democracia. Assim:
1. “A formação dos futuros professores deixa muito a desejar. Segundo notícia do “Expresso” (9.Fev.2008), intitulado “Erros nas universidades”, 'os alunos mais responsáveis da Faculdade de Letras de Lisboa queixam-se de que os “maus tratos do Português chegam ao corredor da universidade. Temos colegas que dizem ‘púzio’ (em vez de ‘pu-lo’(…). ‘Fizestes’, ou ‘dizestes’, em vez de ‘disseste’ ou’ fizeste’, ‘derivado a…’ ou ‘ténhamos’ são mais alguns exemplos do que os estudantes escutam a toda a hora”'. Se é assim que falam, difícil não me parece descortinar erros de palmatória no que concerne a textos seus manuscritos numa sociedade em que os correctores de texto dos computadores “escrevem” pelo autor.(…) Saudosos tempos nos separam da época de ouro de Eça que referindo-se, salvo erro, a Pinheiro Chagas, o retratou como 'um homem simples sem ambições excepto saber e tendo como único receio o erro”' No entanto, o testemunho dado pelos actuais alunos da Faculdade de Letras fazem renascer a esperança numa juventude capaz de si criticar a si própria, verdadeiro oásis num deserto cultural generalizado. Embora comungue da opinião de que há um limite em que a tolerância deixa de ser uma virtude, hesitei, mesmo assim, em escrever este texto com respaldo em prosa queirosiana: ‘Achais estas páginas cruéis? Pensais que não nos dói tanto escrevê-las como vos dói lê-las?’” (“O Acesso à Carreira docente”, "De Rerum Natura", 15/02/2008).
(CONTINUA)
4 comentários:
Uma pergunta como aquela só podia vir de Ana Benavente.
Ela devia saber que não há forma de garantir que qualquer conjunto de orientações trará "melhores aprendizagens para todos os jovens face aos desafios do mundo actual"
Nunca todos os jovens, sublinho o "todos", obterão boas aprendizagens com qualquer método de ensino (será melhor dizer aprendizagem?...), inventado ou por inventar. Ou, pelo menos, não o podemos garantir, nem demonstrar...
A não ser que se peça tal feito a Ana Benavente...
Mas, em minha opinião, melhor faria ela em interrogar-se sobre os prejuízos que ela mesma, ou a sua acção, causou ao ensino. E aí temos a demonstração, quer dizer, a realidade.
Que ainda agora sofremos.
m escrever este texto com respaldo em prosa queirosiana
o continua encheu-me de temor
seguir-se-ão catadupas de palavras?
assi con grosas e glosas de respaldos
o espírito santo tornará puras essas palavras e libertará essas frases dos seus erros
Comentário (29 Junho: 21:19): Como disse Voltaire, “todos os géneros de leitura são bons, excepto os aborrecidos”. Ora, dificilmente se pode ter como aborrecida a prosa de Eça a não ser por aqueles que se deliciam com leituras que nada ensinam e, muito menos, inspiram.
Daí, o eu ter dificuldade em compreender o temor aflorado neste seu comentário. Ainda se se desse o caso, mas não dá, da população escolar destes tempos de facilitismo cultural estar afogada em citações de autores da nossa literatura que tão esquecidos andam, a repetição dessas citações, de uma pena brilhante como a de Eça, poder-se-ia tornar numa espécie de lavagem ao cérebro tão do agrado de certas almas . Mas acredita mesmo que as frases por mim citadas precisam de ser libertadas pelo espírito santo ou por espíritos malignos que criticam por criticar? Aqui, sim, não há respaldo que nos valha!
Finalmente, a discussão sobre o sistema educativo nacional, embora sujeita a diversas opiniões e salutares discordâncias, deve despertar um verdadeiro interesse que se não preocupe com borbulhas numa carne prestes a decompor-se. Enfim, idiossincrasias!
Apesar de tudo, ou por causa disto tudo, o seu comentário teve o mérito de procurar uma ponte que esclarecesse melhor o meu post e justicasse a sua discordância para com ele. Obrigado, portanto!
O discernimento da causa liberta do erro. "Discernir"
Apontar com criatividade por analogias, quer sejam prosas exemplos para um objetivo concreto.
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