sexta-feira, 26 de junho de 2009

"Porque é que a educação é um problema difícil?"

Quanto se muda alguma coisa no sistema de ensino, quando acontece um incidente numa escola, quando há exames nacionais ou internacionais, quando um responsável pelas políticas educativas se pronuncia publicamente acerca das mesmas, muitas pessoas interrogam-se cerca dos princípios pedagógicos que norteiam a educação, da cientificidade das decisões que se tomam, dos resultados que se obtêm em termos de aprendizagem.
Neste final de ano lectivo têm sido retomadas interrogações antigas, sem que se vislumbre, mais um vez, uma convergência de respostas.

Pensando no assunto, lembrei-me do pedagogo espanhol J. Quintana Cabanas que, a abrir o livro Eduquemos mejor: guia para padres y profesores, já aqui apresentado, põe a seguinte pergunta: "Porque é que a educação é um problema difícil?"

A sua opinião é a seguinte:
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“A dificuldade para chegar a fórmula correcta da boa educação é uma experiência quotidiana, e distintos níveis: em casa, é frequente o pai e a mãe não encontrarem um acordo sobre a aplicação de certas sanções aos filhos ou de os pôr um não num colégio religioso; na escola, nem todos os professores compartilham o mesmo ideário educativo; esses professores queixam-se habitualmente de que os princípios educativos que consideram convenientes não são os mesmos que orientam muitas famílias; esses mesmos professores às vezes julgam inoportunas ou nefastas certas directrizes introduzidas no sistema educativo; e como se tudo isto não bastasse, ao nível teórico defendem o que outros condenam; e isto é uma dialéctica histórica que se assemelha à dos filósofos, sucedendo-se umas doutrinas a outras, mesmo as mais inverosímeis, parecendo impossível chegar à “verdade objectiva”, à norma da boa educação.

O problema está não só na determinação dos fins, mas também dos meios. O dogma evidente que uns consideram, é criticado e negado por outros que consideram o dogma contrário. Por exemplo, no começo do século XX, Durkheim apresentava como princípio da educação a necessidade de que o educando se adaptasse às normas sociais (entre elas as de trabalho), dizendo que a sociedade deveria obrigá-lo, sendo que a escola – a agência desta «socialização» – devia contar com a «autoridade» do professor, o qual poderia recorrer a castigos para tal. Porém, nessa mesma época, o movimento da Escola Nova surgia com grande força, e os seus mentores (Bovet, Montessori e Decroly) proclamavam o princípio da espontaneidade e da liberdade da criança como condição para que esta pudesse «autodesenvolver-se» de forma perfeita e segura. Um par de décadas depois, a Pedagogia marxista de Rússia soviética (…) voltavam às propostas pedagógicas de Durkheim, acentuando-as. E, simultaneamente, a escola de Summerhill no Reino Unido, proclamava que as crianças e os adolescentes não devem trabalhar nem estudar de maneira forçada, mas de interpretar e seguir os seus impulsos num ambiente de liberdade e não de doutrinamento que os resguarde de qualquer repressão pessoal.

Como se vê, o desconcerto teórico em educação não pode ser maior. É-o, e compreende-se, a nível ideológico (…) mas é-o também a nível técnico e científico, sendo aqui um pouco mais estranho, dado que a Ciência distingue-se da Filosofia pela sua aspiração a formular teses previamente comprovadas, objectivas e seguras. Ora bem, como a Pedagogia se apoia nas Ciências Humanas (Psicologia, Sociologia, Antropologia, estas têm também os seus problemas gnoseológicos e metodológicos, que se projectam na Pedagogia; e assim não é estranho que a teoria da aprendizagem humana soçobre nos seus pressupostos e afirmações e que, por conseguinte, a Didáctica se perca em modelos explicativos e teorias da comunicação, a Organização Escolar divague em observações e experiências para determinar o currículo escolar mais eficaz, e os sistemas educativos dos vários países introduzam umas inovações que, a posteriori, defraudem as esperanças que se haviam posto neles.

Percebemos que a educação anda à deriva num mar de problemas. Toda ela é um problema. De vez em quando aparece um profeta da educação, com ar de messias que anuncia a salvação. Mas, logo de seguida surge a dúvida e o desencanto. Normalmente a causa disto é a sua teoria da educação ser «unilateral», quer dizer, basear-se num princípio educacional que, sendo acertado e verdadeiro, descuida outro ou outros princípios (também verdadeiros) que se lhe opõem.”

Quem continuar a leitura do livro de Quintana Cabanas percebe que o caminho que ele sugere àqueles que trabalham nas Ciências da Educação não é nem a negação deste “mar de problemas”, nem a desvalorização do conhecimento científico e filosófico, nem a desistência do pensamento racional e da investigação. É, exactamente, o contrário.

Referência:
Quintana Cabanas, J. M. (2007). Eduquemos mejor: guia para padres y profesores. Madrid: Editorial CCS.

3 comentários:

joão boaventura disse...

O que Quintana consagra está correcto mas as valências que refere equivalem à preocupação em consagrar o alcatrão e o cimento, em detrimento das coisas humanas.

Isto a propósito de o núcleo fundamental, o aluno, ou a criança, que tem um ritmo de vida, estar subordinado a, e dependente de, dois ritmos, o da escola e o dos pais. Sendo estes dominantes, o do aluno fica obliterado, ou alterado, sem o rendimento escolar que os instrumentos pedagógicos tentam salvar. Não sendo possível conjugar o horário de trabalho dos pais com o horário escolar, o aluno fica dependente do horário do pai ou do horário dos transportes colectivos. É um mal que não pode ser corrigido, mas que interfere no ritmo de vida e no ritmo biológico do aluno.

Sabido que o rendimento escolar é menor até aos dez anos de idade, na parte da tarde, ocorrendo o contrário com os de idade superior, o Ministério salta por cima dos ritmos biológicos das crianças, e deseja a todo o transe mantê-las num semi-internato, de manhã até final da tarde, não na convicção de que o rendimento escolar vai aumentar, mas como forma de cativar o apoio das famílias às suas intransigentes regulações, como se dissesse:

- Eu faço a vontade aos pais, de ter os meninos encurralados o dia todo, mas os pais têm que estar coniventes com as minhas medidas espartanas reguladoras do ensino, para domesticar e dominar os professores e os alunos.

Os pais acabaram por se tornarem cúmplices da humilhação dos professores por parte do Ministério, e criaram a revolta dos filhos que agrediram a Ministra numa das visitas a uma escola.

Com esta cumplicidade, os pais são os primeiros a prejudicar o ritmo biológico dos filhos, não só com a sobrecarga de disciplinas como com a sobrecarga de horas. Isto é, tornam os pais felizes e despreocupados, e os filhos infelizes.

Conclusão: a logorreia e a política estão em primeiro lugar, e a criança… a criança... essa será celebrada no Dia Internacional da Criança. Uma vez por ano, só se pensa nela.
Não chega.

Fartinho da Silva disse...

O problema essencial é colocar a ideologia à frente do pragmatismo. Enquanto não percebermos todos que a escola é um local de conhecimento e cultura, o professor é aquele que estuda e ensinar, o aluno estuda e aprende e o encarregado de educação é o responsável pela educação dos seus filhos, não vamos a rigorosamente sítio nenhum e continuaremos TODOS a empobrecer rumo a ABISMO!

Enquanto TODOS nós não levarmos o APERTÃO que aí vem e com grande violência, continuaremos a chutar para baixo do tapete os problemas evidentes de VIOLÊNCIA e INDISCIPLINA que grassa nas nossas escolas graças ao "eduquês" e aos "cientistas" e "especialistas" da educação!

Depois do APERTÃO, que passará pelos nossos salários e até pela própria noção de Estado Social, talvez percebamos de uma vez por todas que o que foi feito na escola pública nos últimos 20 anos é uma VERGONHA e que este projecto nos condenou a empobrecer durante pelo menos outros tantos anos (é só fazer meia dúzia de contas)!

Sei perfeitamente que muitos dos leitores deste blog vão afirmar que estou a exagerar, no entanto se perguntarem a qualquer economista sério vos dirá EXACTAMENTE a mesma coisa...!

A produtividade (que não é o número de horas que se trabalham por dia e muito menos o número de dias que se trabalham por ano) só aumentará com uma população que tenha VERDADEIROS conhecimentos e com isso VERDADEIRAS competências!

Por enquanto, vamos assobiando para o lado e vamos achando piada ao facto de os jovens trabalhadores com a escolaridade mínima obrigatória serem, normalmente, incapazes de perceberem um texto com mais de quatro parágrafos ou de serem incapazes de realizarem operações aritméticas simples sem recorrerem à máquina resgitadora, mas quando sentirmos no bolso este problema, julgo que as coisas passarão a ser bem diferentes...

Anónimo disse...

Educação e ecopedagogia,

A ecopedagogia fundada na consciência de que pertencemos a uma única comunidade da vida, desenvolve a solidariedade e a cidadania planetária, associando direitos humanos e direitos planetários.

Madalena Madeira

O corpo e a mente

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