Novo post de Rui Baptista sobre a luta dos professores (na imagem um dos cartazes divulgados por professores descontentes):
“Insanidade: fazer as mesmas coisas repetidamente esperando resultados diferentes” (Albert Einstein)
A luta dos professores encontra-se contextualizada num ataque cerrado e num lavar de culpas entre o Ministério da Educação e a Plataforma Sindical. Ou melhor dito, entre a ministra Maria de Lurdes Rodrigues e o sindicalista Mário Nogueira. Trata-se, portanto, essencialmente, de uma luta político-partidária entre o Partido Socialista e o Partido Comunista pela posse de um território que o poder político sempre soube ser importante controlar: a Educação.
Em analogia, colho numa mensagem de Laurent Lafforgue, tido como um dos maiores matemáticos contemporâneos, dirigida ao presidente do Alto Conselho para a Educação de França (em 16 de Novembro de 2007), a seguinte opinião acerca dos sindicatos dos professores e dos peritos da educação do seu país:
“No que diz respeito aos sindicatos maioritários no seio dos professores ou dos pais dos alunos, todos (animados das melhores intenções, como podemos facilmente imaginar) ajudaram à destruição da escola, e penso que não são mais dignos de confiança de que os peritos da Educação Nacional”.
Para se compreender o estado calamitoso a que chegou o sistema educativo português deve ser-se suficientemente isento para procurar a sua etiologia em anos recentes. No findar de cada ano civil, as casas comerciais fecham as suas portas para balanço, ou seja para avaliar o stock da mercadoria existente e providenciar as necessidades futuras. O sistema educativo nacional tem prescindido desses tão úteis balanços não tendo conseguido, como tal, “programar o sistema que foi ao sabor das ondas e, assim, resolveu problemas em vez de programar politicamente um sistema”, como escreveu Isidro Alves, ao tempo reitor da Universidade Católica.
Basta recordar a Lei de Bases do Sistema Educativo, publicada no tempo do ministro Roberto Carneiro, num clima de exigências conflituosas de trinta sindicatos e organizações afins a favor dos seus associados menos habilitados em que foi conseguido que a diferença entre um licenciado universitário e indivíduos habilitados apenas com um curso médio ou mesmo secundário se cifrasse tão-só em um escalão: O 10.º escalão para aquele e o 9.º para estes, separados, em remuneração, em escassos contos de réis mensais.
Mas mesmo isso foi sol de pouca dura. Logo foram criadas escolas privadas que lhes venderam, enquanto o diabo esfrega um olho, diplomas de “licenciatura”. Daqui nem sequer viria grande mal ao mundo não se desse o caso de ter havido um sistema de avaliação de professores que os tornou numa espécie de “clones” de uma profissão na qual nunca se separou o trigo do joio. E não digo isto de ânimo leve. Várias vezes lancei o repto de ser dada a conhecer publicamente a percentagem de professores que não atingiram o topo da carreira docente sem ser por abandono voluntário ou involuntário da profissão ou por se terem reformado antes. Sintomaticamente, quer o Ministério da Educação, quer os sindicatos têm-se fechado em copas “não penetrando eu na razão deste silêncio” (uso a bela expressão de Aquilino Ribeiro). Será que a mensagem que se quer fazer passar para o exterior é a de que os professores são uma classe fora de série, numa sociedade com imperfeições humanas em que há bons e maus políticos, bons e maus médicos, bons e maus advogados, etc.? Mas esta mensagem soa a falso mesmo nas almas mais crédulas por só encontrar eco no nacional-porreirismo que preside, por exemplo, à avaliação dos alunos para fins meramente estatísticos. A antiga avaliação de professores deixava, de facto, muito a desejar. Todavia, como sói dizer-se, pior que o soneto é a emenda, isto é, a avaliação proposta pelo Ministério da Educação que tentou fazer de uma burocracia pesadíssima uma espécie de solução milagrosa para os males de que enformava a antiga avaliação.
Os problemas da educação não se resolvem com o culto de personalidade de um porta-voz a fazer um discurso sindical como que a modos de campanha eleitoral (a uma semana das eleições europeias, que é prelúdio das próximas legislativas) que possa dar votos a um determinado partido ou que possa satisfazer aspirações políticas próprias, citando, ainda, Lafforgue, “fugindo às suas responsabilidades e, consequentemente, escondendo a todo o custo as dimensões do desastre”.
Seja a que pretexto for, a profissão docente não se pode nem deve esgotar em manifestações de massas em frente de palanques, como o faziam os sindicatos da era industrial que tiveram a sua época. Actualmente, em nome de uma dignidade muito própria, e que a opinião pública justamente lhes reconhece, devem os professores procurar uma representatividade e uma acção que denunciem inequivocamente o forte propósito de estarem ao serviço da sociedade portuguesa e não de interesses de um sindicalismo retrógrado e ultrapassado.
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15 comentários:
Lê-se no início que a luta dos professores é a luta do PC com o PS e já não apetece ler mais nada. E não, de facto, não vale a pena, o começo é demasiado primário.
É claro que a instrumentalização político-partidária é indesmentível, o que não torna todos os professores manipuláveis, nem a causa injusta. Claro também é que os professores não são perfeitos e muitos há que, como sabe quem vive profissionalmente todos os dias nas escolas, talvez não desempenhem a profissão de modo minimamente aceitável (como outros profissionais, em Hospitais, Assembleias ou outros).
O problema é que a forma como a educação tem sido conduzida em Portugal, pelos constantes ME a soldo de curiosos pseudo-pedagogos aderentes de modas pseudo-científicas, tem perjudicado bastante a já difícil tarefa de ensinar e fazer aprender crianças e jovens que vivem numa sociedade mais ou menos alheada do fazer-se humano, como é a educação e o ensino.
Solução (para os males "sindicato" e "ME"): a criação de uma Ordem de Professores, assente em princípios claros de cientificidade habilitacional, princípios éticos de exercício da profissão e independência partidária mínima; estas prerrogativas são bem mais fáceis de encontrar do que os "(des)interessados" querem fazer crer! Mas só isto seria levar, efectivamente, a sério a profissão/missão de professor.
Concordo com o anónimo das 14:14 - basta ler o 1º parágrafo para perceber que o resto é perda de tempo.
Fui.
Anónimo e António: Previamente, convém estabelecer os sinónimos para a palavra “contextualizada”: enquadrada, condicionada.
Assim, no início do meu post poderia ter escrito, para uma melhor compreensão: “A luta dos professores encontra-se enquadrada (ou condicionada)…”
Os comentaristas, atrás citados, entenderam não existir essa contextualização. Recordo, todavia, haver uma máxima do jornalismo anglo-americano, inspirada em C.P. Scott, que nos diz serem os comentários livres e os factos sagrados. Respeito, portanto, a liberdade dos seus comentários.
Mas não abdico da apresentação de factos que fundamentam o parágrafo inicial do meu post que lhes causou um desconforto tamanho que por aí se quedou a sua leitura. Lamento-o, não por mim. Mas pelo facto de não terem lido a citação que faço de Laurent Lafforgue. Se não fosse correr o perigo de abusar da vossa paciência, pedia-lhes que a lessem pela analogia entre o que se passa em França e em Portugal no aspecto do sindicalismo docente.
Mas vamos aos factos (esses, sim, sagrados):
1. Tendo a Plataforma Sindical como porta-voz, Mário Nogueira, dirigente máximo da Fenprof, filiado do Partido Comunista e candidato, uma vez mais, a deputado por esta força política não se trata de uma mera suposição associar a acção desencadeada pela Fenprof e pelo Partido Comunista na luta sindical dos professores.
2. Aliás, isto mesmo reconheceu Mário Soares quando disse: “Voltaram à instrumentalização dos sindicatos como ‘correia de transmissão’ do PCP” (“Diário de Notícias”, 29.Janeiro.2008).
3. Na manifestação do passado dia 30, ou seja uma semana antes das eleições europeias (demasiada coincidência?), o orador de serviço (e único) foi Mário Nogueira que se aproveitou da altura para fazer um discurso de verdadeira campanha eleitoral contra o Partido Socialista e não tanto, como seria de esperar, contra o actual ministério da Educação.
4. Claro que a luta dos professores não se circunscreve, apenas, a questões politico-partidárias. E tanto assim é que logo surgiu, por exemplo, o blog “A Educação do meu umbigo” numa manifestação desalinhada e espontânea de um número incalculável de professores que se fizeram voz do descontentamento da classe perante as medidas prepotentes desencadeadas pelo ministério da Educação . Ou seja, a luta dos professores não foi apenas enquadrada pela Fenprof e pelos outros sindicatos da Plataforma Sindical. Mas no aspecto político, as duas forças em confronto são o ministério da Educação do Partido Socialista e a Fenprof com fortes ligações ao Partido Comunista.
Miguel Portugal: A leitura que fez do meu post deixou-me descansado sobre a intenção que presidiu à sua redacção.
Mormente, quando reconhece que a luta dos professores não se deve circunscrever a questões meramente laborais. Existe a necessidade da criação de uma organização profissional de professores de direito público que lhes permita serem interlocutores válidos e responsáveis perante questões que se prendem com a melhoria do ensino.
Tenho 56 anos de idade, 33 de professora, nunca votei PC e tenho votado PS. Fui.
Rui Baptista:
Se é como diz, a que propósito vem a palavra "essencialmente" logo no período seguinte? Ou a "luta" que refere nesta frase não é a mesma "luta" da frase anterior?
Maria Evangelina Silva: A intenção do meu post não foi tornar o seu “assunto” numa espécie de confessionário público sobre as intenções de voto dos que tiveram a amabilidade em tecer-lhes comentários em direito de cidadania e num clima de liberdade opinativa.
Registo, no entanto, que nunca votou PC e que tem votado PS. Terá as suas razões que eu respeito, como respeito todos aqueles que votam, em boa consciência, no espectro político existente: CDS, PSD, PS. PCP, BE ou qualquer um outro.
José Luiz Sarmento: Começo, essencialmente, por lhe agradecer o seu comentário e, acessoriamente, o não me ter sujeito a uma interpretação dos 1.ºe 3.º períodos do primeiro parágrafo do meu post de resposta múltipla, ou seja do tipo cruzinhas, a que fui sujeito, há tantos anos que lhes perdi a conta, no Curso de Oficiais Milicianos de Infantaria, e que vejo hoje recuperada com assinalável afã pela sociedade civil nas provas de exames da Língua Portuguesa.
Mas vou agora à essência da questão que me levanta. No 1.º período digo que a luta dos professores se encontra contextualizada (ou seja, enquadrada ) num ataque cerrado, etc. No 3.º período, escrevo que se trata, essencialmente, de uma luta político-partidária, etc.
Encaremos, portanto, os sinónimos encontrados, grosso modo, para a palavra “essencialmente”: basicamente, fundamentalmente, extremamente, realmente, sobretudo. Ou seja, mantenho que se trata, ESSENCIALMENTE, basicamente, fundamentalmente, extremamente, realmente, sobretudo, de uma luta político-partidária entre o Partido Socialista e o Partido Comunista pela posse de um território que o poder político sempre soube ser importante controlar: a Educação. E isto tanto vale, actualmente, para o PS como para o PC como, para não ir mais longe, a décadas de Estado Novo. O advérbio “essencialmente” quis reforçar a ideia de que a luta dos professores não se esgota neste braço-de-ferro entre a Fenprof (com todo o seu poderio numérico: ao que se diz, e que eu tomo apenas nesse contexto, o número dos seus associados suplanta o número de sócios de todo os outros sindicatos da Plataforma em conjunto) e a teimosia perigosamente doentia do ministério da Educação.
Há mais vida docente a palpitar para além disso. Por exemplo, professores não sindicalizados, a acção meritória do blogue “A educação do meu umbigo”e do seu autor, sempre pronto a acolher as diferentes correntes de opinião, e de todos aqueles professores que nele encontram uma tribuna livre e um espaço sempre disponível para terem uma voz activa em todo este nefasto processo, movimentos independentes de professores, professores que escrevem artigos de opinião nos media, etc.
Por a leitura do meu post poder ter criado um clima de ingratidão para todas as vozes não sindicais que de lés-a-lés de Portugal têm terçado armas por um ensino melhor e mais justo, entendi um dever de consciência fazer este esclarecimento, agradecendo ao autor do comentário que o despoletou o levantar da questão dando-me, assim, essa oportunidade.
Caro Rui
Este seu post revela um "primarismo" ideológico que me ofende. Explico porquê no meu blogue.
Rui Baptista:
"Essencialmente" é vulgarmente usado em ttodas essas acepções, mas o que quer dizer em rigor é "na essência." Descontando a ambiguidade inerente à expressão "trata-se de", que deixa em aberto a possibilidade de você estar a referir duas lutas diferentes em duas frases sucessivas, resta que você está a dizer que a luta dos professores é na essência - por contraposição a "no acessório" - uma luta politico-partidária entre o PS e o PC. A sua falácia é um non sequitur: do facto de A estar "contextualizado" por B ou "enquadrado" por B não resulta necessariamente que A seja B.
José Luiz Sarmento: Quando escrevi que se tratava, essencialmente,de uma luta político-partidária entre o PS e o PC quis dizer que essa luta se não circunscrevia a este único aspecto pois vai para além dele.
Haja em vista, como aliás escrevi no meu comentário anterior,a acção de alguns blogues e dos movimentos independentes que julgo não se identificarem com essa forma de luta em que todos os meios são lícitos como, por exemplo,a antecipação de uma manifestação sindical relativamente a uma outra marcada pelos movimentos independentes muitos dias antes.
Quanto ao facto de eu ser acusado de uma falácia, embora prezando a sua opinião, gostaria de ouvir a opinião de outras pessoas que dominem os meandros da Filosofia de que fui um amador (aquele que ama)desta disciplina no último ano do meu curso liceal. Com isto, quero, em nome desse amor, não ir além da chinela.
Rui Baptista, costumo ler os seus posts e, de um modo geral, diz aquilo que sinto.Concordo com este post muito especialmente no que é dito quanto à "diferença entre um licenciado...se cifrasse tão-só em um escalão...". Para além do mais, também nunca achei grande jeito haver uma carreira única para o pré e demais ciclos e secundário.É por estas e por outras que há professores a aposentarem-se (pré/1ºciclo)com menos idade e tempo de serviço(anos de desconto)com centenas e até bem mais de um milhar de euros a mais do que outros (2º/3ºciclos/S) com mais idade, anos de desconto e licenciaturas feitas numa faculdade. Basta ver as listas de aposentados da CGA!Foi tudo ao molho e fé em Deus.Nem consigo entender (ou talvez até entenda..) por que razão os sindicatos apenas acautelaram a situação de alguns docentes face às alterações das condições de aposentação.Quanto às tais licenciaturas... Algumas de um ano e aos fins de semana, segundo consta...Até existem casos de auxiliares de educação educativa que, com as sucessivas benesses do ME, passaram a educadoras e depois se licenciaram num ano...Este ME tem sido pai para uns e padastro para outros.Para terminar: que nunca lhe fraqueje o ânimo para dizer as verdades que a alguns ou a muitos incomodam.
Anónimo (23:03):Assumiria uma falsa modéstia, se não registasse o agrado que me causaram as suas palavras de estímulo.
Não reconheço em mim nenhum mérito. Sinto como obrigação manifestar o meu repúdio pelas injustiças criadas pelo antigo estatuto da carreira docente havido, por uns tantos sindicalistas que dele beneficiaram pessoalmente,como uma espécie de vaca sagrada.
Acontece que, aquando da criação dos respectivos escalões, professores licenciados que se encontravam na letra A (topo da carreira anterior) não foram situados no topo dos novos escalões, 10.º escalão, tendo que esperar uns tempos para que esse acesso se processasse.
Houve um caso que contribuiu para uma reforma amargurada da sua vítima e que devia criar problemas de consciência nos seus responsáveis. Um brilhante professor de Matemática, antigo reitor do então chamado liceu, reformou-se no 9.º escalão, por entretanto ter atingido o limite de idade para a aposentação. Vivia no mesmo prédio uma docente com um curso médio que, apenas por ser mais nova, se reformou nesse mesmo escalão. Ou seja, a data constante dos referidos bilhetes de identidade teve mais força institucional que os longos anos de estudo académico e respectiva complexidade que os separava. Em época anterior a este estatuto, o referido professor ter-se-ia reformado na letra A e a docente em causa na letra C!
Recorde-se que para esta injustiça contribuiu o forceps dos sindicatos então existentes em defesa das suas clientelas menos graduadas perante a apatia dos professores licenciados. A meritocracia deu lugar a uma mediocracia nefasta à criação de elites tão necessárias a países que se encontram na vanguarda dos países desenvolvidos. Ou seja, interesses pessoais ou de classe sobrepuseram-se aos interesses da sociedade.
Rui Baptista, apreciei deveras a sua resposta ao meu modesto comentário. Incisivo e acutilante como sempre.Respigo esta parte: "Sinto como obrigação...como uma espécie de vaca sagrada" Exactamente na "mouche"... Lembro-me até do completo dislate que é ser considerado como tempo de docência/monodocência o tempo passado em tarefas administrativas (DRE´S,Centros de Formação,Sindicatos e outras associações, como ANPEB, Delegações e Direcções escolares - mas que rol!) durante anos e anos... Só mesmo neste Portugal! E o mais curioso é que pessoas destas falam ex-catedra, mas andar no terreno... Muita teoria e pouca ou nenhuma prática.Também a parte final da resposta faz um retrato exacto do que, infelizmente, se tem passado. A propósito, recordo-me de um artigo do Prof. Alfredo de Sousa (ISE) no Jornal de Educação,lá pelos anos oitenta, salvo erro, que dizia exactamente que não valia a pena os pais quererem que os filhos tirassem uma licenciatura.Bastaria irem para o ensino e ganhariam tanto como um licenciado sem tantos custos... Até ao próximo post.
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