sexta-feira, 13 de outubro de 2017

No sistema educativo actual reina o princípio de que tudo tem de ser fácil

Extractos de recente entrevista a Andrea Marcolongo, autora do livro "La lengua de los dioses. Nueve razones para amar el griego" (ver aqui).
A última reforma educativa de Espanha, la LOMCE, tornou as disciplinas de filosofia e grego como optativas, cortando assim a relação dos alunos com o mundo clássico. 
Em Itália temos a mesma discussão no plano educativo. Creio que quando os políticos tomam essas decisões é porque têm medo que aprendamos a pensar. As gerações actuais são filhos da crise, os seus pais perderam o trabalho e foi-lhes dito que têm de estudar informática porque essa é uma área em que vão encontrar trabalho. É como se perseguissem um futuro que nunca chega. Deixamos o grego porque o consideramos inútil, pensamos que é algo muito difícil e no sistema educativo actual reina o princípio de que tudo tem de ser fácil. Pois não tem de ser assim. Estamos a formar futuros cidadãos e devemos ensiná-los que nem tudo na vida é fácil. Além disso, temos de saber que todas as línguas, incluindo o grego, são política, ensinam-nos a pensar, ensinam-nos a entender a perspectiva do outro. 
O que é que os clássicos nos ensinam? 
Deixaram-nos escrito tudo o que havia que saber sobre os seres humanos. As tragédias gregas são actuais porque nos explicam que as pessoas não são pura e eternamente boas, que dentro de nós também há muitas coisas más e temos de aprender a experimentar e gerir as nossas emoções. Actualmente não sabemos gerir o que sentimos; se estamos felizes, temos de estar extremamente felizes, e se estamos tristes, somos as pessoas mais desgraçadas. Não existe meio termo.

3 comentários:

Anónimo disse...

Apesar de o cristianismo poder ser considerado uma variação do judaísmo, os judeus propriamente ditos nunca quiseram, de corpo e alma, fazer parte da cristandade. Os gentios gregos e romanos até podiam ser cultos e civilizados, mas povo eleito só há um! Só que, nos primeiros contactos, a supremacia militar do Império Romano ensinou os judeus de que a força das ideias, por grande que seja, torna-se mais eficiente se tiver a apoiá-la a força das armas! Passados vinte séculos, e depois de muita água correr por baixo das pontes, hoje, os vencedores são os judeus e os americanos do norte. A cultura greco-latina já não é a dominante no mundo, portanto não vale a pena ensiná-la. Assim, a própria Unesco torna-se uma organização cultural obsoleta que não deve ser apoiada financeiramente.

Anónimo disse...

É verdade. Os clássicos disseram tudo, ou quase tudo, o que se refere ao ser humano.
Se olharmos para o passado verificamos que há constância na natureza humana. Por isso não entendo a fúria de se operarem, a todo o custo, alterações profundas na educação.
A vida não é fácil e a escola tem de preparar par as suas adversidades.
É urgente tratar as crianças e os jovens não como acéfalos ou vidrinhos, mas como pessoas que devem ser formadas humanamente.
A apologia do facilitismo e do lúdico está a hipotecar o seu futuro como cidadãos conscientes e críticos.
Maria Dulce R. Marques da Silva.

Carlos Ricardo Soares disse...

É um desafio muito grande comentar textos que não pretendem ser inócuos, nem imparciais, textos críticos, empenhados, que defendem valores. Há áreas que, na verdade, não queremos tratar com objetividade, porque a objetividade é uma terra de ninguém. O nosso amor (às causas) leva a primazia sobre tudo o mais. E a própria ciência é perigosíssima se não for por amor à verdade.
Há os que defendem aquilo em que não acreditam, porque a função deles é defender tudo o que lhes interessar (muitos políticos e advogados...E também pseudo-cientistas e pseudo-filósofos e pseudo-sacerdotes e comerciantes da banha da cobra e militares, etc...,) e há os que defendem ilusões, convencidos de que estão a defender realidades e os que não defendem nada...
Defender valores supõe uma predisposição criativa e otimista e interpelativa, não ostensiva, nem hostil, para a construção, para a comunicação e a partilha proveitosa. Isto não costuma acontecer nos negócios e no mercado dos egoísmos, nessa esgrima cínica e sádica cujo objetivo é apenas punitivo (das fraquezas, da estupidez, da inépcia, da arrogância, enfim, dos defeitos e dos défices).
A cultura da competição, qual Esparta, encontra na adrenalina e na droga o clímax do nada e do absurdo. A cultura da solidariedade e da alegria das pequenas etapas vencidas, na aprendizagem, na doença, nos trabalhos, nos dias vividos a observar as abelhas e as estrelas, está ameaçada de morte.
Do que eu tenho a certeza é que a maioria das pessoas aspira a que as deixem viver, em paz, nem querem que as ajudem, só querem que não as estorvem, que não as persigam, que não as explorem, que não se atravessem no seu caminho.
A escola é uma instituição mobilizadora, tal como uma igreja, ou um Estado, que tem de saber responder às questões do sentido, do interesse, do valor, da verdade, do presente e do futuro, mais do que do passado, sob pena de ser um instrumento de tortura.

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