John Banville, o escritor irlandês que entre os vários
prémios recebeu o Booker, o Kafka e o Príncipe das Astúrias, tem uma atracção
pelas ciências que ele atribui à leitura de “Os Sonâmbulos” de Arthur Koestler.
Talvez pofr isso escreveu a chmada Trilogia
das Revoluções: “Doutor Copérnico” (1976) , “Kepler” (1981), este último prémio
Guardian de ficção de 2011, e a “Carta de Newton” (1982). Outro livro c om algum conteúdo científico é “Os
infinitos” (2009). “Luz Antiga”,
publicado pela Porto Editora numa excelente tradução de José Vieira de Lima, em
2012 (mesmo ano que o original, que recebeu o Irish Book Award), que comprei
nuns saldos de Verão de uma livraria Bertrand, tem um título de sabor
astronómico. O livro trata das recordações
de uma paixão tórrida de um rapaz de 15 anos por uma mulher casada de 35 anos, que
era a mãe do seu melhor amigo. Mas a expressão “luz antiga” aparece, na p. 188,
numa conversa de copos, noite alta, do protagonista, actor em adulto, com um
desconhecido num bar de um hotel italiano (o actor estava no hotel na companhia
de uma estrela de cinema). Transcrevo, pedindo desculpa ao tradutor de não respeitar
o acordo ortográfico que ele respeitou:
“Nessa altura, a minha cabeça deve ter deambulado, errado não
sei por onde, extraviada por certo, o que era um efeito do vinho e da falta de
sono, ou talvez tenha mesmo dormido, um pouco, sim, cochilado de algum modo.
Ele começa a falar de minas e metais, de ouro e diamantes e de todos os
elementos preciosos que se encontram enterrados nas funduras da terra, mas
agora, sem eu saber como, vagueava já pelas profundezas do espaço, e estava a
falar-me de quasares e pulsares, de gigantes vermelhas e anãs castanhas e
buracos negros, da morte térmica do universo e da constante de Hubble, de
quarks e quirks* e múltiplos infinitos. E de matéria negra. O universo, segundo
ele, contém uma massa perdida, extraviada, uma massa que não podemos ver, nem
sentir, nem medir. Essa massa é muito maior do que tudo o mais, e o universo
visível, aquele que conhecemos, é comparativamente pequeno, uma coisa de nada.
Pensei nesse vasto e invisível mar de matéria transparente e imponderável,
presente em todo o lado, indetectado, através do qual nos movemos, nadadores
insuspeitos, e que se move através de nós, uma essência secreta e silenciosa.
Agora estava a falar da luz antiga das galáxias que vinha um
milhão – mil milhões, um bilião! – de quilómetros para chegar até nós. Mesmo aqui
– disse ele - , a esta mesa, a luz que é a
imagem dos meus olhos demora o seu tempo, um tempo mínimo,
infinitesimal, claro, e, no entanto, tempo, para chegar aos seus olhos, e é por
isso que, para onde quer que olhemos, estamos a olhar para o passado.
Acabada a garrafa, não se coibiu de deitar as borras no copo
dele. Tocou com a beira do copo contra o meu, produzindo um inevitável
tilintar. – Tem de cuidar bem da sua estrela, nestas paragens – disse ele no
mais suave dos murmúrios, sorrindo, e inclinando-se tanto para a frente que eu
podia ver-me reflectido, duplamente reflectido, nas lentes dos seus óculos. – Os
deuses observam-nos. E têm ciúmes.”
*Quirks são partículas hipotéticas, semelhante aos quarks por se agregarem, embora a força responsável seja não a força nuclear forte, mas uma outra força, desconhecida.
*Quirks são partículas hipotéticas, semelhante aos quarks por se agregarem, embora a força responsável seja não a força nuclear forte, mas uma outra força, desconhecida.
1 comentário:
Grande livro, grande autor. Os Infinitos já era excelente, mas a Luz Antiga é uma obra prima:
http://olivrodaareia.blogspot.com/2014/03/ler-e-reler-uma-luz-antiga-de-banville.html
Não há como ler em inglês para evitar os dislates do A.O.
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