quinta-feira, 24 de maio de 2012

O SISTEMA EDUCATIVO NUMA ENCRUZILHADA


Meu artigo de opinião saído hoje no jornal Público:

“Imaginamos o que desejamos, queremos o que imaginamos e, por fim, acreditamos no que queremos” – Bernard Shaw.

Portugal, afectado por grave e generalizada crise, parece querer encontrar lenitivo numa esperança sebastianista que resolva todos os problemas que afectam os portugueses cansados da política e dos seus governantes. Mas as manhãs quentes de nevoeiro sucedem-se,  a lembrarem climas tropicais, e nada de aparecer um D. Sebastião que lhes levante o ânimo.

Ora, como não podia deixar de ser, esta crise afecta o sistema educativo nacional, que se encontra numa verdadeira encruzilhada sem saber o rumo a seguir, numa declarada e grave situação de desemprego a subir entre os próprios licenciados e em que os  governantes se desentendem nas suas consequências.

Assim, com optimismo, o primeiro-ministro, Passos Coelho, vê no desemprego uma oportunidade;  Vitor Gaspar, Ministro das Finanças, com realismo, um drama.

Mas quem estará mais capacitado para se pronunciar sobre os efeitos do desemprego são todos aqueles que sentem na carne o látego impiedoso desta verdadeira chaga social . Ainda por estes dias se viu na televisão jovens engenheiros portugueses desesperados por falta de emprego a procurarem uma possível solução na emigração para países escandinavos.

Ora, sabendo-se que as estruturas educativas (do ensino infantil ao universitário) condicionam o estado de vitalidade de um país, reflectindo as suas virtudes e os seus defeitos, o seu dinamismo e a sua inércia, a sua riqueza e a sua pobreza, sendo um verdadeiro banco de dados do respectivo desenvolvimento, seja ele científico, técnico e económico, não pode ou deve Portugal continuar a assistir a uma política educativa que tarda em consolidar uma personalidade forte independente da influência de partidos políticos, no Governo ou na oposição, que correm o risco  de se deixarem influenciar pelas suas clientelas sem sequer darem o benefício da dúvida a quem detém nas mãos a pasta da Educação, não lhe concedendo, com isso,  sequer, paz de espírito para redireccionar os caminhos percorridos pelos seus antecessores.

E, muito menos, o sistema educativo deve ser vítima de um sindicalismo de grandes massas que toca a charanga para dar a conhecer na rua aquilo que querem fazer crer ser os respectivos problemas  em benefício  corporativista dos associados de mais de dezena e meia de sindicatos de professores ( em recorde, não sei se mesmo, mundial) a puxarem a brasa à sua sardinha como se os interesses (já para não falar na dignidade) dos docentes se esgotassem em questões meramente laborais ou em eternizarem os dirigentes sindicais nos seus lugares, segundo chegam a dizer ou dar a entender, em sacrifício de verdadeiros missionários deste milénio.

Não me parece ser esta a forma correcta de ajudar os políticos de boa vontade que se não deixem cilindrar pelas engrenagens trituradoras de interesses inconfessáveis. Ou seja, políticos que  encarem este pequeno rectângulo e o seu sistema educativo como capazes de fazer face a uma livre circulação de mão-de-obra especializada no competitivo mundo da Comunidade Europeia, que continua a alargar as suas fronteiras numa economia mundial de vasos comunicantes e em convulsão espasmódica num caldeirão a fervilhar que se estende de uma Europa que se julgava suficientemente desenvolvida para poder fazer face a economias emergentes em outros continentes em que as questões do ensino não se perdem em longas dissertações académicas, embora bem-vindas se não exaltarem um descarado facilitismo científico e pedagógico em palavreado tão ao jeito do chamado “eduquês”.

A contrario, sou da opinião que o objectivo do nosso sistema educativo não deve descurar o velho aviso de Mao-Tsé-Tung, vindo da China uma das maiores potências económicas actuais do globo:” Um caminho demasiado plano não desenvolve os músculos das pernas”.

Rui Baptista, co-autor do blogue De Rerum Natura.

24 comentários:

José Batista da Ascenção disse...

Caro Rui Baptista

No nosso ensino parece não haver (sequer)

plano. Ou, a haver, será um plano inclinado...

descendente.

Donde, parece já não haver músculos, nem pernas

nem sequer... neurónios. Um neurónio que fosse,

e que... funcionasse.

A nossa prática parece (mais) governar-se por

miasmas, orientados para (e por) certos

interesses.

Parece, parece.

Ou então sou eu que vejo mal...

Rui Baptista disse...

Caro José Batista da Ascenção: E cá estamos nós, uma vez mais (e tantas quanto as necessárias), a debater as encruzilhadas do sistema educativo.

A complexidade e os desafios que se lhe deparam podem ser perspectivados, sob o ponto de vista de um psiquiatra e de um filósofo, este último no que respeita à encruzilhada com que os solteiros se deparam em prosseguiram nos caminhos do celibato ou em se casarem. A decisão não é tão simples como isso se o raciocínio não estiver embotado por uma paixão assolapada. Anos atrás, muitos anos, li algures a opinião de Sócrates a este respeito: “Quer te cases, quer não te cases tem por certo o arrependimento”

Ao ser interrogado por uma mãe preocupada com o caminho a seguir no que respeitava à forma de educar o filho (felizmente que ainda as há, hoje!), Freud deu uma resposta pouco tranquilizadora: “Minha Senhora, faça o que fizer, fará sempre mal”.

Receio (com a esperança que deposito em Nuno Crato) que com o mesmo dilema se defrontará o actual Ministro da Educação pressionado por sindicatos, interesses com e sem razão de ser, um passado de barafunda (eu diria mesmo, de bagunça!) criado, com destaque, sem desresponsabilizar Maria de Lurdes Rodrigues, pela antiga secretária de Estado, Ana Benavente, perspectivas políticas diferentes de encarar a educação, a não audição uníssona dos professores, através de uma ordem profissional, como se tratassem de interessados unicamente em questões laborais, etc., etc. E nesta alergia a uma Ordem dos Professores não posso deixar de trazer à colação a história (por mim evocada em escritos de jornal amarelecidos pelos anos) de uma mãe babosa que ao assistir a um desfile militar em que participava o filho se volta para os circunstantes, dizendo com orgulho: “Todos levam o passo trocado, só o meu filho é que o leva certo"!.

Julgo que a criação de uma Ordem dos Professores obrigaria o Ministério da Educação a olhar para os docentes com a dignidade e a audição que eles merecem pela sua preparação académica e pela sua experiência pessoal. Mas não será cedo de mais ou precipitado retirar ao professor Nuno Crato o benefício da dúvida? Agradar a gregos e troianos é difícil, mas recorrendo (como faço muitas vezes e com muito agrado) a um ditado "no meio é que está a virtude". E a virtude é dar aos professores um clima de pacificação e aos alunos o melhor ensino possível.

José Batista da Ascenção disse...

Meu caro Rui Baptista

Não vão mal os seus considerandos, não.

O meu comentário foi produzido na sequência de mais uma formação(?)

obrigatória do "g(r)ave", sigla que eu traduziria por qualquer coisa

como "gabinete repetente pelas asneiras que vicejam nos exames",

feitas a contrário do (ou propositadamente contra o) que tão bem

caracterizou e denunciou Nuno Crato.

E por causa disso, o espanto e o desânimo crescem até onde nem o mais

pessimista suspeitaria.

Por isso, dou-lhe cada vez mais razão: se os professores não se

levantarem, ainda que mais ou menos corporativamente, o ensino pode tornar-se

uma impossibilidade.

Mesmo com Nuno Crato.

Que venha uma Ordem, pois, que nada é pior do que o que temos.

E o que temos não se (auto)regenera, se bem que autopropague...

Rui Baptista disse...

Meu Caro José Batista da Ascenção: Lembro-me sempre das suas restrições iniciais (aliás bem fundamentadas) à criação de uma Ordem dos Professores. Também eu, embora defendendo a sua criação de há anos, tantos que se me perdem na memória, não vejo na sua criação a resolução de todos os problemas dos docentes que, como diria, Pessoa não passam de arrabaldes de si próprios: qualquer bicho-careta se intitula professor sem que se possa evocar o exercício ilegal de profissão.

Repare que , se não fosse a Ordem dos Engenheiros, ainda hoje teríamos Sócrates (para além dos seus estudos de “filosofia” em França) a intitular-se engenheiro. Mas, ainda corremos o risco de se intitular Sócrates II, o filósofo que não deixaram ser engenheiro! Ultimamente, tenho visto na net muitos professores a defenderem a criação da Ordem dos Professores. E isso dá-me uma grande alegria pela isenção que a minha luta assume por me encontrar aposentado e, como tal, não me moverem interesses de vir a beneficiar da sua criação. Ela surgirá (a Ordem dos Professores”), é tudo uma questão de tempo e de paciência.

Continuarei a lutar por uma Ordem dos Professores porque, como escreveu Miguel Torga: “Maldito seja quem se nega aos seus nas horas apertadas”. E cada vez mais, sem uma ordem profissional os professores têm a sua voz abafada pela vozearia de manifestações sindicais e respectivos megafones a exigirem melhores condições laborais, postergando a nobreza da profissão e os verdadeiros interesses que norteiam (ou devem nortear) o magistério: os alunos.

Grato pelo seu comentário pela ajuda que deu a uma discussão que não pode continuar a ser tabu em benefício dos opositores de uma Ordem dos Professores que o único argumento que apresentam (passe o paradoxo) é um silêncio cúmplice!

José Batista da Ascenção disse...

Ali mesmo, no fim, devia estar ..."se bem que se autopropague..."

José Batista da Ascenção disse...

Meu caro Rui Baptista

Depois de muito pensar e penar: Estou consigo. Sem reservas.

Rui Baptista disse...

Meu Caro José Batista da Ascenção: A criação da Ordem dos Professores não podia desejar, e encontrar, melhor aliado. Muito aprendi consigo a pensar os prós e os contras deste empreendimento que faz pender o prato da balança a favor da sua criação urgente.

O facto de haver um certo sindicalismo que se manifesta contra é a prova provada (como se diz agora) de que os dias de um sindicalismo obsoleto que se arroga de funções (numa espécie de travesti) de uma Ordem dos Professores não pode continuar a servir do argumento estupidificante de que uma ordem profissional e um sindicato são antagónicos. Nada disso, ambos se completam. Haja em vista outras profissões com estas duas espécies de associativismo a conviver com proveito para ambas, v.g, os médicos. Recordo, a propósito, que a Ordem dos Médicos Veterinários, aquando da sua criação, teve o apoio do respectivo sindicato começando, inclusivamente, por utilizar as instalações sindicais.

Julgo que esta temática muito teria a ganhar se os professores de boa vontade, que não são servos de um sindicalismo que tem como bandeira uma política em que os respectivos interesses estão muito acima dos interesses de uma profissão de inegável interesse público, se pronunciassem.

E mesmos aqueles que se rendem às bem aventuranças de um sindicalismo do século XIX o fizessem também. No mínimo seria um exercício dialéctico interessante em defesa da proletarização da classe docente!

José Batista da Ascenção disse...

Meu caro Rui Baptista

Nenhum sindicado, por mais poderoso que seja pode impedir a criação de uma Ordem dos Professores. Nem ganha(ria) nada com isso...
Agora, cabe aos professores fazer a sementeira e cuidar e acarinhar uma "cultura" que há-de crescer e dar frutos.
O senhor tem feito bem a sua parte, sem esmorecimento, mas não pode retirar-se nem passar a pasta nem sequer diminuir os seus esforços.
E a nós, a maralha, compete transportar os pianos e empurrar, empurrar a montanha. Quantos mais formos mais depressa ela há-de começar a mover-se.
Não temos alternativa, suponho.
Ao trabalho, formiguinhas...
Por onde começar?

tempus fugit à pressa disse...

Está numa encruzilhada desde que o colégio dos nobres foy creado, a estrada deve ser má e ninguém lhe deu boleia
Mas cá por mim a cara do sistema educativo também não ajuda muito
Talvez com um face-lift como o dos anos 60? ou o dos 80?

joão boaventura disse...

Caros dialogantes

Há três obstáculos que obstam à criação da Ordem dos Professores:

1 - A educação é um instrumento ideológico da política, uma arma de domínio e poder;
2 - Para o efeito o Governo legislou de forma a impedir qualquer criação de Ordem de Professores, para não perder nem o instrumento nem a arma;
3 - E legislou ainda no sentido de os Sindicatos poderem criticar as Ordens, mas proibir estas de criticar aqueles;

São três setas envenenadas a pedirem revogação, ou um trabalho de Sísifo.

E o problema é que, se o Sísifo não esmorece no seu trabalho, também é verdade que se eterniza nele.

Como calculam a democracia também se Sisifiza.

Um abraço aos dois



política

Rui Baptista disse...

Caríssimo João:

Ponhamos de parte o trabalho de Sísifo que se eternizou sem solução. Espero que não seja esse o caso quanto à criação da Ordem dos professores.

Nada como um “flash-back” sobre os bastidores da sua criação que só não aconteceu por estar no auge, então, a divergência havida entre a Ordem dos Engenheiros e o Partido Socialista pelo facto desta ordem profissional não reconhecer o curso de engenharia de José Sócrates, obtido a um Domingo, numa “universidade” que seria obrigada fechar as portas pelo escândalo público gerado.

Vamos, portanto, a alguns factos que constam de um meu artigo de opinião publicado, em página inteira, no Jornal de Notícias ((08/03/2006), intitulado “Ordem dos Professores e AR”:

Em 17 de Julho de 92, noticiavam os jornais a conferência de imprensa dada Pelo Sindicato Nacional dos Professores Licenciados (SNPL) para a criação de uma Ordem dos Professores (OP). Anos depois (20/06/96), é entregue pelo SNPL, na Assembleia da República (AR) uma pequena brochura (de que fui seu principal redactor) contendo uma Proposta de Estatutos da Ordem dos Professores . Em 25 de Fevereiro de 2004, apresenta o SNPL, na AR, uma petição com 7857 assinaturas (sem necessárias, apenas, 4000) para a criação da OP. Finalmente, em 2/Dez./2005, foi debatida na AR, a petição n.º 74/IX do SNPL.

Como era de esperar, o Partido Socialista (pelo litígio havido com a Ordem dos Engenheiros) nomeou para relator da petição o seu deputado João Bernardo, curiosamente, professor do 1.º ciclo do ensino básico e, para além disso, vice-secretário geral de um sindicato de professores, o SINDEP, desfavorável à criação da OP. Estava, assim, criada uma situação (eu diria mesmo estava feita toda a papinha) para justificar o voto contra do Partido Socialista, ainda a lamber as feridas da não aceitação de Sócrates como membro da Ordem dos Engenheiros.

(Continua)

Rui Baptista disse...

Por seu turno, o deputado Fernando Antunes do PSD, embora apresentando algumas restrições, obrigou-se a reconhecer que “a ambição de criar uma ordem dos professores surge, pois, aliada a um forte sentimento de união de classe, responsabilizando-a face a esse importante desígnio nacional que é a educação”.

Entretanto, o deputado do CDS/PP, Abel Baptista, foi incisivo na sua intervenção de que respigo: “Ao contrário d que diz o Partido Socialista, entendo que a criação da Ordem dos Professores acrescentaria, desde logo, a dignificação da actividade docente que, ultimamente que, ultimamente, tem andado muito mal e sido criticada pelo actual Governo”. E reforçou: “Nesta medida, julgamos que a Ordem dos Professores pode e deve ser criada”.

Aliás, mesmo antes, sendo eu na altura presidente da Assembleia Geral do SNPL, em estudo por mim realizado da matéria respeitante às ordens profissionais (com consultas em bibliotecas públicas a estatutos que remontam à criação das mais antigas ordens, a dos médicos, por exemplo) escrevi o livro, intitulado “DO CAOS À ORDEM DOS PROFESSORES” (Janeiro/2004), que desfaz argumentos como, por exemplo, este, em desespero de causa, subscrito por Manuela Teixeira, dirigente máxima da FNE: “Não faz nenhum sentido falar de uma Ordem para trabalhadores por conta de outrem” (“O Independente”, 16/02/1996).

Aliás, em idêntica e santa ignorância pública se manifestava o dirigente da Fenprof , Augusto Pascoal, em conivência ocasional:”O vínculo à Função Pública não se coaduna com o próprio conceito de Ordem” (“Correio da Manhã”, 16/11/1996). Fraquíssima, ou mesmo ridícula argumentação, na tentativa de contrapor razões às 201 páginas do meu livro acima citado. Nos de hoje, seria conveniente que a Fenprof apresentasse as razões pelas quais está contra a criação da Ordem dos Professores. Nanja que nisso veja eu qualquer interesse que não seja outro da sua argumentação vir à luz do dia. Tem sido atribuído a Voltaire a frase: “Posso não concordar com o que dizes, mas defenderei até à morte o direito que tens em o dizer”. Este o conceito que tenho de democracia!

Como escreves, "a educação é instrumento ideológico da política, uma arma de domínio e poder". Igual perspectiva tive-a quando escolhi para título do meu post, "O sistema educativo numa encruzilhada". Para escolher o caminho certo nada como impedir que o sistema educativo continue marioneta sujeita a desígnios sindicais que o escravizam a modelos não encontrados em outras profissões.

Um abraço,

Rui Baptista disse...

Adenda ao final do derradeiro parágrafo do meu último comentário (27 de Maio de 2012 02:50). Termina ele, "em outras profissões" . Em outras profissões de igual exigência académica (licenciatura A.B.:antes de Bolonha). Repare-se, e isto é importante que se diga, e se não esqueça, para se ver como alguns partidos (como o BE, PC e PS) encaram a docência como uma actividade desmerecedora de ter tratamento igual prestado aos médicos, engenheiros, arquitectos, economistas, psicólogos, etc., de igual exigência de formação académica.

De igual exigência se subtrairmos o período que se seguiu imediatamente a 25 de Abril em que para se ser professor quase que bastava saber assinar o livro de sumários . E, por outro lado, como “exigência” para a inscrição em sindicatos docentes, que hoje se arvoram como os mais representativos em número de associados, bastava , em troco de uma quotização mensal , preencher uma ficha que o passava a identificar qualquer um como “professor” mesmo sem a exigência de um sindicato de operários, em que os seus futuros associado tinham que prestar provas da sua competência prática para evitar que um sapateiro qualquer se armasse em canalizador. São estas espécies de sindicatos que estão contra a criação de uma Ordem dos Professores para manterem um “statu quo” que lhes engorda os cofres.

E isto é tanto mais insólito quando os próprios Governos, em nome de princípios de uma falsa democracia, que eu chamo de “demeritocracia”, sancionou a criação de ordens profissionais de formação académica pouco exigente. Falando claro, com intuitos meramente de comparação de metodologias diferentes de exigência académica, refiro-me à criação da Ordem dos Enfermeiros e Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas. Ou seja, nisto no que se refere à criação das ordens profissionais, aliás, como em tudo na vida, há os filhos e os enteados. Aliás, no reconhecimento (que tenho como sagrado) ao contraditório, estou pronto a discutir estes temas publicamente com quem quer que seja para que a criação de uma Ordem dos Professores seja reconhecida como um direito com toda a legitimidade moral e institucional. Nunca como um favor ou compadrio baseado em outros favores e compadrios anteriores sem caboucos sólidos, ainda que de uma tradição que os suportassem.

Com a sua criação muito teria a ganhar o Ministério da Educação que passaria a ter como interlocutor uma associação de direito público em situações que transcendem questões meramente laborais tomadas de assalto por um sindicalismo em que, como escreveu o ensaísta Eugénio Lisboa (por mim várias vezes citado pela síntese perfeita que faz). “para tudo isto os sindicatos têm dado uma eficaz mãozinha, em áreas que não são da sua vocação nem da sua competência”.

A criação de uma Ordem dos Professores teria, entre outras, a vantagem importante de acabar com um simples exercício profissional que não responsabiliza os seus agentes, e não dá garantias suficientes de o interesse público da profissão, só então defendida por lei, de PROFESSOR ao serviço da dignidade e prestígio da profissão e respeito por princípios deontológicos. Daqui emerge a pergunta: não seria uma ocasião soberana para o Ministério da Educação encarar definitivamente, depois de uma auscultação pública aos interessados, a criação da Ordem dos Professores?

Joaquim Manuel Ildefonso Dias disse...

Professor Rui Baptista;

Eu penso que deve ser muito difícil aos Partidos de esquerda dar uma razão aceitável para não apoiar a criação da Ordem dos Professores.
Será por preconceito?
Será preconceito que lhes vêm daquilo que não apreciam nas outras Ordens Profissionais?
Eu penso que não, que o ensino têm algo mais importante e "sagrado" que é preciso não mexer,...têm sobretudo o poder de abrir horizontes e despertar a consciência e análise crítica nas pessoas; ora isto é mais do que aquilo que qualquer Partido político deseja.

Lamento que assim seja, que os horizontes dos Partidos sejam tão curtos.
Eu creio que é precisamente aqui que os Partidos deviam ter um papel activo e não o têm (fogem às suas obrigações); que esse papel deveria ser de ajuda e colaboração na criação de um organismo - que sirva os interesses de uma classe profissional - tão importante como a Ordem dos Professores.

Mas não os Partidos pensam exclusivamente nos seus interesses.
A gravidade é esta: os Partidos políticos não fazem aquilo que deviam, que é, ajudar a criar, e fazem aquilo que não deviam, que é, sentenciar, aniquilar, em completo desacordo com aquilo que são ou que deveriam ser.

Sou favorável à criação da Ordem dos Professores, mas que ela seja uma Ordem agregadora das melhores inteligências do País, e que sejam essas inteligências a formar outras inteligências.

Penso que é várias vezes mais importante para o País ter um bom Professor que um bom Médico, basta apenas pensar: que no futuro, provavelmente, ninguém tomará sequer uma "aspirina" se não for prescrita por um diagnóstico de uma máquina; pensar que o Professor é insubstituível e deverá ser o estimulador e formador das inteligências.
Quanto mais depressa se perceber isso mais possibilidades temos de andar à frente no conhecimento.


Cordialmente,

Rui Baptista disse...

Caro Joaquim Ildefonso Dias: As suas palavras deram-me novo alento para continuar a lutar pela criação de uma Ordem dos Professores. E elas têm tanto mais valor para mim por partirem de um Engenheiro que perspectiva esta problemática sem correr o risco de se tornar juiz em causa própria.

Aliás, de há muito me habituei a ver nos seus escritos o profundo respeito que lhe merecem os Professores, obreiros de uma missão que paira acima de muitos políticos. Tenho esperança que o leitor se aperceba que o actual edifício educativo não soube (ou não quis?) habilitar-se ao valioso e secular de Erasmo de Roterdão: "A principal esperança de uma Nação reside na Educação apropriada da sua juventude"!

E essa Educação passa, sem dúvida, em ser reconhecida, e revigorada, pelo poder político por tratar-se de um problema fulcral do país e do seu desenvolvimento cultural, científico e tecnológico.

Cordiais cumprimentos,

José Batista da Ascenção disse...

Meu caro Rui Baptista

Pela minha parte, penso que é altura de retomar os esforços para constituir

uma Ordem dos Professores.

E penso também que não devemos despender muito tempo com a indisposição do

ministério da educação, dos sindicados ou de outras organizações ou pessoas.

Uma Ordem de Professores far-se-á se os professores a quiserem fazer.

Peço-lhe que não veja nestas palavras qualquer reparo. Ao senhor devo

agradecimento, para além da estima e da consideração.

Peço igualmente que não se veja nestas minhas palavras qualquer desejo de

protagonismo ou de me pôr em bicos de pés. Para mim, nada quero, mas estou

disponível para dar o meu humilde contributo, enquanto posso, o qual, neste

momento é afirmar: eu professor quero que se faça uma Ordem de Professores,

e pergunto aos demais colegas: Também querem?

Se sim, mexamo-nos!

Nós, os professores merecemos, e os alunos e o país precisam.

Ora, se cremos e legitimamente queremos, então podemos.

Como não?

joão boaventura disse...

Caro Rui

Tudo o que escreves é inquestionável, as razões ponderosas, mas os argumentos esbarram num normativo jurídico, especificamente promulgado para impedir qualquer veleidade de qualquer Ordem que abranja o pelouro sagrado da educação, a via comunicacional por excelência para a inculcação ideológica do Estado na juventude, a coberto do falso critério de que os Governos são pessoas de bem, únicas capazes de armar a Nação com todos os requisitos exigidos para o seu perfeito funcionamento.

O sistema acaba por claudicar porque a cada mudança de Governo, vai corresponder mexidas na Casa da Educação, em obediência, não ao bom e isento funcionamento dos parâmetros que a deviam construir, mas de acordo com a ideologia que aproxime a juventude do ideário perseguido pelo Partido que tomou o poder. E o poder é para ser usado de acordo com o livre arbítrio que lhe confere a vitória eleitoral, independentemente dos resultados que o responsável da educação venha a obter no final da legislatura, mesmo que esta, na maior parte das vezes, não cubra o quadriénio, implicando novas eleições, para suprir os anos em falta.

Posto este último ponto, a objecção maior que se aponta à irresponsabilidade dos Governos, pelo facto de não ter conseguindo cumprir o tempo da legislatura, por incapacidade, resulta deixar o programa a meio caminho – que direi ? passado um, dois ou três anos ? - distorcido, talvez experimental, incompleto, inacabado, e sobre o qual vai cair o novo programa, do novo Partido, do novo Governo.

Não sei se se vislumbra neste panorama paradoxal, de programas não cumpridos integralmente nos quatro legítimos anos de legislatura, os microchoques ideológicos sucessivos que são inculcados na juventude, sem qualquer proveito para quem frequenta a escola, e sem qualquer proveito real para os Partidos para criarem aderentes à causa de cada um deles.

Só esta fotografia estático-dinâmica permite detectar a total incapacidade dos Governos para assumirem a pasta da Educação porque quer cumpram a legislatura, quer não cumpram – e que é a maioria – não podem é servirem-se do poder para baralharem os cérebros da juventude.

Mas os Governos têm ouvidos de mercador, porque há neles um chamamento ou pulsação selvagem chamado poder que os cega. E é assim que se legisla contra a juventude, ou melhor, contra a Ordem dos Professores.

Um abraço

Rui Baptista disse...

Caro João: O PSD e o CDS/PP para serem coerentes com a posição tomada na Assembleia da República, aquando do debate aí decorrido, em 2.Dez.2005, sobre a criação da Ordem dos Professores, terá que votar favoravelmente.E a moção passará pois ambos estes partidos têm a maioria.

Um abraço fraterno,

Rui

Rui Baptista disse...

Errata: 3.ª linha do meu comentário anterior, "terá", não; terão, sim.

joão boaventura disse...

Caro Rui

Nesse caso estaria tudo resolvido para o que bastaria solicita aos dois Partidos a revogação da lei impeditiva da Ordem dos Professores.

Acontece que o poder, porque está sedento de imposições ditatoriais, prepara-se para dificultar mais ainda a vida das 15 Ordens existentes no território nacional, para as impedir de limitarem o acesso à profissão, como é o caso corrente das Ordens dos Advogados e dos Engenheiros, escandalizados com a vergonhosa variedade dos cursos, sem eira sem beira, defendidos pelo sistema socrático.

E é do Ministério da Economia que parte a corrida, não porque considere que as "limitações injustificadas no acesso à profissão" sejam desproporcionais e injustificadas, mas porque o Governo ficava em cheque com as alcabalas com que autorizou cursos sem nível, e não quer ser apontado a dedo, nem passar pela vergonha de as Ordens dos Advogados e dos Engenheiros, terem detectado a fraude, e impedirem que o mercado seja invadido por profissionais inábeis e incompetentes.

Para o efeito ofereço mais uma fotografia da vergonha deste Governo, para memória futura
de como se desgoverna este país.

Um abraço

joão boaventura disse...

Caro Rui

Apresento a Proposta de lei n.º PL 172/2012, de 2012.04.19, do Ministério da Economia

E o que disse o semanário Sol, de 19.04.2012, a propósito.

Um abraço

Rui Baptista disse...

Meu caro João:

O Ministro da Economia, Álvaro Pereira, acossado por todos os lados para mostrar trabalho deve ter tido a ideia de fazer esta proposta (aliás, por ser uma proposta, para já, não é vinculativa para nada nem para ninguém). Transcrevo-a no essencial:"Para já, estão delimitados os princípios orientadores do regime, que incluem a harmonização da legislação e ‘mais exigência na criação de novas Ordens e Câmaras Profissionais’.

Ou seja, "depois de casa roubada, trancas na porta". Sendo ele professor de Economia estará a chorar sobre o leite derramado de ter sido criada a Câmara de Técnicos Oficiais de Contas, passado pouco tempo (por ser coisa pouca?) ascendendo a Ordem dos Técnicos Oficiais de Contas de uma falta de exigência tal que mete no mesmo saco indivíduos sem qualquer curso, outros com os antigos cursos comerciais (equivalentes ao antigo 5.º ano dos liceus, hoje 9.º ano do secundário), outros com cursos médios dos antigos Institutos Comerciais, outros bacharéis e licenciados em Contabilidade, pelos Institutos Superiores de Contabilidade, outros, finalmente, licenciados ou mesmo doutorados em Economia? Será esta a forma (em que não acredito, ou melhor não quero acreditar) de fazer o justo pagar pelo pecador?

Aliás, se virmos bem, até estou de acordo com este governante, no que respeita a “mais exigência na criação de novas Ordens e Câmaras Profissionais” Mas ainda estaria mais de acordo caso esta proposta passasse a letra de forma com efeitos retroactivos (aliás, a retroactividade das leis tem tido interpretações diferentes na sua aplicação ou não) para pôr cobro às (des)Ordens Profissionais.

Como é consabido, e é conveniente que se insista neste ponto para memória futura, o princípio doutrinário que preside a determinadas restrições na criação de novas ordens profissionais não passou, parafraseando o falecido Almirante Pinheiro de Azevedo, não passou de “fumaça” do Partido Socialista (em “revanche” pelo facto da não aceitação da inscrição de licenciaturas privadas de pechisbeque na Ordem dos Engenheiros que ocupou as páginas dos jornais, em escândalo público). Devido, ou melhor repudio, que os professores possam não merecer , por direito próprio e por respeito que lhes deve a própria sociedade portuguesa e os seus cidadãos, serem incluídos na exigência, ainda que a desoras, das novas ordens profissionais em satisfazerem determinadas exigências. Seria, no mínimo, de bradar aos céus!

Meu caro João, compreendo e agradeço-te, até, o teu tão necessário papel de “advocatus diaboli”, que muito útil me tem sido para me desembaraçar desde verdadeiro dédalo de dificuldades para a criação a Ordem dos Professores. E isto é tanto mais grave por os obstáculos levantados à sua criação serem forjados por docentes em defesa de interesses sindicais. Chegou a altura de se chamar, como soe dizer-se, os bois pelo nome. Mas isto (por me competir o ónus da prova) será matéria a merecer provas devidamente fundamentadas. Aqui fica, portanto a promessa!

Para já do poema de Miguel Torga, “Sisifo”, peço de empréstimo estes versos que me têm servido de inspiração quando me assalta a desesperança que logo atiro para trás das costas:

“Recomeça…
Se puderes,
Sem angústia e sem pressa.
E os passos que deres,
Nesse caminho duro
Do futuro,
Dá-os em liberdade.
Enquanto não alcances
Não descanses.
De nenhum fruto queiras só metade”.

Um abraço,

Rui Baptista disse...

Adenda: No meu comentário anterior, esqueci-me de mencionar as licenciaturas, mestrados e doutoramentos universitários em Gestão. Mas como diz o povo. "mais vale tarde do que nunca"...

Rui Baptista disse...

Com o pedido de desculpa ao leitor, corrijo no meu comentário escrito às 02:23:

No respectivo 4.º §, linhas 3 e 4, estão repetidas as palavras "não passou"; e na 8.ª linha, do mesmo §, emendar "Devido" para duvido.

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