domingo, 27 de maio de 2012

Células-tronco do sangue do cordão umbilical?

Em meio à expectativa pela chegada do bebê, os pais hoje costumam se ver diante de um dilema: congelar ou não as células-tronco do sangue do cordão umbilical do recém-nascido?

O procedimento, que ocorre ainda na sala de parto, pode ser feito de duas formas: por meio de uma empresa privada, para uso exclusivo do bebê, ou através de um banco público. Neste caso, o material fica disponível para qualquer paciente que dele necessite. Apesar de alguns bancos privados argumentarem que aquele punhado de células funcionará como um seguro-saúde caso o recém-nascido venha a sofrer, no futuro, de doenças como diabetes ou Alzheimer, sua utilização ainda é bem restrita. "Por enquanto, o único uso clínico comprovado é o transplante de medula óssea", explica a geneticista Mayana Zatz, pesquisadora da Universidade de São Paulo. Para esclarecer dúvidas sobre o congelamento das células do cordão, VEJA ouviu cinco especialistas no assunto.

Quais são as diferenças entre os bancos públicos e os privados?
Coordenados pelo Instituto Nacional de Câncer (Inca), os bancos públicos coletam e armazenam células de cordão em maternidades conveniadas, sejam elas ligadas ao Sistema Único de Saúde (SUS), como é o caso do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, no Rio Grande do Sul, sejam elas privadas, a exemplo do Hospital Albert Einstein, em São Paulo. O serviço é gratuito e o material fica disponível para doação. Ao contrário dos bancos públicos, os privados cobram, em média, 3 000 reais pela coleta e 600 reais de anuidade pelo armazenamento das células. Nesse caso, elas são de uso exclusivo da criança

Toda amostra de sangue de cordão coletada é viável para uso?
Não. De acordo com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), a amostra deve ter, no mínimo, 500 milhões de células-tronco viáveis e estar livre de contaminações. Nos bancos públicos, 60% do material coletado é dispensado após uma minuciosa triagem — se os testes revelarem propensão genética a algum tipo de doença, por exemplo, aquela amostra não será útil para ninguém. Já nos bancos privados, o descarte é de apenas 2% (caso em que se reembolsa o cliente). Embora as regras para bancos públicos sejam mesmo mais rígidas, os especialistas consideram essa discrepância demasiado grande. "A própria análise do material congelado pode danificá-lo. Portanto, só saberemos de fato de sua viabilidade quando houver necessidade de uso", diz o biólogo Daniel Coradi, da Anvisa

Em que tipos de tratamento o sangue do cordão é utilizado?
Por enquanto, apenas no transplante de medula óssea. Isso porque esse material é, sim, riquíssimo em células-tronco, mas apenas em um tipo delas: as hematopoiéticas — capazes, pelo que se sabe até o momento, de formar única e exclusivamente células sanguíneas. "Cerca de 0,1% das células presentes no sangue de cordão pertence ao grupo das mesenquimais — essas, sim, com potencial de originar músculos, ossos, cartilagem e gordura", explica o hematologista Luís Fernando Bouzas, diretor do Centro de Transplante de Medula Óssea do Inca. Em um estudo publicado em 2008, porém, a geneticista Mayana Zatz demonstrou que, em cada dez amostras de sangue de cordão, apenas uma continha células mesenquimais."Acho bobagem congelar o sangue de um bebê para uso privado. Primeiro, porque temos células-tronco em diversos tecidos, inclusive na polpa dentária. Segundo, porque o risco de ele desenvolver anemia grave ou leucemia é muito baixo. E, se isso vier a acontecer, não se recomenda o uso do cordão do próprio paciente", diz a geneticista

Quais são as chances de uma criança vir a utilizar as células do próprio cordão?
De acordo com a Sociedade Americana de Transplante de Sangue e Medula Óssea, as chances são de 0,04% nos primeiros vinte anos de vida. "Menos de 15% das crianças que desenvolvem leucemia linfoblástica aguda — doença sanguínea mais comum nessa fase — precisam de um transplante.
E, quando isso ocorre, o sangue do cordão do próprio paciente é contraindicado", diz o médico Carmino Antonio de Souza, presidente da Associação Brasileira de Hematologia, Hemoterapia e Terapia Celular. Mais um porém: uma amostra de sangue de cordão é suficiente apenas para o tratamento de uma pessoa com até 50 quilos. No caso dos bancos públicos, quando não se encontra um doador adulto compatível, opta-se pelo uso de mais de uma unidade de cordão. Outra situação em que o congelamento é recomendado é quando o recém-nascido tem um irmão que pode ser salvo caso haja compatibilidade genética. "Mas, nessas situações, os próprios bancos públicos fazem a coleta", explica a hematologista Andrea Kondo, do Hospital Albert Einstein.

Fonte: Revista Veja( Gabriella Sandoval)

3 comentários:

José Batista da Ascenção disse...

Saúdo a utilização da expressão "células tronco".

Entre nós, generalizou-se outra: "células estaminais".

Ora, não se percebe qual o étimo da segunda daquelas

palavras, porquanto "estaminal" se refere, em bom

português, a estames. E a expressão "células

estaminais" há muito existe para designar as células

daquelas peças florais masculinas.

Admito que o (ab)uso que passámos a fazer da

expressão "células estaminais" tenha derivado de

alguma tradução literal do inglês...

Esclareça quem souber.

Paulo Cabrita disse...

Eu, pelo contrário, questiono a tradução do termo "tronco", a origem a expressão "stem cells" relaciona-se com a sua capacidade de originar uma descendência. Em inglês, a palavra "stem" tem vários significados, sendo um deles precisamente uma linha de ascendência, também designada como "stock" em inglês. Além disso, também existe o verbo "to stem" que de entre os vários significados e quando é um verbo intransitivo significa originar-se ou desenvolver-se como consequência ou a partir de algo, e que por isso é usado com a preposição "from". O significado destas expressões é muito anterior ao uso da palavra inglesa "stem", que mais correctamente se refere a caule em português do que a tronco (em inglês trunk), para designar o caule das plantas; expressão que só apareceu como termo usado pela botânica em 1724.

José Batista da Ascenção disse...

Caro Paulo Cabrita

Pois é precisamente o conceito de tronco ou caule, como bem refere, ou ramo,

acrescentaria eu, que se adapta melhor à ideia de células embrionárias que

são capazes de originar outras células e estas outras cada vez mais

diferenciadas. Ora parte-se de um "tronco" comum para se estabelecer uma

"ramificação" ou "arborização" com diferenciação progressiva.

Agora a relação etimológica de célula embrionária, indiferenciada ou "pouco"

diferenciada, com célula estaminal é que eu não consigo descortinar.

Relativamente a todos os outros significados que refere para "stem": linha

de ascendência, originar-se ou desenvolver-se como consequência ou a partir

de algo... também eles me parecem muito apropriados e relacionados com a

capacidade de as células embrionárias (estaminais, porquê?...) originarem

outras células (mais) diferenciadas.

Obrigado pelo seu contributo.

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