segunda-feira, 13 de fevereiro de 2012
A EQUAÇÃO DE DEUS
Minha habitual crónica na "Gazeta de Física":
“God’s equation” foi o título do livro, saído em 1999, da autoria do matemático e divulgador de ciência israelita Amir Aczel, o autor de “O Último Teorema de Fermat” (com tradução portuguesa publicada pela Gradiva). O título refere-se à equação da relatividade geral que Einstein escreveu em 1916, relacionando o espaço-tempo com a matéria-energia. O subtítulo explicita o assunto do livro “Einstein, Relativity and the Expanding Universe”. De facto, logo no ano seguinte, Einstein aplicou a sua equação à cosmologia, verificando que uma solução descrevia a expansão do Universo. Nesses dias, anteriores à descoberta do afastamento das galáxias (mesmo a ideia de galáxia era, na época, extremamente precária), o Universo parecia estático ou quase. É, por isso, natural que Einstein tenha acrescentado um termo – mais tarde chamado constante cosmológica – que contrariava a expansão, uma espécie de ajuda à força da gravidade. O grande físico chamou mais tarde a este termo, introduzido “à mão”, o "maior erro da minha vida". Por um lado, a evidência observacional trazida pelo asrónomo Edwin Hubble nos anos 20 em favor do afastamento das galáxias era inapelável e, por outro, o equilíbrio do Universo conseguido por Einstein era instável.
Mas que os grandes erros feitos por grandes génios podem ser bastante fecundos é mostrado pela atribuição em 2011 do Prémio Nobel da Física a três astrofísicos, de duas equipas concorrentes, que anunciaram em 1998, após cuidadas observações de supernovas do tipo IA (uma observação muito mais fina do que a que foi feita por Hubble), que o Universo não apenas está em expansão, mas está também em expansão acelerada. Era o reconhecimento pela Academia Sueca de que Einstein não estava tanto errado quanto julgava estar. A constante cosmológica é necessária para dar conta das modernas observações, isto é, deve entrar na “equação de Deus”. Em vez de ser uma força a ajudar à gravidade é antes uma força, a que o astrofísico Michael Turner deu o nome de “energia escura”, que funciona como uma anti-gravidade. A sua origem é um dos grandes mistérios da física contemporânea. Terá a ver com a energia do vácuo, um resultado, portanto, da teoria quântica que Einstein tinha dificuldade em aceitar (esse sim o seu maior erro científico!). Mas falharam até hoje todas as tentativas de fazer um cálculo quântico que dê um valor dessa constante minimamente parecido com aquele que as observações requerem.
Aczel, que entrevistou, para escrever o livro, um dos laureados Nobel deste ano, o norte-americano Saul Perlmutter, não podia adivinhar que, uma década volvida, o tema do seu livro viria a dar o prémio maior da Física. Mas a relevância do Prémio Nobel de 2011 está contida na frase de Perlmutter que abre o primeiro capítulo do livro: “O que mais notável é que estamos a responder a questões filosóficas profundas com medidas físicas”. Essas perenes questões incluem as do início e do fim do mundo. A palavra Deus era usada por Einstein com um significado particular: quando ele disse que só queria conhecer “os pensamentos de Deus”, não era uma atitude religiosa no sentido comum, mas a expressão da sua vontade em penetrar na harmonia do Universo, que tão bem se expressa em fórmulas matemáticas conceptualmente simples. No seu livro “Out of my Later Years” (1950), saído cinco anos antes da sua morte, Einstein escreveu: “A teoria da relatividade geral ainda está incompleta uma vez que até agora só foi capaz de aplicar satisfatoriamente o princípio geral da relatividade a campos gravitacionais, mas não ao campo total”. A constante cosmológica não passa de um indício, uma pálida imagem, do campo total, a força unificada com que o sábio sonhou.
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3 comentários:
Não estou bem certo, mas me parece que o autor de O Último Teorema de Fermat é Simon Singh.
Caro Moisés
Confirmo a informação que dei: o livro é de Aczel. Singh tem um livro com o mesmo título, mas não publicado em Portugal: na Gradiva saiu "O Big Bang" e na Temas e Debates "Livro dos Códigos".
Cordialmente
Carlos Fiolhais
Eu não conhecia esse livro que você mencionou. Agradeço pela informação e vou procurar ler.
Obrigado e um abraço!
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