segunda-feira, 7 de abril de 2025

A AVALIAÇÃO TOTALITÁRIA

Os representantes (e beneficiários) da lógica neoliberal têm usado estratagemas, sempre muito certeiros, para transformar a Escola Pública em empresa privada. Um deles é a avaliação de tudo e de todos, a todo o momento. Isto segundo critérios de eficácia, de sucesso, de bem-estar, de felicidade e afins, que eles próprios determinam e que, por mistérios insondáveis (ou talvez não), ministros, directores, reitores,  coordenadores, professores e outros profissionais de educação aceitam, executam, toleram...

Estou disponível a admitir que uma parte substancial destes responsáveis pela educação das novas gerações estão convictos que a pan-avaliação é boa para os sistemas e para as instituições, para o ensino e para a aprendizagem. Alguns procuraram especializar-se a fim de dar suporte "científico" ao processo e não lhes faltaram cursos de pós-graduação, mestrado e doutoramento. Outros ou não têm grande opinião, ou não querem pensar muito no assunto, ou não têm conhecimentos para agirem de modo diverso, ou já não querem saber. 

Em geral, todos participam, para evitarem problemas, arregaçam as mangas e fazem (ou mandam fazer) testes, grelhas, questionários, plataformas, formulários, relatórios, tabelas... Figuras sub-reptícias como o "Medo de Ficar de Fora" (FOMO) e o "Não há Alternativa" (TINA) fazem milagres, para não falar do megafone que é a comunicação social: veja, veja em que lugar ficou o seu país, a sua escola, a sua turma...

É a competição como modo de vida, na sociedade e na escola: estamos numa corrida, com regras que nos são ditadas, temos de ultrapassar o outro, chegar à sua frente... mostrar-lhe que temos mais skills, habilidades, competências... Queremos ser "relevantes" e, se possível, chegar ao pódio. Não é por acaso que ranking é uma palavra importada do desporto de competição...

Este texto surge a propósito da divulgação dos mais recentes rankings de escolas, a que, como se entenderá, não prestei a menor atenção. Do muito que se publicou li apenas dois textos que o Professor António Duarte publicou no seu blogue Escola Portuguesa. São eles:

Dia de S. Ranking (ver aqui);
Rankings e desinformação (ver aqui).

Acrescento um terceiro texto que li posteriormente:

Rankings: o falhanço da Escola (pública e privada (ver aqui).

Nota: Não, não sou contra a avaliação pedagógica da aprendizagem - diagnóstica, formativa e sumativa - pautada por finalidades efectivamente educativas.

13 comentários:

Mário R. Gonçalves disse...

Essa é uma maneira de ver as coisas numa perspectiva política, de política educativa. Mas não é a maneira de ver dos pais que têm de escolher uma escola para os filhos. Se fosse o meu caso, eu recorreria aos rankings , agradecido, por me darem uma indicação de maior probabilidade de sucesso para o meu filho/a. Não me interessa se a população é mais de betinhos ou de bairro; interessa-me sim que os rankings, de forma aproximativa e imperfeita, dão a perceber onde há melhores professores e melhorees condições de ensino. É esta a sua utilidade, e não concordo com a visão da desenfreada competição no quadro do neo-liberalismo - uma análise algo preconceituada e básica a lembrar outras de um célebre pós-moderno. Percebo ( e concordo) que a visão do decisor político não possa ser interesseira como a dos pais, e deverá pautar-se por um esforço de relativização que tenha em conta as condiçóes sociais; mas não por um parti pris contra o modelo liberal.

Anónimo disse...

É inevitável, temos de voltar ao tempo de Salazar!
Em plena noite fascista, tínhamos um ensino elitista, quer dizer, um ensino baseado no estudo, na compreensão e assimilação das matérias escolares por parte dos alunos. Admitia-se que, para além da classe social de cada um, havia alunos muito inteligentes, alunos medianamente inteligentes (a maioria) e alunos pouco inteligentes. Desde então para cá, o mundo deu muitas voltas. Agora, o grande objetivo do ensino é o sucesso, traduzido em altas classificações escolares, para todos, principalmente para os mais pobrezinhos, quer sejam muito ou pouco inteligentes, estudiosos ou preguiçosos. A compreensão, por parte dos alunos, daquilo que os professores lhes pretendem ensinar, é um pormenor educativo sem a mínima importância. Com o foco nas altas classificações de acesso ao ensino superior, as fraudes, principalmente nos colégios privados, proliferam. No tempo do Salazar, os meninos do colégio iam fazer o exame aos liceus do Estado. Depois do 25 de Abril, os professores dos colégios resolvem as provas de exame e escrevem as respostas no quadro para os alunos as passarem para a prova!
Ao fim do dia, os grandes beneficiados são os ricos. Mas, nem assim, essa catrefada de professores, mestres e doutorados, em ciências da educação, muda de opinião. A escola da indisciplina e da violência, com muitas grelhas, projetos, medidas específicas e universais, onde já não se ensina, cumpre o seu objetivo!

Helena Damião disse...

Estimado Leitor, deixo duas notas ao seu comentário, que agradeço:
1) a relação de causa-efeito que aponta está longe de ser real: a posição de uma escola (mais acima ou mais abaixo) num ranking, não tem necessariamente a ver com "melhores professores e melhores condições de ensino" (muitos factores estão pelo meio e o "melhor professor" e o "melhor ensino" reporta-se sempre a um critério político, teórico, social, etc)
2) no meu texto não falei em pais, falei em profissionais que têm responsabilidade na escola pública. Esses, onde me incluo, têm de fazer tudo o que está ao seu alcance para que todos os filhos de todos os pais possam aprender o que não se aprende em mais lado algum e que ajuda a elevá-los como seres humanos (o que é muito diferente de conseguirem o tal "sucesso" que os coloca à frente de...)
Cordialmente, MHDamião

Helena Damião disse...

Estimado Leitor, confesso que não entendi bem o alcance da sua primeira frase que me parece dissonante do resto do texto. A educação escolar tem de ser pautada por valores éticos que estimamos ou, pura e simplesmente, não é educação.
Cordialmente, MHDamião

Anónimo disse...

A minha primeira frase não é no sentido de pedir ao tempo que ande para trás; é só no sentido de comparamos a qualidade e o rigor no ensino e na educação de outros tempos, com o espalhafato, patente nas próprias orientações ministeriais, que tomou conta das nossas escolas EB 1,2,3 + S + JI. Por exemplo, eu cheguei a lecionar movimento relativo na disciplina de Física do 12.º. Atualmente, dado que alguns pobrezinhos não compreendiam o movimento relativo, este foi expurgado das aprendizagens essenciais. Para o ranking das escolas só interessam as altas classificações dos alunos, mesmo que atribuídas com base na fraude. Com este ranking, promotor de más práticas, entre alunos e encarregados de educação, ficamos todos a perder!

Mário R. Gonçalves disse...

Drªa helena Damião, o problema das perspectivas começa logo no título "Avaliação totalitária". Porque inquina logo a independência de opiniões; ora uma avaliação livre em regime democrático promovida por seja quem for que cumpre as regras não é nunca totalitária, é uma entre outras livres abordagens possíveis. Perdoe dizê-lo - sei que é injusto - mas o seu texto reflecte mais tendências totalitárias do que a publicação dos rankings, quase desejando a sua proibição e a sujeição de qualquer avaliação a preconceitos socio-políticos. Os rankings são um instrumento NEUTRO, uma estatística fria, indiferente, objectiva, mecânica. Lamento que haja quem ainda se deixe guiar por dogmas desacreditados dos piores que o passado legou.

Anónimo disse...

Os exames nacionais são avaliações normativas isentas de contexto. Aí reside a sua mecânica neutralidade.
Questão: a avaliação deverá ser cega, isto é, neutra? Se assim é, mede que coisa? O resultado de determinados exercícios? E o que se faz com isso? Não percebo o impacto dos exames nas escolas. Melhoram o ensino? Melhoram a aprendizagem? Para que servem? Um circo preditivo de posteriores matrículas. O melhor é irmos todos viver para o norte…
Claro que é uma avaliação totalitária, imposta por uma teoria de igualdade, que pelos vistos, não passa de neutralidade, completamente estropiada de equidade. Uma igualdade forçada num contexto desigual é, por isso, injusta, revestida de uma ferrugenta mecanicidade que se prolonga no tempo cumprindo a geringonça de sempre.
Uma chatice, professores e alunos trabalharem para mecanicamente acertarem nos exercícios dos exames. Realmente, a Escola é o que é. Um mecanismo.

Anónimo disse...

Caro Mário Gonçalves, que nunca lhe falte um teclado - será este um artefacto neoliberal? - para expressar-se como o fez. E mais não escrevo. (Tem graça, saltar-lhe a cronista ao caminho para teentar (re)conduzi-lo ao redil "progressista"!)

Anónimo disse...

Os exames nacionais são um julgamento do estudo e inteligência dos alunos Na sua génese, destinavam-se avaliar a aprendizagem e inteligência dos alunos. Competia aos examinandos apresentarem provas do que tinham aprendido. O "professor-juiz", fazia, por escrito ou oralmente, perguntas, umas mais fáceis, outras mais difíceis, estas que obrigavam a puxar muito pela cabeça, que, a partir das respostas ou dos espaços em branco, permitiam a classificação dos alunos com bastante objetividade. Esta classificação servia para muitas coisas. Por exemplo, se o examinando fosse classificado com zero a matemática, ficava a saber que para a próxima vez que se apresentasse a exame teria de estudar mais, ou, se não fosse esse o caso, o melhor era mudar de curso. O ensino por grelhas, parte do princípio abstruso de que devemos ser todos, obrigatoriamente, doutores. Se os exames, impedem que chegue a físico nuclear, então acabe-se com os exames. Todos devem ter iguais oportunidades de realizarem exames justos, mas, no fim do dia, não podem ser todos avaliados com vinte, alguns levam uma raposa para casa.
Dito isto, e dado que o nosso sistema de ensino é feito por grelhas, quer dizer os professores pouco, ou nada ensinam, e os alunos passam todos, e passam bem, a fantochada a que oficialmente chamam exames é, efetivamente, uma fantochada.
Vivam os exames verdadeiros!
Abaixo a bandalheira!

Anónimo disse...

Valha-me Deusss! Vou explicar outra vez e mais devagar! Repare! O novo paradigma da escola pretende ser inclusivo! Se é bandalheira ou não?Pois não sei! Logo, o sistema acefalamente igualitário das avaliações deve sofrer alterações. A avaliação deve estar de acordo com os currículos normativos, os percursos curriculares diferenciados, a filosofia multinível do ensino respeitando as capacidades de cada um e a abundância de estrangeiros de diferentes línguas que nos caem nas escolas, o trabalho que é efetivamente feito nas escolas. Eu não posso avaliar da mesma forma águias, patos, besugos, passaroilos e tartarugas. Ora, se estou o ano inteiro a diferenciar e a priorizar o currículo consoante asas, patas, barbatanas e sei lá que outros psicológicos andamentos, não posso chegar ao fim do ano e espetar um papel igualzinho para toda a bicharada, compreende? Portanto, mais valia a avaliação ser de percurso, retendo os alunos que não conseguem suprimir as suas falhas mesmo com pedagogia diferenciada. Não é passar toda a minha gente.
Para que serve a IGE? Arranjem comissões de avaliação e vão buscar aos agrupamentos evidências anuais de todos os ciclos do trabalho feito em termos curriculares, de adequações curriculares e de avaliação. Se querem que os professores façam um trabalho árduo de alfaiataria, quem avalia o sistema tb o deverá fazer. Nada de obter resultados falsos pela preguicite igualitária do exame estatístico! Nós professores não fazemos isso pq as turmas não são homogéneas. Inclusão é diferenciação em toda a linha, desde a partida até à chegada.
Não sei se percebeu…

Anónimo disse...

Quer dizer, Vossa Excelência recebe um mancebo de 17 anos de idade, cidadão da República Popular da China, que não percebe patavina de português, e integra-o, porque a escola, antes de mais nada, é uma instituição eminentemente inclusiva, numa turma do 11.º Ano. No dia a seguir, recebe uma jovem muçulmana do Paquistão, com 17 anos de idade, que não sabe falar nem escrever português, e inclui-a na mesma turma do chinês. E assim por diante...
Com esta arrumação das pessoas e dos saberes, acha que faz sentido discutir a existência de exames?! Com esta bandalheira, o melhor é continuar no ensino feito por grelhas, do qual Vossa ExceLência será especialista, como o meio mais fácil e expedito para que os professores sejam obrigados a passá-los todos!

Anónimo disse...

Ora aí está! Os exames não fazem sentido! São papeluchos com grelhas classificativas anexas que avaliam, não o que o chinês e o muçulmano efetivamente sabem, mas a sua incapacidade de perceber português. Fazem exames em PLNM só a Português…
Então, já que é um especialista em arrumação de pessoas, como faria? Uma turma de chineses e outra de muçulmanos e outra de ucranianos e outra e outra? E se for só dois ou três em cada agrupamento? Aposto que os deixava a abandalhar à porta da escola…

Anónimo disse...

Parem de complicar tudo com "a realidade"! A cronista tem uma "equação linear" - ou será uma constante indeterminada? - que resolve tudo. È que já não se aguenta tanta opinião! (Abaixo a liberdade! - Buñuel.)

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