O simpático Movimento Comer Devagar (Slow Food Movement) surgiu nos finais dos anos oitenta do passado século, em Itália, para contrariar a pressa crescente às refeições, que, por acréscimo, são pré-feitas e padronizadas.
O princípio foi transposto para o ensino, por enquanto, pelo que percebi, para o ensino superior, sendo bem explicada no livro The Slow Professor, assinado por Maggie Berg e Barbara Seeber e publicado no ano passado.
As autoras dissertam sobre a apropriação que a universidade tem feito do discurso empresarial, modificando, em poucos anos, a sua vocação, o que nela se faz, as relações sociais e a própria perspectiva dos professores, que se querem sobretudo investigadores.
Nesta dupla condição são levados a crer que não produzem nem em termos de quantidade nem de qualidade, o que podem e devem. Os critérios e as formas de apresentação dos "produtos" - sobretudo artigos científicos e prestações escolar dos alunos - são estabelecidos por entidades externas e redundam na possibilidade de aplicação no imediato.
Como investigadores passaram a trabalhar para um tipo currículo cada vez mais estereotipado e contabilizável.
Como professores são levados a substituir a sua presença física junto dos alunos, em favor do uso das novas tecnologias (gravando aulas, fazendo cursos ou tirando dúvidas online, etc.).
São, pois, constantemente impelidos a fazer mais e mais, e também a apresentar contas públicas de todos os seus passos, num sistema burocrático que absorve tempo e paciência. O clima de competitividade, afasta-os dos pares e dos alunos. A solidão ganha terreno, a culpa espreita, o cansaço acumula-se. As práticas, claro está, tornam-se desgastantes e, em última instância, não produtivas.
No respeitante à docência, as autoras assinalam a importância de reconsiderar a ideia de ensino agradável, prazeroso. Isso traduz-se na possibilidade de planificarem as suas aulas para os seus alunos, e de voltarem à sala de aula para estar com eles. Pensar com eles em directo, ao vivo, ouvir as dúvidas constitui uma das maiores recompensas de quem é professor.
Gostei de saber que a relação pedagógica (desaparecida da pedagogia nas última décadas pelo facto de se querer fazer crer que a conectividade e as redes suplantaram a convivialidade, ou, pelo menos, que esta depende daquelas) volta a ser considerada.
sexta-feira, 29 de setembro de 2017
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2 comentários:
Que venham muitas vozes iguais a estas para ver se algo muda! Será que as "cabeças pensantes" dos que decidem o que "deve ser feito" ouvem ou lêem estes livros? Duvido... não têm tempo para tanto... é maior do que um post das redes sociais e eles não têm tempo...É isso, falta de tempo: falta de tempo para pensar, para reflectir sobre o que se passa, para "legislar" em consciência, por isso tudo agora é feito a correr...
O que é dito neste artigo, aplica-se, mutatis mutandis, ao ensino secundário. As causas da degradação atual do ensino, e da concomitante "melhoria das aprendizagens" apregoada pelos teóricos das ciências da educação, devem procurar-se nas filosofias e políticas igualitaristas que, entre outros dislates, defendem que um homem é igualzinho a uma mulher e, nas escolas, os professores devem trabalhar para impedir que os alunos inteligentes e interessados saibam mais do que os alunos ordinários. As ordens são claras: os professores só devem ensinar o suficiente para atingir as metas porque os anteriores objetivos mínimos abarcavam demasiados saberes inúteis. Esta decadência da instituição escolar insere-se no âmbito mais vasto da decadência da civilização europeia. Eu não sei ler o futuro nos astros, mas tenho a certeza de que as novas gerações que se vão sucedendo, nesta época de transição, hão de encontrar um novo sistema político-filosófico que substitua o desgastado cristianismo que nos tem regido, por uma nova ordem com carris onde possam voltar a rolar instituições escolares que não reneguem, de uma forma suicidária, a função para que foram criadas.
João Silva
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