Está em marcha, ao nível governamental, uma profunda alteração curricular para o ensino básico e secundário.
Mais uma! É o que ouço dizer a professores e directores com quem tenho conversado. O tom situa-se entre a indiferença e a preocupação. Como em ocasiões anteriores, não dei conta de expectativas da sua parte e ainda menos de entusiasmo.
Compreende-se, cansados de mudanças impostas pelos diversos partidos-poder, para que fique sempre tudo na mesma, percebem nesta alteração, tal como em todas as que tiveram lugar nas últimas décadas, uma forte tendência partidária. E mais, alteração que declara como uma demarcação da tendência partidária anterior, que também havia feito questão de se demarcar da que a precedeu...
É um "eterno retorno", impulsionado pela velha e enganadora oposição entre "esquerda progressiva e liberal" e "direita reaccionária e conservadora". Uso as palavras de Anthony Gardiner, investigador inglês, recentemente convidado pela tutela para se pronunciar, precisamente, sobre a mencionada alteração curricular.
A questão a colocar é se o currículo escolar deve depender da orientação político-partidária vigente num determinado momento (quatro anos, que é o da legislatura), num país ou conjunto de países, e a que não é alheia a opção económico-financeira.
A minha resposta é não, não deve depender.
E aqui há uma especificação a fazer: ainda que todo o currículo não dispense uma base política (a par de outras, como sejam a filosófica, a ética, a epistemológica, a histórica, a social, a pedagógica...), ela tem de ser distinta dos programas dos partidos políticos que alternam no poder.
Se vivemos em democracia, a base política do currículo é essa e não outra, que está, aliás, consagrada na Constituição da República e na Lei de Bases do Sistema Educativo.
Assim, os partidos políticos, quando ascendem ao poder, deveriam pugnar para que toda e qualquer reforma ou reorganização curricular que empreendessem teria de assentar nesse valor - porque é de um valor que, efectivamente, se trata - e não impor as suas particularidades doutrinais elevadas a certezas absolutas, sempre com o argumento de que elas, e só elas, salvarão todos os alunos, independentemente das suas especificidades, e também a sociedade, nas suas mais diversas acepções.
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2 comentários:
Costuma chamar-se a essa prática do poder partidário "engenharia social": fazer das pessoas peças de uma engrenagem que se pode mexer, programar, desta ou daquela maneira, para produzir salsichas ou alheiras.
O odioso dessa maneira de fazer política é que os cidadãos são manipulados ao sabor das ideologias como marionetes sem vida. Não interessa nada, nem mesmo no debate se o houver, o que as decisões vão acarretar para a vida profissional e pessoal das "vítimas": a escola é vista como um grande mecanismo com botões, ora liga aqui, ora desliga acolá, eles que se calem e cumpram.
O curioso é que os maiores criminosos deste tipo de crime são os ditos socialistas, ou de esquerda. Têm a mania de que mexendo aqui, desligando acolá, vão mudar o mundo para melhor. Quem der não houvesse governo. Ou houvesse um que ficasse quieto, fosse a banhos ou caçar gambuzinos.
Não entendi, Helena. É uma contradição nos termos uma definição de curriculo escolar distinta dos partidos políticos que se alternam no poder. Desde logo, porque nem sequer existe um "direito natural" que se aplique a politicas da educação. Cada partido tem um programa pedagógico, epistemológico, etc, e um sistema de valores, distinto dos outros. Não poderia deixar de ser assim, ou não estaríamos em democracia, e nem sequer vem grande mal ao mundo por causa disso.
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