terça-feira, 26 de março de 2013

Audiência de Vasco Teixeira, director da Porto Editora

http://ilcao.cedilha.net/?p=10262

«Uma fervente sopa de letras» [Nuno Pacheco, "revista 2", 24.03.2013]

Depois de tanta esperança e de tanto esforço

Nas últimas duas décadas tem sobressaído um certo tipo de discurso sobre a educação para a cidadania, além de que se encontra invariavelmente representado nas orientações internacionais para a educação formal e, em sequência, nas directrizes curriculares nacionais.

A cidadania tornou-se um tema de tratamento obrigatório em todas as escolas, por todos os educadores e professores, desde o jardim-de-infância até ao ensino secundário e também no ensino superior.

As áreas disciplinares e disciplinas foram reconvertidas para abordar na perspectiva da educação para a cidadania os temas que lhes são específicos, ou pelo menos alguns deles. Além disso, a cidadania foi estabelecendo os seus próprios temas, que não param de se desdobrar: educação para a saúde, rodoviária, para a paz, para a convivência, para a multiculturalidade, para a diferença, etc, etc, etc,

A educação para a cidadania tornou-se o centro do currículo escolar.

Isto no pressuposto de que seria a (única) solução para acabar com os males da humanidade: poluição, racismo, obesidade, violência, desigualdade, comportamentos de risco e tudo o mais que impedisse a harmonia e a felicidade na terra...

Depois de tanta esperança e de tanto esforço, eis que um sujeito ainda jovem, com pelo menos doze anos de aprendizagem da cidadania, saiu-se, em público, com uma expressão simples de entender e, seguramente, representativa do modo de pensar vigente. A expressão foi "peste grisalha". O sujeito ainda jovem integra o governo da nação. A nação, deixou breves apontamentos, mas não estremeceu. E tudo já foi esquecido.

Mas não devia. Porque este tristíssimo caso é (mais) uma evidência do falhanço do caminho que trilhamos na educação para a cidadania.

sábado, 23 de março de 2013

Ainda o deputado Carlos Peixoto e um comentário ao meu post "Os filhos da praga cinzenta"


“Outrora, a velhice era uma dignidade; hoje, ela é um peso” (François Chateaubriand, 1768-1848).

Foi com indisfarçável emoção que me deparei com o comentário de um estimado aluno dos idos de 60, ínsito no meu “post”, “Os filhos da praga cinzenta”, aqui publicado em 15/04/2013 (cf., comentário com o nikname Jack,  do dia 22 do corrente, pelas 02:16).

Numa altura em que o português sofre de tratos de polé até de indivíduos carregados de diplomas universitários (bem nos basta o Relvas com a canga pesada de um diploma de licenciatura de pechisbeque), é sempre grato ler uma prosa  bem redigida que faz jus a uma escola de exigência  onde este meu antigo aluno se  diplomou  e em que, não me canso de o repetir, iniciei a minha saudosa docência em terras do Índico: a Escola Industrial  Mouzinho de Albuquerque de Lourenço Marques.

Mas regressemos à essência de um assunto que tem feito correr rios de tinta. Ou seja,  à triste e desastrada tirada de um jovem trintão deputado do PSD, de seu nome Carlos Peixoto, tomando-a com aquilo que julgou ser um  momento de glória seu e dos seus dotes oratórios. .E aqui não posso deixar de me interrogar: será que a exemplo da imortalizada personagem de Oscar Wilde, fez ele um pacto com o demónio para que o mantivesse  livre de cabelos brancos por si denominados como “peste grisalha”? Se assim foi, para esconder a vergonha futura (a juventude não é eterna!) de cãs suas encanecidas bastar-lhe-á usar  o  “Restaurador Olex”, dos reclames radiofónicos da minha juventude e, ao que julgo, de seu pai. Hoje, com a passagem inexorável do tempo,  sou representante  de uma grande franja do eleitorado português caído no  esquecimento de quem se senta em São Bento não pode deixar de saber  porque, como nos ensina a sabedoria popular,  não é com vinagre que se apanham moscas. E, muito menos, votos que, porventura, o possam reconduzir a nova legislatura. Ou seja, deixou, assim,  de ser uma questão de desrespeito pela velhice para passar a ser uma questão de falta de inteligência eleitoral
.
Na minha modesta condição de simples cidadão, atingido pelas medidas punitivas do actual Governo do PSD contra os reformados, apresso-me a recordar-lhe  uma homenagem  que não posso deixar de citar. Mais concretamente, reporto-me  à comovente letra da canção do brasileiro Roberto Carlos, intitulada “Meu Querido, Meu Velho, Meu Amigo”, dedicada a seu pai e  tornada hino de homenagem aos pais de todo o mundo, sejam eles ou não progenitores de homens do mundo da política:
 
“Esses seus cabelos brancos, bonitos, esse olhar cansado, profundo.
Me dizendo coisas, num grito, me ensinando tanto do mundo...
E esses passos lentos, de agora, caminhando sempre comigo,
Já correram tanto na vida,
Meu querido, meu velho, meu amigo
Sua vida cheia de histórias e essas rugas marcadas pelo tempo,
Lembranças de antigas vitórias ou lágrimas choradas, ao vento...
Sua voz macia me acalma e me diz muito mais do que eu digo
Me calando fundo na alma
Meu querido, meu velho, meu amigo
Seu passado vive presente nas experiências
Contidas nesse coração, consciente da beleza das coisas da vida.
Seu sorriso franco me anima, seu conselho certo me ensina,
Beijo suas mãos e lhe digo
Meu querido, meu velho, meu amigo
Eu já lhe falei de tudo,
Mas tudo isso é pouco
Diante do que sinto...
Olhando seus cabelos, tão bonitos,
Beijo suas mãos e digo
Meu querido, meu velho, meu amigo”.



sexta-feira, 22 de março de 2013

50 lições de filosofia



Está já disponível o blog de apoio do novo manual escolar de filosofia intitulado 50 Lições de Filosofia, da autoria de Aires Almeida, Célia Teixeira e Desidério Murcho. Trata-se de um manual para o 10.º ano de escolaridade português. No blog iremos dar apoio a professores e alunos que usarem o nosso manual, e disponibilizaremos também materiais complementares. Todas as críticas e sugestões são bem-vindas!

IMAGINE


O livro "Imagine" de Jonah Lehrer (Lua de Papel), apresentado por Carlos Fiolhais: aqui.

A FÍSICA DO KLIMT


A física que está a estudar uma pintura do Klimt é Benilde Costa, do Departamento de Física da Universidade de Coimbra. Com a devida vénia, transcrevemos notícia, assinada por CP, do "Campeão das Províncias" (em cima o quadro de Klimt que está a ser examinado):
"Uma especialista do Departamento de Física da Universidade de Coimbra colabora com a verificação da autenticidade de um quadro do famoso pintor Gustav Klimt, tendo recorrido para encontrar a verdade a um aparelho utilizado pela NASA em Marte.
A investigadora Benilde Costa refere que “as medidas científicas já foram realizadas e estão agora em fase análise, com os resultados a serem anunciados em Setembro, na Croácia”, mas adianta que, para já, “tudo indica que a obra é verdadeira”, esperando que “os resultados obtidos forneçam clareza à controvérsia gerada em torno da autenticidade do quadro”.
A polémica gerada em torno da autenticidade de um dos primeiros quadros do pintor Gustav Klimt, que se julgava perdido e que foi encontrado numa garagem austríaca, determinou a chamada da ciência para verificar se a obra - Trumpeting Putto - é, ou não, verdadeira.
A controvérsia instalou-se quando o coleccionador Josef Renz adquiriu a obra do pintor, mundialmente conhecido pelas suas obras eróticas de mulheres - especialmente pelo quadro “O Beijo”, encontrada numa garagem do Norte da Áustria -, com historiadores de arte a virem, de imediato, questionar a autenticidade da obra.
Da discussão acesa resultou a decisão de solicitar peritagens científicas para esclarecer a autenticidade do fresco “Trumpeting Putto”, que fez parte do tecto do estúdio Klimt, em Viena, onde o pintor viveu com seu irmão Ernst, entre 1883 e 1892. A obra desapareceu quando um elevador foi instalado no edifício e pensava-se que tinha sido destruída.
Uma equipa de sete investigadores de Hannover (Alemanha), Valladolid (Espanha) e de Coimbra (Portugal), especialistas em técnicas analíticas não invasivas (não destrutivas da obra), nomeadamente por espectroscopia de Mössbauer e de Raman, e por fluorescência de RX, foi chamada para resolver o mistério.
Especialista em Espectroscopia de Mössbauer, Benilde Costa, do departamento de Física da Universidade de Coimbra (UC), ficou responsável pelas medidas e análises dos resultados através desta técnica nuclear. Para tal recorreu a um espectrómetro portátil, um aparelho usado pela NASA para estudar rochas marcianas, através do qual é possível identificar os pigmentos usados na pintura.
A Espectroscopia de Mössbauer permite identificar os pigmentos usando radiação gama e o espectrómetro utilizado regista a radiação reemitida pelo objecto em estudo, e sendo miniaturizado e portátil, dispensa a extracção de amostras desses mesmos pigmentos”, conforme explica a especialista.

É a economia!


Na revista Visão de 28 de Fevereiro, num artigo intitulado Os erros de Gaspar, chamou-me a atenção as seguintes declarações atribuídas a João César das Neves: A mecânica, a física e química, como estudam coisas simples, como motores, planetas ou sal, dão sempre certo. Mas isso não é por serem melhores [do que a economia]. As declarações falam por si, num mundo em que, com bastante sucesso, nos conseguiram impor uma sub-cultura económica que se tornou dominante.

De facto, liga-se o rádio e lá está a bolsa a subir e a descer todos os dias, a par do futebol e do trânsito, num jargão omnipresente, qual ladaínha encantatória a Mamon, repetitiva e pobre de informação. Liga-se a televisão, o mesmo, ou pior.

Não vou falar da crise e das mentiras com que nos enganam. Sobre isso só digo que, quando começarem a faltar as batatas e as couves, o dinheiro, sobretudo o virtual, de pouco servirá. Mas, infelizmente, não sou optimista, a história, embora quase nunca se repita, aumenta quase sempre de preço, e mostra que, nessas alturas, costuma acabar a retórica e começar a violência.

Lavoisier foi economista e gestor (actividades que são distintas), nas horas vagas, e foi a sua acção como gestor que o levou à guilhotina, não a química. Nessa altura nem a economia nem a ciência eram ainda o que são hoje, actividades profissionais omnipresentes no quotidiano das pessoas. Nem a gestão podia gerar os lucros e prejuizos imorais que pode gerar hoje, levando não só os melhores, mas também os ambiciosos e os que não têm escrupulos a procurá-la. Adam Smith, contemporâneo de Lavoisier ainda não tinha sido canibalizado pelos cínicos e oportunistas. O seu livro mais importante ainda tratava da moral na economia. O próprio cinismo e o oportunismo não se tinham tornado doutrinas económicas respeitáveis.

Não é por a economia ser uma ciência humana que se torna mais complexa que as ciências físicas. E também não é por as pessoas serem mais complexas que as bactérias, cérebro, ou coração, que a economia é mais difícil ou falível que a biologia, neurociências, ou medicina. Até porque os modelos económicos costumam ser, em geral, matematicamente mais simples que os da física, química ou mecânica. Os modelos meteorológicos e do clima também falham. Mas falham menos porque apresentam resultados com margens de erro objectivas.

A utilização cada vez mais complexa da matemática e dos modelos em economia surgiu, segundo Robert Frank, como uma forma de se mostrar competência, não porque fosse realmente necessário. No seu livro mais famoso, Keynes diz que esse é um capítulo que pode ser saltado. Entretanto os modelos aumentaram de complexidade e começaram a seu utilizadas simulações computacionais. Mas as equações não pensam pelas pessoas, em especial quando nos modelos são introduzidas equações had hoc. Como as famigeradas cópulas Gaussianas que entravam no cálculo dos riscos para as seguradoras de forma automática e ajudaram a esconder durante tempo demais o escândalo do subprime nos EUA que esteve na origem da actual crise na Europa. Ao aumento da importância da modelação, há ainda que juntar a ideologia no seu estado mais puro: os delírios de crescimento e lucro infinitos, os pesadelos do empobrecimento obrigatório e a renovação da doutrina do choque e do capitalismo de desastre (nas palavras de Naomi Klein). Dizem-nos que são assuntos técnicos mas não é verdade. São ideologia na sua pior forma, fingindo não o ser, disfarçada de objectividade.

Talvez os modelos económicos pudessem ter maior capacidade preditiva se nestes fosse incluída menos ideologia e subjectividade e, sobretudo, se não estivessem ao serviço de agendas ocultas. Tenho poucas dúvidas, contrariamente a alguns economistas, que, se fossem incluídas todas as incertezas, no final poder-se-ia ter uma resposta cientificamente válida. Mas essa resposta teria com certeza margens de erro grandes, ou daria resultados indesejados, os quais não serviriam os interesses dos políticos que usam os modelos. E, infelizmente é para isso que servem os modelos económicos: servir interesses.

E os interesses é o que mais ordena. Um prémio chorudo agora, um bom lugar como consultor no futuro. E tudo isso acaba por ficar demasiado caro porque para ser obtido podem provocar-se, se necessário, embora muitas vezes de forma involuntária, colapsos e crises económicas. Assim, há que falsificar os resultados dos modelos para servirem os objectivos e as agendas ocultas. Ora isso não é ciência nem economia. E, se é para nos aborrecerem todos os dias com a economia, ao menos que sejam honestos e não se desculpem a dizer que é mais complicada do que a física, química ou mecânica: digam antes que certos economistas têm menos escrúpulos em fazer batota, têm ideologias ou seguem agendas ocultas.

Does Spelling Matter?

Reviewed: Does Spelling Matter? by Simon Horobin
http://www.newstatesman.com/culture/2013/03/reviewed-does-spelling-matter-simon-horobin

It is a nice idea that spelling should be more phonetic and should represent better the sound of the words, until you realise that not everybody chooses to pronounce the words in the same way.

(via Instapaper)

quinta-feira, 21 de março de 2013

Nunca Mais


A investigação sobre os crimes da ditadura militar de J. Videla, que chefiou os destinos da Argentina entre 1976 e 1983, esteve a cargo da Comissão Nacional Sobre O Desaparecimento De Pessoas (CONADEP), chefiada pelo físico e escritor, Ernesto Sábato. As 50 mil páginas de depoimentos, não deixam dúvidas quanto à barbaridade da ditadura: trinta mil mortos, trezentos e quarenta campos de concentração e nove mil desaparecidos. A comissão resume desta maneira o que foi a crueldade da ditadura:

«As grandes calamidades sempre geram lições e, sem dúvida o drama mais terrível que a Nação sofreu em toda a sua história servirá para compreendermos que só a democracia é capaz de preservar o povo de tal iniquidade; que somente ela pode manter e salvar os sagrados e essenciais direitos da criatura humana. Só assim poderemos ter certeza de que NUNCA MAIS em nossa pátria acontecerão os factos que nos fizeram tragicamente famosos no mundo civilizado.»

Em um país, que até há pouco tempo entre nós era considerado um país do terceiro mundo, houve coragem para se elaborar um relatório desta natureza. No meu país, todavia, faltou denodo à democracia para investigar os crimes cometidos durante as várias décadas de fascismo. É hábito latino passar uma esponja pelo passado, e deixar que caudilhos, com rosto de democrata, envolvidos em escândalos, em corrupção e até em assassínios, regressem à cena política e mediática. A eleição de S. Berlusconi para o governo italiano e a impunidade, em Portugal, de eminentes historiadores e escritores envolvidos na ditadura do estado novo, são dois exemplos flagrantes; depois do 25 de Abril, estes historiadores e escritores, continuaram alegremente nas suas funções, e perpetuaram-se pelos jornais diários como cronistas. Esta leviandade permitiu que Sá – Carneiro fosse primeiro-ministro, apesar das suas ligações ao fascismo, e que espalhasse pelo país um mundo onírico, mundo no qual que estamos prestes a entrar: o regresso ao fascismo.

A igreja católica foi também um dos pilares do estado novo, e alguns senhores ainda hoje se recusam a ver o evidente, e até negam o seu envolvimento com a ditadura. O perdão em mim tem limites, e não posso conceder indulto a senhores que de forma consciente permitiram que milhares de pessoas neste país morressem tuberculosas. Quando reverenciamos criminosos, é porque os aceitamos, quando nos entregamos ao mutismo, é porque aceitamos. A união europeia está a caminhar a passo estugado para o fascismo, e a igreja, estultamente, adiantou-se e resolveu eleger para o pontificado um senhor com um passado nebuloso e de complacência com o regime de J. Videla (isto para muitos argentinos). Para que não restem dúvidas sobre a posição pendular da igreja temos que ler o relatório de Sábato:

«1-Sobre atitudes de alguns membros da Igreja
O episcopado Argentino condenou reiteradamente a modalidade repressiva que esta comissão investigou. Não haviam transcorrido dois meses após o golpe de 24 de Março de 1976 quando a Conferência Episcopal, em assembleia-geral, qualificou de “pecado” os métodos empregados. Em Maio de 1977 publicou, no mesmo sentido, um severo documento precedido de comunicações aos membros da junta militar.
Lamentavelmente houve membros do clero que cometeram ou avaliaram, com sua presença, com seu silêncio e até com palavras justificativas, estes mesmos factos que haviam sido condenados pelo Episcopado.»

É neste último parágrafo que muitos argentinos e a senhora presidente Kirchner incluem o Papa Francisco. E não é o subterfúgio da igreja, dita universal, de que a suspeita e a calúnia vêm de grupos de extrema-esquerda que apaga o passado de Bergoglio. Tem que ser o próprio, em nome da verdade, a explicar a sua posição.

No relatório estão vários depoimentos contra padres que rezam factos impensáveis:

«…Também ouvi-o defender e justificar as torturas …» (Depoimento de Luis Velasco)
«…Esclarece que Videla foi a alma caridosa que elaborou este plano para não perder as inteligências…diz que os jovens são atendidos por psicólogos e sociólogos, que há equipas médicas para a saúde e que, aos irrecuperáveis, é possível que alguém piedoso lhe dê uma injecção e o irrecuperável adormece para sempre…» (Denúncia apresentada pelo desaparecimento de Carlos Óscar Lorenzo)
«…mostrou-nos uma lista com muitos nomes e disse-nos que nos fixássemos no nome de nosso filho; aqueles que tinham uma cruz queria dizer que estavam mortos, se não, que estavam vivos…» (Denúncia de Adelina Burgos de Di Spalatro)

Os depoimentos e as denúncias, não deixam margem para conjecturas hipotéticas. A igreja católica argentina, para além de compactuar com a ditadura, foi cínica e hipócrita.
Agora espero que o Papa esclareça a sua posição e que siga os passos de S. Francisco de Assis, porque a nuvem que paira sobre ele pode bem ser um céu sombrio. Sugiro também que não defenestre poeira para os olhos dos cristãos, com o seu franciscanismo. Uma coisa é sentir o sofrimento na pele, como o sente hoje o presidente Cavaco Silva, e outra, bem diferente, é a verborreia para iludir o povo. Por fim, recomendo, a sua santidade, a leitura da biografia do santo, escrita por G. K. Chesterton.

A felicidade de aprender

Chegou ao fim, há pouco mais de uma hora, o primeiro Dia Internacional da Felicidade, declarado pela Organização das Nações Unidas.

Podendo parecer que não, a felicidade é um assunto central na Pedagogia. O seu debate foi convocado logo nos primeiros textos que se reportam à educação formal e nunca mais desapareceu do horizonte dos filósofos que se interessaram e interessam por esta área. As orientações desse debate têm, naturalmente, sido diversas, como é compreensível em assunto tão subjectivo, mas a sua extensão e inflexões daria, no presente, um tratado do maior interesse.

Num registo leve, que não deixa de ser profundo, várias têm sido as obras a tocar no tema. Aqui deixo uma breve passagem duma que considero particularmente bem conseguida: A felicidade de aprender e como ela é destruída, da autoria de François de Closets
"Não entendo como a felicidade de aprender é partilhada por tão poucos  - essa felicidade que iluminou toda a minha vida, e fez dela uma existência sem rotina e sem tédio. Gostaria de perceber como é possível que o prazer da descoberta não desempenhe na vida da maior parte das pessoas o mesmo papel que nelas desempenha o prazer de amar ou de possuir (...)
Nenhuma sociedade havia dado, antes da nossa, instrução a todas as crianças e liberdade a todos os adultos. Esta dupla oportunidade, a crer no sonho social de muitos utopistas, deveria ter despertado o gosto pela iniciativa, o desejo pela investigação, uma curiosidade insaciável. Aconteceu, apenas, que esse sonho não se concretizou. O que vemos à nossa volta é uma passividade generalizada, um conformismo moldado pela pressão mediatico-publicitária. Todas as atitudes se tornam previsíveis, todas as reacções esperadas - os sinais de um condicionamento tristemente eficaz estão por toda a parte visíveis.
(...)
As sensações que experimentara no contacto com o mundo da ciência - a vertigem da ignorância, a angústia do erro, o esforço de aprender, o prazer da descoberta, o jogo da simplificação -, voltei a encontrá-las na abordagem de outros domínios, quando a ciência deixou de me interessar. À beira dos sessenta anos, continuo a sentir-me como sobre uma linha de partida, pronto para novas expedições. No dia em que a minha curiosidade esmorecer, nesse dia saberei que o meu tempo terá passado.
Essa felicidade que busco através da curiosidade não é, no entanto, uma extravagância nem, aliás, uma esquisitice da minha natureza. Há mais gente assim. Gente com pude partilhar uma espécie de cumplicidade gustativa e um pouco glutona. Há mais gente do que se pensa a cultivar o seu jardim secreto. Diferem todos uns dos outros, é certo; cada jardim tem as suas flores e os seus arbustos próprios, mas o que une todos os jardineiros é o amor com que se entregam à tarefa, unicamente interessados no prazer que ela lhes dá."
Referência completa: Closets, F. de (2002. Edição original: 1996). A felicidade de aprender e como ela é destruída. Lisboa: Terramar, 9 a 13.

quarta-feira, 20 de março de 2013

Sugar, not fat, exposed as deadly villain in obesity epidemic

Lustig's book, Fat Chance: The Bitter Truth About Sugar has made waves in America and has now been published in the UK by 4th Estate. As a paediatrician who specialises in treating overweight children in San Francisco, he has spent 16 years studying the effects of sugar on the central nervous system, metabolism and disease. His conclusion is that the rivers of Coca-Cola and Pepsi consumed by young people today have as much to do with obesity as the mountains of burgers.

"Passou-me ao lado"

Dois professores da universidade estadual da Pensilvânia, um médico (Michael J. Green) e um ilustrador (Ray Rieck), publicaram uma história aos quadradinhos sobre o erro médico numa prestigiada revista clínica (Annals of Internal Medicine), cujo título é Missed it (Passou-me ao lado).


O primeiro diz tratar-se de uma história autobiográfica com vinte anos, quando se encontrava ainda em a formação, mas que “iria assombrá-lo ao longo de toda a sua vida.
"Um jovem médico está de banco no hospital, à espera de conseguir dormir umas horas nessa noite, quando recebe um telefonema a dizer que tem de ir examinar um doente que acabou de dar entrada na urgência. Ao longo da noite, o doente, que sofre aparentemente de um problema pulmonar, piora apesar dos tratamentos que lhe vão sendo administrados. E acaba por morrer. A seguir, quando o médico recebe o resultado da autópsia, percebe que não soube ver um sintoma-chave do doente (um sopro cardíaco), apesar de ter estado, literalmente, à frente do seu nariz. Fez um diagnóstico errado – um erro fatal."
Falar do erro, analisar o erro, com saber e ponderação, seja em medicina seja noutra área profissional que requeira grande responsabilidade pelas pessoas, constitui um passo fundamental para a sua desocultação e, em sequência, para a sua transformação em conhecimento, para a sua superação e para a sua prevenção.

Nota: Tive conhecimento desta história através do artigo de Ana Gerschenfeld, saído no Público (em papel) de hoje, dia 20 Março, página 29.

A EVIDÊNCIA DA EVOLUÇÃO


Carlos Fiolhais apresenta o livro "Evidência da Evolução" de Jerry Coyne recentemente saído na Tinta da China: http://nautilus.fis.uc.pt/rc/?p=950

German researchers publish full Neanderthal genome

http://www.richarddawkins.net/news_articles/2013/3/20/german-researchers-publish-full-neanderthal-genome

The Max Planck Institute for Evolutionary Anthropology, in Leipzig, Germany, hascompleted the genome sequence of a Neandertal and makes the entire sequence available to the scientific community today.

(via Instapaper)

terça-feira, 19 de março de 2013

PEN Clube contra a nova ortografia

Os sócios do PEN Clube Português, reunidos em Assembleia Geral no dia 18 de Março de 2013:

1. Defendem a necessidade de suspensão imediata da aplicação do AO, a fim de que possa ser retomada uma discussão pública séria sobre um assunto que não pertence ao foro político nem económico mas linguístico e cultural;

2. Consideram que, tal como os autores dos pareceres qualificados sobre o Acordo, que em 2008 foram completamente ignorados e cuja opinião deve ser tomada em consideração, também os escritores, que trabalham com a matéria-prima da língua e que na sua grande maioria sofrem com os resultados da amputação das raízes em muitas palavras, tornando estas irreconhecíveis, têm que ser ouvidos, quer individualmente, quer através das organizações que integram, como a Associação Portuguesa de Escritores (APE), o PEN Clube Português e a Sociedade Portuguesa de Autores (SPA).

http://ilcao.cedilha.net/?p=10222

A importância das humanidades

It's not to say that technological innovation is not a creative enterprise. Google changed the world, absolutely. But it didn't make the world. It organized it. And that's great, but if you're not creating things, and all you do is organize other people's stuff, then you're Wikipedia. And Wikipedia is awesome, but who is going to write the stuff that goes into Wikipedia?

http://news.stanford.edu/news/2013/march/rachel-maddow-speech-031913.html

DESCOBERTO MECANISMO CHAVE NA FORMAÇÃO DOS GLÓBULOS VERMELHOS

Publicado primeiramente na imprensa regional.


A cada segundo são produzidos cerca de 2,4 milhões de glóbulos vermelhos numa pessoa saudável. Mais de cem mil milhões todos os dias! Este número pode parecer muito grande mas é a realidade que permite a renovação regular e normal dos cerca de cinco milhões de glóbulos vermelhos, ou eritrócitos, que existem num mililitro de sangue, conferindo a este a sua característica cor vermelha. Cerca de um quarto de todas as células que compõem o nosso corpo são eritrócitos!


Cada eritrócito tem um tempo de vida médio de entre 100 a 120 dias. Depois de mais de 3 meses a transportar oxigénio e dióxido de carbono por todo o corpo, a ter papel decisivo na regulação do ferro presente no organismo, entre muitas outras funções, estas células sanguíneas “envelhecem”, perdem a flexibilidade necessária para atravessar a rede apertada de vasos capilares e vénulas e são retirados de circulação pelo baço.

Onde é que são formados estas células que nos oxigenam de vida? Num tecido especializado chamado hematopoiético, presente na medula óssea de alguns ossos (diferentes ao longo da vida) e num processo de diferenciação celular designado por eritropoiese. Este processo envolve uma série de transformações celulares sucessivas a partir de células estaminais hematopoiéticas presentes naquele tecido.

Se por um lado os vários passos celulares da eritropoiese são conhecidos há muito tempo, por outro lado os mecanismos bioquímicos, a base molecular subjacente à transformação de uma célula estaminal nas sucessivas células precursoras ainda não é totalmente compreendida.

A malformação de glóbulos vermelhos, tendo um grande impacto na saúde do indivíduo, resulta de uma deficiente composição das biomoléculas que formam o eritrócito. Ao se identificar as primeiras e subsequentes etapas bioquímicas que estão e são a base da diferenciação, poder-se-á desenvolver novas terapias dirigidas para o epicentro do problema, e assim eventualmente tratar diversas doenças como sejam a anemia falciforme, entre outras.

Para isto contribui uma descoberta publicada num artigo na edição online de 14 de Março da revista Science. Uma equipa de investigadores suíços (da Escola Federal Politécnica de Lausanne) e espanhóis (do Centro de Regulação Genómica de Barcelona) descobriu os mecanismos moleculares que regulam um passo importante na formação dos eritrócitos conhecido por mitofagia. Este consiste na eliminação das mitocôndrias (organelos intracelulares envolvidos na respiração celular, assim como em outros processos essenciais da vida) presentes no citoplasma das células hematopoiéticas. 

A mitofagia é conhecida há muito tempo, mas a descoberta agora publicada identifica uma cascata de reacções envolvendo proteínas (o sistema KRAB/KAP1 e micro RNAs que regulam a sua transcrição) que em concerto modulam de uma forma subtil e sofisticada a degradação das mitocôndrias presentes no eritroblasto percursor do eritrócito.

Esta descoberta desvenda um potencial alvo terapêutico não só para as doenças que envolvem uma deficiente formação dos glóbulos vermelhos, mas também para outras doenças em um mau funcionamento das mitocôndrias é verificado.

Por fim, este conhecimento vem potenciar a possibilidade de produção de eritrócitos em laboratório e assim resolver problemas de saúde relacionados com estas células essenciais à vida.

António Piedade

Referência do artigo: Isabelle Barde, Benjamin Rauwel, Ray Marcel Marin-Florez, Andrea Corsinotti, Elisa Laurenti, Sonia Verp, Sandra Offner, Julien Marquis, Adamandia Kapopoulou, Jiri Vanicek, and Didier Trono. A KRAB/KAP1-miRNA Cascade Regulates Erythropoiesis Through Stage-Specific Control of Mitophagy. Science, 14 March 2013 DOI: 10.1126/science.1232398

segunda-feira, 18 de março de 2013

MOOC: revolução ou fantasia?

Já falámos aqui dos cursos online em quantidade industrial (MOOC: massive open online courses), e vale a pena ler aqui o resultado do inquérito aos professores que já leccionaram nos MOOC.

Do meu ponto de vista, estes cursos são mais uma tolice pedagógica, limitando-se a continuar a tolice do ensino medieval em que ainda estamos mergulhados. Inventámos a ideia engenhosa de um professor a falar para várias dezenas de estudantes num tempo em que quase não havia livros, estes eram caros e difíceis de obter. Neste contexto, e dado não haver na altura meios de gravação de áudio, fazia sentido pagar a um professor para recitar um livro para dezenas de alunos, que diligentemente tentavam anotar o máximo que conseguiam. Porque as escolas e universidades se caracterizam por um conservadorismo que as faz continuar a ensinar que a Terra está no centro do universo cem anos depois de se saber o contrário, continuamos a usar aproximadamente o mesmo método de ensino, que era razoável há trezentos anos.

Mas hoje esse método de ensino não faz sentido porque temos livros e textos baratos, tanto em papel como electrónicos, que quase qualquer pessoa pode comprar (e quem não pode comprar, o estado pode pagar em seu lugar, tal como paga aos professores para dar aulas). Quem quiser aprender história da pintura, física quântica ou seja o que for só precisa de se deitar a estudar: a bibliografia de qualidade está aí para quem a quiser estudar. O único papel relevante de um professor é discutir ideias com os alunos e avaliar os seus trabalhos e exercícios; a exposição oral (quase sempre desorganizada e sem rigor) do que os estudantes podem ler num livro ou texto bem organizado e rigoroso é pura tolice.

A maior parte dos estudantes nada aprendem com os professores, em qualquer caso, excepto coisas artificiais para pôr nos exames e que são felizmente esquecidas duas semanas depois. O único estudo que conta realmente é o estudo individual de livros e artigos, a redacção de trabalhos, a resolução de exercícios inteligentes e a discussão do que desse modo se aprendeu com colegas e professores. A exposição oral de matérias, que é tudo o que as pessoas associam ao ensino, é a parte irrelevante e até perniciosa do ensino, pois consiste demasiadas vezes em caricaturas da realidade das coisas.

Assim, os MOOC já existem há muito tempo. Basta que quem quiser estudar X se junte num fórum da Internet para discutir os livros e textos que há muito estão disponíveis, e basta que nesse grupo algumas pessoas tenham mais conhecimento do que outras. Não é preciso dar-lhe um nome chique e ainda menos fingir que é uma novidade, sobretudo se, como se viu no inquérito divulgado no Chronicle of Higher Education, a maior parte dos professores gravou vídeos com eles mesmos falando (!) para dar aos alunos. Duh? Qual é a metafísica pedagógica assim tão extraordinária de um passarão a falar coisas vagas quando pode escrever coisas rigorosas?

In the Digital Era, Our Dictionaries Read Us

In the Digital Era, Our Dictionaries Read Us - The Chronicle Review - The Chronicle of Higher Education
http://chronicle.com/article/In-the-Digital-Era-Our/137719/

The days of displaying a thick Webster's in the parlor may be past, but dictionaries inhabit our daily lives more than we realize. "There are many more times during a day that you are interacting with a dictionary" now than ever before, says Katherine Connor Martin, head of U.S. dictionaries for Oxford University Press. Whenever you send a text or an e-mail, or read an e-book on your Nook, Kindle, or iPad, a dictionary is at your fingertips, whether or not you're aware of it.

(via Instapaper)

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