terça-feira, 7 de abril de 2020

Carta Aberta ao Professor A. Galopim de Carvalho

Por esta Carta Aberta poder ser tida por ousada, só depois de ter consultado o meu travesseiro, lha endosso, Professor A. Galopim de Carvalho, tendo como leitmotiv o vosso post, publicado ontem no DRN, intitulado: “18 anos depois de Abril”. 
Pelo contrário, tem ela fundamento no respeito que voto ao vosso estatuto académico de professor catedrático e pela leitura atenta, com grande proveito meu, dos textos de divulgação cientifica de inspiração pedagógica aqui publicados. 
A minha ousadia, a ter, porventura, havido, não foi, de forma alguma, intencional, residindo, apenas, na minha condição de "retornado" de Moçambique tão pobre de fortuna quando lá cheguei e tanto quanto rumei a Portugal, após 18 aos de docência no ensino técnico-profissional de Lourenço Marques, passando a leccionar, neste rectângulo mais ocidental da Europa, nos ensinos secundário e universitário. 
Devo esclarecer, outrossim, o respeito que me merecem os oficiais oriundos da Academia Militar de que fui camarada e amigo de alguns deles como oficial miliciano. 
Passo, agora, para um assunto discutível e, possivelmente, melindroso: a chamada "Revolução dos Cravos" que quanto a mim foi um golpe de Estado ensaiado um mês antes por uma coluna de militares, comandada por um capitão, cujo nome não passou à história, saída do Quartel das Caldas que avançou sobre Lisboa tendo os seus intervenientes sido interceptados e presos pelo caminho. 
Foi esta acção como que um balão de ensaio para o vitorioso 25 de Abril em que o probo e valente capitão Salgueiro Maia assumiu um papel destacado no seu êxito sem, por vontade própria, ter colhido quaisquer benesses tidas por outros camaradas seus na ocasião. Mas esta é uma questão que só encontrará resposta no provir porque, fazendo fé em Gertrude Stein, “a História leva o seu tempo; a História faz memória”. 
Perdoe-me ter eu saído, porventura, dos trilhos da minha intenção que foi inspirada em conversas havidas entre mim e um colega em que a determinada altura damos connosco a dizer um para o outro: “Você é que parece de esquerda e eu de direita ou vice-versa", quando se diluem as fronteiras que delimitam aquilo que é justo ou injusto na actual política portuguesa! 
A vossa isenção, frontalidade e hombridade, Professor Galopim de Carvalho, levou-o ao desabafo de se referir ao caos que se instalou no ensino depois de 25 de Abril quando desalentado escreve a determinada altura: “Mais de quatro décadas em que o ‘gosto pelo saber’ foi institucionalmente substituído pela preocupação pelas estatísticas visando o ‘sucesso escolar’ Recuámos, mesmo em relação ao tempo de Salazar e Caetano. Neste quadro decepcionante todos perdemos. Perdem os professores amarrados que estão a ditames que não controlam, perdem os alunos e, em consequência, perdemos todos e perde Portugal”. 
Que bela lição de anti-maniqueísmo a vossa que leva a ver o bem onde está o bem e a ver o mal onde está o mal. 
Obrigado Professor por me levar a ansiar ter a vossa isenção de opinião pela qual também tenho pugnado, não sei se o conseguindo ou não, naquilo que escrevo em defesa do que que tenho por justo e verdadeiro, apesar de ser sabido, como nos avisa Fernando Pádua, "haver sempre um modo diferente de ver os problema dependente 'del cristal com que se mira´". 
Reside aqui a riqueza da controvérsia civilizada que não admite dogmas! 
Respeitosos cumprimentos com votos de boa saúde, 
Rui Baptista

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