sábado, 5 de outubro de 2019

No dia do professor foram os jornais à procura da(s) melhor(es) maneira(s) de ser professor

"Quem entra na aula de … não estranha os alunos agarrados ao telemóvel (…) 
[em jogos que o] professor inventou, para retirar trabalho a quem estuda 
e, com isso, conseguir que aprendam mais. Parece uma equação impossível, 
mas os resultados escolares mostram que é possível. 
(…) Foram precisas muitas horas agarrado à internet e à matéria, 
a explorar ferramentas como o Google Classroom, o Quizizz ou o Kahoot!. 
O resultado é um modelo inovador em que a matéria é apreendida 
com mais facilidade e estudar tornou-se 
um divertimento, em vez do sacrifício (…). 

(Depoimento de um professor, 2019, aqui)

Comemora-se hoje o Dia Mundial do Professor, instituído pela UNESCO em 1994. Passei os olhos por várias notícias disponibilizadas online que faziam alusão à data e que, por certo, muitos lêem. Detive-me num artigo que saiu no Diário de Notícias, em resultado de entrevistas a quatro professores experientes, cuja carreira está a meio ou a mais de meio. O título é Professores que fazem a diferença e sabem motivar alunos para aprenderassina-o a jornalista Céu Neves. Trata-se de um artigo semelhante a muitíssimos outros que fazem passar as mesmas concepções de educação escolar: meias verdades, erros e omissões, além de incoerências. A distância do conhecimento filosófico e pedagógico sobre essa educação é evidente, mas pode sempre argumentar-se que são os professores, que estão na prática, que sabem o que é a realidade, que as validam, pelo que passam a certezas.

Esperando não ter interpretado mal as palavras escritas (confira o leitor na notícia), sistematizo a ideia de ensino veiculada sobretudo em duas entrevistas que se diz permite aprender mais e melhor:
- As novas tecnologias são uma enorme mais-valia: com os telemóveis os alunos não precisam de tomar apontamentos ou de fazer exercícios. A ligação à internet e as "ferramentas" que são disponibilizadas (acrescento, por empresas) potenciam estratégias inovadoras e eficazes; 
- Os alunos são realmente desafiados através do jogo (gamificação), com a sua lógica de pontos, de competição, de sucesso (ainda que não seja isso que se pretenda); 
- Estudar deve ser uma tarefa que implica esforço mínimo por parte do aluno, um "divertimento" em vez de um "sacrifício". O professor terá, pois de se esforçar para "retirar trabalho a quem estuda"; 
- Professores e alunos devem estar ligados, em rede: os primeiros colocam problemas (na forma de jogos) e dão o feedback imediato; os segundos resolvem problemas; 
- Esses problemas devem estar ligados ao quotidiano, a situações do dia-a-dia (acrescento que se trata da intocável "aprendizagem contextualizada); 
- Importa que todos os alunos estejam sempre motivados, nunca "entediados"; 
- Há que trabalhar as emoções, as competências emocionais e socioemocionais, através do mindfulness, da yoga; 
- É desejável a ligação a entidades fora da escola (autaquias...); 
- Critérios de avaliação das iniciativas são o "gosto" (dos alunos e das famílias), a percepção dos colegas de que os alunos melhoram e a solicitação que fazem para dar seguimento às iniciativas, 
Nota: não é de somenos importância pelo menos um dos cenários é de um bairro social.
A minha interpretação é que estes e outros professores fazem o melhor que sabem e podem em ambientes físicos, sociais e intelectuais adversos. E, por certo, têm os seus resultados, que os encorajam a prosseguir. Além disso, facilmente as suas práticas ou que dizem sobre elas ou o que se diz que dizem sobre elas são aplaudidas nessa nebulosa que é a desinformação na área da Educação. Nebulosa de que o jornalismo padece ao não questionar além da superfície, ao não procurar contraditório, limitando-se a fazer passar a "narrativa" que serve a alguém, mas não aos alunos a que temos o dever de ensinar o que é especificamente escolar a partir da abordagem ou abordagens mais esclarecidas que conseguimos construir.

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