segunda-feira, 16 de abril de 2018

O PAPÃO DA MATEMÁTICA


Matemática é raciocínio puro, aristotélico, límpido, e o cérebro humano do século XXI, com milhões de anos de apuramento, excluídos os casos de deficiências clinicamente reconhecidas, tem plenas capacidades para se envolver com ela, com as suas regras e os seus símbolos.

Isto para dizer, preto no branco, que o insucesso de um aluno em matemática (como em outra qualquer disciplina), partindo do princípio não estar diminuído nas suas faculdades cerebrais ou perturbado por problemas comportamentais, só pode ser da responsabilidade do sistema educativo e/ou de quem lhe ministra o ensino.

“- A matemática é como uma escada que se sobe, degrau a degrau, desde o primeiro até ao mais alto que se puder”. - Disse-me o meu professor, do segundo 7.º ano do Liceu (o actual 11.º), que tive de repetir, após reprovação no exame final do ano lectivo anterior.

A geologia, ramo do conhecimento no qual desenvolvi toda a minha actividade docente e de investigação, percorre muitos dos seus caminhos de mãos dadas com diversos domínios da matemática (trigonometria, cálculo diferencial, integral, vectorial e tensorial, mecânica, probabilidades, erros e estatística, entre os mais utilizados). Áreas de investigação como cristalografia, tectónica, geofísica, petrologia, geoquímica e sedimentologia não prescindem de uma ou outra destas ferramentas. Estou, pois à vontade para afirmar que, entre nós, povo, na grande maioria, inculto nesta e em muitas outras coisas do saber científico, generalizou-se uma injustificável vénia pela matemática, vénia que atesta este mesmo lamentável padrão nacional.

Nem sempre gostei de matemática. Aprendi a tabuada com a minha mãe que, enquanto costurava, me mandava recitá-la desde o dois vezes dois, quatro, ao nove vezes nove, oitenta e um, numa cantilena de que a minha geração se lembra com saudade. Na escola primária, vá que não vá, a aritmética e a geometria prenderam a minha atenção e até gostei de fazer aqueles problemas complicados, na 4.ª classe (4.º ano), de um tanque com 6,50 m de comprimento por 3, 20 m de largura e 1,75 m de fundo, recebe água de uma torneira, à razão de 7,5 litros por minuto. Quanto tempo demora este tanque a encher, até transbordar?

Mas no Liceu as coisas não correram tão bem, certamente por culpa minha, mas também, seguramente, por deficiência do professor que me coube em sorte, que me não soube abrir o caminho e estimular o suficiente e o necessário. Neste contexto, fui um aluno sofrível até ao 7.º ano (o actual 11.º), transitando de ano para sempre coxo, sem alegria e a muito custo como dizia o meu pai. E, como era previsível, nesse último ano, tive boas notas em todas as disciplinas, mas chumbei em matemática. E foi o melhor que me podia ter acontecido. Fiquei um ano a repetir esta matéria, mas desta vez, com um professor a sério, digno desse nome. Este, sim, um verdadeiro mestre a ensinar e a cativar os alunos. Era algarvio e, logo nas primeiras aulas, o Dr. Seruca procurou avaliar a bagagem dos seus novos alunos e eu era um deles.

- Se não souberes bem e se não te familiarizares com as bases da matemática, que são as coisas mais simples deste mundo, nunca gostarás desta disciplina. Pelo contrário, se aprenderes a lidar tu cá, tu lá com elas, irás ver que a matemática é como o ar que se respira. – E continuou. – A matemática é como uma escada que se sobe, degrau a degrau, desde o primeiro até ao mais alto que se puder.

Na sequência desta conversa que, só por si, me predispôs a encetar uma nova maneira de ser aluno, passei a sentir prazer nas aulas deste professor. Voltei, por assim dizer, ao rés-do-chão da matemática e, encorajado e acompanhado por ele, fui subindo essa escada, ao longo desse ano, até ao patamar que, em cumprimento do programa, me era exigido. E passei no exame com uma boa nota que, associada ás obtidas nas outras disciplinas, me dispensaram do exame de admissão à Faculdade.

A. Galopim de Carvalho

34 comentários:

Unicórnio disse...

A métrica é complicada em extensos papiros criados/ditados em 11 minutos. Seria preciso mais tempo para correções e substituições. As ideias não se ajoelham: esticam-se.

Fernando Caldeira disse...

Quem passou por alguma experiência semelhante à descrita pelo Professor Galopim, sabe bem a importância do papel que um professor pode desempenhar na ultrapassagem das dificuldades com que um aluno, em qualquer altura do seu percurso escolar, se pode confrontar. Com efeito, um professor não é nem nunca poderá ser “um simples facilitador das aprendizagens” (uma das muitas frases que, durante décadas, fizeram parte do psitacismo que, ainda recentemente, infestava muitas das acções de formação de professores).
A metáfora da escada pode realmente, com toda a propriedade, aplicar-se à aprendizagem da matemática (disciplina cumulativa por natureza), e a praticamente todas as outras disciplinas. Passar “coxo”, no nosso sistema de ensino, equivale assim a pôr o aluno na situação de ter de tentar progredir (subir) por uma escala a que faltam vários degraus.
Pela mesma razão, ver o papel do professor como o de um “andaime” para o aluno, para caracterizar a acção daquele na aprendizagem, como faz Vygotsky, é uma imagem muitíssimo apropriada e elucidativa de como o professor deve actuar.
F. C.

Anónimo disse...

O texto,cheio de candura e idealismo, entende-se e aprova-se no tempo e espaço para que remetem as memórias do senhor Professor Galopim.
Estamos todos de acordo que a população humana não é totalmente constituída por mentecaptos, mas também nos parece evidente que não somos todos génios!...
A Matemática do 7.ºano do tempo do Doutor Salazar não estava ao alcance de toda a gente, incluindo os que tinham a sorte de apanhar bons professores. Mesmo no nosso tempo, com notas internas muito elevadas, resultantes da avaliação contínua corrupta em colégios e escolas EB2,3+S, e do facilitismo vigente, se voltássemos aos exames à séria do tempo do Professor Galopim, as classificações na Matemática do 12.ano seriam uma autêntica razia.
Nestes tempos conturbados, são as próprias autoridades governamentais que incentivam explicita, ou implicitamente, as mais das vezes, um ensino prático, e mesmo psitacista, porque o objetivo primordial é formar pessoas, a quem são atribuídos diplomas, não dando especial importância à questão de averiguar se na escola os alunos ainda aprendem alguma coisa!

Resiliência disse...

Neste momento, o chão é apropriado. Dormir com papel em cima, o cabelo desgrenhado, a beata fumada e a roupa rota e amarrotada.
Outros que façam.

Anónimo disse...

Só por ingenuidade (mas não por candura ou idealismo), ignorância ou interesses particulares, se pode defender as actuais políticas de ensino.
[À margem: gostei do plural majestático na frase " mas também nos parece evidente que não somos todos génios!...); quem sois vós?]

Anónimo disse...

Um plebeu, dos mais baixinhos, a quem a Revolução dos Cravos, em Abril de 1974, fazendo das habilitações académicas uma tábua rasa, permitindo que as formações médias de enfermeiros, professores primários, professores de trabalhos manuais, educadores de infância, e outros que tais, ultrapassassem os licenciados de cursos superiores universitários como eram a Física, a Biologia, a Matemática, a Filologia Românica, as Belas Artes, e por aí adiante, impediu a minha ascensão tranquila à classe média baixa portuguesa. Se quiser continuar a comer pão tenho de trabalhar até perto dos 70 anos de idade. Muitos rapazes e raparigas do meu tempo, que foram estudar para o Magistério Primário, reformaram-se com 50 anos!
Abaixo a burguesia intelectual!
Viva o 25 de Abril!

Anónima disse...

Agora queria fazer um doutorameteo... Acho interessante o trabalho solitário de plágio criativo durante três ou quatro anos. Dá para dar aulas em edifícios de Ensino Superior e tudo.

Ana Piquena disse...

Apresentação: Eu cá sou professoreca do básico mais básico não há, daquelas que põem a cachopada a pintar o dia todo enquanto sai da sala para ir ao super (que não dá tempo pa ir noutro horário porque temos o dia todo ocupado com a escolinha).
Assunto: como estive chateada durante algum tempo, lembrei-me da fazer o 12º, mais o Magistério (do primário), mais um curseco DESE de dois anitos (chamam-lhe especialização), e vão 5 anos de médio e superior, mais duas Pós - Grades e só não acabei o Meestrado porque me avórreci lá com as profes que não sabiam orientar a coisa. Não sabiam. Ponto. Não estudava nada e tive 17 de Lic e 18 de Pró. Vejam lá o facilitismo! Ó pois, refleti e parei de pseudo-estudar. Não vale a pena. A carreira de professor é bué horizontal. Há malta que assume cargos não remunerados sem cursos específicos para tal. Amiguismos... O currículo é só para higienização.
Conclusão: Agora tou a fazer formação pa escrever mais bem.

Anónimo disse...

A Senhora Doutora D.ª Ana Piquena já escreve primorosamente - outra coisa não seria de esperar de uma diplomada do tipo DESE!...
Quando os revolucionários de abril alçaram os professorecos mais básicos que há a professores do liceu cometeram um crime de lesa-ensino!
Antes da anarquia, quando um primário qualquer queria subir, inscrevia-se na universidade para estudar, frequentemente história, e, se tivesse capacidades intelectuais, lá acabaria por formar-se em doutor para dar aulas no liceu.
Assim é que estava bem!
Num país pequeno e pobre, como Portugal, atribuir tantas qualificações superiores, por equivalência e de supetão, viria a ter, poucos anos volvidos, consequências trágicas no orçamento do estado, quando o Governo do senhor engenheiro Sousa ficou sem dinheiro para pagar a tantos doutores reais e fictícios.

Aninhas disse...

Por acaso até é um CESE em Supervisão Educativa (Portaria nº 855/93 de 11/09), curso que para nada serve, como se sabe, uma vez que, neste país, nada se supervisiona, nem os políticos.
As discussões académicas sobre hifenização e tipos de medalhas nas fardas são conversa de escada...
Esclarecimento: um primário nunca quer subir porque não há para onde. As subidas no ensino são como os interruptores: às vezes para cima, outras para baixo.
A falência do Estado deve-se à má gestão de recursos e a uma profunda roubalheira. Os 23 milhões que o Sacristão Carlinhos está a tentar desenterrar são meus.
Quem quer saber de História com um presente destes?
Aposto que o anónimo é o Rui Baptista!

Anarca disse...

Os privilegiados não são os professores de província que se esticaram durante um ano ou dois para sacar um canudo fininho por onde se bebe um chá e pouco mais. Não sejamos mesquinhos...
Os privilegiados são os "políticos ou ex-políticos que gerem interesses, movem influências e beneficiam de direitos adquiridos". Palavras de um vosso conterrâneo, Gustavo Sampaio. Um livrinho com muita paginação...

Anónimo disse...

A Doutora Aninhas, como não sabe com quem está a falar, quanto mais argumenta mais se enterra!...
Se os CESES, quantas e quantas vezes obtidos por plágio, com recurso à internet, não servem para nada, está a dar-me razão quando digo que o ensino se transformou numa palhaçada!
A senhora Aninhas, cheia de CESES, formalmente, e por força da lei, é uma professora primária doutorada, especializada e pós-graduada em supervisão educativa.
O comunismo dos soviéticos russos, tal como o PREC de alguns delinquentes portugueses, também tinha toda a legitimidade revolucionária, mas, como a verdade, nua e crua, vem sempre ao de cima, agora estamos a pagar as favas de termos sido governados por quem não sabia o que fazia!
Muitos relvas e muitos sócrates, com muitas equivalências a artesanato e folclore, aprovados com muitos DESES, tirados a ferros em universidades privadas maçónicas- que patrocinam praxes aberrantes horrorosas, com muitos mortos e duxes assassinos -, formalmente com muitos canudos superiores, realmente não são mais do que uns ladrões com muitos milhões!
Como dizia o outro, tudo começa na escola!
Agora, já pouco se pode fazer!
Pouco mais nos resta do que um apelo desesperado que tem dado muito brado:

VAI ESTUDAR RELVAS!

Anónimo disse...

Já pensaram que o primeiro contacto com a Matemática, via Aritmética, é dado no 1º Ciclo/Primária é dado por pessoas da Área de Humanidades, que "normalmente" tem de raiz uma má relação com a dita Matemática?
É o mesmo de me porem a ensinar, Godo, Grego, Mandarim ....
Além disso, nem toda a gente "digere convenientemente bem", coisas como "desembaraçar de parêntesis", a importância duma Propriedade Distributiva na Factorizarão, e certas evidências ("rectas paralelas não se cruzam" versus meridianos, etc), e mesmo o não ser imediatamente visível o interesse intrinsecamente prático ....
Turmas sobre carregadas de alunos, mui matéria no programa, tempos exposição curtos ..

Iluminária disse...

Arre! Não percebeu nada! A licenciatura é que é em Supervisão. Os pós são em Língua Portuguesa e Sociologia (ano curricular). Por falar em Sociologia... Nem vou falar! Outra treta. Cada tiro, cada melro!
Gostava que me ensinassem a roubar na escola! Ao menos, servia para alguma coisa!

Sugestão disse...

Professores das ciências exatas, já pensaram que todos tivemos um primeiro contacto com a Matemática no 1º Ciclo, dado por pessoas das Humanidades? (Tempo de reflexão)

Conclusão: uns chegam lá por solitária suprema inteligência; outros nunca chegam por culpa dos professores primários.

Por mim, dada a estupidez dos professores do 1º ciclo, os alunos poderiam sair disparados do JI para o 2º ciclo. A economia é tudo. De qualquer forma, as passagens são administrativas, eles não sabem nada, portanto, ninguém notaria.
Em vez das retas paralelas do feiticeiro do Oz traçadas em Mandarim, apenas um arco, em configuração afetiva, humanística e mais prática, de A para C.

Anónimo disse...

Lá por ter recebido de mão beijada, provavelmente numa universidade privada- onde as praxes do DUX conduzem à morte caloiros e segundanistas que só queriam sentir-se integrados! -, uns pós em língua portuguesa e sociologia, isso não lhe dá o direito de se dirigir a um Mestre, como eu, nesse tom de voz!
A doutora só pode estar a fingir que não sabe que eu sou um inimigo figadal do eduquês e de quem o apoia! Quando alguém me diz que é licenciado em Supervisão Pedagógica, ou em Ensino/ Aprendizagem, vêm-me as lágrimas aos olhos, de tanto rir!
Logo eu, que, sentado em frente de um computador, já fiz para fora, embora de forma graciosa, muitos trabalhos e teses em supervisão e melhoria das aprendizagens!
Para vir ao meu encontro, a doutora primária ainda tem de subir muito mais para cima!
Só gosto de letras na sopa!
Eu só ensino Ciência no ensino secundário!
A carreira única é uma aberração revolucionária!

Viva o 25 de Abril!

Carlos Ricardo Soares disse...

Não é despiciendo observar que os primeiros professores de aritmética possam ter um papel importante na preparação das crianças para o gosto e a desenvoltura na matemática.
Presumo, dada a relevância do assunto, que já existam muitos estudos credíveis que expliquem o fenómeno da dificuldade generalizada da matemática para os estudantes.
Por mim, baseado apenas no que concluo da experiência, há uma razão para essa dificuldade. Para a maioria das crianças, o contacto e manuseamento dos números, medidas, pesos, tabelas, escalas, proporções... dá-se formalmente na escola, numa idade em que a criança estando bastante familiarizada com a língua falada e escrita, ainda não teve, ou teve muito fortuitamente, contacto, nem sequer de audiva, com a linguagem dos números.
Haverá casos, e isso seria interessante averiguar, de indivíduos que tiveram muito sucesso na matemática cuja infância foi alheada dos números, e vice-versa. Mas parece-me óbvio que, enquanto o contacto com a linguagem verbal se inicia ainda no ventre da mãe e continua logo após o nascimento, o contacto com a linguagem algébrica raramente acontece antes da escola. Se este primeiro contacto não for adequado, e sobretudo se não for o melhor, porque o(a) professor(a) não gosta de números, dificilmente a criança descobrirá essa realidade fascinante que é, afinal, uma realidade do quotidiano, do merceeiro, do calceteiro, do alfaiate e do banqueiro...

Anónimo disse...

No campo das possibilidades académicas, um indivíduo pode ter grandes dotes retóricos e, no entanto, estender-se ao comprido quando perora sobre matérias que conhece menos bem. Começando por tomar algum balanço, arrisco-me a afirmar que numa quantificação ad hoc que eu faço do acervo de conhecimento científico recolhido pela Humanidade, no seu conjunto, até ao dia de hoje, 22 de abril de 2018, a matemática tem direito a uma fatia de leão, nunca inferior a 90 % do bolo, ou do queijo, da Serra ou de Nisa, consoante o gosto de cada um!
Isso de sermos todos muito bons quando frequentamos a escola e depois os professores e a sociedade transformarem-nos em barrigudos maus, admite tantas excepções que não pode ser assumido como uma regra. A mim, parece-me mais uma desculpa esfarrapada. O ambiente tem a sua influência, conforme atestado por literatura abundante na área da etnologia e da antropologia comparada, mas as diferenças marcantes e decisivas devem continuar a procurar-se na constituição do ácido desoxirribonucleico (ADN).

Quando Deus criou o mundo
do Alto do Paraíso,
deixou rico, deixou pobre,
deixou falto de juízo!

Tonalidades disse...

Pelos sinais no céu, passou um ovni...

Há muito que trato Odin eloquentemente por tu, um beija-mão incorrigível que me dá tudo o que lhe peço. Nunca pedi integração porque isso exige muito trabalho da minha parte, um trabalho tétrico de encaixe que o meu ser original e individuado não está preparado para executar. Não subo para lado nenhum, nem vou ao encontro de ninguém por causa do perigo de poder desenvolver uma teoria materialista da socialização. Além do mais, sou fragmentária como Nietzsche, perdida num mundo irreal e erróneo, no qual curto viver. A irresponsabilidade da loucura...
Tudo é de um absurdo aberrante profundo! Estou nas nuvens com Schopenhauer, sorvendo uma sopinha (sem judeus no creme da batata), med(e)itando, em transcendente liberdade de um feriado eterno de abril.

Ah ah ah ah disse...

https://youtu.be/-kbi1EMcD3E

Anónimo disse...

VAI ESTUDAR, RELVAS!

Unknown disse...

O que se passa hoje com este governo e com o actual ministro da educação é demasiado grave pois será o culminar de situações que algumas caricaturas aqui apresentadas mostram em relação formação de professores. Mas esses comentários parecem, por outro lado, também indicar alguma perda da capacidade de nos indignarmos sobre a maneira como o futuro dos jovens está a ser tratado, atendendo também ao facto de se afastarem do tema do artigo que supostamente lhes teria dado origem (na minha leitura, o artigo chama a atenção para o papel crucial que o professor pode representar no processo de ensino). Será essa não indignação sinal de que a nossa “inteligência emocional” se está a desenvolver?

Vagabundo Ignorante disse...

Creio que percebeu o meu ponto de vista, que é tão simples quanto isto: uma coisa é saber "arte" ensinar, outra é dominar a matéria/assunto que se ensina.
Sendo assim, não se espantem que uma pessoa que sabe ensinar, diga coisas como "o Homem descende do macaco" numa aula de História, ou eu a ensinar Mandarim (e, já agora, Português), ou que há quatro operações aritméticas distintas, sem reparar que a multiplicação é a soma n vezes dum Número e idem para a Multiplicação versus Potenciação, e que solução é papaguear a Tabuada, ou que a Terra é plana, ou, pior para o Método Cientifico, confunda as suas crenças pessoais legitimas com factos.
E todo isto, numa idade precoce e plena fase de aquisição e estruturação de conhecimentos.
Considero muito mais importante, na Primária, ensinar a formação das Palavras, com a sua Raiz e seu significado, e os seus prefixos e sufixos, para que, no futuro diálogo cientifico, saibam, por exemplo, "iso" é igual a "equi" e é igualdade/equivalência, "duo" <=> "bi", e assim sucessivamente, o significado de "Domínio"/"Universo" na Teoria de Conjuntos (Ex. no Universo dos brinquedos existentes na sala, há o conjunto dos que estão no armário no fundo da sala, o dos que estão a ser usados, e os que estão na secretária da professora, e nenhum deles pertence ao Universo dos brinquedos da sala ao lado) fundamental para se perceber como podemos ser manipulados nas Estatísticas...
E já agora, para que não digam que só implico os professores do 1º Ciclo, já alguém se preocupou com facto de, no Secundário, os Vectores, um conceito que todos comemos ao pequeno-almoço, ser dado no 1º Período em Física, mas só é explicado, em Matemática, no 3º Período do mesmo Ano, se for?

Vagabundo Ignorante disse...

As passagens são mesmo mui administrativas, e, uma das poucas vantagens do Exame da 4ª Classe à Crato, era trazer este facto à superfície, ou pelo menos as suas consequências...
Além disso, façam o que fizerem, e com qualquer comportamento, as criancinhas não são sancionadas, nem os pais são "chamados" à Escola.
Daí que, quando as ditas chegam ao 2º ciclo, estes professores tenham de lidar com todo o "não saber" e "hábitos comportamentais" que alguns trazem (o que pode incluir não saber ler um texto ...) o que é meio caminho para vários insucessos.
Sim há necessidade de se mudar a atitude com que a Sociedade olha para a Pré-Primária e Primária e as valorize como preparação de Cidadãos.
Até porque, com Turmas sobre lotadas, é impossível um Professor Primário chegar a cada aluno!

Receita da vovó disse...

A formação de professores é uma caricatura. Vou desistindo de algumas a meio do caminho, mesmo quando creditadas. Demasiadas atividades de teatro e partilha de vivências... Pouco conhecimento académico. Tenho a teoria de que sem teoria a prática é inconsistente, mal fundamentada e pouco eficaz. Das formações, quero a parte académica que, com o percurso dos anos, se vai esboroando e envelhecendo. A prática não pode ficar suspensa na intuição, no que cada um acha, em projetos da CM para angariação de votos, no que está na berra, em decisões conjuntas mal paridas nas reuniões de Conselho de Docentes (há coisas tão giras, pá!)...
Quanto à capacidade de nos indignarmos, mostra-mo-la de que forma? Manifes e greves bem pagas por nós? Protestantismo latente e sistemático com as Direções numa atitude de suicídio islâmico? Refilar mudamente nas redes sociais?
O clã académico não tem força nem para fazer valer as suas investigações na prática (impera a lei do manual, lido, respondido, projetado: se não tivermos cuidado, as editoras mandarão nas práticas pedagógicas); o ME serve para organização de concursos, leis avulsas e pouco mais; a IGE vai lá de forma calendarizada e preparada dar umas notas passíveis de reclamação; a (in)Dgest não responde a nada e promove umas palestras com gente importante para fazer resumos do trabalho que faz; os sindicatos são inócuos, senão não tínhamos chegado onde estamos.
Anarquia e boicote? Instalar ainda mais a desorganização no caos?
A coisa tem de ser pensada politicamente, em gabinetes arejados, com gente academicamente forte que saiba jogar xadrez, mas que andou nas pedreiras e tem a noção do que lá se passa. Conhecimento, realismo e eficácia.

Vai trabalhar, malandro! disse...

Por acaso, os exemplos são pouco felizes e pouco credíveis, pelo que faço e vejo fazer.
Nem me obriguem a voltar o espelho para os ciclos que vêm depois do primeiro, os quais passam as culpas das desgraças do mundo à primordial raiz que nenhum machado parece cortar. Puro determinismo salvífico de batutas que têm culpa, como todos os maestros, das dissonâncias e desarmonias.
Fiz vigilância de exames de Português de 12º ano e, enquanto rodava pelas carteiras, apercebi-me de frases mal estruturadas, caligrafias irregulares e sujas, erros ortográficos, desconhecimento da matéria (na altura, o teste versava sobre heterónimos de Fernando Pessoa), falta de coesão no discurso, enfim... O que é que esta gente andou a fazer, desde a pré-adolescência até à idade de jovem adulto, durante 8 anos? Deixaram de se corrigir erros? Os erros são apenas da responsabilidade dos professores de Português?
A culpa é do primário, claro! O nosso fantasma percorre todo o caminho como um demo encapotado à espera da crucificação. Fica bem pensá-lo e dizê-lo - coesão parcial de classe e lavagem de mãos, Pilatos. O Barrabás é que é o culpado!

Anónimo disse...

Aqui temos um discurso básico, mas aparentemente honesto, de uma professora primária que nos apresenta o sistema de ensino, visto de dentro para fora. Para começar eu também sou professor, mas não sou primário... A formação de professores e educadores de infância é uma palhaçada. Para já, a formação inicial dos professores do ensino secundário, para que estes fossem dignos do tratamento "doutores", deveria ser da competência exclusiva de universidades públicas. A formação dos outros, também com muita pedagogia e supervisão pedagógica envolvida, mas com uma exigência de preparação científica, obviamente, muito menor, ficaria a cargo dos politécnicos.
Os médicos e os enfermeiros têm carreiras distintas, apesar de serem todos licenciados. O mesmo se deveria passar com os professores do secundário, por um lado, e os educadores de infância e primários, por outro. Ensinar a resolver as equações do lançamento oblíquo de um projétil, mesmo com desprezo pela resistência do ar, e avisar a auxiliar de ação educativa que é preciso mudar a fralda de um infante são tarefas inerentes a profissionais diferentes.
Os professores primários não precisam de formação extraordinária. Do que eles precisam é de inspetores que vão verificar às escolas se os alunos ainda aprendem alguma coisa, independentemente de os seus mestres serem doutorados e saberem, muito ou pouco, de Supervisão Pedagógica e Melhoria das Aprendizagens em Contexto de Sala de Aula pelo Método do Aprender a Aprender!
Apesar de tudo, concordo que a Esperança tem de ser a última a morrer!

Abril, de novo, pela força do Povo!

Anónimo disse...

Um professor de Física do ensino secundário, formado nas Faculdades de Ciências, que proporcionavam estágios integrados aos futuros professores, não um engenheiro, ou um farmacêutico, qualquer, teve aulas, no Departamento de Matemática, de Cálculo Infinitesimal, Álgebra Linear e Geometria Analítica e Análise Infinitesimal. Qual é o problema em ensinar vetores? Qual é problema?
O problema é que uma percentagem elevada de alunos do Secundário não aprenderam, nas aulas de matemática a dividir 0 por 1, a multiplicar 1 por 10, sem máquina de calcular, nem a procurar a solução para uma equação do primeiro grau!

Vagabundo Ignorante disse...

Vejamos, meus caros Inquisidores:
-Os vectores não tem problema, à parte de serem um conceito que não entra usualmente no quotidiano, onde geralmente só se fazem contas com valor do seu módulo.
O QUE NÃO FAZ SENTIDO, a meu ver, É O CONCEITO CAIR DO CÉU EM FÍSICA no 1º PERÍODO, PARA SÓ SER DADO, SE FOR, EM MATEMÁTICA NO 3º PERÍODO (O ÚLTIMO, CASO NÃO SAIBAM) do mesmo Ano Lectivo. O que faz sentido, é ser dado 1º em Matemática e só depois, e em consonância, em Física, quanto mais não seja, para se aperceberem da sua utilidade prática ....
- Caso não saibam, PORTUGUÊS NÃO É SÓ LITERATURA! É também uma língua usada em Ciência (já não estamos no tempo do Greco-Latim, e apesar do Inglês), e tenho tropeçado com mui gente que não percebe uma explicação de Física porque não sabe Português básico. E quem diz Física, pode dizer Ciências Naturais, História etc.
Não percebo porque é que, uma resposta correcta, não tem de estar também correcta no Português.
Sendo assim, não é de estranhar que os heterónimos levem "um tiro no porta-aviões e restante frota";
- Finalmente, caríssimos Inquisidores, podem crer nos exemplos que dei (sei que só acreditem em confissões sob tortura, mas não se pode ter tudo e estamos no Séc. XXI), nem quero fazer um Auto de Fé queimando os Profs Primários, para vossa tristeza.
O que é importante é revermos o que se passa na Pré-Primária e Primária, que matérias são dadas e como se interligam, e na atenção que damos, ou podemos dar, a cada aluno individualmente.

Lição disse...

“Os professores primários não precisam de formação extraordinária. Do que eles precisam é de inspetores que vão verificar às escolas se os alunos ainda aprendem alguma coisa”.
Discurso do mais básico não há e pouco honesto, convenhamos.

Corrijo: “Os professores primários precisam de formação extraordinária.” Para além das nove disciplinas que trabalham, cujos conteúdos têm de saber, deveriam ter formação extraordinária consistente em áreas como Pedagogia, Metodologia, Psicologia Infantil, Filosofia...
Por exemplo, seria fundamental que um professor soubesse de que forma se consubstancia a identidade de alguém, como se passa de um quadro quase branco para um plano ideativo mais complexo, que big bang é necessário para a produção de pensamento, de que maneira é o exterior absorvido e convertido em consciência de si e dos outros com significações lógicas e emocionais, como se passa de um universo caótico de possibilidades à ordem das coisas com lugares mentais definidos, que processos se encontram na base do desenvolvimento da inteligência (assumida nas diversas dimensões). Provavelmente, sabendo os mecanismos que regulam qualquer processo de aprendizagem, seria mais fácil ensinar/aprender, adequar práticas pedagógicas ao formato mental de cada um.
A simplicidade é mais complexa do que a complexidade porque a complexidade explica-se por decomposição gradativa de ideias. Como se explica o simples? Foi Deus que fez?
Há qualquer coisa de metafísico no traçar de uma reta porque tenho de explicar que ela continua mesmo que não a veja a não ser no pedaço do quadro em que a risquei, que ela é unidimensional e que tem comprimento infinito nos dois sentidos opostos. E aqui tenho que ter explicado antes o conceito de dimensão inerente apenas ao comprimento e de infinito quando todos nós somos segmentados. E como se forma o conceito de infinito numa criança de 7/8 anos? Como é que a ajudo a ultrapassar a matéria, a existência para a colocar num plano meramente teórico e virtual? Num esforço de mediação e de abstração, continuo a recorrer à imagem, porque a criança não tem ainda mais do que isso, e associo fantasias que lhe sejam tangíveis e peço-lhe para imaginar... para olhar as estrelas e para além delas e eles lá vão situando afetivamente a reta, abrindo-lhe portas de um lado e de outro sem nunca chegar às últimas. Imaterialidade da qual se vê apenas um fragmento e tudo o resto se imagina. Perceber ecos, visualizar sombras, sentir o vento pode ajudar a percepcionar o abstrato que passa primeiro por ser físico. Poesia.
Coisa simples, né?

Quanto a inspetores, há uma insuficiência metafísica da definição.
Monitorização precisam todos os professores principalmente os de ensino superior que formam professores.

Anónimo disse...

"...que big bang é necessário para a produção de pensamento...?"
A doutora não brinca!... Pode ser primária, mas vê-se que já leu "Breve história do tempo", de Stephen Hawking! Sinto-me esmagado! Quem sabe Supervisão Educativa, sabe tudo!
Como continuo a ser contra a carreira única dos professores do ensino secundário, dos professores primários e dos educadores de infância, proponho uma divisão profissional entre os que sabem muito, os chamados primários, que ganham mais, e os que sabem muito pouco, os chamados doutores do ensino secundário, que ganham menos!

Anónimo disse...

Senhor vagabundo ignorante,
Um professor de Física, licenciado por uma faculdade de ciências, tem habilitações académicas mais do que suficientes para ensinar cálculo vetorial a alunos do ensino secundário, independentemente do que possa ocorrer nas aulas de matemática. Para a maioria dos alunos do ensino básico e secundário, a noção de vetor está mais associada à Física do que à Matemática.
Essa história da consonância e dos vetores quotidianos que caem do céu remete para uma cosmologia fora do meu entendimento!

Tio Patinhas disse...

“Estudara” muito pouco o comportamento das paisagens
“do tempo” pergunto “que sabia ele”?
bruscamente voltara-se para uma explosão de álcool
algures na “biografia” no “mapa” dele naquelas partes
que mexem de leve
junto ao fígado? à espinal medula? coração? intestinos?
nada conhecia das “transcrições” que logo começam a ferver
e caem sob os olhos
foi apenas o melhor numa “agonia transparente para si mesma”
um morto veloz na maneira de pôr os dedos
sobre a “escrita impossível”.
(...)

Helder, Herberto: “Poemas Completos”, Texto 11, p. 293, Porto Editora

Não sei conversar com gente que só pensa em dinheiro. É fastidioso.

Vagabundo Ignorante disse...

Caro Anónimo,
Mui mal estaríamos se um Licenciado em Física não tivesse conhecimentos para explicar a Matemática Primário-Liceal (Licenciatura por equivalencias ainda não chegou aqui, por enquanto....).
O que pergunto é se é função dele dar os conceitos ou se so se deve focar no seu uso prático.
Para mim, é este último caso a sua função.

NOVA ATLÂNTIDA

 A “Atlantís” disponibilizou o seu número mais recente (em acesso aberto). Convidamos a navegar pelo sumário da revista para aceder à info...