quarta-feira, 20 de janeiro de 2016

A Ordem dos Professores, a Fenprof e os exames


 “De repente, perante a obstinação dos que teimaram em acreditar na realidade, o Portugal novo-rico transformou-se no Portugal novo-pobre. Pobre, porque pobre na qualificação das pessoas” (António Guterres).


Existem actualmente 17 (dezassete) ordens profissionais.

 A  doutrina  legislativa que tem presidido à  respectiva criação  aponta estas, inequivocamente, stricto sensu, como associações públicas que exigem uma formação académica superior dos seus membros que se possa responsabilizar pela qualidade dos respectivos actos profissionais e pelo estrito cumprimento de um código deontológico próprio.

 Em tempos, a Fenprof, numa perspectiva maniqueísta, pouco abonatória e elegante para com os profissionais tutelados por ordens profissinais, considerou publicamente que os problemas de natureza ética e deontológica “para  serem assumidos pela classe docente não necessitam da vigilância ou da orientação de nenhuma ordem” ( Jornal de Notícias, 13/08)1998). Ou seja, de um lado os maus e desonestos profissionais a necessitarem do “policiamento” dos respectivos pares; do outro, os bons e honestos professores à rédea solta.

Este statu quo tem dado azo a que a voz dos professores se manifeste, essencialmente,  através dos sindicatos de professores  como se  a nobre missão de ensinar se pudesse circunscrever a questões meramente salariais ou de horários de trabalho. Deixando, consequentemente,   a responsabilidade das grandes e graves questões educativas (de entre elas,  o sistema de avaliação dos alunos)  para os diversos ministros da Educação, que se têm sucedido em catadupa e que a primeira coisa que  fazem é desfazer o que os seus antecedentes fizeram.

Embora reconhecendo a carga política subjacente, por o seu autor  Paulo Rangel ser eurodeputado pelo  PSD,  o artigo de opinião,  saído ontem no Público, intitulado “O grande desastre educativo”, julgo poder trazer  novas achegas  para a discussão, concordante ou discordante,  sobre os exames que neste blogue me mereceram dois  posts “A velha polémica sobre os exames” (14/01/2016) e ”Ainda a velha polémica sobre os exames” (16/01/2016).

Transcrevo parte  do supracitado e extenso artigo  por ser a prova que os exames não são tratados como uma questão eminentemente do múnus docente, mas  transformados  numa questão  política ( o próprio Mário Nogueira reconheceu publicamente quando confessou “estar a travar um combate político-partidário”, “Jornal de Notícias”, 08/11/2008). Aliás,  a Fenprof congratulou-se (pouco faltando lançar foguetes de jubilo) com o seu fim anunciado, extemporaneamente, pelo actual ministro da Educação, mais um dos que se vão sucedendo na 5 de Outubro, sem  a audição dos professores representados por uma ordem profissional que os represente em bloco e não,  como o acontecido,  pulverizados por inúmeros sindicatos de professores  que os não representam na totalidade. Reza esse excerto:

 O  Primeiro-Ministro e o Ministro retomam a outrora flamejante recusa dos exames como método de avaliação. Tudo começa por uma impostação infantil a respeito dos exames. Tudo assenta na diabolização dos exames e das capacidades que eles são adequados a avaliar. E no caso concreto, assentou até num logro, num logro intencional: a ideia de que a avaliação feita nos 4.º, 6.º e 9.º ano era exclusivamente determinada pelas provas de exame. Ora, ao contrário da ideia que se fez passar, o resultado dos exames era apenas uma fracção da avaliação e a sua influência efectiva na aprovação dos alunos foi comprovadamente diminuta. Os exames são um método legítimo e útil de avaliação: medem capacidades e qualidades – ou competências, como gostam de pomposamente dizer os adeptos do “eduquês” – que outros tipos de avaliação não são aptos a medir. E introduzem um factor de apreciação externa e homogénea que permite colocar todos os discentes em igualdade de circunstâncias. De resto, fomentam e desenvolvem a consciência de que, nas sociedades competitivas hodiernas, há momentos especialmente determinantes em que o nosso grau de ciência e de destreza é posto à prova. Que se saiba, os exames não fazem ainda parte do museu dos instrumentos da tortura, dos registos da inquisição ou do arsenal das polícias políticas. Nem implicam nenhuma violência psicológica sobre as crianças. São um teste com exigências próprias, com dificuldades inerentes, mas que correspondem às exigências e às dificuldades que os humanos encontram na vida quotidiana. Achar que uma criança de 10, 12 ou14 anos não pode fazer um exame, – que nem sequer é a fonte exclusiva ou principal de avaliação – porque isso pode ser traumático, releva do mero preconceito e revela uma visão desqualificada das crianças e dos jovens”.

Em face do exposto e “em nosso tempo, onde insultamos a democratização pela mediocratização de tudo”, como escreveu o falecido académico de Física António Manuel Baptista, tenho agendado, para breve, um texto em que abordarei, mais detalhadamente, os argumentos que me levam a persistir na necessidade da criação de uma Ordem dos Professores por mim defendida no meu livro  “Do Caos à Ordem dos Professores (2004).  

Aliás,  criação que foi debatida  por iniciativa  do Sindicato Nacional dos Professores Licenciados, em 2 de Dezembro de 2005, na Assembleia da República e que não  vingou com o argumento de estar para breve uma nova legislação sobre esta matéria. Criada que está essa legislação não seria altura de criar  esta associação profissional de direito público que dê voz ao sociólogo Francesco Alberoni: “Na verdade a pedagogia que nivela tudo por baixo no intuito de esbater as diferenças tem como consequência tornar ignorante milhões de pessoas e não privilegiar aqueles que podem ir para a universidade e para escolas de excelência com professores respeitados e programas rigorosos; é por esta razão que há cada vez mais pessoas a quererem uma escola mais séria, mais rigorosa, com professores preparados e mais respeitados”.

2 comentários:

Francisco Domingues disse...

Este texto merecia muitos comentários. Infelizmente, as presidenciais levam-nos o tempo... Obrigado ao autor. Da Fenprof não vale a pena falar. Usurpou o poder, com o seu "mentor" bem instalado na direcção, mentor que nunca deve ter dado aulas, se é que é professor..., e só é de admirar que haja professores que se filiem em tal sindicato cujo contributo, em análise objectiva, tem sido bem negativo para a educação em Portugal e dignificação da classe docente. Quanto ao actual ministro da educação e governo que acabam com os exames, só não percebo porque ainda continua como ministro quando o povo o rejeita liminarmente.

Rui Baptista disse...

Obrigado sobre o seu comentário. Brevemente, publicarei um outro sobre a Ordem dos Professores que espero merecer a sua atenção.

Só não posso deixar de lamentar que os professores (os verdeiros professores) não se pronunciem com os seus comentários (quer pró quer contra) sobre uma matéria que poderia valorizar uma profissão (ou mero exercício profissional) de que muito haveria a esperar no que tange à respectiva valorização e à melhoria do ensino em prol dos alunos.

NOVA ATLÂNTIDA

 A “Atlantís” disponibilizou o seu número mais recente (em acesso aberto). Convidamos a navegar pelo sumário da revista para aceder à info...