sábado, 6 de setembro de 2014

A CRISE DO ENSINO EM PORTUGAL E NA SUÉCIA

"Fiquei aterrado: ensinar!" - Eça de Queiroz.

Começo por transcrever um pequeno excerto de um artigo publicado hoje:
Jonas Sjöstedt, líder do Partido da Esquerda da Suécia, e potencial parceiro de coligação num futuro governo de centro-esquerda,  resume a decepção da opinião pública sueca: ‘Os suecos acreditavam que a desregulação era a solução para tudo, da gestão dos caminhos-de-ferro à educação dos filhos, mas isso acabou. Há partes da nossa vida que o mercado não pode preencher’. E aponta o dedo às organizações com fins lucrativos, considerando-as responsáveis pela crise que se abateu sobre o país – a que os suecos chamam ‘o choque de Pisa’. «Não estão nisto por gostarem dos miúdos ou por estarem interessados na educação. Estão nisto porque querem fazer dinheiro rapidamente» (Diário Económico, 06/09/2012).
Este statu quo  torna actual um post por mim aqui publicado, intitulado:  “ENSINO OFICIAL, ENSINO CONVENCIONADO E ENSINO PRIVADO” (10/11/2012).Pela analogia entre as situações de crise do ensino privado na  Suécia e em Portugal (pago com o dinheiro dos contribuintes), sem mais delongas, transcrevo esse meu post, até porque, como escreveu Pitigrilli, “tudo deve ser discutido; sobre isso não há discussão possível”:

"Perante uma aparente apatia de escolas oficiais confrontadas com a acção concertada do ensino privado com contrato de associação (para o qual a lei estabelece condições que nem sempre são cumpridas), estão grande número daquelas escolas do país transformadas em verdadeiros elefantes brancos com instalações luxuosas carenciadas de alunos e com professores com horários zero que fazem pairar nuvens negras sobre o seu presente e futuro.

Mas será que se tornou tabu discutir esta temática com todos aqueles que o deviam fazer e o não fazem? Ou seja, uns tantos políticos, ou até mesmo, professores das actuais escolas secundárias oficiais parecem esquecidos do papel heróico e digno de personalidades que deram um estatuto de grande qualidade e honorabilidade a antigos liceus de que se tornaram herdeiros directos. Como, por exemplo, no caso do Liceu Pedro Nunes de Lisboa, professores como Rómulo de Carvalho e alunos como o actual Ministro da Educação, Nuno Crato [perante a má prestação ministerial de Nuno Crato, abro um parêntesis para me referir, apenas ao seu perfil científico], e tantas outras e ilustres personalidades nele docentes ou cursadas, difíceis de nomear pelo seu elevado número, pontificam em numerosos aspectos científicos, culturais  e artísticos da sociedade portuguesa.

Apesar deste statu quo, ainda há escolas oficiais que tudo fazem para sobreviver à tona de água da verdadeira mediocridade que infestou o ensino em Portugal. Casos de sucesso dos ensinos oficial, privado e convencionado minimizam essa mediocridade. Como mero exemplo, ditado pela posição de destaque ocupada no ranking nacional de escolas oficiais em função da média das notas de exames nacionais do 12.º ano, o caso da Escola Secundária Infanta D. Maria, de Coimbra. Sem esquecer, e muito menos desconsiderar, outras escolas das margens do Mondego, ou de outras partes do território nacional, sob a tutela directa do Estado.

Tomando para mim uma citação de Edgar Morin, faço o seguinte apelo: “Peço que me ataquem frontalmente, me julguem pelas minhas ideias e não por aquilo que queriam que fossem as minhas ideias”. Isto é, a minha defesa em prol das escolas oficiais não significa, de forma alguma, um ataque às escolas privadas convencionadas. A cada uma delas o seu papel específico para não se tornarem as escolas públicas numa espécie de vazadouro de alunos que por elas optam como última escolha e não como eleição deliberada de tempos gloriosos na memória colectiva dos portugueses.

Mas grande parte desta polémica, que está longe de ter chegado ao fim, reduz-se a uma coisa tão simples como esta: dever ser o ensino privado com contrato de associação uma alternativa ao ensino público inexistente numa determinada área e não mera satisfação megalómana de carteiras familiares pouco abonadas que gostam de blasonar terem os filhos a estudar em colégios. Em plena época de grave crise económica, promover  uma situação de favor para com o ensino privado subsidiado, poderá ser uma forma de transformar o ensino privado sem apoios do Estado num barco em perigo de se afundar por, em nome da sua independência, dispensar quaisquer formas de subsídios. Salvo melhor opinião, reduzir esta questão ao binário ensino oficial/ensino privado convencionado poderá ter como consequência ferir de morte os colégios independentes dos dinheiros públicos. Alíás, estabelecimentos de ensino com uma longa e valorosa  tradição  no panorama do ensino nacional.

Contrariando um exagerado pessimismo da alma lusitana, de que receio me ter feito intérprete, Almada Negreiros deixou-nos lampejos de esperança: “Os dias terríveis são, afinal, as vésperas dos dias admiráveis”.


Mas que cheguem rapidamente esses dias admiráveis em benefício da sociedade portuguesa fustigada por ventos constantes de mudança do sistema educativo que em nada ajudam o equilíbrio emocional da sua juventude e prejudicam o seu rendimento escolar!"

Os factos são estes (e como se costuma dizer, contra factos não há argumentos). Cabe, todavia, ao leitor extrair da matéria factual as devida ilacções. Quanto ao Governo, deste extremo ocidental europeu, deve ser exigido que acabe com experiências em que os alunos são verdadeiras cobaias e os professores uma revivência dos escravos gregos ao serviço dos governantes de Roma. Ademais se, a exemplo da crítica mordaz de Oscar Wilde, essas experiências tomarem o nome que damos aos erros que cometemos!

2 comentários:

Ildefonso Dias disse...

Professor Rui Baptista;

Eu penso que, porventura o que falha na Suécia só é um problema - de mercado, de desregulacão e de liberdade de escolha para os pais - na medida em agora concluiram que não foi possivel chegar ao "caminho livre para os capazes". A criacao de um sistema de ensino justo na seleccao de capacidades deve ser independente de se tratar de ensino publico ou privado.
Por isso, para mim, a observacao "Não estão nisto por gostarem dos miúdos ou por estarem interessados na educação. Estão nisto porque querem fazer dinheiro rapidamente” é verdade, mas nada tem a ver com os reais problemas do ensino e a criaccão de um sistema que vá primar por uma seleccao adequada de capacidades; mais parece um saída airosa para uma “elite mediocre” (falsa) que por o ser falhou, não me parece que desta forma vão encontram o bom caminho tão cedo!!!
Idem para nós... em Portugal tambem o caminho livre para os capazes é distorcido e inclinado para muitos! os lugares de dirigente da sociedade são apartida só para alguns privilegiados, não os mais capazes é certo, em muitos casos são até pouco capazes! como se assiste.

P.S.:Quanto ao ensino convencionado, em Portugal, são por demais evidentes os sinais de riqueza exterior daqueles que administram essas instituicões! É imoral!

Cumprimentos Cordiais,

Rui Baptista disse...

Engenheiro Ildefonso Dias:
Quando se concorda com um comentário nada há a acrescentar. Apenas lamentar que a mediocridade do compadrio se sobreponha ao mérito do indivíduo. Cumprimentos gratos, pelo seu comentário.

NOVA ATLÂNTIDA

 A “Atlantís” disponibilizou o seu número mais recente (em acesso aberto). Convidamos a navegar pelo sumário da revista para aceder à info...