sexta-feira, 13 de junho de 2014

O debate do direito ao óptimo

Nunca neguei o meu apreço por todas as liberdades e direitos individuais. Aliás, isso faz de mim um alvo dos inúmeros insultos que aparecem e vão aparecer nas caixas de comentários, porque nem toda a gente é apreciadora da responsabilidade individual e colectiva que essas liberdades e esses direitos trazem. No entanto, para desgosto de alguns dos meus amigos mais liberais, há coisas em que reconheço  direito do colectivo a benefícios que os indivíduos só podem usufruir se o colectivo  for beneficiário. Por exemplo, sou um opositor ferrenho de planos de reforma separados porque se o colectivo assume o compromisso de apoiar qualquer cidadão até à morte isso significa que a opção por um plano individual de reforma também impacta no coletivo e em todos os outros  indivíduos. Portanto, mantendo o direito do individuo a complementar a sua reforma o melhor que puder ou quiser, não tem o direito de prescindir daquela que está associado ao compromisso que o colectivo tem com ele.

Esta conversa para chegar ao ponto que gostava de focar. O voto obrigatório. Confesso que durante muito tempo fui um opositor do voto obrigatório (leia-se com penalidades) porque sempre achei que há um direito associado ao voto, o de não votar. Hoje não tenho essa opinião porque, como expliquei acima, há um direito do colectivo a coexistir com a garantia da manutenção do direito individual.

A democracia é o sistema óptimo porque a diversidade de opiniões e a volatilidade destas faz com que um colectivo  extraordinariamente complexo se vá adaptando às mutações do meio ambiente e social que enquadram esse colectivo. Por isso sempre achei parvo seguir ideais escritos quando se levava dois dias a chegar de Lisboa ao Porto numa era em que se fala cara a cara com Pequim em segundos. As pessoas que "desenharam" esses ideais hoje escreveriam outros completamente diferentes, se os anormais que os seguem os deixassem. A fluidez da opinião do colectivo é fundamental para progresso económico e social.

Mas só existe essa fluidez com estatística. Se às urnas só forem os fanáticos, a opinião do colectivo  retirada do sufrágio é dura como um calhau e esse colectivo adapta-se com maior dificuldade às mutações que o rodeiam. Portanto, cada um dos indivíduos, ao recusar-se a votar, está a aumentar a viscosidade do processo e a retirar aos demais a eficácia do processo eleitoral.

Há um direito individual a não ter opinião? Há. Ninguém é obrigado a exprimir uma opinião ainda que seja obrigado a votar. O processo eleitoral secreto permite votar em branco, colar macacos, desenhar falos e, até, acrescentar o Ronaldo ao boletim. Portanto, havendo o um direito do colectivo  e não estando em causa os direitos fundamentais, tem que passar a haver penalização para quem não vote. Eu tenho o direito a usufruir dos benefícios da optimizaçao do processo democrático, construída com as ideias mais patetas que por aí andam( e se as há....).

No meu tempo, ninguém faltava à inspecção da tropa para ir à praia. Dependendo da penalização, vão ver que toda a gente vai arranjar tempo para votar. E eu vou ter o sistema óptimo, ainda que por vezes não concorde com a maioria.

25 comentários:

A cruz disse...

Ou vota ou é castigado. Porque o voto, em democracia é obrigatório. Para que o sistema funcione...


A cruz disse...

Falta uma vírgula.

Carlos Ricardo Soares disse...

Detesto este tipo de discurso.
Apesar de ser tão parco em justificações quanto é generoso em estereótipos desbotados, o João já pensou que os partidos podem ter muito receio do voto obrigatório? Isto do obrigatório, ou é muito (direito) bem justificado ou dá sempre pró torto. Para obrigar alguém é preciso força, mas, mais do que isso, a força da razão e, mesmo assim, nem sempre se consegue a obediência voluntária.
Imagina os partidos a saírem todos derrotados das eleições? É difícil? O sistema eleitoral não foi desenhado por mim e ninguém pode obrigar-me, a mim ou a si, a concordar ou a discordar.
Na realidade, ninguém pode ser obrigado a nada.
Às vezes (?) aparecem uns tipos que querem (gostavam) de mandar nos outros, mas a história não se cansa de mostrar que isso é uma estúpida (bestial) ambição.

João Pires da Cruz disse...

A justificação está clara, a democracia só funciona se a estatística funcionar. Acha que é uma estúpida ambição? Eu vivo num país onde 2/3 do valor do meu trabalho, percebido pelos meus clientes, é absorvido por funcionários com recurso à violência, pela ameaça da privação da liberdade. Eu diria que estúpido sou eu...

Ob jet ivo disse...

Se todos votássemos, o mundo seria bem melhor.

Anónimo disse...

Um pouco menos de provincianismo -- leia-se ignorância bruta -- não seria má ideia. No Brasil, o voto é obrigatório. O resultado está longe de aproximar este país de um paraíso político, económico, social ou cultural. E o estudo científico destas questões não é também uma má ideia.

João Pires da Cruz disse...

Que estupidez. A sua vida vale aquilo que os insultos anônimos e a pseudo erudição que tenta passar? Chica....

Anónimo disse...

Só concordo com a sua última afirmação. É óbvia.

Humildemente disse...

Agradeço o insulto. Assim discutem as ideias, os palermas.

joão viegas disse...

Caro João Pires da Cruz,

1. Se v. quiser ser insultado, escreva um texto que o mereça. Afinal de contas, ja demonstrou ser dotado de talentos suficientes para isso...

2. Concordo com muito do que v. escreve (neste post), mas permaneço indeciso sobre a questão. Existe um biés problematico quando a decisão é deixada apenas aos mais "militantes", deixando de fora os outros, porventura mais numerosos (os que não se deslocam às urnas). Certo. Mas não existira um biés no voto de quem o faz por mera obrigação, sem acreditar minimamente naquilo que esta a fazer ? Ou seja, admitindo que o objectivo, paradoxal, é forçar as pessoas a agir de forma "responsavel", cabe perguntar : até que ponto tem sentido "obrigar" alguém a ser "responsavel"...

3. Dito isto, a minha posição é mesmo de indecisão. Porque um sistema que se pretende democratico mas em que vota apenas uma minoria, enfim...

Boas

Unknown disse...

Em Portugal não há muito espírito de debate (não sei como é nos outros países) porque as pessoas preferem atacar o criador da ideia/opinião invés de atacar a ideia/opinião de outra pessoa. Depois há pessoas que se revêm na ideia e reagem como se estivéssemos a ofende-los quando a sua ideia é esmagada com argumentos ou factos. Outra coisa é rotular as pessoas com base na sua ideia. No caso do Dr. João Pires da Cruz acusariam de ser liberal e com isso traz toda a bagagem do liberalismo.O que faz com que qualquer opinião liberal que exista mesmo que essa pessoa não se reveja nela, para eles essa será sempre a sua ideia. E assim se destrói um debate.

Quanto ao voto a minha opinião é que se votar é um dever, então temos de votar. Mas compreendo que actualmente se encontram limitações: um aluno numa faculdade longe da sua residência oficial, num fim-de-semana carregado de trabalhos não consegue fazer uma viagem grande para exercer o seu voto. Sei que quando o voto for electrónico, isto não será um obstáculo porque o cidadão pode votar onde lhe der mais jeito, arrisco a dizer mesmo na praia. Depois também temos o problema das pessoas acamadas e doentes, nesse caso terão de ir ao centro de saúde obrigatoriamente pedir "baixa" para não serem multados?
Também sou da opinião que os boletins deviam ter um quadradinho no fim da lista a dizer: nenhum destes

Anónimo disse...

Isso de atacar a pessoa é tão antigo quanto o debate em si. Faz parte. Aliás, o Pires da Cruz é particularmente expedito em insultar o seu oponente. O problema é que em Portugal há muito o síndrome de "virgem ofendida" e os insultos são levados demasiado a sério. Quanto à matéria da coisa, o facto é que não é preciso pensar mais do que dois segundos para contrapor à tese do post: "e nos casos onde é obrigatório votar? Isso melhorou a democracia local?" E a resposta parece ser negativa. Infelizmente, logo à primeira réplica - que é quase imediata - o pires da cruz resolveu retirar-se de campo. Pior ainda, este tipo de atitude é-lhe vulgar aqui: primeiro lança com estrondo a tese e quando surgem as primeiras réplicas (muitas vezes, óbvias), ou tenta desviar a conversa ou desaparece do debate (deixando um insulto gratuito pelo caminho), raramente apresenta a sua treplica. E assim não há debate.

Anónimo disse...

Mas verdade seja dita: isto é um blog; não um forum.

João Pires da Cruz disse...

Caro joão viegas,

1. Se me preocupasse com os insultos, não escrevia. Não era uma queixa, era uma constatação. E talento para ser insultado, não me falta...

2,3. O voto obrigatório não resolve a irresponsabilidade de ninguém. Aliás, a irresponsabilidade faz parte. Só traz as pessoas a serem activamente irresponsáveis, que me parece diferente. Vou ser irresponsável, mas vou fazer por isso. E penso que por aí, pelo menos, a resiliência das escolhas passará a ser menor. Mas, obviamente, vai continuar, como tem que continuar, a haver brancos e nulos porque as pessoas têm o direito de não escolher. Não terão é o direito de se demitir.

João Pires da Cruz disse...

Ricardo,
todas essas circunstâncias se pesam relativamente à penalidade. Se não há penalidade, até o javali ao lume é desculpa, como diria a personagem do Astérix. Se a penalidade é o presídio militar, até os emigrantes aparecem, como apareciam à inspecção militar. A virtude deverá estar no meio, sendo que nos dias de hoje onde tudo se faz remotamente, não me parece que nada disso possa servir de impedimento. Finalmente, não me trate por Dr. que não sou médico...

João Pires da Cruz disse...

Meu caro anónimo, insultos de parte de anónimos não podem ser levados a sério. Nem são. Por isso não respondo. Da mesma forma que não me vê a começar os textos a chamar burro a toda a gente (ou provinciano, ou fascista, ou ...) não me peça para responder a quem o faz.

Provinciana disse...

Discussão de favela.

Anónimo disse...

Isso de ser anónimo ou ser zé pedro é irrelevante quando se trata de ideias ou de insultos de gente que nos é estranha. Por extensão, dizer que não se responde porque pelo meio houve insultos é precisamente fazer figura de "virgem ofendida", isto é, sentir-se insultado e amuar. É uma desculpa fraca. Se existe vontade de debater, basta ignorar os insultos e ir para a carne do problema. E aqui é: 1) que penalidade haveria? (falta à tropa dava direito a prisão...); 2) se noutros países existe o voto obrigatório (aliás, é uma prática comum das ditaduras, curiosamente) por que funcionaria em Portugal?; 3) Dado que existem em Portugal - ao que parece - cerca de meio milhão de eleitores fantasma então haveria mais de meio milhão de notificações e aberturas de processos a gente que já está morta....o que implica a CNE ter uma estrutura e equipa muito superiores - tudo financiado pelo estado (note-se que pelo mesmo argumento, a abstenção em Portugal é falsamente aumentada); 4) Mesmo com as cadernetas limpas e mesmo que abstenção caia para metade, ainda assim estamos a falar em mais de um milhão de pessoas. Uma vez mais, era preciso construir toda a máquina para lidar com a abertura de um milhão de processos e etc...às custas do estado; 5) o voto obrigatório não vai dar origem ao problema do voto ao calhas? E portanto, teríamos duas ficções: 1) é uma democracia obrigatória; 2) os votos não correspondem à consciência de quem vota. Aliás, eu tenho ideia que esta coisa do voto obrigatório só iria beneficiar os partidos do centro e, portanto, iria resultar num parlamento cada vez mais monocromático. Isso não interessa às democracias, mas às ditaduras cínicas. Talvez seja isso...

João Pires da Cruz disse...

Se anónimo é irrelevante ou não, sou eu que decido.

Anónimo disse...

E para mim isso é irrelevante. Não o insultei e apresentei-lhe várias questões relativas ao assunto do seu "post". Poderia ter a simpatia de responder?

Anónimo disse...

Pela resposta das !8:02 vê-se que para o Snr J Pires da Cruz as ideias são coisa secundária. Mais que a ideia importa se o autor é José ou Marcelo R. de Sousa.
E mais, colabora num blogue que admite anónimos e não concorda. Tão fácil a solução que nem digo.

Luís Silva disse...

As minhas perguntas continuam sem resposta. Foram feitas sem insultos e com o propósito de contribuir. No entanto - nada. Perdoe-me que lhe diga então que do seu silêncio, para além da enorme falta de educação que denota, só se pode concluir que nunca esteve interessado em debater este assunto, ou então que confunde debater com debandar e pensar com opinar.

Anónimo disse...

1) que penalidade haveria? (falta à tropa dava direito a prisão...); 2) se noutros países existe o voto obrigatório (aliás, é uma prática comum das ditaduras, curiosamente) por que funcionaria em Portugal?; 3) Dado que existem em Portugal - ao que parece - cerca de meio milhão de eleitores fantasma então haveria mais de meio milhão de notificações e aberturas de processos a gente que já está morta....o que implica a CNE ter uma estrutura e equipa muito superiores - tudo financiado pelo estado (note-se que pelo mesmo argumento, a abstenção em Portugal é falsamente aumentada); 4) Mesmo com as cadernetas limpas e mesmo que abstenção caia para metade, ainda assim estamos a falar em mais de um milhão de pessoas. Uma vez mais, era preciso construir toda a máquina para lidar com a abertura de um milhão de processos e etc...às custas do estado; 5) o voto obrigatório não vai dar origem ao problema do voto ao calhas? E portanto, teríamos duas ficções: 1) é uma democracia obrigatória; 2) os votos não correspondem à consciência de quem vota. Aliás, eu tenho ideia que esta coisa do voto obrigatório só iria beneficiar os partidos do centro e, portanto, iria resultar num parlamento cada vez mais monocromático. Isso não interessa às democracias, mas às ditaduras cínicas. Talvez seja isso...

joão viegas disse...

Caro anonimo de 17.06 às 01:58,

Como disse, tenho duvidas sobre os méritos do voto obrigatorio, mas não é caso para caricaturar. Esta solução existe, ou existiu, em Estados perfeitamente democraticos (Bélgica, Australia, Luxemburgo, Italia antes de 1993, nos Paises Baixos, embora não tenha a certeza que ainda esteja em vigor, etc.).

As sanções, tanto quanto sei, costumam ser de multa.

Como (quase) sempre, a questão merece ser ponderada, o que supõe que deixemos de parte os argumentos 100 % emocionais e procuremos fazer o balanço das vantagens e dos inconvenientes de cada uma das soluções.

Pela parte que me toca, não me parece obvio qual é o lado para o qual se inclina a balança...

Boas

Anónimo disse...

Caro João Viegas, eu igualmente não tenho posição definida sobre o assunto e por isso gostava de o debater. Não tentei caricaturar mas apenas apresentar as primeiras dúvidas que se me ocorrem. Recordo que os pressuposto do Pires da Cruz - que, como lhe é usual, deu em debandada logo que se ia iniciar o debate- eram que "dependendo da penalização, vão ver que toda a gente vai arranjar tempo para votar" e que "ninguém faltava à inspecção da tropa para ir à praia". Pois, acontece que falta à inspecção dava prisão, pelo qual aqui não é argumento pois certamente que não se iria prender quem não fosse votar. Então qual seria a medida? Multa? E que multa seria penalizadora o suficiente para obrigar a votar? E já viu: um por cento apenas de eleitores em portugal equivalem a 80 000 pessoas. Vai ser preciso montar toda uma máquina para abrir processos, julgar, multar...Por outro lado, há vários países onde o voto é ou foi obrigatório: a democracia foi melhor? Pergunto apenas, porque apenas quero saber. A única caricatura que vejo aqui é colocar no título a palavra debater e depois fugir perante as primeiras dúvidas.

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